Espiritismo e Espiritualismo.
(2.)
— Dissidências. (3.)
— Fenômenos espíritas simulados. (4.)
— Impotência dos detratores. (5.)
— O maravilhoso e o sobrenatural. (6.)
— Oposição da Ciência. (7-10.)
— Falsas explicações dos fenômenos.
(11-14.) — Não basta que os incrédulos vejam para que se convençam. (15.)
— Boa ou má-vontade dos Espíritos para convencer. (16.)16.)
— Origem das ideias espíritas modernas. (17.)
— Meios de comunicação. (18-20.)
— Médiuns interesseiros. (21-23.)
— Médiuns e feiticeiros. (24,
25.) — Diversidade dos Espíritos. (26-29.)
— Utilidade prática das manifestações. (30.)
— Loucura, suicídio e obsessão. (31.)
— Esquecimento do passado. (32.)
— Elementos de convicção. (33, 34.)
— Sociedade Espírita de Paris. (35.)
— Interdição do Espiritismo. (36.) |
Falsas explicações dos fenômenos.
Alucinação. — Fluido magnético. — Reflexo do pensamento. — Superexcitação cerebral. — Estado sonambúlico dos médiuns.
11. O Visitante. — É contra os fenômenos provocados que a crítica mais se opõe. Deixando de lado toda suposição de charlatanismo, e admitindo a mais completa boa-fé, não se poderá pensar que os médiuns sejam vítimas de uma alucinação?
A. K. — Ignoro se já conseguiram explicar claramente o mecanismo da alucinação. Tal como a entendem, ela não deixa de ser um efeito muito singular e digno de estudo. Por que, então, aqueles que por meio dela pretendem explicar os fenômenos espíritas não possam antes apresentar a explicação de tais fenômenos? Há, além disso, fatos que escapam a essa hipótese: quando a mesa ou outro objeto se move, se ergue, ou bate; quando se desloca à vontade, num quarto, sem que ninguém lhe toque; quando se destaca do solo e fica suspensa no espaço, sem ponto de apoio; enfim, quando se quebra, ao cair, por certo isto não resultará de uma alucinação. Supondo que o médium, por efeito da sua imaginação, creia ver o que não existe, será possível que todos os presentes sejam vítimas da mesma vertigem? E quando o mesmo fato se reproduz por toda parte, em todos os países? Nesse caso, a alucinação seria um fenômeno bem mais prodigioso que o próprio fato.
12. O Visitante. — Admitindo a realidade do fenômeno das mesas que giram e respondem por batidas, não será mais racional atribuí-lo à ação de um fluido qualquer, do fluido magnético, por exemplo?
A. K. — Tal foi o primeiro pensamento que tive, como tantos outros. Se tudo se limitasse a esses efeitos materiais, não há dúvida de que poderiam ser explicados desse modo; mas, quando esses movimentos e golpes nos deram provas de inteligência; quando se reconheceu que respondiam ao pensamento com inteira liberdade, chegou-se à seguinte conclusão: Se todo efeito tem uma causa, todo efeito inteligente deve ter uma causa inteligente. Ora, poderão tais fenômenos ser produzidos por um fluido, sem se admitir que esse fluido seja dotado de inteligência? Quando vedes os braços do telégrafo fazerem sinais transmitindo o pensamento, compreendeis perfeitamente que não são esses braços, de ferro ou de madeira, que são inteligentes, mas sim que é uma inteligência que os faz mover. Dá-se o mesmo com a mesa. Dão-se, ou não, efeitos inteligentes? Eis a questão. Os que contestam são pessoas que nada viram ainda, mas que, a despeito disso, se apressam a tirar conclusões segundo suas próprias ideias, ou baseadas, quando muito, em observações superficiais.
13. O Visitante. — Pode-se responder que, se há um efeito inteligente, este não passa de um reflexo da própria inteligência, seja do médium, seja de quem interroga, ou mesmo dos assistentes, visto que a resposta recebida está sempre no pensamento de alguém.
A. K. — É ainda um erro, oriundo da falta de observação. Se os que assim raciocinam se tivessem dado ao trabalho de estudar o fenômeno em todas as suas fases, não deixariam de reconhecer, a cada passo, a independência absoluta da inteligência que se manifesta. Aliás, como conciliar essa tese com as respostas obtidas, levando-se em conta que muitas delas estão fora do alcance intelectual e da instrução do médium, respostas que contradizem suas ideias, desejos e opiniões, ou que frustram completamente as previsões dos assistentes? Quando os médiuns escrevem em uma língua que não conhecem, ou mesmo na sua própria língua quando não sabem ler nem escrever? À primeira vista, essa opinião nada tem de irracional, convenho, mas é desmentida por fatos de tal modo numerosos e concludentes que, diante deles, a dúvida já não é possível. Além disso, mesmo se admitindo essa teoria, o fenômeno, longe de ser simplificado, seria muito mais prodigioso.
Pois quê! Então o pensamento poderá refletir-se sobre uma superfície, como a luz, o som, o calórico? Em verdade, havia nisto um motivo para a Ciência exercer a sua sagacidade. E, depois, o maravilhoso seria ainda maior, porque, achando-se presentes vinte pessoas, será o pensamento desta ou daquela que é refletido, ou o desta ou daquela outra? Tal sistema é insustentável, sendo realmente curioso ver-se os contraditores se empenharem na busca de causas cem vezes mais extraordinárias e incompreensíveis do que aquelas que lhes são apresentadas.
14. O Visitante. — Não se poderia admitir, segundo a opinião de alguns, que o médium se ache em estado de crise e goze de certa lucidez, que lhe dá a percepção sonambúlica — espécie de dupla vista — o que explicaria a ampliação momentânea de suas faculdades intelectuais? Por que razão, dizem, as comunicações obtidas pelos médiuns não vão além do alcance das que nos dão os sonâmbulos?
A. K. — É ainda um desses sistemas que não resistem a um exame aprofundado. O médium não se acha em crise, nem dorme, mas está perfeitamente acordado, ag5ndo e pensando como todo o mundo, sem nada apresentar de extraordinário. Certos efeitos particulares deram lugar a essa suposição; porém, quem não se limitar a julgar as coisas por uma só face reconhecerá sem dificuldade que o médium é dotado de uma faculdade particular que não permite confundi-lo com o sonâmbulo, sendo a completa independência do seu pensamento demonstrada por fatos da maior evidência.
Pondo de lado as comunicações escritas, qual o sonâmbulo que fez alguma vez sair um pensamento de um corpo inerte? Qual deles foi capaz de produzir aparições visíveis e, mesmo, tangíveis? Qual fez que um corpo pesado se mantivesse suspenso no ar, sem ponto de apoio? Será por efeito sonambúlico que um médium desenhou, um dia, em minha casa e na presença de vinte testemunhas, o retrato de uma jovem, morta havia dezoito meses e a quem ele não conhecera, retrato reconhecido pelo pai da moça, presente à sessão? Também será por efeito sonambúlico que uma mesa responde com precisão às questões propostas, mesmo feitas mentalmente? Por certo, se admitirmos que o médium se ache em estado magnético, parece-me difícil acreditar que a mesa seja sonâmbula.
Dizem, ainda, que os médiuns só falam com clareza daquilo que é conhecido. Entretanto, como explicar o fato seguinte e cem outros do mesmo gênero? Um dos meus amigos, excelente médium escrevente, perguntou a um Espírito se uma pessoa que ele tinha perdido de vista, havia quinze anos, ainda pertencia a este mundo. Respondeu o Espírito: “Sim, ainda vive; mora em Paris, rua tal, número tanto”. Ele foi e encontrou a pessoa no lugar indicado. Seria isso uma ilusão? Seu pensamento jamais poderia sugerir-lhe tal resposta, porquanto, tendo em vista a idade da pessoa por quem ele perguntava, havia toda probabilidade de ela não existir mais. Se, em certos casos, vemos respostas combinarem com o pensamento de quem pergunta, será racional concluirmos que isso seja uma lei geral? Nisso, como em todas as coisas, são sempre perigosos os juízos precipitados, porque podem ser desmentidos pelos fatos que ainda não se observaram.