O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Voltei — Irmão Jacob


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Vida nova

(Sumário)

1. A excursão, embora de alguns passos somente, apesar de realizada com o auxílio de energias alheias, agravou-me o abatimento. Contudo, não perdera o gosto de observar, tamanhas as surpresas que se sucediam.

2 Recordando a ansiedade com que sempre aguardara na Terra as descrições do momento da morte, por parte de companheiros que me haviam antecedido, buscava fixar todas as particularidades da situação, na esperança de transmitir notícias aos irmãos da retaguarda.

3 Aquele contato inesperado com a Natureza impunha-me, porém, singular renovação. Os remanescentes das dores físicas desapareciam. A ausência de certas impressões desagradáveis ampliava-me a apatia. Achava-me intensamente aliviado, conquanto mais fraco.


REPOUSO BREVE


2. Irresistível desejo de dormir assaltou-me.

Bezerra, Andrade e Marta eram benfeitores e expressavam a vida diversa em que eu penetraria doravante. Com certeza, guardariam mil informações preciosas que eu esperava, curioso e feliz, mas, como vencer o sono a pesar-me no cérebro?

2 Extenuado, vacilante, notei que não envergava as mesmas peças que usava habitualmente no leito. Envolvia-me vasto roupão claro, de convalescente.

Tentei indagar; entretanto, a fraqueza dos órgãos vocais prosseguia sem variações. Era preciso aceitar os recursos quais se me ofereciam. Não adiantava qualquer interrogação. Indispensáveis a serenidade e a paciência.

3 Perante o mar, diferençava-se-me a posição orgânica. Aquelas bafagens de ar fresco, que eu recebia encantado, regeneravam-me as forças. Pareciam portadoras de alimento invisível. Inalando-as, permanecia singularmente sustentado, como se houvera sorvido caldo substancioso.

4 Marta, agora sentada, oferecera-me o regaço acolhedor, acariciando-me a fronte.

Notei que o Irmão Andrade comentava as virtudes do mar no reerguimento das energias do perispírito. Referia-se a casos repetidos de socorro a irmãos recém-desencarnados, conduzidos com êxito à frente das águas.

5 Desenvolvia o máximo esforço para registar-lhe as impressões, quando o benemérito amigo me dirigiu a palavra, cuidadoso, aconselhando-me o sono pacífico e restaurador.

Não deveria reagir contra o repouso, — disse-me, fraternal, — e acrescentou que não convinha sacrificar necessidades da alma à curiosidade, embora nobre. Teria tempo para observar e aprender muito e, pelo menos durante algumas horas, não poderia furtar-me ao descanso imprescindível.

6 Compreendi o alcance do conselho e obedeci. Entreguei-me sem resistência e perdi a noção de espaço e tempo no sono abençoado e reparador.


IMPRESSÕES DIFERENTES


3. Despertando, dia alto, não podia precisar o tempo curto em que repousara.

Continuava a filha ao meu lado, mas de ambos os benfeitores não havia sinal. Notificou-me Marta que se haviam ausentado, porém não tardariam. Confiaram-me a ela, enquanto me aquietara; contudo estariam junto de mim em breves minutos.

2 Sentia-me outro homem. Movimentei os braços e ergui-me sem dificuldade. Tentei falar, e que alegria experimentei! Entendi-me com a filha querida, à vontade. Explicou-me que eu não havia repousado quanto seria de desejar e que voltaria ao descanso na primeira oportunidade. 3 Indagou, em seguida, se me achava amedrontado e, como lhe demonstrasse a firmeza de ânimo que me possuía, cientificou-me de que Bezerra em breves minutos cortaria os derradeiros laços que me retinham ainda, de certa forma, aos envoltórios carnais; consultando-me, ao mesmo tempo, se me não inspiraria temor assistir, de algum modo, ao enterramento dos meus despojos.

4 Respondi-lhe com o meu interesse. Tudo o que eu pudesse aprender de novo representaria enriquecimento de observação.

Em verdade, animavam-me outras disposições. Guardava a ideia de haver rejuvenescido. Toquei meu veículo novo. Eu era o mesmo, dos pés à cabeça. Coração e pulmões funcionavam regulares.

5 Fascinava-me, porém, acima de tudo, o novo aspecto da paisagem. Casas, vegetação e o próprio oceano pareciam coroados de substância colorida. Que sugestões surpreendentes em torno! A claridade solar, em derredor, revelava maravilhosos cambiantes.

6 Informou-me Marta de que enquanto a nossa mente funciona, sob determinadas condições, vemos somente alguns aspectos do mundo; e porque eu interrogasse se todos os desencarnados se surpreendiam com as visões que me encantavam os olhos, respondeu negativamente. Muitos libertos da disciplina física, — esclareceu, — conservam tão fortes ligações com os interesses humanos que a visão não se lhes modifica de pronto, e prosseguem vendo a Terra nas mesmas expressões em que a deixaram.

7 Era prodigioso o quadro!

Senti forte impulso de prosternar-me, em sinal de reconhecimento à Majestade Divina.

Tão grande leveza caracterizava agora o meu organismo que, contemplando, enlevado, as águas próximas, nelas adivinhei pesadíssimo elemento. Pensei concomitantemente que, se eu tentasse, talvez conseguisse caminhar sobre as ondas líquidas, aureoladas, ao meu olhar, de sublime coloração.

8 Registando-me o ânimo, a querida filha mostrou-se satisfeita. Desde o primeiro momento de nosso reencontro, Marta revelava ansiedade de ver-me tranquilo e contente.


SURPREENDIDO


4. Dispúnhamo-nos a deixar o abrigo a que nos refugiáramos, quando percebi que me encontrava em trajes impróprios. Arraigado à ideia de que seria visto por amigos encarnados, não ocultei um gesto de aborrecimento.

A distância do leito, aquele roupão alvo não deixava de ser escandaloso.

2 Marta que me seguia as reflexões, sorridente, vestia-se com apurado gosto.

Ia expor-lhe os receios que me assaltavam, quando se adiantou, asseverando que as preocupações do momento me atestavam as melhoras.

— Um homem desalentado não pensa em roupa, — disse-me alegremente.

Acrescentou que Bezerra e o Irmão Andrade não se demorariam e que a solução do problema fora prevista na véspera.

3 De fato, transcorridos alguns minutos, chegaram, atenciosos. A possibilidade de endereçar-lhes a palavra encheu-me de imenso júbilo. Abracei-os reconhecidamente.

Trouxeram-me um costume cinza, muito semelhante aos que eu aí preferia no verão.

O Irmão Andrade ajudou-me a vesti-lo.

4 Mais alguns instantes e, entre os dois benfeitores que me amparavam lado a lado, oferecendo-me os braços, afastamo-nos da praia.

Enorme o movimento nas vias públicas. A mesma diferença que assinalara no mar, nas plantas e no casario, notava nas pessoas. Cada qual se revestia de halo diferente. Não me sentia, contudo, disposto a formular indagações. 5 Assombrava-me com a locomoção própria e esse problema naturalmente solucionado bastava, por enquanto, à minha capacidade de analisar. Andava, sem grande desenvoltura; todavia, a lentidão de meus passos obedecia à inexperiência e não a qualquer impedimento por parte do corpo, que reconhecia leve e ágil.

6 Aproveitaria o momento para acentuar observações nesse sentido, quando apressada senhora, sobraçando embrulho de vastas proporções, investiu indiferentemente contra nós.

Grande foi o abalo para mim. Recuei, num movimento instintivo, temendo o atrito, mas não houve tempo. A dama atravessou-nos o grupo, sem dar conta de nossa presença. n

7 Assustado, procurei o olhar dos companheiros. Todos me fitavam sorridentes.

— Este, meu caro Jacob, — falou Bezerra, bem-humorado, — é o novo Plano de matéria, que vibra em graduação diferente.

— Passou por nós, sem perturbar-nos, — exclamei.

— Por nossa vez, não a perturbamos também, — acentuou o irmão Andrade, satisfeito.

8 O incidente chocara-me. Via-me perfeitamente integrado no antigo patrimônio orgânico.

— Não estaremos num corpo de ilusão? Ousei interrogar.

Bezerra esclareceu, delicado:

— O poder da vida, na ilimitada Criação de Deus, é infinito, e a mulher que passou despercebidamente por nós, cujo veículo de carne caminha para a morte, poderia fazer a mesma pergunta.

9 A pequena ocorrência dava-me bastante material à reflexão. Gostaria de trocar comentários e propor questões diversas; todavia, o meu abatimento ainda era grande.

Deixei-me, pois, conduzir sem relutância, de imprevisto a imprevisto.


DE RETORNO A CASA


5. Grande movimentação de gente se fizera em volta do lar onde meus olhos de carne se haviam cerrado para sempre.

Natural atração me impulsionava a entrar, precipitadamente. O campo doméstico reclamava-me o espírito qual poderoso ímã. Entretanto, forças desconhecidas compeliam-me a retroceder.

2 Registando o fenômeno, aflito, fixei Bezerra, buscando esclarecimento.

O venerável amigo contemplou-me pacientemente e falou:

— Ainda agora, reparávamos que o veículo físico de uma senhora em nada nos afetou a organização, mas aqui somos defrontados por matéria de nosso Plano, envolvendo pensamentos agressivos e desfavoráveis em massa. As projeções mentais da maioria de nossos amigos, aqui congregados, formam energias contraditórias, entre si. Alguns discutem e muitos pensam de maneira inadequada, ao respeito que devemos a um companheiro em transe. 3 Para nós, adestrados na travessia de obstáculos, esta compacta emissão de forças antagônicas não constitui barreira insuperável, mas é preciso reconhecer as condições especialíssimas do seu estado. Você ainda se acha na condição do pássaro mal saído do ninho, incapaz de voar livremente.

4 Regozijei-me com a explicação; contudo, indaguei, curioso:

— E se eu insistisse?

— Teria choques sumamente desagradáveis, adiando o restabelecimento de suas forças. Toda realização útil pede exercício.

Não teimei. A simples vizinhança das conversações infundia-me pronunciado mal-estar.

5 Recomendou Bezerra ao Irmão Andrade e Marta me assistissem, enquanto cortaria o laço que, de certa forma, ainda me retinha às vísceras cadavéricas.

O regresso a casa, com as surpresas de que se fazia acompanhar, trouxe-me penosas impressões.

Esforçava-me por não cair extenuado, ali mesmo.

Retornara a dispneia. Se o leito estivesse à minha disposição, nele buscaria, sem delonga, refúgio confortante.

6 Marta ajudou-me, esclarecendo que a hora se caracterizava por muita ansiedade no coração dos entes que me consagravam sincera estima na Terra, que inúmeros pensamentos de angústia convergiam sobre mim e, por isso, eu devia resistir, garantindo a tranquilidade própria.

Considerando o que ouvia, procurei acalmar-me.

7 As forças que me colhiam em cheio, insofreáveis e impetuosas, surpreendiam-me, dolorosamente, qual se fossem corrente elétrica.

Vozes imprecisas cercavam-me os ouvidos.

Onde me encontrava? Entre amigos ou no centro de um redemoinho de energias desconhecidas, mais furiosas que as do vento forte?

8 O Irmão Andrade percebeu-me o desajustamento e sustentou-me nos braços com mais carinho e segurança.

Não ignorava que muitos amigos meus ali se encontravam; entretanto, apesar do imenso desejo de revê-los, via-me inibido de semelhante satisfação. Meus olhos se mantinham turvos e minha mente jazia atormentada.


Irmão Jacob



[1] [Poder-se-ia objetar, na observação do fenômeno, que embora não houvesse entrechoque da matéria do corpo físico da senhora encarnada com a matéria do corpo espiritual do Irmão Jacob, o mesmo não deveria suceder quanto ao seu perispírito; quando, então, poderia ter havido uma superposição e o consequente entrechoque de ambos. Relativo ao assunto, vide observação no tema Matéria.]


Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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