O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Parnaso de Além-Túmulo — Autores diversos


22

Casimiro Cunha


Poeta vassourense, nasceu aos 14 de abril de 1880 e desencarnou em 1914. Pobre, ao demais espírita confesso, não teve maior projeção no cenáculo literário do seu tempo, mau grado à suavidade da sua musa e inatos talentos literários. Há, na sua existência terrena, uma triste particularidade a assinalar, qual a de haver perdido uma vista aos 14 anos, por acidente, para de todo cegar da outra aos 16. Órfão de pai aos 7 anos, apenas frequentou escolas primárias. Era um espírito jovial e forte no infortúnio, que ele sabia aproveitar no enobrecimento da sua fé. Se tivesse tido maior cultura, atingiria as maiores culminâncias do firmamento literário.


Na eterna luz

1 Quando parti deste mundo
Em busca da Imensidade,
A alma ansiosa da Verdade,
Do azul imenso dos céus,
Fugi do pesar profundo,
Lamentando os sofrimentos,
As mágoas, os desalentos,
Confiado no amor de Deus.


2 Mal, porém, abrira os olhos
Em meio de luzes puras,
Nas radiantes alturas,
Em célico resplendor,
Compreendi que os abrolhos
Que a Terra me oferecera,
Eram mesmo a primavera
Do meu sonho todo em flor.


3 Disseram-me então: — «Ó crente
Que chegais a estas plagas,
Fugindo das grandes vagas
Do mar revolto das lutas,
Aportai serenamente
Nesta estância do Senhor,
Pois aqui existe o amor
Nestas almas impolutas!


4 Aqui existe a pureza
A meiga flor da Bondade,
O aroma da Caridade
Perfumando os corações;
Não se conhece a torpeza
Da lâmina — hipocrisia,
Que mata toda a alegria,
Provocando maldições.


5 Aqueles que já sofreram
No dever nobilitante,
Cujo peito sempre amante
Só conheceu dissabores;
Aqueles que conheceram
As feridas dolorosas,
Dessas mágoas escabrosas
De um triste mundo de dores,


6 Encontram nestas moradas
Tão formosas, resplendentes,
Os clarões resplandecentes
De afetos imorredouros!
As almas imaculadas
São flores das boas-vindas,
Luminosas, sempre lindas
Ofertando-lhes tesouros:


7 Os tesouros peregrinos
Formados de amor e luz
Do Mestre Amado — Jesus,
Arauto do Onipotente;
Os reflexos divinos
Quais lírios iluminados,
Alvos, belos, deificados,
Penetrarão sua mente.


8 Acordai, pois, ó vivente,
Contemplai-vos nesta vida,
Que vossa alma ensandecida
Procure a luz que avigora.
O Senhor sempre clemente,
Concede-vos neste instante
A bênção dulcificante
Do seu amor — doce aurora.


9 Sacudi o pó da estrada
Que trilhastes na amargura,
Pois agora na ventura
Fruireis consolações;
Nesta Esfera iluminada,
Que aportais neste momento,
Não vereis o sofrimento
Retalhando os corações.


10 Só vereis clarões de luz
A despontar nestas almas,
Tornadas em belas palmas
Das mansões do Criador!
Bendizei, pois, a Jesus,
O Mestre da Caridade,
O Luzeiro da Bondade,
O grande mestre do Amor!»


11 Então, eu vi que na Terra
Em meio da iniquidade,
Na tremenda tempestade
Das dores e expiações,
A nossa alma que erra,
Tão longe das grandes luzes,
Só aproveita das cruzes,
Das amargas provações.


12 Venturoso, abençoei
A dor que amaldiçoara,
Que renegar eu tentara
Como os míseros ateus,
E feliz então busquei
As bênçãos, flores brilhantes,
Alvoradas fulgurantes
Do amor imenso de Deus.




Anjinhos

1 Ó mães que chorais na vida
Os vossos ternos anjinhos,
Que quais meigos passarinhos
Cindiram o espaço azul,
Deixando-vos sem conforto,
O peito dilacerado,
O coração desolado,
A alma tristonha e exul,


2 Reconhecei que na Terra
Só se conhecem as dores,
Os prantos, os amargores,
As frias noites sem luz;
E os vossos filhinhos ternos,
Quais centelhas luminosas,
São as flores mais formosas
Das moradas de Jesus.


3 São mensageiros felizes
Nas radiantes alturas,
Em meio das luzes puras,
De outras rútilas Esferas.
Resplandecendo imortais
Nos Espaços deslumbrantes,
Quais reflexos brilhantes
Das celinas primaveras.


4 Visitam os vossos lares
Como gênios protetores,
Ofertando-vos as flores
Do seu afeto eternal;
Osculam-vos ternamente,
Insuflando-vos coragem,
Ao transpordes a voragem
Do abismo negro do mal;


5 Alegrai-vos, pois, ao verdes
Quando partem sorridentes,
Venturosos inocentes,
Como fúlgidos clarões;
Eles farão despertar
As alvoradas formosas
De luzes esplendorosas
Dentro em vossos corações.




Ascensão

1 Perguntai à flor virente,
De pétalas multicores,
Que com mágicos olores
Perfumam vosso ambiente,


2 O que fazem cá no mundo,
Tão viçosas, perfumadas,
Pelas sendas desoladas
Deste abismo tão profundo.


3 Como sorrisos dos Céus,
Essas flores perfumosas
Responderiam formosas:
— «Nós marchamos para Deus!»


4 À ave que poetiza
Com seus cânticos maviosos
Vossos campos dadivosos
Em beleza que harmoniza,


5 Se perguntásseis também,
Ela vos retrucaria:
— «Caminhamos na alegria,
Para a Luz e para o Bem.»


6 Tudo pois, em ascensão,
Marcha ao progresso incessante,
À alvorada rutilante
Da sublime perfeição.


7 Segui pois irmãos terrenos,
Nessas trilhas luminosas,
Caminhai sempre serenos,
Entre lírios, entre rosas;


8 Entre os lírios da Bondade
Entre as rosas da Ternura,
Espargindo a caridade,
Consolando a desventura.


9 Só assim caminharemos
Nessa eterna evolução,
E no Bem conquistaremos
A suprema perfeição.




Quadras

1 Ser cego e nada ver
Na triste noite escura
E ver depois a luz
Da aurora de ventura;


2 Chorar na escuridão
Em dores mergulhado,
E após o sofrimento
Ter gozo ilimitado;


3 Sorver dentro da treva
O fel das amarguras,
Depois, buscar o amor
Nas lúcidas alturas;


4 É possuir tesouros
De paz, de vida e luz,
No sacrossanto abrigo
Do afeto de Jesus.



Supremacia da Caridade

( † )

1 A fé é a força potente
Que desponta na alma crente,
Elevando-a aos altos Céus:
Ela é chama abrasadora,
Reluzente, redentora,
Que nos eleva até Deus.


2 A esperança é flor virente,
Alva estrela resplendente,
Que ilumina os corações,
Que conduz as criaturas
Às almejadas venturas
Entre célicos clarões.


3 A caridade é o amor,
É o sol que Nosso Senhor
Fez raiar claro e fecundo;
Alegrando nesta vida
A existência dolorida
Dos que sofrem neste mundo!


4 A fé é um clarão divino,
Refulgente, peregrino,
Que irrompe, trazendo a luz;
A caridade é a expressão
Da personificação
Do Mestre Amado — Jesus!


5 A esperança é qual lume,
Ou capitoso perfume
Que nos alenta na dor;
A caridade é uma aurora
Que resplende a toda hora,
Nada empana o seu fulgor.


6 Seja, pois, abençoada
Essa fúlgida alvorada
A raiar eternamente!
Caridade salvadora
Pura bênção redentora
Do Senhor Onipotente.




Versos

1 Vivi na mansão das sombras,
            Desterrado;
Na noite das trevas densas,
            Sepultado.


2 Entrei no sepulcro escuro,
            Nascendo;
E dele fugi feliz,
            Morrendo.


3 É que a vida material
            É a prisão
Onde a alma é encarcerada
            Na aflição;


4 E a vida da alma é a nossa
            Liberdade,
Onde as luzes recebemos
            Da Verdade.




Símbolo

1 Sobre a lama de um monturo
Um branco lírio sorria,
Alvo, belo, delicado,
Perfumando a luz do dia.


2 Vendo essa flor cariciosa
No pantanal sujo e imundo.
Via o símbolo do Bem
Entre os males deste mundo.


3 Pois entre as trevas e as dores
Da vida de provações,
Pode existir a bondade
Irradiando clarões.


4 E o coração que cultiva
A caridade e o amor,
É a flor cheia de aromas,
Cheia de viço e frescor.


5 Que mesmo dentro da treva
Do mundo ingrato, sem luz,
É lírio resplandecente
Do puro amor de Jesus.




Pensamentos espíritas

1 Dobram sinos a finados,
Com mágoa e desolação…
Porque não sabem que a morte
É a nossa libertação.


2 Toda a esperança da fé
Que vive com a caridade,
É realizada no mundo
Da eterna felicidade.


3 A palavra que reténs
É tua serva querida,
Mas aquela que te foge
É dona da tua vida.


4 Todo suicida presume
Que a morte é o fim do amargor,
Sem saber que o desespero
É porta para outra dor.


5 Quem sofre resignado,
Após a morte descansa;
Quem luta, sem naufragar,
Verá decerto a bonança.


6 Quem tem a flor da humildade
Medrando no coração,
Tem o jardim das virtudes
Da suprema perfeição.


7 Volve ao Céu todo piedoso,
Coração que andas ferido!…
Deus cura todas as chagas
Do mal que tens padecido.




Sombra e luz

1 Vem a noite, volta o dia,
Cresce o broto, nasce a flor,
Vai a dor, surge a alegria
Dourando a manhã do Amor.


2 Assim, depois da amargura
Que a vida terrena traz,
A alma encontra na Altura
A luz, a ventura e a paz.



O beijo da morte

1 Para quem viveu na Terra
Em meio dos sofredores
E somente frias dores
No mundo ingrato colheu,
O frio beijo da morte
É o beijo da liberdade,
É um raio de claridade
Que vem da altura do Céu.


2 A vida terrena é a noite
Que precede as madrugadas
Das regiões aureoladas
De amor, de verdade e luz:
Sem paradoxo, portanto,
O gozo é o próprio martírio,
Que se fez excelso lírio
Na devoção de Jesus.


3 A morte é a deusa celeste
Da vida, da plenitude
Que a alegria da Virtude
Faz, linda, desabrochar;
Seu beijo é um raio de luz
Do dealbar das alturas,
Que na noite de amarguras
As almas vem despertar.




O engano

1 Às vezes diz a Ciência
Que a crença é engano profundo,
Esperando uma outra vida
Noutros Planos noutro mundo…


2 E diz arrogante à Fé:


  — «Estás louca! A morte apenas
É o sono eterno e tranquilo
Depois das lutas terrenas.»


3 Ao que ela replica, humilde:


  — «Mais tarde, Ciência amiga,
Serás o sósia da Fé,
Andarás ao lado meu.
Se for sono dormiremos,
Mas se não for, pois não é,
De quem será esse engano?
Será meu ou será teu?»




Flores silvestres

1 Já viste, filho, a floresta
Varrida pelas tormentas?
Partem-se troncos anosos,
Caem copas opulentas.


2 Mil árvores grandiosas
Esfacelam-se nos ares,
Tombam gigantes da selva,
Venerandos, seculares.


3 Mas as florinhas silvestres
São apenas baloiçadas,
Continuando graciosas
A tapetar as estradas.


4 Zune o vento? Geme a selva?
Não sabe a pequena flor,
Que perfumando o caminho
Compõe um hino de amor.


5 Flores silvestres!… Imagem
Dos bons e dos pequeninos,
Que sobre o mundo derramam
As graças dos dons divinos.


6 Na selva da vida humana
Caem grandes, poderosos;
Arcas repletas de ouro.
E frontes ébrias de gozos.


7 Mas, os humildes da Terra,
Dentro da fé que os conduz,
Não caem… São refletores
Da bondade de Jesus.


8 Flores silvestres da vida,
Não sabem se há tempestade
De ambições e se há no mundo
Leis de ódio e iniquidade.


9 Nos dias mais tormentosos,
Sê, filho, como esta flor:
Chore o homem, grite o mundo,
Palmilha a estrada do amor.




Ao meu caro Quintão n

1 Quintão, eu sei da saudade
Que te aperta o coração,
Dos nossos dias passados,
Que tão distantes se vão.


2 Vassouras!… Belas paisagens
Cheias de vida e de cor,
Um céu azul e estrelado
Cobrindo uns ninhos de amor.


3 Árvores fartas e verdes
Pela alfombra dos caminhos,
A ermida branca e suave
De ternos, doces carinhos.


4 O nosso amigo Moreira
E a sua barbearia,
Onde uma vez me encontraste
Na minha noite sombria.


5 Detalhes cariciosos
Da vida singela e calma
Vida de encantos divinos
Que eu via com os olhos dalma.


6 Meus pobres versos — «Singelos»,
«Aves implumes» da dor,
Que traduziam no mundo
O meu pungente amargor.


7 A minha pobre Carlota,
A companheira querida,
O raio de claridade
Da noite da minha vida.


8 Os artigos do Bezerra,
De outros tempos, no «O País»,
O mestre da Velha Guarda
Unida, forte e feliz.


9 A tua doce amizade
À luz do Consolador,
Teu coração generoso
De amigo irmão e mentor.


10 Ah! Quintão, hoje os meus olhos
Embebedam-se de luz,
Pelas estradas sublimes
Da santa paz de Jesus!


11 Mas não sei onde a saudade
É mais forte nos seus véus,
Se pelas sombras da Terra,
Se pelas luzes dos Céus.




Espiritismo

1 Espiritismo é uma luz
Gloriosa, divina e forte
Que clareia toda a vida
E ilumina além da morte.


2 É uma fonte generosa
De compreensão compassiva,
Derramando em toda parte
O conforto d’Água Viva.


3 É o templo da Caridade
Em que a Virtude oficia,
E onde a bênção da Bondade
É flor de eterna alegria.


4 É árvore verde e farta
Nos caminhos da esperança,
Toda aberta em flor e fruto
De verdade e de bonança.


5 É a claridade bendita
Do bem que aniquila o mal,
O chamamento sublime
Da Vida Espiritual.


6 Se buscas o Espiritismo,
Norteia-te em sua luz:
Espiritismo é uma escola,
E o Mestre Amado é Jesus.


Aos companheiros da Doutrina


1 Examinada de perto,
A luz da nossa Doutrina
É sempre a lição que ensina
A paz do caminho certo.


2 Necessário é discernir
A mistura, a ganga, o véu;
Muita vez a água do céu
Torna-se em lama, ao cair.


3 O mal vem de ouvidos moucos
Ou de olhos nevoados,
Há sempre muitos chamados;
Escolhidos? Muito poucos.


4 Verdade é que o coração,
Que abrace a nossa Doutrina,
Penetra numa oficina
De esforço, luta, e ação.


5 Já não deve andar a esmo
Nas estradas da ilusão,
Mas buscando a perfeição
Na perfeição de si mesmo.


6 Portanto, é nossa divisa
Oração e Vigilância,
No bem que é substância
Da crença que diviniza.


7 No Evangelho de Jesus
Feliz quem pode guardar
A força de realizar
Os grandes feitos da Luz.

………………………………………

8 Que no altar do coração
Tenhamos o amor profundo
Daquele que é a Luz do Mundo
— Eis meu desejo de irmão.


Casimiro Cunha



[1] Ver nota 1 no final do volume. [É a nota a seguir.] — Esta poesia singela e, por assim dizer, intimamente pessoal, foi recebida em circunstâncias imprevistas e timbra episódios velhos de mais de 30 anos, que o médium não podia conhecer, atento mesmo a sua banalidade. Singelos e Aves Implumes são títulos de dois pequenos volumes de versos publicados em começos do século. Carlota é o nome da esposa do poeta cego, também cegada de uma vista, por acidente, depois de casada.


Texto extraído da 6ª edição desse livro. — Revista e ampliada pelos autores espirituais.

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