O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

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O que é o Espiritismo.

(Primeira versão.)
(Idioma francês)

Capítulo primeiro.


PEQUENA CONFERÊNCIA ESPÍRITA.


SEGUNDO DIÁLOGO. — O CÉTICO.

(Sumário)


Diversidade dos Espíritos.


26. O Visitante. — Falais de Espíritos bons ou maus, sérios ou frívolos; confesso-vos que não compreendo essa diferença; parece-me que, deixando o envoltório corporal, os Espíritos se despojam das imperfeições inerentes à matéria; que a luz se deve fazer para eles, sobre todas as verdades que nos são ocultas, e que eles ficam libertos dos prejuízos terrenos.


A. K. — Sem dúvida eles ficam livres das imperfeições físicas, isto é, das dores, das enfermidades do corpo; contudo, as imperfeições morais são do Espírito e não do corpo. Entre eles, alguns são mais ou menos adiantados, moral e intelectualmente, sendo erro acreditar-se que os Espíritos, só porque deixaram o corpo material, recebem logo a luz da verdade. Acreditais, por exemplo, que, quando morrerdes, não haja distinção alguma entre o vosso Espírito e o de um selvagem ou o de um malfeitor? Se fosse assim, de que vos serviria ter trabalhado para a vossa instrução e melhoramento, quando um preguiçoso, depois da morte, poderá valer tanto quanto vós? O progresso dos Espíritos só se realiza gradualmente e, algumas vezes, com muita lentidão. Conforme o grau de adiantamento a que chegaram, alguns entre eles veem as coisas sob um ponto de vista mais justo do que quando estavam encarnados; outros, pelo contrário, conservam ainda as mesmas paixões, os mesmos preconceitos e os mesmos erros, até que o tempo e novas provas os venham esclarecer. Isto vem provar um princípio elementar do Espiritismo: o de que existem Espíritos de todos os graus de inteligência e moralidade. E notai bem que o que digo é fruto da experiência, colhido no que eles nos dizem em suas comunicações.


27. O Visitante. — Por que, então, não são perfeitos todos os Espíritos? Tê-los-ia Deus assim criado em tão diversas categorias?


A. K. — É o mesmo que perguntar por que nem todos os alunos de um colégio estão cursando Filosofia. Todos os Espíritos têm a mesma origem e o mesmo destino. As diferenças que existem entre eles não constituem espécies distintas, mas graus diversos de adianta- mento. Os Espíritos não são perfeitos porque são as almas dos homens que não atingiram a perfeição; pela mesma razão, os homens não são perfeitos por serem encarnações de Espíritos mais ou menos adiantados. O mundo corpóreo e o mundo espiritual estão em contínuo revezamento; pela morte do corpo, o mundo corpóreo fornece seu contingente ao mundo espiritual; pelos nascimentos, o mundo espiritual alimenta a Humanidade. Em cada nova existência, o Espírito realiza um progresso maior ou menor e, quando adquiriu na Terra a soma de conhecimentos e a elevação moral que o nosso globo comporta, ele o deixa para ir viver em mundo mais elevado, onde vai aprender novas coisas.

Os Espíritos que formam a população invisível da Terra são, de certo modo, o reflexo do mundo corpóreo; neles se encontram os mesmos vícios e as mesmas virtudes; há entre eles sábios, ignorantes, pseudossábios, prudentes e levianos, filósofos, argumentadores, cultores de sistemas; como ainda não se despiram de seus prejuízos, todas as opiniões políticas e religiosas encontram representantes entre eles; cada um fala segundo suas ideias e o que dizem é, muitas vezes, apenas a sua opinião pessoal. É por isso que não se deve crer cegamente em tudo o que dizem os Espíritos.


28. O Visitante. — Sendo assim, apresenta-se grande dificuldade: nesses conflitos de opiniões diversas, como se distinguir o erro da verdade? Não consigo descobrir a utilidade dos Espíritos, nem o que ganhamos em conversar com eles.


A. K. — Se os Espíritos servissem apenas para dar-nos a prova de sua existência e de serem as almas dos homens, só isto já não seria de grande importância para quantos ainda duvidam que tenham uma alma e ignoram o que será deles depois da morte? Como todas as ciências filosóficas, esta exige longos estudos e minuciosas observações, pois só assim é que se aprende a distinguir a verdade da impostura, e que se adquire os meios de afastar os Espíritos enganadores. Acima dessa turba de baixa esfera, existem os Espíritos superiores, que só têm em vista o bem, e cuja missão é guiar os homens pelo bom caminho; cumpre a nós saber apreciá-los e compreendê-los. Estes nos vem ensinar grandes coisas; mas não julgueis que o estudo dos outros seja inútil; para conhecer bem um povo é necessário estudá-lo sob todas as suas faces.

Vós mesmos tendes a prova disso; pensáveis que bastava aos Espíritos deixarem seu envoltório corporal para que se despojassem de todas as suas imperfeições; ora, são as comunicações com eles que nos ensinaram o contrário e nos fizeram conhecer o verdadeiro estado do mundo espiritual, que nos interessa a todos no mais alto grau, visto que todos iremos para lá. Quanto aos erros que podem surgir da divergência de opiniões entre os Espíritos, eles desaparecem por si mesmos, à medida que se aprende a distinguir os bons dos maus, os sábios dos ignorantes, os sinceros dos hipócritas, absolutamente como se dá entre nós. Cabe ao bom senso repelir as falsas doutrinas.


29. O Visitante. — Insisto na observação feita quanto ao ponto de vista das questões científicas e outras que podemos sub- meter aos Espíritos. A divergência de suas opiniões sobre as teorias que dividem os sábios deixa-nos na incerteza. É compreensível que, não possuindo todos o mesmo grau de instrução, os Espíritos não podem saber tudo; mas, então, que peso pode ter para nós a opinião daqueles que sabem, quando não podemos distinguir quem erra ou quem tem razão? Tanto vale nos dirigirmos aos homens como aos Espíritos.


A. K. — Essa reflexão é ainda uma consequência da ignorância do verdadeiro caráter do Espiritismo. Aquele que supõe nele achar meio fácil de saber tudo, de tudo descobrir, incorre em grande erro. Os Espíritos não estão encarregados de trazer-nos a ciência já feita; seria, realmente, muito cômodo se nos bastasse pedir para sermos logo servidos, ficando assim dispensados do trabalho de estudar. Deus quer que trabalhemos, que o nosso pensamento se exercite, pois só adquirimos a ciência a esse preço; os Espíritos não nos vêm libertar dessa necessidade: eles são o que são; o Espiritismo tem por meta estudá-los, a fim de que, por analogia, fiquemos sabendo o que seremos um dia, e não para nos fazer conhecer o que nos deve ser oculto, ou revelar-nos coisas antes do tempo devido.

Os Espíritos tampouco são leitores de buena-dicha, e aquele que se vangloria de obter deles certos segredos prepara para si estranhas decepções da parte dos Espíritos zombeteiros; em suma, o Espiritismo é uma ciência de observação, e não uma arte de adivinhar e especular. Nós o estudamos com o fito de conhecer o estado das individualidades do mundo invisível, as relações que existem entre elas e nós, sua ação oculta sobre o mundo visível, e não para dele tirar qualquer vantagem material. Deste ponto de vista, não há Espírito algum cujo estudo não nos traga alguma utilidade; sempre aprendemos alguma coisa com eles; as suas imperfeições, os defeitos, a incapacidade, a ignorância mesmo, são outros tantos objetos de observação, que nos iniciam na natureza íntima desse mundo; e, ainda mesmo que eles não nos instruam, nós mesmos, ao estudá-los, nos instruímos, como fazemos quando observamos os costumes de um povo que não conhecemos.

Quanto aos Espíritos esclarecidos, esses nos ensinam muito, mas sempre nos limites do possível; nunca, pois, lhes perguntemos o que eles não podem ou não devem revelar; contentemo-nos com o que nos dizem; querer ir além é nos sujeitarmos às mistificações dos Espíritos levianos, sempre dispostos a responder a tudo. A experiência nos ensina a julgar do grau de confiança que lhes devemos conceder.


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