1 João Cota chamou o filho,
Conhecido por Joãozinho,
E passou a prepará-lo
Para as lutas do caminho.
2 Estava perto, na mesa,
Uma garrafa aprumada,
Com líquido claro e leve
Sobre toalha bordada.
3 O pai falou ao rapaz:
— “Ouça o que vou lhe dizer:
O líquido à nossa frente
É o veneno do prazer.
4 “Foi garapa açucarada
De cana que se cultiva,
Passou por transformações
E agora é uma “cousa viva”.
5 “Foi muito doce, mas hoje
É fogo na vida humana,
Tem o nome de aguardente,
Cachaça, pinga, umburana…
6 “Dizem que vem de mandraca, n
É vapor de algum feitiço,
Tomba a pessoa na rua,
Tira o homem do serviço.
7 “Creio que vem do demônio
Que anda em canaviais,
Furta a mulher do marido,
Separa o filho dos pais…”
8 O pai calou-se um momento,
Mas voltou com voz segura:
— “Prometa, meu filho, agora,
Não beber essa loucura.”
9 Joãozinho explicou-se, humilde:
— “Pai, o seu verbo é uma lei!…
Dessa praga na garrafa
Não quero, nem beberei…”
10 Houve silêncio entre os dois,
Mas o pai de mão alçada
Baixou-a, certa na pinga,
E engoliu à talagada.
11 O moço aflito, pergunta:
“Meu pai, o que vejo eu?
Esse líquido é veneno
E, acaso, o senhor bebeu?”
12 O velho desapontado
Falou, de cara amarela:
— “Sim, filho, a pinga é um veneno
Mas não sei passar sem ela.”
Jair Presente
|