O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Voltei — Irmão Jacob


13

Revendo círculos de trabalho

(Sumário)

1. O retorno ao Rio emocionava-me.

Não ignorava que a maioria dos recém-libertos do Plano Físico não se podem movimentar com a eficiência desejável.

Muitos Espíritos permanecem como que anestesiados e inconscientes, outros se demoram na incapacidade de qualquer apreciação de si mesmos, imobilizados pelo choque ou pelo terror.

Comigo, porém, a situação diferia.

A sede de saber renovava-me as forças.

2 Relembrando os últimos instantes na experiência material, retomava mal-estar indefinível. A dispneia parecia uma entidade imaginária, pronta a individualizar-se dentro de mim toda vez que a evocava em pensamento. Bastava recordar certos sintomas do esgotamento que experimentara no corpo de carne, para registá-los imediatamente no organismo espiritual.

3 Compreendi, desse modo, que a mente possui incalculável poder sobre o nosso campo emotivo e, assim como poderia materializar ideias de doença, também deveria criar ideias de saúde e mantê-las. Baseado nessa convicção, procurei decifrar o problema em meu próprio benefício e passei a mentalizar o equilíbrio e a esperança, a alegria e o serviço.

4 Estimulado pela proteção de valorosos amigos, cabia-me honrar-lhes o carinho e a devoção. Convidado, pois, a segui-los, competia-me apresentar o melhor padrão de energia, serenidade e entendimento.


OBSERVAÇÕES NA CROSTA


2. Na volta não se verificaram as peripécias da ida. Ao nos afastarmos mais extensamente do parque e achando-me amparado pelos companheiros que me ofereciam braços acolhedores, entregamo-nos à volitação plena.

2 Perdurava em mim a impressão de viagem na linha horizontal, mas lembro-me de haver contemplado, curiosamente, a grande ponte que o facho luminoso destacava, espaço a espaço, calculando que íamos, agora, não só rapidamente, mas em maior altura.

3 Guillon, robustecido e bem-humorado, aconselhou-me estabelecer paralelo entre o veículo que usávamos ali, e o pesado corpo de carne que abandonáramos ao solo terrestre, e porque alcançássemos a estação de destino, em minutos breves, afirmou-me que, 4 se há rotas aéreas para os pássaros metálicos da aviação planetária, há rotas espirituais definidas que favorecem a instantânea condução de entidades menos chumbadas às sensações da vida física.

5 Reparei que não atingimos a cidade quais foguetes verticalmente derramados do céu e, sim, com a naturalidade de alguém que descesse uma escada de vastíssimos degraus, perfeitamente disfarçados uns dos outros.

6 Pousando no chão, senti estranha diferença. O contato com a terra semelhava-se ao de um magnete, o que me obrigou a concluir que a volitação só é possível, com facilidade, na Crosta do Mundo, aos Espíritos mais evolvidos e adestrados na movimentação de certas forças fluídicas.

7 Comentou Schutel as surpresas dos primeiros dias do homem desencarnado na vida extracorpórea, alegando que os decênios transcorridos no corpo carnal imprimem hábitos que, efetivamente, passam a constituir uma “segunda natureza” para a individualidade.

8 Quando considerei a possibilidade de nos materializarmos em plena avenida, para dar testemunho da sobrevivência, riu-se Guillon, discreto, e afiançou que, se tal cometimento fosse provável a perturbação alcançaria muita gente; 9 de vez que o próprio clarão revelador da crença, para demonstrar-se benéfico, há de penetrar gradualmente o templo interno de cada um, acentuando que, por isso mesmo, concede o Senhor suficientes recursos à mente encarnada para aproveitar-lhe as bênçãos, na renovação e iluminação de si mesma. 10 O progresso espiritual será sempre gradativo, sem violência e sem alarme.


CORTANDO A VIA PÚBLICA


3. Era, contudo, uma novidade para mim devorar a distância nas vias públicas, dentro da noite, sem ser visto pelos semelhantes encarnados.

2 No dia imediato ao de minha liberação, em verdade fiz pequena caminhada em companhia dos amigos que me amparavam; entretanto, a posição de abatimento não me havia proporcionado ensejo de experimentar toda a extensão da surpresa de que me via agora possuído.

3 O que mais me espantava era a expressão espiritual de cada pessoa que me cruzava o caminho. Observei que muitas criaturas permaneciam acompanhadas por Espíritos benignos ou por sinais luminosos, que me deixavam perceber o grau de elevação que já haviam atingido, mas o número de entidades gozadoras das baixas sensações da vida física, a seguirem suas vítimas, de perto, era francamente incalculável.

4 Anunciou-me Guillon que bastaria breve exame para identificarmos a natureza do vício de cada uma. Pouco a pouco, embora o tempo curto, verificava por mim mesmo através dos gestos com que se revelavam, os Espíritos ainda presos às paixões sexuais, aos tormentos do ódio e aos caprichos da vingança. 5 O Irmão Andrade, a cuja assistência recorrera, muitas vezes, nos últimos tempos de minha tarefa humilde para socorrer alcoólatras inveterados, em casos difíceis nos quais a obsessão se caracterizava perfeitamente, indicou-me alguns transeuntes torturados pela dipsomania. 6 Estavam seguidos por verdadeiros vampiros de forma repugnante, alguns completamente embriagados de vapores, outros demonstrando aflitiva sede, pálidos e cadavéricos. 7 O quadro mais inquietante, porém, era constituído por um morfinômano e pelas entidades em desequilíbrio que se lhe jungiam. Parecia um homem subjugado por tentáculos de polvos enormes…Vendo-o aprisionado em cordões escuros, perguntei ao amigo Andrade como interpretar a visão que tínhamos sob os olhos, esclarecendo-me ele, então, que os hipnóticos, mormente os mais violentos, afetam os delicados tecidos do perispírito, proporcionando doces venenos aos amantes da ociosidade; os fios negros são fluidos de ligação entre as “lampreias” invisíveis e os plexos da vítima encarnada.

8 Compreendi, com mais exatidão, que o viciado de qualquer espécie é compelido a procurar material emotivo para si e para os que o obsidiam, caindo invariavelmente na insaciedade que o caracteriza.

9 Fitei Guillon, espantado, e indaguei:

— Que acontecerá a um infeliz destes, se ele desencarnar?

— Se a morte encontrá-lo em tal posição, — respondeu, sereno, — vagueará por aí, à vontade dos verdugos que o exploram vorazes, até que um dia delibere modificar-se intimamente para o bem de si mesmo.


AULA DE PREPARAÇÃO ESPIRITUAL


4. Daí a minutos penetrávamos respeitável instituição, onde cooperaríamos na transformação de entidades perigosas pela avançada cultura desviada para o mal.

2 Conduzido por Guillon a extensa sala, com surpresa forte aí encontrei Leopoldo Cirne rodeado de dezenas de entidades menos evolutidas a lhe escutarem a palavra, atenciosas.

Era uma aula perfeita na qual o velho amigo preparava futuros companheiros para a contribuição espiritual de ordem elevada.

3 Notei-lhe a preocupação de sintetizar para ganhar tempo.

Dos tópicos registados por mim, assinalei, por mais expressivo, o ensinamento da cooperação.

4 Ainda depois da morte, — enunciava ele, — a fraternidade é o caminho da salvação. 5 Para que um criminoso retome o patrimônio da paz, urge regenerar-se e socorrer os irmãos ignorantes que tiveram também o infortúnio de resvalar nos despenhadeiros do crime; 6 a fim de que o intemperante se reajuste, é imprescindível se cure, colocando-se no auxílio aos que ainda não puderam libertar-se dos maus hábitos; 7 se o ingrato deseja iluminar o próprio caminho, convém-lhe a reparação dos erros em que se mergulhou impensadamente, amparando o próximo de coração enrijecido, despertando-o para os benefícios da gratidão. 8 Inadiável, portanto, é a reforma íntima com o trabalho de autoaperfeiçoamento, para que a dádiva da reencarnação produza frutos de paz e sabedoria.

9 Os Espíritos, revelando fundo interesse, ouviam-no com a mesma atenção com que na Terra se registam informes alusivos ao dinheiro fácil.

10 Sorridente, Guillon comentou a posição diversa em que nos achamos, atravessado o sepulcro. Enquanto no mundo vulgar, esmagadora maioria das criaturas menospreza a alma, atendendo às vantagens imediatas do corpo, sobrevindo a morte assinala-se a reviravolta; — os indiferentes de ontem, na maioria, buscam o olvido das impressões que lhes ficam da experiência física, procurando as vantagens da alma.

11 Ninguém se eleva do chão planetário ostentando asas alheias e, daí, as organizações numerosas de assistência e socorro sobre a Terra mesmo.

12 Cirne é um dos pioneiros dessas escolas de preparação espiritual. Terminada a aula, veio ter conosco, prestativo e amável.

— Então, — disse-lhe, satisfeito, — orientando nossos irmãos para o Céu?

13 Fitou em mim aqueles mesmos olhos cintilantes que lhe conhecíamos noutro tempo e respondeu:

— Não, Jacob, não é bem isto. Se na Esfera carnal trabalhamos na condução do próximo para que aprenda a bem morrer, cooperamos agora a fim de que saiba renascer com proveito.


NOS SERVIÇOS DE DOUTRINAÇÃO


5. Não tive tempo para refletir-lhe a resposta sábia. Schutel veio buscar-nos para o serviço de evangelização.

Os trabalhos de socorro aos desencarnados endurecidos estavam iniciados com a prece do orientador da reunião.

2 Naturalmente, poderiam ser instruídos em nossa Esfera de luta, — afirmou Guillon, compreensivo, — entretanto, os benefícios decorrentes da colaboração atingiriam particularmente os amigos encarnados, não somente lhes aumentando o conhecimento e a experiência, mas também lhes suprimindo lastimáveis impulsos para o mal.

3 Que os infortunados ali diante de nós, eram perseguidores sombrios não padecia dúvida. Não viam os benfeitores que até ali acorriam para melhorar-lhes as condições, embora agissem constrangidos pelas forças magnéticas que deles emanavam; contudo, ouviam-lhes as instruções e advertências edificantes, através daqueles mesmos aprendizes das aulas do Cirne.

4 Reparei, então, com mágoa, a diferença que existia entre mim e os abençoados companheiros que me haviam trazido. Ao passo que nenhum deles era visível aos irmãos ignorantes e perturbados, não obstante as irradiações brilhantes que lhes marcavam a individualidade, notavam-me a presença, entre os ajudantes intermediários, pertencentes aos cursos preparatórios de espiritualidade superior.

5 Certa entidade reconheceu-me e gritou:

— Aquele ali não é o Jacob?

E mirando-me de alto a baixo, acentuou:

— Que é da luz dele?

6 Sentindo a opacidade de minha organização espiritual e envergonhado com o incidente, recolhi-me ao silêncio e à inação, receando intervir nos serviços da noite, no desdobramento dos quais não sobrava tempo para qualquer indagação ociosa de minha parte.

7 Finda que foi a tarefa, expus ao Guillon o meu caso; todavia, afagando-me os ombros, fraternalmente, exclamou sem humilhar-me:

— Não se atormente, meu caro. Medite, ore e, no momento oportuno, receberá os necessários esclarecimentos. Esteja certo de que a sua luz virá.

8 Semelhantes palavras de reconforto, porém, não conseguiram afastar a profunda tristeza que me tomou o coração.


Irmão Jacob


Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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