O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Voltei — Irmão Jacob


8

A chegada

(Sumário)

1. Que seria da existência humana se todos os homens guardassem consigo a certeza de que vivem rodeados pela “nuvem de testemunhas espirituais”? ( † ) Como agiria a criatura na vida doméstica e no círculo social se estivesse convencida de que amigos e afeiçoados a esperam em outro lar?

2 Inseguro viajante, preferindo roteiros incertos, o Espírito encarnado quase nunca se lembra de que é simples hóspede da Esfera que o recebe. Não fosse um desmemoriado das bênçãos divinas e a caminhada através da carne ser-lhe-ia muito mais proveitosa e mais feliz o regressar!

3 Esses pensamentos assaltavam-me o cérebro, ante os amigos que nos abraçavam acolhedores. Aguardavam-nos, contentes, no “outro lado”, com o carinhoso amplexo de boas-vindas!

4 Nenhum de nós, os que fazíamos aquela travessia pela primeira vez, depois de permanência demorada na carne, ficou órfão das lágrimas de ventura! As explosões de carinho com que éramos recebidos faziam-me acreditar no ingresso no Paraíso.


NA PAISAGEM DIFERENTE


2. Modificara-se a paisagem depois de transposta a extensa ponte. A escuridão quase absoluta ficara para trás, nos caminhos percorridos, e a atmosfera noturna tornara-se mais leve, mais clara. Impregnara-se o ar de perfumes sutis.

2 Movimentando-se ao nosso lado, os amigos que nos aguardavam, além do despenhadeiro, entoavam cânticos de júbilo. Não havia qualquer nota de tristeza nesses hinos de regozijo. Eram todos vazados em soberana alegria, qual se estivéssemos regressando à casa paterna, como o filho pródigo da parábola. ( † ) Alguns foram acompanhados por Marta, cuja voz cristalina me expulsava o cansaço e o abatimento.

3 Muitos dos companheiros sustentavam tochas acesas e, à claridade delas, via-se-lhes o semblante iluminado e feliz.

Fizera-se a volitação mais agradável, mais rápida.

A estrada que percorríamos marginava-se de flores, algumas delas como que talhadas em radiosa substância, o que convertia a paisagem numa cópia do firmamento. Árvores próximas pareciam cobertas de estrelas.

4 Ouvindo as melodias suaves que partiam para longe, levadas pelo vento fresco a soprar-nos de leve sobre o rosto, eu não expressaria de modo algum a emoção que me dominava.

A que país, afinal, fora eu arrebatado pela morte? Teria subido a Terra até ao Céu ou teria o Céu baixado para a Terra?

5 Em verdade, incoercível desejo de dormir, ampla e despreocupadamente, escravizava-me os sentidos. As aflições de natureza física haviam terminado; todavia, certa fadiga sem dor me submetia inteiramente.

6 No entanto, aquelas vozes argentinas, a se evolarem para o alto, alegremente, como que me embalavam o ser, revigorando-me as energias. Os versos comoventes dos cânticos e a música espiritualizante que vagava na atmosfera me arrancavam lágrimas inesquecíveis.

7 Que fizera no mundo para merecer o devotamento dos amigos e as ternuras de minha filha? Por que não me lembrara, mais vezes, na Terra, de que retornaria ao Lar Espiritual? Eu pensara na morte, aguardara-a sereno e providenciara quanto julguei justo para quando o corpo exausto baixasse ao túmulo; todavia, não supunha que a vida, aqui, fosse tão natural. Se soubesse antes, ter-me-ia preocupado em semear o bem e a luz, mais intensamente, na causa que abraçamos.


REENCONTRO EMOCIONANTE


3. Meditando nas festividades cristãs dos tempos primitivos do Evangelho, notei que celeste bando de aves luminosas surgia longe, voando ao nosso encontro.

Que pássaros seriam aqueles? Lera, em vários ditados mediúnicos, informes sobre a existência de aves diferentes das nossas, nas Esferas espirituais vizinhas do Plano físico, mas eram tão lindos os seres alados que se me revelavam aos olhos, que não hesitei em perguntar ao Irmão Andrade quanto à procedência deles.

2 Interpelado por mim, não ocultou o riso afável e esclareceu:

— Não são aves e, sim, crianças. Estou informado de que viriam buscar nossa irmã M…

— E designou a professora cujo corpo espiritual se caracterizava por formosas irradiações de luz.

3 Atencioso, prosseguiu dizendo:

— Algumas lhe receberam no mundo o calor da maternidade sublime.

Quase no mesmo instante, a assembleia de meninos particularizava-se. Sob a admiração de nós todos, que interrompêramos a marcha, comovidos, alcançaram-nos cantando maravilhoso hino de glorificação à tarefa santificadora da maternidade espiritual, que as educadoras humildes, muita vez abnegadas e anônimas, abraçam na Terra.

4 Os pequeninos rodearam-na felizes e um deles, que lhe fora tenro filho no mundo, enlaçou-lhe o colo e gritou:

— Mamãe! mamãe!…

Reparei que a venturosa mulher, como que tangida pela emotividade interior, tornara-se mais radiosa e mais bela, parecendo-me que trazia uma estrela incrustada no coração.

5 Tão profundos sentimentos lhe afloravam nalma, que se prosternou de joelhos, soluçante.

Graciosa pequenina de olhos brilhantes e aureolada de luz comunicou-lhe que outra escola, muito mais linda, a esperava num parque celestial.

Como não chorarmos todos, ante aquelas manifestações de ternura?

6 Despedindo-se, ditosa, ladeada pelas criancinhas que lhe eram amadas, orou com lágrimas copiosas, emocionando-nos o coração.

Em breves minutos, vimo-la tomar rumo diferente, amparada pelos amigos que a seguiam desde o princípio, e pelos pequenos ternos e trêfegos, num grupo iluminado e maravilhoso que remontou, célere, a ignota região da Pátria Infinita.


VELHOS AMIGOS


4. Nosso agrupamento prosseguia, volitando…

A luz que de vez em quando varria o céu, vagarosa e sublime, em forma de leque, parecia mais próxima.

2 Começamos a divisar encantadoras e espaçosas moradias.

De distância em distância compareciam pequenas comissões, aguardando amigos.

Abraços fraternos eram distribuídos de momento a momento. Nenhuma nova despedida, porém, chegou a assemelhar-se à daquela professora devotada e desconhecida.

3 Prosseguíamos, já em pequeno número, quando, num grupo de quatro pessoas à margem, meu nome foi pronunciado em alta voz:

— Jacob! Jacob!

Sorridente, Bezerra imprimiu nova pausa à jornada, voltou-se para mim, deu-me o braço e conduziu-me até elas.

4 A palavra não pinta a grande emoção.

Surpreendido, jubiloso, mal contendo o pranto de emotividade, desferi um grito de alegria. Eram Guillon e Cirne, Inácio Bittencourt e Sayão. n

Abraçaram-me efusivamente, e pelo olhar afetuoso e grave que me dirigiram, demonstravam saber quanto se passava em minha alma.

5 Sentia-me na posição do viajante que volta de longe, com a bolsa cheia de novidades. Embora a fraqueza a constranger-me, gastaria horas relacionando o noticiário dos companheiros que se demoravam na carne, como trabalhadores da retaguarda. Não pareciam, contudo, muito interessados em recolher-me as informações.

6 Falou Cirne, bondoso, dos obstáculos que nos incomodam ao desencarnar. Acrescentou que meu caso, entretanto, era agradável e pacífico, pela expectativa mais ou menos longa em que eu vivera os derradeiros dias de octogenário, salientando que o mesmo não lhe ocorrera, em vista do repentino ataque de angina.

7 Guillon interrompeu-nos a ligeira palestra:

— Libertemos o Jacob, — acentuou alegre, — teremos tempo para conversar.

Doía separar-me deles, quando o ensejo se me afigurava dos melhores para a troca de impressões.

— Oh! — Exclamei consternado, — quando nos veremos de novo?

8 Riu-se Guillon, em me observando o gesto de angústia, aduzindo:

— Ora, Jacob, esquece-se de que é eterno? Vá repousar.

Afastaram-se contentes, alegando ocupações imediatas. Não podiam acompanhar-me. Ver-me-iam na primeira oportunidade.

9 Bezerra, paternal, regozijava-se. Menos preocupado com o nosso grupo a dispersar-se, tantos eram os componentes já encaminhados a diferentes destinos, o dedicado supervisor manteve comigo um entendimento esclarecedor, comentando a extensão e a diversidade das tarefas que nos aguardam além-túmulo.

10 Explanava atenciosamente [sobre] o Espiritismo no Brasil, quando uma casa iluminada de graciosa configuração se nos deparou aos olhos.

Marta, radiante, indicou o jardim povoado de flores, murmurando:

— Enfim!

11 Bezerra, então, designou a entrada, abraçou-me afetuosamente, e concluiu:

— Descanse.

Intentei segui-lo, instintivamente; todavia, o estimado protetor prometeu, firme:

— Ver-nos-emos depois.


EM REPOUSO


5. O Irmão Andrade acompanhou-me, delicadamente.

Ingressei na casa acolhedora sob forte impressão de paz e ventura.

2 Difícil determinar se me achava, realmente, distante dos Círculos terrestres. O ambiente doméstico era perfeito, não obstante mais acentuada beleza nos caracteres interiores. Tapetes, móveis, adornos e iluminação eram mais belos e mais leves e, apesar de revelarem autêntico bom-gosto, não exibiam notas de luxo. n

Retratos pendiam das paredes estruturadas em substância semiluminosa.

3 Uma senhora simpática e respeitável recebeu-nos com inexcedíveis demonstrações de ternura. Nomeou-a Marta, ante minha falha de memória. Recolhi-a nos braços, num transporte de indefinível felicidade. Como não situá-la nos dias inolvidáveis da infância? Era para minha filha, tanto quanto para mim, uma segunda mãe. Chamemo-la “Mamãe Frida”, já que, por ordem superior, não estou autorizado a identificá-la.

4 Tentei a conversação longa, em perguntas compridas, mas reparei que fora do grupo em que viajara e desligado da influência vivificante de Bezerra meu cansaço se fez invencível.

Até ali, na jornada de prolongado curso, — esclareceu Marta, — estivera sustentado, em grande parte, pela cooperação magnética do conjunto dos companheiros.

5 Busquei manter-me de pé, no entanto, a dispneia voltou, angustiante.

O Irmão Andrade conduziu-me a vasta câmara que a filhinha me reservara, abriu extensa janela, através da qual pude contemplar as estrelas pálidas da manhã que se anunciava, acomodou-me num leito macio e, após aplicar-me passes reconfortadores, recomendou fraternalmente:

— Durma tranquilo.

E, sem saber como, entreguei-me ao repouso, encantado e feliz.


Irmão Jacob



[1] Ver as Notas existentes no fim deste volume.

[2] [Vide: Algumas referências ao uso de itens materiais no Mundo Invisível do Plano Espiritual, como edificações providas dos mais diversos objetos, aparelhos, veículos de transporte, etc.]


Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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