O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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O Evangelho por Emmanuel — Volume VII

Comentários às Cartas universais e ao Apocalipse

Introdução às Cartas de Pedro

Pedro é um dos mais importantes personagens do Novo Testamento. Sendo um dos primeiros apóstolos a receber o convite de Jesus, desde o princípio ele aparece normalmente com algum grau de distinção. Jesus o convida com a proposta de fazê-lo “pescador de homens” (Lucas, 5.10), ainda que este convite, em Mateus e Marcos, seja estendido também a André. É a ele, também, que Jesus atribui a alcunha de pedra, sobre a qual se erigirá a sua comunidade. O nome Pedro em grego é Πέτρος (Pétros) deriva da palavra πέτρα (pétra), que significa rocha, pedra.

Apesar das deferências a ele concedidas, Pedro é uma figura que carrega também os seus desafios e idiossincrasias. Normalmente, aparece como alguém rígido, não só nos costumes, mas também nas ideias. Determinado e às vezes impulsivo na defesa do que considera correto, haja vista o episódio em que ele corta a orelha de Malcos, o soldado que vinha prender Jesus no Getsêmani. (João, 18.10 e 11, Mateus, 26.51; Marcos, 14.47 e Lucas, 22.49 a 51). Isso fez com que, em mais de uma vez, o Mestre o advertisse e mesmo indicasse que ele o negaria três vezes depois de sua prisão. Essas características e advertências, contudo, não impediram que o Cristo conferisse a ele a liderança dos apóstolos após a sua morte na cruz. É Pedro a figura que aparece com maior nível de respeitabilidade e não raro detentor da última palavra nas questões mais importantes. Ele encarna a figura do patriarca que, depois de Jesus, é a que detém a maior autoridade. A tradição manteve essa posição e o próprio papado se institui na simbologia dos ocupantes da cadeira, ou posição, de Pedro.

É natural, portanto, que algum legado direto dessa figura tão importante figurasse entre os escritos do Novo Testamento. Temos, assim, as duas cartas a ele atribuídas. Isso, contudo, não é algo isento de controvérsias, uma vez que a autoria dessas duas cartas é motivo de controvérsia entre os estudiosos.


Estrutura e temas

Destaca-se, em ambos os escritos, as orientações que abrangem um espectro amplo da conduta cristã, e abarcam dos anciões aos jovens, dos esposos aos servos e senhores. Estão presentes também as advertências contra os falsos mestres e a exortação à esperança e à fé, diante das tribulações e dores.

Estão presentes também a exaltação do Cristo e uma conexão importante com algumas narrativas do Antigo Testamento, como a história de Noé sendo a prefiguração do rito do batismo (mergulhar) em 1 Pedro, 3.20 a 22.

O autor das duas epístolas conhece e reverencia os textos do Antigo Testamento (2 Pedro, 1.19 a 21), única escritura de referência à época, o que faz com que um pleno entendimento de suas ideias demande um conhecimento das fontes judaicas.


PRIMEIRA CARTA DE PEDRO — Capítulos: 5 — Versículos: 105 — Destinatários: Aos peregrinos da diáspora.


Temas e versículos:
Saudação e destinatários, 1.1 a 2.
Louvor a Deus e exaltação de Jesus, 1.3 a 5.
Alegria na fidelidade a Jesus, 1.6 a 9.
Os profetas revelaram a salvação presente, 1.10 a 12.
Recomendação de conduta, 1.13; 2.10.
A conduta entre os gentios, 2.11 e 12.
A conduta entre as autoridades, 2.13 a 17.
A conduta com os superiores, 2.18 a 25.
A conduta entre os conjugues, 3.1 a 7.
A conduta entre os irmãos, 3.8 a 12.
A conduta nas perseguições, 3.13 a 17.
Sentido da morte de Jesus, 3.18.
Pregação aos Espíritos em prisão, 3.19 e 20a.
O batismo prefigurado na história de Noé, 3.20b a 22.
Necessidade de romper com o pecado 4.1 a 6.
Manter a esperança — o fim está próximo, 4.7 e 8.
Hospitalidade, 4.9.
Consagração ao serviço, 4.10 e 11.
Felizes os que sofrem pelo Cristo, 4.12 a 19.
Exortações aos anciães, 5.1 a 4.
Exortação aos jovens, 5.5 a 11.
Saudações finais, 5.12 a 14.


SEGUNDA CARTA DE PEDRO — Capítulos: 3 — Versículos: 61 — Destinatários: Aos que conosco obtiveram a fé.


Temas e versículos:
Saudação e destinatários, 1.1 e 2.
Nos foram dadas todas as condições para a vida e a fé, 1.3 e 4.
Necessidade de esforço para a aquisição das virtudes, 1.5 a 11.
Depoimento pessoal e testemunho, 1.12 a 18.
A importância das escrituras, 1.19 a 21.
Existiram e existirão falsos doutores e profetas, 2.1 a 3.
Ação Divina no passado, presente e futuro, 2.4 a 9.
Ações e consequências, 2.10 a 22.
Equívocos dos descrentes e escarnecedores, 3.3 a 7.
O tempo do Senhor e o dia do Senhor, 3.8 a 11.
Apelo à conduta correta, 3.12 a 14.
Ensinos das cartas de Paulo, 3.15 e 16.
Admoestação e saudação final, 3.17 e 18.


Destinatários

As duas cartas atribuídas a Pedro possuem uma destinação genérica. A primeira é endereçada aos “peregrinos da diáspora” n e a segunda aos “que conosco adquiram a fé”. Há uma conexão entre as duas cartas em 2 Pedro, 3.1 e seguintes, o que pressuporia pelo menos de maneira geral, que o autor tinha em mente um mesmo conjunto de comunidades que estariam geograficamente situadas na Ásia Menor. O conteúdo, contudo, revela uma intensão mais geral, o que fez com que algumas vezes se pretendesse que esses escritos estariam mais para o gênero de homilia do que para o de uma carta. Não se trataria, portanto, de um escrito endereçado a uma comunidade específica ou a um indivíduo, mas ao conjunto daqueles que buscariam viver de acordo com o Evangelho. Esse propósito é expresso na segunda carta, em que o autor registra “[…] em ambas procuro despertar com lembranças a vossa mente esclarecida, para que vos recordeis das palavras que, anteriormente, foram ditas pelos santos profetas, bem como do mandamento do Senhor e Salvador.” (2 Pedro, 3.1 e 2).


Autoria

Embora os atestados internos e a praticamente unânime aceitação da autoria por parte dos Pais da Igreja, a crítica moderna frequentemente contesta a autoria de Pedro para as duas epístolas. A dúvida normalmente surge tendo por base o excelente uso do grego koiné nas cartas, a citação do Antigo Testamento a partir da septuaginta e uma exegese muito aprimorada da Torá, particularmente nos casos de Noé e Moisés. Isso seria, segundo os que defendem outro autor que não Pedro, incompatível com os dados biográficos presentes em Atos, que classificam Pedro como simples pescador da região de Cafarnaum e Betsaida. Isso, contudo, não é um argumento definitivo. Além disso, a menção ao nome de Silvano, no final de 1 Pedro, levanta a questão do porquê alguém escrevendo em nome de Pedro, anos mais tarde, utilizaria um nome conhecido dos primeiros cristãos, atribuindo-lhe o papel de responsável por meio do qual a epístola seria escrita e talvez entregue aos destinatários.


Origem e datação

Em termos de local de origem, pesa a utilização do termo Babilônia (5.13), que significava, no Cristianismo e no Judaísmo do primeiro século uma clara alusão ao Império Romano e particularmente a sua capital. Por essa razão, embora haja divergências, acredita-se que Roma seja o local mais provável tanto da redação da primeira quanto da segunda carta de Pedro.

O problema da datação é um pouco mais complexo, visto estar intimamente ligado à questão da autoria, e oferece em 2 Pedro desafios adicionais.

Os dados internos das cartas são insuficientes para uma datação inequívoca. Sabemos que Pedro conhece as cartas de Paulo e a sua importância (2 Pedro, 3.15), o que define uma data inicial de pelo menos alguns anos após o início das cartas de Paulo. Por outro lado, se tomarmos Roma como o local de redação, sabemos que Pedro esteve em Roma por volta dos anos 63 e 67. Admitindo-se a autoria como de Pedro, e a origem em Roma, seria forçoso considerar, então, esse período como o de redação das cartas. Rejeitando-se a autoria de Pedro, as datas para a primeira carta pressuporiam um período posterior à queda de Jerusalém como inicial. Para a segunda carta há o argumento de uma familiaridade do texto com o apocalipse de Pedro, cuja data é do final da primeira metade do século II. Dessa forma, aceitando-se a autoria, temos como período de composição os anos de 63 e 64 para 1 Pedro e 65 a 67 para 2 Pedro. Rejeitando-se a autoria, teríamos de 70 a 90 o período de composição de 1 Pedro e de 92 a 125 para 2 Pedro.


Perspectiva espírita

Pedro é uma figura que personifica o ser humano em suas virtudes e idiossincrasias, desafios e conquistas. Ele nos mostra que as nossas concepções de verdade e de bem devem se afastar cada vez mais do egocentrismo e do preconceito, dando espaço estabeleceu no apóstolo de súbito, demandou tempo e é na perspectiva do tempo que transforma que entendemos mais profundamente a personalidade e a importância de Pedro, já que, em regra geral, a nossa própria transformação demanda também um considerável espaço de tempo e experiências.

Além do tempo, o fator mais importante na transformação de Pedro, que se reflete na nossa própria autotransformação, é a presença do Cristo. Jesus acompanhou Pedro de perto, não faltando com as orientações e advertências, mas sempre confiante na vitória sobre si mesmo daquele que marcaria de maneira indelével o conjunto das comunidades dedicadas à vivência do Cristianismo. Essa permanência deriva do fato de que o olhar de Jesus para Pedro, e, por extensão, para cada um de nós, não é o do superior que desconsidera o inferior, mas o do Mestre que reconhece no discípulo aquilo que ele possui de virtudes em seu íntimo, trabalhando para dilapidar e libertar o que há de bom dos emaranhados transitórios dos equívocos. Por isso Emmanuel nos diz que:

“Aos olhos de muita gente, Simão Pedro era fraco e inconstante; para ele [Jesus], contudo, representava o brilhante entranhado nas sombras do preconceito que fulgiria à luz do Pentecostes para veicular-lhe o Evangelho.” n

E prossegue afirmando:

“Em Pedro, no dia da negação, não repara o cooperador enfraquecido, mas sim o aprendiz invigilante, a exigir-lhe compreensão e carinho, e, por isso, transforma-o, com o tempo, no baluarte seguro do Evangelho nascente, operoso e fiel até o martírio e a crucificação.” n



[1] Ver em Comentários às Cartas de Pedro - 1 Pedro, 2.11 o texto de Emmanuel intitulado Peregrinos e forasteiros. (Nota da Editora.)


[2] Trecho retirado de Palavras de vida eterna. FEB Editora; CEC. Capítulo 35. — Observemos amando. In. O Evangelho por Emmanuel — Comentários ao Evangelho segundo Mateus. (Nota da Editora.)


[3] Trecho da mensagem O olhar de Jesus. Reformador, janeiro de 1956, p. 6. In. O Evangelho por Emmanuel — Comentários ao Evangelho segundo Mateus. (Nota da Editora.)


Saulo Cesar Ribeiro da Silva.


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