DESTINO DO HOMEM.
47. — O Espírito retornando à vida espírita pela morte do corpo é feliz ou infeliz de acordo com o bem ou o mal que haja feito durante a vida corporal, e segundo o uso que fez das faculdades e dos bens que lhe foram concedidos. Ele sofre [as consequências] de todo o mal que haja feito e de todo aquele que não impediu, quando o podia, assim como de todo o bem que ele poderia fazer e que não o fez. Ele não desfruta de uma felicidade absoluta senão quando esteja completamente purificado.
48. — Quanto mais o Espírito encarnado se liberta da influência da matéria, mais se eleva; quanto mais se apega às coisas materiais além das necessidades reais, mais retarda o seu progresso.
49. — A indiferença para com as coisas passageiras não deve se estender aos conhecimentos que podem ser adquiridos sobre a Terra. Devendo o Espírito progredir em todos os sentidos, tudo o que ele aprende ajuda o seu desenvolvimento.
50. — Os Espíritos não progridem sempre simultaneamente em ciência e em moralidade. O progresso pode se realizar ora num sentido, ora no outro, o que explica porque a inteligência não está sempre relacionada com a moral; mas o que não se adquire em uma ocasião, se adquire noutra, e é assim que a pluralidade das existências é a âncora de salvação que Deus, na sua justiça, deu ao homem não fazendo depender nunca o seu destino futuro de uma vida passageira, que não é mais que um momento na eternidade, e que mil circunstâncias podem interromper inesperadamente.
51. — As diferentes existências corporais não ocorrem todas sobre a Terra, nem no mesmo mundo. É possível que tal indivíduo já tenha vivido neste planeta e que a ele voltará novamente, como é possível que esteja aí pela primeira vez e que não mais retorne. É possível que tenha vindo para a Terra de um mundo inferior ou de um mundo semelhante, como pode deixá-la para ir a um mundo semelhante ou para um mundo superior. Depende dele, desde esta vida, fazer o que seja necessário para merecer uma posição mais feliz do que tem aqui.
52. — Os Espíritos superiores encarnam às vezes nos mundos inferiores para realizar uma missão de progresso e conduzir os homens na via do bem. Os sofrimentos que suportam voluntariamente nestas missões elevam-nos aos olhos de Deus e na hierarquia dos Espíritos.
53. — A alma liberta da matéria vê o seu passado [v. Recordação da existência corpórea]; todas as existências anteriores se reconstituem à sua memória, bem como todas as ações boas ou más; vê a felicidade dos justos e sofre dela ser privada.
54. — À medida que o Espírito se desmaterializa, compreende que as imperfeições são para ele uma causa de sofrimento; é por isso que aspira se purificar numa outra existência na qual poderá se elevar por novas provas. Esta satisfação não lhe é determinada de acordo com os seus desejos; às vezes a justiça de Deus quer que ele sofra por longo tempo, e como a sua própria inferioridade limita seu horizonte moral e a extensão das suas percepções, não lhe permitindo ver o termo dos seus sofrimentos, ele acredita sofrer sempre, e é ainda para ele um castigo.
55. — Em seu regresso ao mundo dos Espíritos, a alma reencontra seus pais e todos aqueles que ela tenha conhecido e amado na Terra; ela vem visitar aqueles que ela deixou, consola-os e protege de acordo com o seu poder.
Ela encontra também todos aqueles com os quais agiu bem ou mal; vê-los incessantemente é para ela uma fonte de felicidade ou de remorsos.
56. — A pluralidade das existências não implica a destruição das relações de família e das afeições; longe disso: entre os bons Espíritos, as afeições são mais vivas e mais duradouras, porque são mais depuradas e livres de quaisquer causas materiais. Elas não dependem mais do capricho e do choque dos interesses; não se cobrem da máscara da hipocrisia. Não senão as afeições passageiras, naquelas onde as causas físicas têm maior parte que as causas morais, que não sobrevivem e que muitas vezes até mesmo se extinguem antes da morte. Se contratam afeições como essa em cada existência corporal, que não são mais sólidas que as ligações efêmeras que se faz em viagem; mas o amor sincero de dois seres realmente simpáticos sobrevive a todas as emigrações do Espírito sobre os mundos corporais, onde frequentemente estes dois seres se seguem e se reencontram, e são inconscientemente atraídos um para o outro.
57. — O destino futuro do homem depende do bem e do mal que fez voluntariamente, e do emprego mais ou menos útil que fez da vida. Resulta que a criança que morreu na infância, não havendo tido tempo de fazer nem bem nem mal, que não tem mesmo, aos olhos da lei civil, o discernimento dos seus atos, não pode desfrutar de uma felicidade eterna e sem mescla que não fez nada por merecer. Com que direito gozaria de um tão subido favor, enquanto que o homem que trabalhou durante longos anos para se aperfeiçoar, que teve mil chances de sucumbir, não tem nem mesmo a certeza de alcançá-la? Deus, que é justo, não pode haver consagrado semelhante iniquidade; ele recompensa segundo o mérito e não pune senão de acordo com as faltas; é aqui que a justiça da pluralidade das existências se mostra com uma inteira evidência. Para a criança que morreu antes de haver podido cumprir a sua tarefa, é pois uma existência incompleta que deverá recomeçar. Pode ter sido para ela o complemento de uma existência anteriormente interrompida, como a sua morte pode ser também uma prova ou uma punição para os seus pais.
[1] Nesta segunda versão deste livro, publicado em 1860, o autor apresenta O que é o Espiritismo sob um novo ponto de vista.