O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Os mensageiros — André Luiz


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Vida social

(Sumário)

1. À noite, surpreendiam-me os sublimes aspectos do firmamento no Posto de Socorro. O luar safirino envolvia todas as coisas. O céu era qual infinita colcha de azul muito límpido, pontilhado de astros fulgurantes. As nuvens da tarde haviam desaparecido.

2 Contemplando a beleza da noite, Alfredo acentuou:

— Felizmente, os fenômenos magnéticos foram deslocados do nosso círculo. Os aparelhos, porém, continuam registrando enorme conflito de forças inferiores.

3 Ia comentar a beleza do céu, ante a observação do administrador, quando a campainha retiniu suavemente.

Chamavam à entrada. Alfredo e Ismália sorriram.

Muito gentil, o chefe do Posto asseverou:

— Temos a visita de amigos do “Campo da Paz”.

4 E, convidando-nos à recepção no baluarte avançado, acrescentou jovialmente:

— Temos, também, aqui, a nossa vida social. Como não? É preciso saber viver.

5 Encantado com essa nota alegre, acompanhei os donos da casa, verificando, com indizível surpresa, que tínhamos sob os olhos um belo carro tirado por dois soberbos cavalos brancos. Tratava-se de veículo confortável e interessante, quase idêntico aos velhos carros de serviço público, do tempo de Luís XV, que reparara, mais de uma vez, em publicações antigas. 6 Nele chegara pequena família da colônia próxima, que, pelas informações de Aniceto, demorava a três léguas do Posto, aproximadamente.

Alfredo apresentou-nos, cavalheirescamente, com exceção de nosso orientador, que era velho amigo dos recém-chegados.

7 Constituíam-se os visitantes do casal Bacelar e duas filhas jovens. O chefe do grupo mostrava idade avançada, revelando, porém, excelentes disposições. A senhora dava impressão de madureza, aparentando, contudo, maravilhosa vivacidade, assim como as duas moças.

8 A alegria era enorme. Não se observava qualquer nota de convencionalismo menos digno, como na Terra. Os gestos de cada um, a simplicidade, a despreocupação, as frases afetuosas, demonstravam sinceridade pura. Permanecíamos num quadro social inacessível ao fingimento.

9 Voltando ao interior doméstico, entre grandes manifestações de júbilo familiar, observei que os recém-chegados eram amigos de muito tempo, que vinham ao encontro de Ismália. A nobre senhora pareceu-me contentíssima. Expediu recados afetuosos para algumas famílias do Posto e, em breves minutos, o castelo recebia inúmeras pessoas que concorriam ao brilhantismo da seleta reunião.

Sentindo-me assaz insignificante, ao lado dos novos amigos, limitava-me a ouvir e observar.


2. Logo aos primeiros instantes de conversação particularizada, ouvi Aniceto perguntar ao senhor Bacelar:

— Como corre o serviço?

2 O velho bondoso respondeu num sorriso largo:

— Bem, sempre bem. Apenas não podemos fixar demasiada atenção nos companheiros encarnados.

E ajuntou com graça:

— É indispensável aprender a servir e passar.

3 Nosso instrutor sorriu igualmente e observou:

— Compreendo, compreendo. Aliás, o progresso humano não é uma questão de dias. Não tenhamos ilusões.

4 E, percebendo que Vicente e eu poderíamos aproveitar com a palestra, Aniceto indicou o novo hóspede de Alfredo, explicando solícito:

— Nosso amigo Bacelar é chefe de turmas de assistência aos nossos irmãos do Círculo carnal. Tem longa experiência dos homens e conhece-os como ninguém. Há muito que aproveitar nas suas observações.

5 — Não tanto, meus caros, — exclamou o senhor Bacelar, de bom humor, — não tanto. Sou simples companheiro de vocês, cumprindo deveres por acréscimo da misericórdia divina. Não posso fazer muito, em razão de minhas deficiências naturais.

6 — Estamos certos do grande proveito da sua palavra, — objetou Vicente, até então calado.

— Tudo o que nos disser sobre o problema de assistência constituirá, para nós, ensinamento precioso, — disse por minha vez.

7 O novo amigo fitou-nos com inteligência, e perguntou:

— Foram médicos no mundo?

— Sim. — Respondemos a um só tempo.

8 O senhor Bacelar pensou alguns momentos e acentuou:

— Sempre gostei de conversar com os amigos, recorrendo aos símbolos sugeridos pela profissão que exercem. Mas, no tocante às minhas atividades, não teria muito o que dizer a médicos militantes.

— Pelo contrário, — aduzi, — seus esclarecimentos enriquecerão nossas experiências.

9 O interlocutor sorriu, otimista, e declarou:

— Não creia. Recorde os seus doentes comuns. Muito raramente lembram a medicina preventiva. De modo quase invariável, esperam a positivação das moléstias para buscarem o recurso preciso. Necessitam de anestésicos para o socorro do bisturi. Fogem ao regímen tão logo surja a primeira melhora. Confundem o método de tratamento, apenas se registe o primeiro sinal de cura. Detestam a dor que restabelece o equilíbrio. Descontentam-se com a indicação de purgativos. Preferem a medicação de sabor agradável. E, sobretudo, quase sempre querem saber muito mais que os médicos. 10 Esta síntese aplicável a corpos doentes representa, em nosso campo de serviço, o resumo do programa de assistência aos Espíritos enfermos, encarnados na Terra, e com agravantes de vulto, porque, em nosso setor, não podemos manipular a alma, à maneira do cirurgião que opera as amídalas.  11 Somos forçados à preparação do campo mental conveniente, a proceder à semeadura de pensamentos novos, velar pela germinação, ajudar os rebentos minúsculos e aguardar a obra do tempo. 12 Nossa luta não é simples, porque, se o clínico do mundo encontra sempre familiares generosos, dispostos a cooperar com ele em benefício do doente, encontramos, por nossa vez, enormes legiões de elementos adversos à nossa atividade restauradora e curativa. 13 Em geral, o médico do mundo presta socorro a quem deseja recebê-lo, pelo menos nas ocasiões de graves perigos; nós, porém, meus amigos, muitas vezes temos de prestar assistência aos que não a desejam, por viverem sob véus de profunda ignorância.


3. — Tem razão, — murmurei, ouvindo comparações tão lógicas; — entretanto, vale por conforto a certeza de que há muitos cooperadores encarnados no mundo, prontos a colaborar na tarefa.

2 O senhor Bacelar teve uma expressão fisionômica muito significativa, e revidou:

— Nem sempre. A cooperação é outro problema. A maioria dos irmãos que se propõem ao serviço, partem daqui prometendo, mas gostam de viver descansados, no planeta. Poucos fogem ao estalão comum. 3 Raramente encontramos companheiros encarnados com bastante disposição para amar o trabalho pelo trabalho, sem ideia de recompensa. A maioria está procurando remuneração imediata. Nessas condições, não percebem que a mente lhes fica como aposento escuro, atulhado de elementos inúteis.  4 À força de viciarem raciocínios, confundem igualmente a visão. Enxergam tormentas onde há paisagens celestes, montanhas de pedra onde o caminho é gloriosa elevação. De pequenos enganos a pequenos enganos, formam o continente das grandes fantasias. 5 Daí por diante, a recapitulação das experiências terrenas inclina-os, mais fortemente, para a exigência animal e, chegados a esse ponto, raros voltam ao dever sagrado, para considerar a grandeza das divinas bênçãos.


4. Nosso interlocutor fez uma pausa e tornou:

— E o “desculpismo”? Nesse terreno de assistência espiritual, verão, um dia, quantos pretextos são inventados pelas criaturas terrestres por fugir ao testemunho da verdade divina, nas tarefas que lhes são próprias. 2 Os mordomos da responsabilidade alegam excesso de deveres, os servidores da obediência afirmam ausência de ensejo. Os que guardam possibilidades financeiras montam guarda ao patrimônio amoedado, os que receberam a bênção da pobreza de recursos monetários aconselham-se com a revolta. 3 Os moços declaram-se muito jovens para cultivar as realidades sublimes, os mais idosos afirmam-se inúteis para servi-las. Os casados reclamam quanto à família, os solteiros queixam-se da ausência dela. Dizem os doentes que não podem, comentam os sãos que não precisam. Raros companheiros encarnados conseguem viver sem a contradição.

4 O senhor Bacelar parecia disposto a prosseguir, mas as duas jovens foram buscá-lo, a ele e Aniceto, em nome de Alfredo, a fim de providenciar solução de problema íntimo que lhes dizia respeito.


André Luiz


Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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