Roteiro 6
A escritura dos Evangelhos. Os evangelistas
Objetivos: Explicar como foram redigidos os textos evangélicos. — Analisar o papel desempenhado pelos evangelistas na divulgação do Cristianismo.
IDEIAS PRINCIPAIS
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Os […] mensageiros do Cristo presidem à redação dos textos definitivos [do Evangelho], com vistas ao futuro, não somente junto aos Apóstolos e seus discípulos, mas igualmente junto aos núcleos das tradições. Os cristãos mais destacados trocam, entre si, cartas de alto valor doutrinário para as diversas igrejas. São mensagens de fraternidade e de amor, que a posteridade muita vez não pôde ou não quis compreender. Emmanuel: A Caminho da Luz, Capítulo 14.
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Entre os anos 60 e os 80 da Era Cristã aparecem os primeiros escritos.evangélicos de Marcos, considerados os mais antigos. No final do século I, entre os anos 80 e 98, surge o Evangelho de Lucas, assim como o de Mateus. Este foi possivelmente escrito em hebraico, atualmente perdido. Finalmente, entre os anos de 98 e 110, aparece, em Éfeso, o Evangelho de João. Ao lado desses Evangelhos, únicos reconhecidos pela Igreja Católica, grande número de outros vinha à luz [são os evangelhos apócrifos]. Porque razão foram esses numerosos documentos declarados apócrifos e rejeitados? Muito provavelmente porque haviam constituído num embaraço aos que nos séculos I e II imprimiram ao Cristianismo uma direção que o devia afastar, cada vez mais, de suas formas primitivas […]. Léon Denis: Cristianismo e Espiritismo, Capítulo 1.
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A grandeza da doutrina [cristã] não reside na circunstância de o Evangelho ser de Marcos ou de Mateus, de Lucas ou de João; está na beleza imortal que se irradia de suas lições divinas, atravessando as idades e atraindo os corações. Emmanuel: A Caminho da Luz, Capítulo 14.
SUBSÍDIOS
Ambiente histórico em que o Evangelho nasceu é o do judaísmo, formado e alimentado pelos livros sacros do Antigo Testamento, condicionado pelos acontecimentos históricos, pelas instituições nas quais se encontrou inserido, e pelas correntes religiosas que o especificaram.
A palavra Evangelho, do grego evangélion, quer dizer “boa-notícia” ou “boa nova”, por extensão. O sentido mais antigo da palavra está relacionado a uma gorjeta que era dada aos que traziam “boas-notícias”. Nas cidades gregas empregava-se o vocábulo Evangelho quando ecoava a notícia de uma vitória militar, ou do nascimento do filho de um rei ou imperador. Uniam-se à notícia cânticos e cerimônias festivas, dando-se uma conotação de alegria. (9)
O Novo Testamento abrange quatro conjuntos de livros, assim discriminados: a) Evangelhos; b) Atos dos Apóstolos; c) Epístolas; d) Apocalipse. Neste roteiro estão inseridas informações sobre o Evangelho de Jesus, segundo os registros de Mateus, Marcos, Lucas e João.
O Evangelho (Boa Nova), cerne doutrinário do Cristianismo, contém aspectos da biografia terrena de Jesus-Cristo e seus principais ensinamentos de caráter moral, coligidos segundo informações de Mateus, Marcos, Lucas e João. Mateus e João, discípulos diretos (apóstolos) de contato pessoal com o Mestre, escreveram respectivamente em hebraico e em grego; Marcos e Lucas, ambos em grego, o primeiro transmitindo reminiscências de Pedro apóstolo, o segundo investigando e recolhendo por via indireta. Harmonizam-se os quatro textos num todo orgânico, composto sem acomodações, sob inspiração mediúnica, cujo influxo não derrogou a liberdade volitiva e os pensadores psíquicos: — Mateus, menosprezado funcionário, atende ao aceno do novo chefe e nele passa a vislumbrar o diretor supremo, o rei em nomenclatura humana, embora em nível do Reino dos céus; — Marcos, atemorizado quando jovem com a intensidade da tarefa, sublima depois em Jesus o servo incansável, paradigma da fraternidade a serviço divino; — Lucas, mais intelectualizado, apresenta Jesus como entidade imaculada, presa pela genealogia ao pai Adão, porém subtraída ao pecado pela redenção no Pai Criador; — João, mais espiritualizado, portanto mais próximo da essência, tem olhos de ver em Jesus a entidade celestial, o verbo mesmo,de Deus, não apenas o rei, o servo, o homem, sinopse da biografia terrena. (1) (15)
O Cristo nada escreveu. Suas palavras, disseminadas ao longo dos caminhos, foram transmitidas de boca em boca e, posteriormente, transcritas em diferentes épocas, muito tempo depois da sua morte. Uma tradição religiosa popular formou-se pouco a pouco, tradição que sofreu constante evolução até o século IV […]. Durante […] meio século depois da morte de Jesus, a tradição cristã, oral e viva, é qual água corrente em que qualquer se pode saciar. Sua propaganda se fez por meio da prédica (sermão, discurso religioso), pelo ensino dos apóstolos, homens simples, iletrados, mas iluminados pelo pensamento do Mestre. Não é senão do ano 60 ao 80 que aparecem as primeiras narrações escritas, a de Marcos a princípio, que é a mais antiga, depois as primeiras narrativas atribuídas a Mateus e Lucas, todas, escritos fragmentários e que se vão acrescentar de sucessivas adições, como todas as obras populares. (3) Foi somente no fim do século I, de 80 a 98, que surgiu o Evangelho de Lucas, assim como o de Mateus, o primitivo, atualmente perdido; finalmente, de 98 a 110, apareceu, em Éfeso, o Evangelho de João. Ao lado desses Evangelhos, únicos depois reconhecidos pela Igreja, grande número de outros vinha à luz. Desses, são conhecidos atualmente uns vinte; mas, no século III, Orígenes os citava em maior número. Lucas faz alusão a isso no primeiro versículo da obra que traz o seu nome. (10)
Os textos evangélicos utilizados pelos povos não anglo-saxônicos originam-se da Vulgata (divulgada) Latina, fixada a partir do século IV, quando o erudito Jerônimo, secretário do papa Dâmaso I, verte do grego para o latim textos autenticáveis, e separa os considerados de autoria obscura ou apócrifa. Sabemos, no entanto, que existiu a chamada Bíblia dos Setenta, corpo doutrinário traduzido, ao que se diz, por setenta sábios de Alexandria, do qual se teria tirado setenta cópias.
O grego, em que os Evangelhos foram escritos, foi o popular dialeto alexandrino chamado kini, que era a língua mais falada ou, pelo menos, compreendida pelos homens cultos de todas as localidades do Oriente e do Ocidente do Império Romano. Por essa razão os evangelistas usaram o grego e não o hebraico para escrever os Evangelhos, tornando-os, assim, acessíveis a um maior número de pessoas.
Naquele tempo, não havia pontuação nem separação de palavras na escrita. Os textos utilizavam apenas as letras maiusculas do alfabeto grego. As palavras eram redigidas com letras minúsculas e sem espaçamentos. A colocação de espaços entre as palavras e as frases foi adotada a partir do século IX d.C. A pontuação surgiu com o aparecimento da imprensa no século XV. A organização dos textos bíblicos em capítulos foi introduzida no Ocidente pelo cardeal inglês Hugo, no século XIII. A subdivisão dos capítulos em versículos foi criação do tipógrafo parisiense Roberto Stefen, no século XVI.
Não obstante a existência de várias traduções inglesas da Bíblia, empreendidas durante a Idade Média, somente no século XVI a História registra a tradução definitiva da Bíblia inglesa, na forma que conhecemos atualmente. Na conferência de Hampton Court, em 1604, foi proposta uma nova tradução da Bíblia. Cinquenta e quatro tradutores foram convidados para o empreendimento dessa tarefa em Oxford, Cambridge e Westminster. Essa tradução, dedicada ao Rei James I, foi publicada em 1611, em volumes grandes. Trata-se de uma tradução, também conhecida como a Versão Autorizada, que se enraizou de tal forma na história religiosa e literária dos povos de língua inglesa que as edições posteriores cuidavam apenas de simples revisões, e não de substituições.
Algumas dessas revisões são: a Revisão Inglesa de 1885 e a Versão-Padrão Americana (American Standard Version) de 1901. Esta última foi vigorosamente revisada pela Revised Standard Version de 1946-52. Os textos bíblicos publicados em língua inglesa — que têm como base a tradução de William Tyndale, de 1525-26 — , sobretudo o Novo Testamento, apresentam diferenças das edições publicadas pelos demais povos. É que a tradução inglesa foi realizada diretamente do original grego e não do latim (Vulgata). (17)
1. Os Evangelhos canônicos e os apócrifos
Os Evangelhos são narrativas cuidadosamente escritas sobre o nascimento, a vida, o ministério, a morte e a ressurreição de Jesus de Nazaré. Não podemos jamais esquecer que os textos existentes em o Novo Testamento retratam, além dos ensinamentos do Cristo, a pregação e a vida dos apóstolos e discípulos diretos.
Estudos críticos (e sérios) demonstram que nos textos evangélicos há diferenças que evidenciam a influência pessoal do escritor, sem deixar de lado a inspiração divina. Assim, os três primeiros Evangelhos (Mateus, Marcos e Lucas) — chamados de Evangelhos sinóticos — têm muitos aspectos comuns e também muitas diferenças. As semelhanças vão de algumas palavras a textos inteiros. As diferenças são encontradas nas narrativas de fatos e de acontecimentos relacionados à vida e à missão do Cristo, percebendo-se discrepâncias, aqui e ali. Em termos numéricos, podemos representar a questão sinótica assim:
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Dos 661 versículos do Evangelho de Marcos, 600 estão no de Mateus e 350 no de Lucas;
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Os Evangelhos de Mateus e Lucas têm 240 versículos em comum, os quais não constam do Evangelho de Marcos;
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Mateus e Lucas inseriram outros versículos, segundo interpretação própria.
Os evangelistas Mateus e João foram apóstolos de Jesus. Lucas e Marcos não conviveram com ele. Os escritos evangélicos, também chamados de Escrituras Gregas, foram divididos em “canônicos” — textos que fazem parte do Novo Testamento, — e “apócrifos” (palavra que significa coisa escondida, oculta). Os apócrifos (ou deuterocanônicos), definidos no Concílio de Niceia, são manuscritos redigidos pelos discípulos de Jesus e que não foram (nem são) reconhecidos pela Igreja Católica, sob a alegação de que a veracidade dos mesmos não poderia sercomprovada. (9) (16)
Existem cerca de 112 textos, apócrifos, 52 no Antigo Testamento e 60 no Novo Testamento. A tradição contabiliza um número maior.
Exemplos de livros apócrifos. (19) (20)
1. Evangelhos: de Maria de Madalena; de Tomé; de Filipe; o árabe que trata da infância de Jesus; do pseudo-Tomé; de Tiago; da morte e assunção de Maria.
2. Atos: de Pedro; de Tecla; de Paulo; dos 12 apóstolos; de Pilatos.
3. Epístolas: de Pilatos a Herodes; de Pilatos a Tibério; de Pedro a Filipe; de Paulo aos laodicenses; epístola aos coríntios, de Aristeu.
4. Apocalipses: de Tiago; de João; de Estêvão; de Pedro; de Elias; de Esdras; de Baruc; de Sofonias.
5. Testamentos: de Abraão; de Isaac; de Jacó; dos 12 Patriarcas; de Moisés; de Salomão; de Jó.
6. Outros livros: A filha de Pedro; a descida do Cristo aos infernos; declaração de José de Arimateia; vida de Adão e Eva; jubileus, 1, 2 e 3; Henoque; Salmos de Salomão; Oráculos Sibilinos.
Os Evangelhos de Marcos, Mateus e Lucas são chamados de sinóticos, porque apresentam, entre si, muitas semelhanças, podendo ser dispostos em colunas paralelas e “abarcados com um só olhar”. Quanto ao quarto Evangelho, o de João, este permanece único, pois se distingue significativamente dos demais em conteúdo, estilo e forma. (1) A hipótese mais aceita para justificar as similaridades existentes nos Evangelhos sinóticos é denominada “teoria das duas fontes”. Nessa teoria, Marcos teria utilizado uma fonte (possivelmente originária de Pedro), a qual serviria de subsídios para os relatos de Mateus e Lucas. A outra fonte, utilizada por estes dois evangelistas, é totalmente desconhecida e se chama Fonte Q (inicial da palavra alemã quelle = fonte) (2). Os textos evangélicos sofreram, ao longo dos tempos três grandes modificações: no texto original, escrito pelos evangelistas, durante a elaboração da Vulgata e na redação final, que é a que temos atualmente.
Por entre essas fases, ocorreram influências em variados sentidos, levando a relações literárias, de semelhança ou de diferenças, que são observadas entre os Evangelhos no seu estado atual. Assim, pode-se perceber, que a redação de Marcos deve ter sofrido influência do documento-fonte de Mateus — daí verifica-se as semelhanças onde é dependente — onde, por sua vez, deve ter influenciado a última redação do primeiro Evangelho. (3)
Os Evangelhos segundo Mateus, Marcos e Lucas mencionam os ensinamentos de Jesus sobre o Reino de Deus mais de noventa vezes, o que é bastante significativo. O Evangelho de João desenvolve a ideia de crença nas noventa e nove citações, o que também nos fornece um material para reflexão.
2. O Evangelho segundo Marcos
Conforme a mais antiga tradição, esse Evangelho foi escrito por João, Marcos (João do hebraico, Marcos do latim ), sobrinho de Pedro e primo de Barnabé. Ao que se sabe, vivia em Jerusalém com seus pais. Supõe-se que o texto de Marcos foi o que serviu de fonte para as escrituras de Lucas e Mateus, tendo ele próprio, por sua vez, utilizado outras fontes (Pedro, por exemplo). Foi o primeiro Evangelho a ser escrito, num tempo não muito distante da destruição de Jerusalém, ocorrida no ano 70 d.C., possivelmente entre os anos 60 e 70. É um Evangelho que apresenta pouca evolução da doutrina cristã, e não conduz a maiores reflexões teológicas. É provável que Marcos tenha acompanhado os acontecimentos da paixão e morte do Cristo.
Para escrever o seu Evangelho, Marcos deve ter recorrido a três fontes: às suas lembranças, às lembranças de pessoas que conviveram com o Mestre e aos documentos que circulavam na jovem comunidade cristã da época. A tradição informa que Marcos teria sido discípulo de Pedro, de quem teria recebido os esclarecimentos evangélicos (1 Pedro, 5.13; Atos dos Apóstolos, 12.12).
O Evangelho de Marcos está escrito em estilo muito simples e com pouca precisão histórica. Descuida-se da sequência cronológica. Usa muitas palavras aramaicas, revelando proximidade com os aramaísmos dos originais em que se baseou. São exemplos de aramaísmo as seguintes palavras ou expressões: “Boanerges” (Marcos, 3.17); “talita cumi” (Marcos, 5.41); “efeta” (Marcos, 7.34); “aba” (Marcos, 14.36); “Eloi, eloi” (Marcos, 15.34). Mostra também vestígios da tradição oral.
Há indícios de que Marcos teria escrito o seu texto evangélico em Roma. Os historiadores que defendem este ponto de vista se fundamentam nos seguintes indícios: a) Na questão sobre o divórcio (Marcos, 10.1-12) — um problema que afligia apenas os romanos da época; b) A utilização de palavras latinas como kenturiôn (centurião) e pretorion (tribunal), entre outras (Marcos, 6.27; 7.4; 12.42; 15.39,44,45); c) O nome latino para designar a moeda (ou óbolo) ofertada pela viúva. (Marcos, 12.41)
O Evangelho de Marcos quer mostrar que Jesus é o Messias prometido e aguardado pelos judeus. Tem como escopo apresentar Jesus como filho de Deus (Marcos, 1.11; 3.11; 15.39), sua condição divina, demonstrando que os milagres realizados por Jesus asseguravam ser ele o Messias prometido. Esclarece também que Jesus é recebido favoravelmente pelas multidões, mas que seu messianismo, humilde e espiritual, decepciona e diminui a expectativa popular.
No propósito de nos apresentar Jesus como filho de Deus, incompreendido e rejeitado pelo povo, Marcos se preocupa menos em explanar o ensino do Mestre, fazendo poucas referências aos seus ensinamentos. Escrito em linguagem popular, de estilo vivo, o texto de Marcos deixa de lado o que interessava apenas aos Judeus, focalizando também os interesses dos pagãos recém-convertidos na fé, após a morte de Pedro e Paulo (entre os anos 62 e 63). No entanto, há no Evangelho de Marcos explicações que nem mesmo os gentios compreendiam (Marcos, 3.17; 5.41; 7.34; 10.46; 14.36; 15.34), assim como relatos de costumes judaicos (Marcos, 7.3,4; 14.12; 15.42). Faz poucas referências ao Antigo Testamento. Destaca as várias emoções dos personagens (Marcos, 3.34; 8.12; 10.14, 21,32; 16.5,6). O ponto culminante do seu Evangelho é a confissão de Pedro, em Cesárea (Marcos, 8.27-30) e a resposta do Cristo, que não declarara antes ser o Messias por causa do falso conceito de libertador temporal, atribuído ao enviado de Deus. Alguns autores afirmam que Marcos usou este “segredo messiânico” para evitar explicações embaraçosas sobre o fato de ter o Cristo morrido da forma como morreu, quando deveria, no entender dos judeus, ser o libertador de um povo.
A tradição diz que a casa, citada em Atos dos Apóstolos, 12.12, era de Marcos, e a mesma onde se celebrou a última ceia de Jesus (Marcos, 14.4).
Supõe-se também que o Jardim de Getsêmani lhe pertencia, que ele (Marcos) era o homem do cântaro (Marcos, 14.13), sendo igualmente o jovem nu, retratado unicamente em seu Evangelho (Marcos,14.51,52).
Marcos acompanhou Paulo e Barnabé na primeira viagem do apóstolo dos gentios — de Jerusalém a Antioquia (Atos dos Apóstolos, 13.5) — , mas não completa a viagem, voltando a Jerusalém (Atos dos Apóstolos, 13.13). Com Barnabé foi a Chipre (Atos dos Apóstolos, 15.39), todavia, permaneceu mais tempo com Pedro, servindo de intérprete e de secretário. Tendo participado de trabalho missionário no Egito, morreu vítima de martírio. (4) (14) e (16)
3. O Evangelho segundo Mateus
O Evangelho de Mateus foi escrito entre 80 e 100 d.C. Seguramente foi depois de 70, após a destruição de Jerusalém, e posterior ao Evangelho de Marcos. O texto conhecido surgiu na Palestina, escrito em grego, em bom estilo literário, para leitores de língua grega. Posteriormente foi traduzido para o latim (Vulgata). Alguns estudiosos acreditam que o texto original de Mateus foi escrito em aramaico e, mais tarde, traduzido para o grego. Se, efetivamente, esse texto existiu, foi perdido.
As linhas gerais da vida do Cristo, encontradas no Evangelho de Marcos, são reproduzidas no de Mateus, mas segundo um novo plano, por que os relatos e os discursos se alternam. Por exemplo, em Mateus, 1.4, há o relato da infância e início do ministério de Jesus. Em Mateus, 5.7 vem em discurso: o sermão do monte, as bem-aventuranças e a entrada no Reino. (5)
No tempo em que foi escrito, a igreja cristã já ultrapassara os limites de Israel. Mateus foi um dos apóstolos e testemunha de vários acontecimentos. Cobrador de impostos para o Império Romano, era menosprezado pelos judeus, porque consideravam impura a sua profissão. Foi o apóstolo mais intelectual do grupo dos Doze.
Percebe-se que o seu Evangelho era o de um cristão vindo do judaísmo, conhecedor das Escrituras, fiel à tradição. Mateus escreve entre os judeus para judeus, procurando defender a tese de que Jesus era o Messias previsto nas escrituras. A sua origem judaica fica evidente quando ele emprega, por exemplo, a expressão reino dos céus, em lugar de Reino de Deus, já que o nome Deus não era pronunciado pelos judeus.
A narrativa do texto de Mateus dispensa explicações sobre os costumes judaicos, por serem considerados corriqueiros e do entendimento dos seus compatriotas.
Na composição literária do seu Evangelho, o autor empregou como fontes o Evangelho de Marcos e outros escritos particulares. Fez um trabalho de compilação bastante pessoal (é um texto rico de hebraísmos), adaptando e completando as fontes com os próprios conhecimentos. Mateus é chamado o homem dos discursos, por ser quem mais cita as fontes. Mostra aos judeus que Jesus é filho de Davi e de Abraão, portanto, o Messias de Israel. Exorta os fiéis a aceitarem Jesus como o Messias prometido por Deus ao seu povo. Refere-se constantemente ao Antigo Testamento. Fala na universalidade da mensagem cristã, convidando judeus e não-judeus a aceitarem os seus ensinamentos. Do ponto de vista cristológico, considera Jesus como Rei, Messias que foi rejeitado e que criou outro povo ou comunidade, que é a Ecclesia (Igreja). Emprega o termo kyrios (Senhor), enquanto os outros usam o termo Mestre. (6) (14) e (15)
4. O Evangelho segundo Lucas
O médico Lucas era natural de Antioquia, fato que ele cita várias vezes nos Atos dos Apóstolos. Não foi discípulo do Cristo, ficando isso claro desde o início, pois que se coloca fora das testemunhas oculares. Utilizou como fontes o Evangelho de Marcos bem como outras particulares da região onde viveu, incluindo-se nessas últimas, documentos da época e testemunhos dos fatos ocorridos. Lucas também teria recebido esclarecimentos de Paulo, por ocasião de um encontro em Antioquia. Paulo fala sobre Lucas em suas epístolas (Colossenses, 4.14), (Filemon 24) (II Timóteo, 4.11). Pode-se situar o aparecimento do Evangelho de Lucas entre os anos 70 e 80 d.C.
O mérito particular do terceiro Evangelho lhe vem da personalidade muito cativante do seu autor, que nele transparece continuamente. […] Lucas é um escritor de grande talento e uma alma delicada. Elaborou sua obra de modo original, com um esforço de informação e de ordem. (Lucas, 1.3) Seu plano reproduz as grandes linhas de Marcos, com algumas transposições ou omissões. Certos episódios são deslocados (Lucas, 3.19,20; 4.16-30; 5.1-11; 6.12-19; 22.31-34)
Seu plano retoma as grandes linhas do de Marcos com algumas transposições ou omissões. Alguns episódios são deslocados (Lc 3.19,20; 4.16-30; 5.1-11; 6.12-19; 22.31-34, etc.), ora por preocupação de clareza e de lógica, ora por influência de outras tradições, entre as quais deve-se notar a que se reflete igualmente no quarto Evangelho. Outros episódios são omitidos, seja como menos interessantes para os leitores pagãos (cf. Mc 9.11-13), seja para evitar duplicatas (cf. Mc 12.28-34 em comparação com Lc 10.25-28). (7)
É tido como um bom escritor pelo estilo elegante da língua (o grego) usada no prólogo, considerado um clássico da época. O próprio costume de escrever prólogos, dedicando o livro, era comum entre os grandes escritores. Corrige o grego de Marcos, substituindo termos vulgares ou banais por palavras eruditas. À vista dos acontecimentos da época, procurou relacionar os acontecimentos narrados com fatos conhecidos da história, obedecendo a detalhes cronológicos. Alguns estudiosos procuram ver no seu Evangelho um certo olho clínico, por ser ele um médico. Vê-se isto, por exemplo, nos episódios da sogra de Pedro, do Samaritano, da hemorroíssa.
Lucas nos apresenta Jesus como o Messias dos pobres, dos humildes, dos desprezados, dos doentes e dos pecadores. Em Lucas, 19.10, fala em salvar o que estava perdido; em 7.36-50, traz o relato da pecadora que banhou os pés do Cristo; em 15.1-32, narra ensinamentos sobre a ovelha ou dracma perdidos, e o retorno do filho pródigo; em 18.9-14, fala da prece do publicano e a do fariseu; em 16. 1931, faz referências sobre o rico avarento e sobre o pobre Lázaro; em 11.41; 12.33 e em 14.13, mostra a necessidade das esmolas.
Nota-se, ainda, em Lucas, uma preocupação com a valorização das mulheres, tendo em vista o conceito que delas tinha a sociedade da época. Assim, refere-se a Ana e a Isabel; às mulheres que acompanhavam os apóstolos; a Maria e Marta de Betânia; à viúva de Naim e à mulher da multidão que exaltou a mãe de Cristo. Cita também Maria, chamada Madalena, da qual haviam saído sete demônios, e Joana, mulher de Cuza, alto funcionário de Herodes; Susana e várias outras mulheres; que ajudavam a Jesus e aos discípulos com os bens que possuíam (Lucas, 8.1-3). E num lugar todo especial está Maria, mãe de Jesus. Fornece muitos detalhes da vida familiar do Mestre, fato que levanta a hipótese de Lucas ter entrevistado Maria de Nazaré. Corrige certas referências extraordinárias a respeito de Jesus, que pudessem escandalizar os não-judeus (multiplicação dos pães, sogra de Pedro, discussão no caminho, etc.). Faz a genealogia de Cristo diferente da de Mateus, começando por Adão. (13) (16) e (18)
5. O Evangelho segundo João
O Evangelho de João só foi escrito em torno do ano 100 d.C. João é o canal de Deus para nos fazer compreender a presença de Jesus, o Verbo Divino. Esse Evangelho é uma obra unitária: as partes só podem ser compreendidas na sua relação com o todo. Portanto, na leitura da obra deve-se ficar atento ao seu conjunto e não somente às unidades que a compõem, tomadas isoladamente. O plano que estrutura o Evangelho de João é espiritual e não histórico-narrativo. A pessoa e a obra de Jesus são interpretadas por uma comunidade no seio da sua experiência de fé.
A história de Jesus no Evangelho de João é apresentada como um drama composto de um prólogo, dois atos principais e um epílogo. Considerando-se o Evangelho sob essa luz, sua característica distintiva pode ser vista como seu ensinamento iluminado. (11)
João proclama a messianidade de Jesus e a sua filiação divina, esclarecendo que, para ter vida, é preciso ter fé em Jesus. Os traços característicos do Evangelho joanino — e que o diferenciam dos demais — mostram a forte influência de uma corrente de pensamento amplamente difundida em certos círculos do judaísmo: os ensinamentos dos essênios. Neles se atribuía importância especial ao conhecimento (gnose), expresso por meio de dualismos: luz-trevas, verdade-mentira, anjo da luz-anjo das trevas. João insiste na mística da unidade com o Cristo e na necessidade do amor fraterno.
Mais ainda: o quarto Evangelho, mais do que os sinóticos, quer dar a entender o sentido da vida, dos gestos e das palavras de Jesus. Os acontecimentos de Jesus são sinais, cujo sentido não transpareceu logo de início, só sendo compreendido após a glorificação do Cristo (João, 2.22; 12.16; 13.7); muitas palavras de Jesus eram dotadas de significação espiritual, que não foram percebidas senão mais tarde. (João, 2.19) (8)
Caberia ao apóstolo falar em nome de Jesus ressuscitado, recordando e ensinando aos discípulos o que Jesus lhes havia dito: “conduzi-los à verdade completa” (João, 14.26 e seguintes). Por outro lado, João nos mostra uma faceta da personalidade de Jesus, não percebida nos demais evangelistas: seus ensinamentos ocorrem no contexto da vida judaica, nas festas e no templo, deixando claro ao povo que ele, Jesus, é o centro de uma religião renovada, em espírito e em verdade (João, 4.24).
Para João, Jesus é a Palavra (o Verbo) enviada por Deus à Terra, e deve regressar ao Pai uma vez cumprida a sua missão (João,1.1 e seguintes). Trata-se de uma missão que consiste em anunciar aos homens os mistérios divinos: Jesus é a testemunha do que viu e ouviu junto ao Pai (João, 3.11 e seguintes). Jesus é a Água Viva (João,7.37). É a Luz do mundo (João, 8.12). Jesus é o Bom Pastor (João, 10.1-18) e é também o Caminho, a Verdade e a Vida. (João, 14.6)
João se move assim acima dos testemunhos dos outros escritores do Evangelho, explorando a natureza de Jesus em relação a Deus e à humanidade, e os fundamentos para a crença cristã e para a vida espiritual, que é a sua consequência. Jesus, no retrato de João, é ao mesmo tempo um com o Pai e um com sua igreja na Terra. (12)
Há detalhes, no quarto Evangelho, que nos fazem supor haja entre o apóstolo e Jesus uma maior proximidade. Por exemplo, ao descrever o encontro do Mestre com Nicodemos, (João 3.1-15) o evangelista nos transmite a certeza de estar presente, testemunhando a conversa. Uma testemunha que talvez estivesse à porta, como quem se encontra à espreita, até surpreender o esclarecedor colóquio entre o Rabi Galileu e o doutor da lei. Noutro momento, quando narra o episódio das Bodas de Caná (João 2.1-12), João parece reviver o adolescente maravilhado, colocado perante o Rabi pleno de sabedoria, que abençoa a união matrimonial com sua luminosa presença.
Em outras passagens evangélicas a presença de João é percebida claramente, como se ele fosse a sombra de Jesus: acompanha o Rabi na íngreme subida de 562 metros até o cume do monte Tabor (Lucas, 9.28-36). Após as quatro horas de marcha, dorme junto a Pedro e Tiago. Na madrugada que avança, escuta vozes que vibram no ar. A sublime visão de Jesus, vestido de luz o faria, mais tarde, evocar a cena inesquecível, ao iniciar a sua narrativa evangélica: “Nele estava a vida e a vida era a luz dos homens, a luz resplandecente nas trevas e as trevas não a compreenderam”. (João, 1.4,5)
Finalmente, é oportuno lembrar que a promessa do advento do Consolador consta apenas do Evangelho de João, que assim nos transmite o feliz anúncio de Jesus: “Se me amais, guardai os meus mandamentos. E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, para que fique convosco para sempre. O Espírito de verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê nem o conhece; mas vós o conheceis, porque habita convosco, e estará em vós. Não vos deixarei órfãos; voltarei para vós. (João, 14.15-18) Mas, quando vier o Consolador, que eu da parte do Pai vos hei de enviar, aquele Espírito de verdade, que procede do Pai, ele testificará de mim. E vós também testificareis, pois estivestes comigo desde o princípio.” (João, 15. 26,27)
ORIENTAÇÃO AO MONITOR: Realizar um amplo debate a respeito do assunto desenvolvido no Roteiro, procurando destacar o trabalho executado pelos evangelistas.
Referências:
1. A BÍBLIA DE JERUSALÉM. São Paulo: Paulus, 2002, p. 1689.
2. Idem, ibidem - p. 13.
3. Idem, ibidem - p. 1692-1693.
4. Idem - (O Evangelho segundo são Marcos), p. 1696.
5. Idem - (O Evangelho segundo são Mateus), p. 1694.
6. Idem, ibidem - p. 1698.
7. Idem - (O Evangelho segundo são de Lucas), p. 1699.
8. Idem - (O Evangelho segundo são João), p. 1835-1836.
9. BATTAGLIA, O. Introdução aos Evangelhos — um estudo histórico-crítico. Rio de Janeiro, Vozes, 1984, p. 19 a 21.
10. DENIS, Léon. Cristianismo e Espiritismo. Tradução de Leopoldo Cirne. 9. ed. Rio de Janeiro: 2004. Capítulo I ( Origem dos Evangelhos) p. 25-26.
11. DICIONÁRIO DA BÍBLIA. VOL. 1. AS PESSOAS E OS LUGARES. Organizado por Bruce M. Metzger e Michael Coogan. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed, 2002, p. 156.
12. Idem, ibidem - p. 157.
13. Idem, ibidem - p. 193-194.
14. Idem, ibidem - p. 197-198.
15. MACEDO, Roberto. Vocabulário Histórico Geográfico dos Romances de Emmanuel. 2. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1994, p 78-79.
16. http://www.fatheralexander.org/booklets/portuguese/bible6_p.htm
17. http://geocities.com/Athens/Agora/1417/Biblia/Lucas.htm
18. http://www.ifcs.ufrj.br/~frazao/apocnt.htm
19. http://www.pt.wikipedia.org/wiki/livros_ap%C3%B3crifos
20. http://www.vivos.com.br/197.htm