Objetivo
da encarnação. — A alma. — Há três coisas no homem: o corpo,
a alma e o perispírito. — Dupla natureza do homem. — Origem
das paixões. — União da inteligência e da perversidade. — Instante
da união entre a alma e o corpo. — Relações congênitas entre
filhos e pais. — Semelhanças físicas e morais. — Indivisibilidade
da alma. — Sede da alma. — A alma é interna ou externa? — Influência
da matéria e dos órgãos sobre as manifestações da alma. Loucura.
Idiotismo. — Ideias intuitivas trazidas ao homem pelo Espírito
nele encarnado. (Questões 80 a 100 b.) |
80. Os
Espíritos podem tornar-se melhores durante sua existência espiritual?
“Eles têm a vontade e o desejo de melhorar-se; contudo, para realizarem
esse desejo, devem passar por todas as tribulações da existência
corpórea.”
80 a. Qual
o objetivo da encarnação dos Espíritos? [Questão
132.]
“Deus lhes impõe a encarnação com o fim de fazê-los chegar à perfeição.
Para uns, é expiação; para outros, missão.”
A passagem pela vida material é necessária à purificação
dos Espíritos. Para se melhorarem e se instruírem, eles têm que
passar por todas as tribulações da existência corpórea. A encarnação
lhes é imposta, seja como expiação para uns, seja como missão para outros.
Tudo se encadeia na Natureza; ao mesmo tempo que o Espírito se depura
pela encarnação, concorre, simultaneamente, para o cumprimento dos desígnios
da Providência.
81. Que
é a alma? [Questão 134.]
“Um Espírito encarnado.”
81 a. As
almas e os Espíritos são, portanto, idênticos, a mesma coisa? [Questão
134 b.]
“Sim, as almas não são senão os Espíritos.”
81 b. Que
pensar da opinião dos que consideram a alma o princípio da vida material?
[Questão 138.]
“É uma questão de palavras, com a qual nada temos. Começai por vos entenderdes
mutuamente.”
A alma é um Espírito encarnado. Antes de unir-se ao corpo,
a alma é um Espírito errante ainda impuro; é um dos seres que povoam
o mundo espiritual e que revestem temporariamente um envoltório carnal,
a fim de se purificar e se instruir.
Ao encarnar no corpo de um homem,
o Espírito lhe traz o princípio intelectual e moral que o torna superior
aos animais (Ver na
Introdução; a explicação da palavra alma).
82. Há
quantas partes essenciais no homem?
“Três: a alma, que é a primeira de todas; o corpo e, depois, o laço
que une a alma ao corpo.”
82 a. O
laço que une a alma ao corpo é de natureza material ou espiritual? [Questão
135 a.]
“De uma e de outra. É preciso que seja assim para que eles possam comunicar-se
um com o outro. Por meio desse laço é que o Espírito atua sobre a matéria
e vice-versa.”
Há no homem três coisas:
1º) O corpo ou ser material, análogo ao dos animais e animado pelo mesmo
princípio vital;
2º) A alma, Espírito encarnado que tem no corpo a sua habitação;
3º) O princípio intermediário ou perispírito, substância semimaterial
que serve de primeiro envoltório ao Espírito e une a alma ao corpo.
Tais são, num fruto, a semente, a polpa e a casca.
83. Qual
a origem das qualidades morais, boas ou más, do homem? [Questão
361.]
“São as do Espírito nele encarnado. Quanto mais puro é o Espírito, mais
o homem é propenso ao bem.”
83 a. Parece
resultar daí que o homem de bem é a encarnação de um Espírito bom, e
o homem vicioso a de um Espírito mau? [Questão
361 a.]
“Sim, mas não digais Espírito mau; dizei antes que o homem vicioso é
a encarnação de um Espírito imperfeito, pois, do contrário, poder-se-ia
crer na existência de Espíritos sempre maus, a que chamais demônios.”
Sendo os Espíritos de diferentes ordens, uns já depurados
e possuídos do amor do bem, e outros ainda impuros, dominados pelas
más paixões, resulta que eles trazem ao homem, ao encarnarem, as qualidades
boas ou más inerentes à categoria a que pertencem, e que, assim, o homem
de bem é a encarnação de um Espírito já purificado, e o homem perverso
a de um Espírito ainda imperfeito.
O homem vicioso que se arrepende
e se melhora é a encarnação de um Espírito que compreende seus erros
e tende a um destino melhor.
84.
Visto que há no homem um corpo e uma alma, e que pelo corpo ele se assemelha
aos animais, haverá nele uma dupla natureza? 83
“Sim, a natureza animal e a natureza espiritual.” [Questão
605.]
84 a. As
paixões do homem lhe vêm dos Espíritos ou são inerentes ao seu organismo?
“De ambos. Já dissemos que uma parte delas se deve à influência dos
Espíritos.”
Há no homem duas naturezas: por seu corpo participa da natureza
dos animais e de seus instintos; por sua alma, participa da natureza
dos Espíritos.
Estas duas naturezas dão às paixões do homem duas fontes distintas:
uma provém dos instintos da natureza animal, e a outra resulta das impurezas
do Espírito nele encarnado, e que simpatiza com a baixeza dos apetites
animais. [Questão 605.]
85. O
mesmo Espírito dá ao homem as qualidades morais e as da inteligência?
[Questão 364.]
“Sim.”
85 a. Por
que alguns homens muito inteligentes, o que é indício de superioridade,
são ao mesmo tempo profundamente viciosos? [Questão
365.]
“É que os Espíritos encarnados nesses homens não são ainda bastante
puros, sendo por isso, dominados por outros Espíritos mais maldosos
que eles mesmos.”
O mesmo Espírito dá ao homem as qualidades morais e as da
inteligência; mas se o Espírito não estiver bastante purificado, o homem
se entrega às paixões animais ou cede à influência de outro Espírito
igualmente imperfeito, que se aproveita de sua fraqueza para dominá-lo.
Daí, no mesmo indivíduo, a união frequente da perversidade e da inteligência.
86.
Em que época a alma se une ao corpo? [Questão
344.]
“No nascimento.” 84
86 a. Antes
do nascimento a criança tem alma?
“Não.” [Vide importante Nota do Tradutor]
86 b. Como
vive, então?
“Como as plantas.”
A alma ou Espírito se une ao corpo no momento em que a criança
vê a luz e respira.
Antes do nascimento, a criança só tem vida orgânica sem alma. Vive como
as plantas, tendo apenas o instinto cego de conservação, comum a todos
os seres vivos. [Vide nota 84.]
87. Os
pais transmitem aos filhos uma parcela de suas almas ou se limitam a
lhes dar a vida animal, à qual uma nova alma vem, mais tarde, adicionar
a vida moral? [Questão 203.]
“Somente a vida animal, pois a alma é indivisível. Um pai estúpido pode
ter filhos inteligentes e vice-versa.”
A geração se opera no homem como nos animais. Os pais só
transmitem aos filhos a vida orgânica, à qual mais tarde uma nova alma,
estranha à do pai e da mãe, vem acrescentar a vida moral e intelectual.
88. Frequentemente
os pais transmitem aos filhos uma semelhança física. Transmitirão também
alguma semelhança moral? [Questão
207.]
“Não, pois têm almas ou Espíritos diferentes.”
88 a. De
onde vêm as semelhanças morais que algumas vezes se notam entre pais
e filhos? [Questão 207 a.]
“São Espíritos simpáticos, atraídos pela similitude de suas inclinações.”
Os pais podem transmitir aos filhos semelhança física, porque
o corpo procede do corpo; mas não podem transmitir semelhança moral,
visto que a alma do filho é estranha à dos pais. Entretanto, a alma
deles pode atrair para o corpo da criança um Espírito da mesma categoria
e tendo com ela similitude de gostos e inclinações.
89. Os
Espíritos dos pais exercem alguma influência sobre os dos filhos, após
o nascimento destes? [Questão 208.]
“Muito grande. Conforme já dissemos, os Espíritos devem contribuir para
o progresso uns dos outros. Pois bem! Os Espíritos dos pais têm por
missão desenvolver os de seus filhos pela educação. Isto constitui para
eles uma prova: se falharem, serão culpados.”
Os Espíritos exercem influência uns sobre os outros; os
bons, com vistas a fazer avançar os que ainda são inferiores; os impuros,
no intuito de retardar o progresso dos bons. É assim que o Espírito
encarnado nos pais transmite ao dos filhos, pela educação,
os princípios bons ou maus de que estiver animado, segundo a categoria
que ocupe, procurando igualá-lo a si.
90. Pode
o Espírito encarnar ao mesmo tempo em dois corpos diferentes? [Questão
137.]
“Não; ele é indivisível.”
90 a. De
onde vem a semelhança de caráter que muitas vezes existe entre dois
irmãos, principalmente entre gêmeos? [Questão
211.]
“Espíritos simpáticos que se aproximam por analogia de sentimentos e
que se sentem felizes por estar juntos.”
Por ser indivisível, o Espírito não pode encarnar ao mesmo
tempo em dois corpos diferentes. A analogia de caráter que existe muitas
vezes entre várias pessoas, sobretudo entre irmãos, provém da similitude
dos Espíritos que se aproximam por simpatia e se sentem felizes por
estar juntos.
91. De
onde provém o caráter distintivo que se nota em cada povo? [Questão
215.]
“Os Espíritos também possuem famílias, formando-as pela semelhança de
suas inclinações mais ou menos depuradas, conforme a elevação que tenham
alcançado. Pois bem! Um povo é uma grande família onde se reúnem Espíritos
simpáticos.”
Os Espíritos formam entre si grupos ou famílias, fundados
sobre a semelhança de suas inclinações, gostos e desejos. A tendência
que têm os membros dessas famílias para se unirem, é a origem da semelhança
que existe no caráter distintivo de cada povo.
92. Que
pensar da teoria da alma subdividida em tantas partes quantos são os
músculos e presidindo assim a cada uma das funções do corpo? [Questão
140.]
“Isso depende do sentido que se atribui à palavra alma. Se por alma
se entende o fluido vital, a teoria está certa; se o que se entende
é o Espírito encarnado, a teoria está errada. Já dissemos que o Espírito
é indivisível; ele transmite o movimento aos órgãos através do fluido
intermediário, sem por isso se dividir.”
A alma, como o Espírito, é indivisível; ela age por meio
dos órgãos e estes são animados pelo fluido vital que se reparte entre
eles e, mais abundantemente, nos que formam os centros ou focos do movimento.
Os que chamam a alma de fluido vital têm razão de dividi-la em tantas
partes quantas são as funções existentes no corpo; mas esta explicação
não pode convir à alma, se for considerada como sendo o Espírito que
habita o corpo durante a vida e o abandona por ocasião da morte.
93. Qual
a sede da alma no corpo? A cabeça ou o coração? [Questão
146.]
“Isso varia segundo as pessoas.”
93 a. Quais
as pessoas que a possuem no coração? [Questão
146.]
“Aquelas cujas ações, todas, têm por objeto a Humanidade.”
93 b. Quais
os que a têm na cabeça? [Questão
146.]
“Os grandes gênios, os literatos, os políticos, etc.”
93 c. Que
pensar da opinião dos que situam a alma num ponto determinado e circunscrito:
num centro vital? [Questão 146 a.]
“Significa dizer que o Espírito habita de preferência essa parte de
vosso organismo, pois para ali convergem todas as sensações: a vista,
o gosto, o olfato, a audição e mesmo o tato. Isto, porém, não quer dizer
que o Espírito aí esteja confinado e, sim, que o organismo concentra
todos esses sentidos num só local, a fim de te provar que é unicamente
pela união e harmonia da matéria que o Espírito pode agir livremente
e assim adquirir os conhecimentos que lhe são necessários.”
A alma, propriamente falando, não possui uma sede absoluta
no corpo, porque o Espírito encarnado não fica confinado num órgão qualquer.
Os que a colocam no centro que consideram como sendo o da vitalidade,
a confundem com o fluido ou princípio vital. Entretanto, pode-se dizer
que a sede da alma se encontra especialmente nos órgãos que servem às
manifestações intelectuais e morais, isto é, no cérebro e no coração.
Localiza-se mais particularmente num ou noutro, segundo as pessoas,
podendo, todavia, residir simultaneamente nesses dois locais.
Está no
coração daqueles cujas ações têm, todas, por objeto a Humanidade e no
cérebro dos grandes gênios e dos intelectuais.
Pode-se ser homem de
bem sem ter inteligência superior, e intelectual sem ser homem de coração.
94. Há
algum fundo de verdade na opinião dos que pensam que a alma é externa
e envolve o corpo? [Questão 141.]
“A alma não está encerrada no corpo como o pássaro numa gaiola. Irradia-se
e se manifesta exteriormente como a luz através de um globo de vidro.
É nesse sentido que se pode dizer que ela é externa. A alma tem dois
envoltórios. Um, sutil e leve: é o primeiro, ao qual chamas perispírito;
outro, grosseiro, material e pesado: o corpo. A alma é o centro de todos
esses envoltórios, como o gérmen em um núcleo, já o dissemos.”
A alma, ou o Espírito, habita o corpo, mas não fica aí aprisionada.
Irradia-se toda ao seu redor por suas manifestações, como o som em torno
de um centro sonoro, ou como a luz ao redor de um foco luminoso. Sob
este ponto de vista, ela é interna e externa ao mesmo tempo, mas nem
por isso é o envoltório do corpo.
Para os que chamam alma o envoltório semimaterial do Espírito, ou perispírito, ela seria externa em relação
ao Espírito. Para nós, a alma é o próprio Espírito, isto é, o centro
ou foco intelectual e moral, não podendo, portanto, ser um envoltório
qualquer.
95. Ao
unir-se ao corpo, o Espírito identifica-se com a matéria? [Questão
367.]
“Não; a matéria é apenas o envoltório do Espírito, como a roupa é o
envoltório do corpo.”
O Espírito, em sua encarnação, não se identifica com a matéria.
A matéria é apenas um envoltório, e sempre distinta dele, como o próprio
corpo é distinto da roupa que o recobre.
96. Ao
unir-se ao corpo, o Espírito conserva os atributos da natureza espiritual?
“Sim.” [Questão 367.]
96 a. As
faculdades do Espírito são exercidas com total liberdade após sua união
com o corpo? [Questão 368.]
“Não; elas dependem dos órgãos que lhe servem de instrumento. A grosseria
da matéria as enfraquece.”
96 b. De
acordo com isso, o envoltório material seria um obstáculo à livre manifestação
das faculdades do Espírito, como um vidro opaco se opõe à livre emissão
da luz? [Questão 368 a.]
“Sim, e muito opaco.”
Ao unir-se ao corpo, o Espírito conserva os atributos de
sua natureza espiritual; mas suas faculdades ficam limitadas pelos órgãos
que lhe servem para manifestar-se.
Sendo os órgãos os instrumentos de manifestação das faculdades da alma, tal manifestação se acha subordinada
ao desenvolvimento e ao grau de perfeição desses mesmos órgãos.
A densidade da matéria que envolve o Espírito também lhe tira uma parte de suas
faculdades, tal como a água lodosa, que tira a liberdade dos movimentos
do corpo que nela se ache mergulhado, ou como um globo de vidro opaco
que embaça a claridade da luz.
97. O
Espírito que anima o corpo de uma criança é tão desenvolvido quanto
o de um adulto? [Questão 379.]
“Sim; apenas a imperfeição dos órgãos o impede de manifestar-se.”
Como as manifestações das faculdades do Espírito estão subordinadas
ao desenvolvimento dos órgãos do corpo, o Espírito que anima a criança
é tão maduro quanto o de um adulto; mas age em função do instrumento,
de cujo auxílio precisa para manifestar-se.
98.
Qual a causa da nulidade moral e intelectual de certos seres, tais como
os que se designam pelos nomes de idiotas ou cretinos? 85
“Imperfeição dos órgãos.”
98 a. Se
a nulidade moral e intelectual é provocada apenas pela imperfeição dos
órgãos, deve-se concluir que a alma do cretino e do idiota seja tão
desenvolvida quanto a de um homem no pleno gozo de suas faculdades?
86
“Sim, e muitas vezes mais.”
98 b. Qual
o objetivo da Providência ao criar seres assim tão infelizes? 87
[Questão 372.]
“São Espíritos em punição que habitam corpos de idiotas. Dá-se a mesma
coisa nos casos de loucura. Esses Espíritos sofrem pelo constrangimento
que experimentam e pela impossibilidade em que estão de se manifestarem
por meio de órgãos não desenvolvidos ou defeituosos. É por isso que,
muitas vezes, buscam na morte um meio de quebrar esses grilhões.”
A nulidade moral e intelectual de certos seres é devida
à imperfeição dos órgãos, que não permite à alma manifestar-se plenamente.
Frequentemente é uma expiação para o Espírito que habita tal corpo.
Ora, como a superioridade moral nem sempre guarda relação com a superioridade
intelectual, os maiores gênios podem ainda ter muito que expiar; daí,
não raro para eles, uma existência inferior à que já tiveram e uma causa
de sofrimentos.
Tais são os idiotas, os cretinos e os loucos, embora a causa fisiológica
de tais moléstias seja diferente. O Espírito deles é tão desenvolvido
quanto o do homem de gênio; os entraves que encontra nas manifestações
são para ele, Espírito, como os grilhões que comprimem os movimentos
de um homem vigoroso, razão por que, tantas vezes, busca quebrá-los
pelo suicídio.
99. Por
que o Espírito encarnado perde a lembrança de seu passado e o conhecimento
do futuro? [Questão 392.]
“O homem não pode nem deve saber tudo. Deus assim o quer.”
99 a. O
passado e o futuro ficam ocultos ao homem de maneira absoluta?
“Sim, para certas coisas; não, para todas. Isso depende da vontade de
Deus.”
O invólucro corpóreo tira ao Espírito a memória do passado
anterior à sua existência atual; esconde-lhe também o futuro e os mistérios
que a Providência houve por bem ocultar ao homem. Sem o véu que lhe
encobre certas coisas, o homem ficaria ofuscado, como quem passa sem
transição da obscuridade à luz.
100. O
Espírito encarnado conserva algum vestígio das percepções que tinha
antes de se unir ao corpo? [Questão
218.]
“Sim; guarda vaga lembrança, que lhe dá o que se chama ideias inatas.”
100 a. É
a essa vaga lembrança que o homem deve, mesmo no estado de selvageria,
o sentimento instintivo da existência de Deus e o pressentimento da
vida futura? [Questão 221.]
“Sim; mas o orgulho sufoca, muitas vezes, esse sentimento.”
100 b. É
a essa mesma lembrança que se devem certas crenças relativas à Doutrina
Espírita, e que se encontram em todos os povos? [Questão
221 a.]
“Sim; essa doutrina é tão antiga quanto o mundo.”
Embora o Espírito perca, sob a ação de seu invólucro corpóreo,
a percepção do mundo espiritual, nem por isso deixa de trazer consigo
a intuição do que conhecia antes de encarnar e que permanece em seu
foro íntimo como vaga lembrança. Tal é a origem do sentimento inato
que leva o homem a reconhecer a existência de um Ser Supremo, que lhe
dá a consciência do bem e do mal e lhe faz pressentir o futuro. Tal
ainda a fonte de inúmeras crenças relacionadas com a Doutrina Espírita
e que se encontram desenvolvidas no seio de todos os povos e em todas
as épocas, se bem que interpretadas sob formas mais ou menos grosseiras
por ignorância, fanatismo e ambição.
[83],
[85], [86],
[87] N. E.:
Ver “Nota explictiva”, p. 551.
[84]
N. T.: Mais tarde esta resposta recebeu a seguinte redação: “A união
começa na concepção, mas só se completa no momento do nascimento. Desde
o instante da concepção, o Espírito designado para habitar certo corpo
a este se liga por um laço fluídico, que cada vez mais se vai apertando
até o instante em que a criança vê a luz. O grito, que então escapa
de seus lábios, anuncia que ela se conta no número dos vivos e dos servos
de Deus.” (O Livro dos Espíritos, 2ª edição, questão
344). A não ser assim, estariam justificados todos os abortos, praticados
em qualquer período da gestação, inclusive os realizados na véspera
da data provável do parto, o que não admitem nem mesmo os defensores
mais ferrenhos dessa prática criminosa.
Menos de um ano após a publicação da 1ª edição de O Livro dos Espíritos
na (Revista Espírita de março de 1858 — Conversas Familiares
de Além-túmulo — “O doutor
Xavier”, questão 26, página 141 da edição da FEB), Allan Kardec,
no claro intuito de esclarecer melhor a questão, indaga daquele Espírito
se há crime em privar da vida uma criança, antes de seu nascimento,
recebendo dele a seguinte resposta: “Há crime toda vez que transgredis
a Lei de Deus. Uma mãe, ou qualquer outra pessoa, cometerá crime sempre
que tirar a vida de uma criança antes do nascimento, pois está impedindo
uma alma de suportar as provas de que serviria de instrumento o corpo
que se estava formando.” Como se vê, a resposta dada pelo doutor Xavier
em 1858 passou a integrar a questão
358, da edição definitiva de O Livro dos Espíritos, publicada
em 1860.
Em 1861, quando da reimpressão da Revista Espírita de 1858, Allan Kardec
houve por bem aditar a seguinte observação, inserida depois da resposta
à questão 34 do mesmo artigo — “O
doutor Xavier” — assim concebida: “A união [entre a alma e o corpo]
começa desde a concepção, isto é, a partir do momento em que o Espírito,
sem estar encarnado, liga-se ao corpo por um laço fluídico, que cada
vez mais se vai apertando até o instante em que a criança vê a luz.
A encarnação só se completa quando a criança respira” (ver O Livro
dos Espíritos, questão 344
e seguintes).