O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão.
Doutrina espírita - 1ª parte.

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O que é o Espiritismo.

(Primeira versão.)
(Idioma francês)

Capítulo primeiro.


PEQUENA CONFERÊNCIA ESPÍRITA.


SEGUNDO DIÁLOGO. — O CÉTICO.
(Sumário)

Oposição da Ciência.


7. O Visitante. — Dissestes que vos apoiais em fatos; mas é a opinião dos sábios, daqueles que os contestam, ou os explicam de modo diferente do vosso, que se opõe a vós. Por que eles não deram a devida atenção ao fenômeno das mesas girantes? Se nisso houvessem notado alguma coisa séria, parece-me que não desprezariam fatos tão extraordinários e nem os repeliriam com desdém; no entanto, são todos eles contra vós. Os sábios não serão os faróis das nações, e o dever deles não será espalhar a luz? Por que teriam deixado de fazê-lo quando se lhes apresentava tão bela ocasião de revelar ao mundo a existência de uma nova força?


A. K. — Traçastes o dever dos sábios de modo admirável; é de lamentar-se, porém, que eles o tenham esquecido em mais de uma ocasião. Mas, antes de responder à vossa judiciosa observação, cumpre-me assinalar um erro grave que cometestes dizendo que todos os sábios são contra nós.

Como vos disse há pouco, é justamente na classe ilustrada que o Espiritismo faz maior número de prosélitos, e isto em todos os países do mundo; entre seus adeptos há grande número de médicos de todas as nações. Ora, os médicos são homens de ciência; os magistrados, os professores, os artistas, os homens de letras, os oficiais, os altos funcionários, os grandes dignitários, os eclesiásticos, etc., que se agrupam ao redor da sua bandeira, não são pessoas em quem não se deva reconhecer uma certa dose de ilustração. Então só há sábios na ciência oficial e nos corpos constituídos?

Pelo fato de ainda não ter o Espiritismo adquirido direito de cidadania na ciência oficial, merecerá ser condenado? Se nunca a Ciência se houvesse enganado, sua opinião teria, nesse caso, grande peso na balança; infelizmente, a experiência prova o contrário. A Ciência não repeliu como quimeras uma porção de descobertas que, mais tarde, ilustraram a memória de seus autores? Não foi devido a um parecer do nosso primeiro corpo científico que a França se absteve da iniciativa do vapor? Quando Fulton veio ao campo de Boulogne apresentar o seu plano a Napoleão I, que confiou o exame imediato ao Instituto, não concluiu este que aquilo era um sonho impraticável e que não se devia ocupar com ele? Devemos daí concluir que os membros do Instituto são ignorantes e que sejam justificados os epítetos triviais que, à força de mau gosto, certas pessoas se comprazem em prodigalizar-lhes? Certo que não; não há pessoa sensata que não faça justiça ao seu saber eminente, sem, contudo, deixar de reconhecer que eles não são infalíveis e, portanto, que as suas sentenças não são inapeláveis, sobretudo no que se refere a ideias novas.


8. O Visitante. — Admito perfeitamente que eles não sejam infalíveis; mas não é menos verdade que, em virtude do seu saber, a opinião deles vale alguma coisa, e que, se ela estivesse do vosso lado, daria grande peso ao vosso sistema.


A. K. — Admiti, também, que ninguém pode ser bom juiz naquilo que está fora da sua competência. Se quiserdes construir uma casa, confiareis esse trabalho a um músico? Se estiverdes doente, procurareis um arquiteto? Se tiverdes um processo contra vós, buscareis a opinião de um dançarino? Finalmente, quando se trata de uma questão de teologia, alguém irá pedir a solução a um químico ou a um astrônomo? Não; cada um tem a sua especialidade. As ciências vulgares repousam sobre as propriedades da matéria, que se pode manipular à vontade; os fenômenos que ela produz têm por agentes forças materiais. Os do Espiritismo têm como agentes inteligências que possuem independência, livre-arbítrio e não estão sujeitas aos nossos caprichos, escapando, portanto, aos nossos processos de laboratório e aos nossos cálculos; estão, por conseguinte, fora dos domínios da ciência propriamente dita.

A Ciência enganou-se quando quis experimentar os Espíritos, como experimenta uma pilha voltaica; foi malsucedida, como devia sê-lo, porque agiu visando a uma analogia que não existe; e depois, sem ir mais longe, concluiu pela negação, juízo temerário que o tempo se encarrega de reformar todos os dias, como já reformou tantos outros, restando àqueles que o emitiram, a vergonha do erro de se haverem levianamente pronunciado contra o poder infinito do Criador.

As corporações científicas não podem nem jamais deverão pronunciar-se nesta questão; isto não é da sua alçada, como também não é da sua competência decretar se Deus existe ou não; é, pois, um erro fazê-las juiz em semelhante caso. O Espiritismo é uma questão de crença pessoal que não pode depender do voto de uma assembleia, porque esse voto, mesmo que lhe fosse favorável, não tem o poder de forçar convicções. Quando a opinião pública se tiver formado a respeito, os membros dessas corporações a aceitarão sob o poder dos fatos. Deixai passar esta geração e, com ela, os prejuízos do seu obstinado amor-próprio, e vereis que se há de dar com o Espiritismo o mesmo que se deu com tantas outras verdades, tão combatidas e que agora seria ridículo duvidar. Hoje, chamam loucos aos crentes; amanhã, será a vez dos que não crerem, exatamente como se deu com os que acreditavam no movimento de rotação da Terra. Nem todos os sábios, porém, julgaram do mesmo modo; e notai que agora chamo sábios aos homens de estudo e saber, tenham ou não um título oficial.

Muitos fizeram o seguinte raciocínio: “Não há efeito sem causa, e os efeitos mais vulgares podem conduzir-nos à solução dos mais difíceis problemas. Se Newton não tivesse prestado atenção à queda de uma maçã; se Galvani houvesse repelido sua serva e a tomasse por visionária e louca, quando ela lhe falou das rãs que dançavam no prato, talvez até hoje ignorássemos a admirável lei da gravitação universal e as fecundas propriedades da pilha elétrica. O fenômeno, burlescamente designado sob o nome de “dança das mesas”, não é mais ridículo que a dança das rãs, e talvez encerre alguns desses segredos da Natureza, os quais, quando se tem a chave para explicá-los, revolucionam a Humanidade”.

Eles disseram ainda: “Já que tanta gente se ocupa com eles, e homens notáveis fizeram deles objeto do seu estudo, é porque existe alguma coisa em tais fenômenos; uma ilusão, uma farsa, se o quiserem, não pode ter esse caráter de generalidade; poderia seduzir um círculo, um grupamento de pessoas, mas não daria a volta ao mundo. Guardemo-nos, pois, de negar a possibilidade do que não compreendemos, sob pena de receber, cedo ou tarde, um desmentido que não faria jus à nossa perspicácia”.


9. O Visitante. — Muito bem! Eis aí um sábio que raciocina com sabedoria e prudência; e, sem ser sábio, eu penso como ele. Notai, porém, que ele nada afirma, mas duvida; ora, qual é a base em que se firma a crença na existência dos Espíritos e, sobretudo, a possibilidade de eles se comunicarem conosco?


A. K. — Essa crença se apoia sobre o raciocínio e sobre os fatos. Eu próprio não a adotei senão depois de meticuloso exame. Tendo adquirido, no estudo das ciências exatas, o hábito das coisas positivas, sondei, perscrutei essa nova ciência nos seus mais íntimos refolhos; busquei a explicação de tudo, porque só aceito uma ideia quando lhe conheço o como e o porquê.

Eis o raciocínio que me fazia um sábio médico, outrora incrédulo e hoje fervoroso adepto: “Dizem que seres invisíveis se comunicam; e por que não? Antes de inventar-se o microscópio, alguém suspeitava da existência desses milhares de animálculos, que causam tantos estragos à economia? Onde a impossibilidade material de haver no espaço seres que escapem aos nossos sentidos? Teremos, porventura, a ridícula pretensão de saber tudo, e de dizer que Deus nada mais nos pode revelar? Se esses seres invisíveis que nos rodeiam, são inteligentes, por que não poderão comunicar-se conosco? Se estão em relação com os homens, devem desempenhar um papel no seu destino, nos acontecimentos da vida. Quem sabe se eles não constituem uma das potências da Natureza, uma dessas forças ocultas de que nem sequer suspeitávamos? Que novo horizonte vai abrir-se ao pensamento! Que vasto campo de observação!

“A descoberta do mundo dos invisíveis tem alcance bem maior que a dos infinitamente pequenos; ela é mais que uma descoberta: é uma revolução nas ideias. Quanta luz pode jorrar dessa descoberta! Quantas coisas misteriosas explicadas! Os crentes são ridicularizados, mas que valor tem isso, quando o mesmo se tem dado a respeito de todas as grandes descobertas? Cristóvão Colombo não foi repelido, assoberbado de desgostos, tratado como insensato? São ideias tão estranhas, dizem, que não merecem crédito; mas a isso se pode responder que data apenas de meio século a possibilidade de estabelecer-se, em alguns minutos, correspondência entre dois pontos opostos do nosso planeta; em algumas horas atravessar-se a França; com o vapor produzido por um punhado de água fervente, um navio avançar contra o vento; e tirarmos da água os meios de iluminar-nos e aquecer-nos.

“Quem, há meio século, se tivesse proposto iluminar toda a cidade de Paris em alguns instantes e com um único reservatório de uma substância invisível, apenas conseguiria provocar risos! Será isso, porventura, coisa mais prodigiosa que o espaço ser povoado pelos seres pensantes que, depois de terem vivido na Terra, deixaram nela o seu envoltório material? Não se achará neste fato a explicação de uma porção de crenças que remontam aos tempos mais antigos? Vale a pena aprofundar tais coisas”.

Eis as reflexões de um homem de ciência, mas de um cientista despretensioso; são, também, as de uma multidão de homens esclarecidos; eles viram, não superficialmente e de ânimo prevenido; estudaram seriamente, sem partido fixo, e tiveram a modéstia de não dizer: não compreendo; logo, isto não é verdade. Sua convicção formou-se pela observação e pelo raciocínio. Se essas ideias fossem uma quimera, acreditais que todos esses homens do mais alto valor as teriam adotado? que, por tanto tempo, pudessem ser vítimas de uma ilusão?

Não há, pois, impossibilidade material de existirem seres invisíveis para nós, povoando o espaço, e só esta consideração já devia bastar para exigir mais circunspeção. Quem poderia pensar, até bem pouco tempo que uma única gota de água límpida encerrasse milhares de seres, cuja extrema pequenez nos confunde a imaginação? Ora, eu digo que é mais difícil à razão conceber seres tão diminutos, providos de todos os nossos órgãos e funcionando como nós, do que admitir aqueles a quem damos o nome de Espíritos.


10. O Visitante. — Sem dúvida, mas a possibilidade de uma coisa não nos autoriza a concluir que ela exista.


A. K. — De acordo; mas não podeis deixar de convir em que, desde que uma coisa não é impossível, ela já avançou muito, porque a razão não a repele. Resta, pois, constatá-la pela observação dos fatos. Ora, essa observação não é nova; tanto a história sagrada quanto a profana provam a antiguidade e a universalidade dessa crença, que se perpetuou por todas as vicissitudes por que tem passado o mundo, encontrando-se, entre os povos mais selvagens, no estado de ideias inatas e intuitivas, e tão gravadas no pensamento como a do Ser Supremo e a da existência futura. O Espiritismo, pois, não é uma criação moderna; tudo prova que os Antigos o conheciam tão bem ou, talvez, melhor que nós; somente ele não era ensinado, senão com precauções misteriosas que o tornavam inacessível ao vulgo, abandonado de propósito no lamaçal da superstição.

Quanto aos fatos, eles são de duas naturezas: uns espontâneos e outros provocados. Entre os primeiros estão as visões e as aparições, ambas muito frequentes; os ruídos, barulhos e movimentações de objetos, sem causa material, e grande número de efeitos insólitos que olhávamos como sobrenaturais e hoje nos parecem simples porque não admitimos o sobrenatural, visto como tudo se submete às leis imutáveis da Natureza. Os fatos provocados são os obtidos por intermédio de médiuns.


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