1 É a ti, meu irmão da Doutrina, que dirijo o meu apelo. Nos derradeiros anos de minha romagem pela Terra, procurei aproveitar algumas horas no labor educativo aos cegos de nossa pátria.
2 Nada mais fiz, entretanto, se não conduzir um pouco de minha boa vontade aos que operam no campo imenso dessas atividades pelo bem dos que foram privados do celeste dom da vista. Agora, do “outro lado” da vida, dirijo-me a ti que podes dispor de uma pequena parcela de tempo, em favor dos que necessitam de nossos esforços para aprender no escabroso caminho.
3 Numerosas já são as obras filantrópicas em benefício dos cegos no que se refere ao livro e aos métodos de sua alfabetização nos institutos oficiais. Mas os nossos irmãozinhos ainda não possuem um dicionário que lhes amplifique o campo dos conhecimentos mais comuns. O meu apelo funda-se tão-somente nessa necessidade. Se te for possível, colabora conosco. Traduzamos um dicionário simples e proveitoso à educação dos nossos amiguinhos que ficaram sem os olhos, ou que renasceram sem eles, cumprindo as dolorosas provações que lhes foram reservadas.
4 O dicionário poderá ser encarado como se fora uma oficina. Cada letra, cada seção de sílabas poderia ser tomada à conta de um aparelho do bem que, manejado por tuas mãos carinhosas e fraternas, produziria a claridade necessária aos cérebros que tateiam dentro da sombra.
5 Se isso constitui uma possibilidade para o teu esforço, meu irmão, nós te esperamos de braços abertos para essa cruzada generosa e Deus, na Sua inesgotável misericórdia, recompensará o gesto de bondade, multiplicando os “talentos” de luz dos teus olhos, do teu raciocínio e do teu coração!
Engrácia Ferreira n
Reformador — Março de 1939.
[1] É sabido que “(…) Engrácia Ferreira, pioneira do alfabeto Braille para cegos, desencarnou a 21 de abril de 1937. Menos de um mês depois, a 6 de maio, comunicava-se por meio de Chico Xavier em mensagem dirigida a Júlia Pêgo de Amorim, sua sobrinha, solicitando a continuação de sua obra. Onze dias depois, Chico recebe a segunda mensagem, na própria grafia do Braille, que foi publicada em Reformador de junho de 1938. Diz uma nota de rodapé da revista que o médium, por não conhecer o alfabeto Braille, levou duas horas para receber tal comunicação psicográfica, que foi assim transcrita: “Minha boa Julinha, a paz de Deus, nosso Pai, seja em teu generoso coração, sempre tão cheio de fé. Trabalhemos pelos cegos, minha filha, pensando que a cegueira do espírito é hem mais triste que a dos olhos. Hei de ajudar-te com o favor de Deus. A tia, Engrácia.” No dia 16 de novembro de 1938, transmite a terceira mensagem, sugerindo que ela transpusesse para o Braille determinado dicionário de Português, obra que havia deixado inacabada. D. Júlia, atendendo à solicitação da querida amiga espiritual, aprendeu sozinha o alfabeto Braille. copiando letra por letra. Para certificar-se, pediu a um cego que lesse o que havia escrito, cujo resultado encheu-lhe de alegrias. A partir daí transformou-se numa verdadeira missionária do Braille. Reuniu em sua casa várias senhoras interessadas nessa obra de altruísmo — na prática do ensino do Braille. Em 1939, iniciou a transcrição do Dicionário da Língua Portuguesa, de autoria de Hildebrando Lima e Gustavo Barroso, cujo trabalho durou cerca de 4 anos, dando, ao todo, 64 volumes. Em 1945, Chico Xavier recebeu a quinta mensagem do Espírito Engrácia Ferreira, agradecendo à sobrinha o atendimento e o valioso trabalho em prol dos cegos. D. Júlia iniciou um curso gratuito do Braille no centro da cidade. visando maior número de colaboradores. Transcreveu para esse alfabeto inúmeras obras espíritas e não espíritas, entre as quais: O Evangelho Segundo o Espiritismo, Agenda cristã, Cartas do Evangelho, Voltei, Pequenas Mensagens e muitas outras, todas doadas à Sociedade Pro-Livro Espírita em Braille (SPLEB). (…)” Segundo Wanda Amorim Joviano, sobrinha-neta de Engrácia Ferreira, em nota em livro de sua organização, juntamente de Geraldo Lemos Neto, o Depois da travessia, Espíritos diversos, psicografado por Chico Xavier, (VINHA DE LUZ / DIDIER, 2013, p. 90), “Tia Engracinha, já no Plano espiritual, reconheceu-se devedora dos cegos, porque, mulher poderosa em vida anterior decretara tal pena ao chefe de insurreição surgida em seus domínios e, em o fazendo, teve como vítima o próprio filho“. Referenciado em nota explicativa da obra já citada, página 90.