1.
Ereto, incendido o tórax de suave luz, falou o Instrutor, comovedoramente:
2 — “Dirigimo-nos a vós, irmãos,
que tendes, por enquanto, ensejo de aprender na bendita escola carnal.
3 “Tangidos pela necessidade,
na sede de ciência ou na angústia do amor que transpõe abismos, vencestes
pesadas fronteiras vibratórias, encontrando-vos na estaca zero do caminho
diferente que se vos antolha. Enquanto vossa organização fisiológica
repousa a distância, exercitando-se para a morte, vossas almas quase
libertas partilham conosco a fraternidade e a esperança, adestrando
faculdades e sentimentos para a verdadeira vida.
4 “Naturalmente, não podereis
guardar plena recordação desta hora, em retomando o envoltório carnal,
em virtude da deficiência do cérebro, incapaz de suportar a carga de
duas vidas simultâneas; a lembrança de nosso entendimento persistirá,
contudo, no fundo de vosso ser, orientando-vos as tendências superiores
para o terreno da elevação e abrindo-vos a porta intuitiva para que
vos assista nosso pensamento fraternal.”
5 O orador fez breve pausa,
fixando-nos o olhar calmo e lúcido, e, sob a leve e incessante chuva
de raios argênteos, continuou:
6 — “Enfastiados das
repetidas sensações no Plano grosseiro da existência, intentais pisar
outros domínios. Buscais a novidade, o conforto desconhecido, a solução
de torturantes enigmas; todavia, não olvideis que a chama do próprio
coração, convertido em santuário de claridade divina, é a única lâmpada
capaz de iluminar o mistério espiritual, em nossa marcha pela senda
redentora e evolutiva. 7
Ao lado de cada homem e de cada mulher, no mundo, permanece viva a Vontade
de Deus, relativamente aos deveres que lhes cumprem. Cada qual tem à
sua frente o serviço que lhe compete, como cada dia traz consigo possibilidades
especiais de realização no bem. 8
O Universo enquadra-se na ordem absoluta. Aves livres em limitados céus,
interferimos no plano divino, criando para nós prisões e liames, libertação
e enriquecimento. Insta, pois, nos adaptemos ao equilíbrio divino, atendendo
à função insulada que nos cabe, em plena colmeia da vida.
9 “Desde quando fazemos
e desfazemos, terminamos e recomeçamos, empreendemos a viagem reparadora
e regressamos, perplexos, para o reinício? Somos, no palco da Crosta
Planetária, os mesmos atores do drama evolutivo. Cada milênio é ato
breve, cada século um cenário veloz. 10
Utilizando corpos sagrados, perdemos, entretanto, quais despreocupadas
crianças, entretidas apenas em jogos infantis, o ensejo santificante
da existência; destarte, fazemo-nos réprobos das leis soberanas, que
nos enredam aos escombros da morte, como náufragos piratas por muito
tempo indignos do retorno às lides do mar. 11
Enquanto milhões de almas desfrutam bons ensejos de emenda e reajustamento,
de novo entregues ao esforço regenerativo nas cidades terrestres, milhões
de outras deploram a própria derrota, perdidas no atro recesso da desilusão
e do padecimento.
12 “Não nos reportamos aqui
aos missionários heroicos que suportam as sangrentas feridas dos testemunhos
angustiosos, por espírito de renúncia e de amor, de solidariedade e
de sacrifício; são luzes provisoriamente apartadas da Luz Divina e que
voltam ao domicílio celeste, como o trabalhador fiel regressa ao lar,
finda a cotidiana tarefa.
13 “Referimo-nos às bastas
multidões de almas indecisas, presas da ingratidão e da dúvida, da fraqueza
e da dissipação, almas formadas à luz da razão, mas escravizadas à tirania
do instinto.”
14 E num rasgo de humildade
cristã, Eusébio continuou:
— “Falamos de todos nós, viajores que extravagamos no deserto da própria
negação; de nós, pássaros de asas partidas, que tentamos voar ao ninho
da liberdade e da paz, e que, no entanto, ainda nos debatemos no chavascal
dos prazeres de ínfima estofa. 15
Por que não represar o curso das paixões corrosivas que nos flagelam
o espírito? Por que não sofrear o ímpeto da animalidade, em que nos comprazemos,
desde os primeiros laivos de raciocínio? Sempre o terrível dualismo
da luz e das trevas, da compaixão e da perversidade, da inteligência
e do impulso bestial. 16
Estudamos a ciência da espiritualidade consoladora desde os primórdios
da razão, e, todavia, desde as épocas mais remotas, consagramo-nos ao
aviltamento e ao morticínio.
17 “Cantávamos hinos
de louvor com Krishna, aprendendo o conceito da imortalidade da alma,
à sombra das árvores augustas que aspiram aos cimos do Himalaia, e descíamos,
logo depois, ao vale do Ganges, matando e destruindo para gozar e possuir.
18 Soletrávamos o
amor universal com Sidarta Gautama, e perseguíamos os semelhantes, em
aliança com os guerreiros cingaleses e hindus. 19
Fomos herdeiros da Sabedoria, nos tempos distantes da Esfinge, e, no
entanto, da reverência aos mistérios da iniciação passávamos à hostilidade
sanguissedenta, nas margens do Nilo. 20
Acompanhando a arca simbólica dos hebreus, reiteradas vezes líamos os
mandamentos de Jeová, contidos nos rolos sagrados, e, desatentos, os
esquecíamos, ao primeiro clangor de guerra aos filisteus. 21
Chorávamos de comoção religiosa em Atenas, e assassinávamos nossos irmãos
em Esparta. Admirávamos Pitágoras, o filósofo, e seguíamos Alexandre,
o conquistador. 22
Em Roma, conduzíamos oferendas valiosas aos deuses, nos maravilhosos
santuários, exaltando a virtude, para desembainhar as armas, minutos
depois, no átrio dos templos, disseminando a morte e entronizando o
crime; escrevíamos formosas sentenças de respeito à vida, com Marco
Aurélio, e ordenávamos a matança de pessoas limpas de culpa e úteis
à sociedade. 23 Com
Jesus, o Divino Crucificado, nossa atitude não tem sido diferente. Sobre
os despojos dos mártires, imolados nos circos, vertemos rios de sangue
em vindita cruel, armando fogueiras do sectarismo religioso. 24
Suportamos administradores arbitrários e ignominiosos, de Nero a Diocleciano,
porque tínhamos fome de poder, e quando Constantino nos abriu as portas
da dominação política, convertemo-nos de servos aparentemente fiéis
ao Evangelho em criminosos árbitros do mundo. 25
Pouco a pouco esquecemos os cegos de Jericó, os paralíticos de Jerusalém,
as crianças do Tiberíades, os pescadores de Cafarnaum, para afagar as
testas coroadas dos triunfadores, embora soubéssemos que os vencedores
da Terra não podem fugir à peregrinação ao sepulcro. 26
Tornou-se a ideia do Reino de Deus fantasia de ingênuos, pois não largávamos
o lado direito dos príncipes, sequiosos de fastígio mundano. Ainda hoje,
decorridos quase vinte séculos sobre a cruz do Salvador, benzemos baionetas
e canhões, metralhadoras e tanques de assalto, em nome do Pai Magnânimo,
que faz refulgir o sol da misericórdia sobre os justos e sobre os injustos.
27 “É por esta razão que nossos
celeiros de luz permanecem vazios. O vendaval das paixões fulminantes
de homens e de povos passa ululante, de um a outro pólo, a semear maus
presságios.
28 “Até quando seremos gênios
demolidores e perversos? Ao invés de servos leais do Senhor da Vida,
temos sido soldados dos exércitos da ilusão, deixando à retaguarda milhões
de túmulos, abertos sob aluviões de cinza e fumo. Debalde exortou-nos
o Cristo a buscar as manifestações do Pai em nosso próprio íntimo. Cevamos
e expandimos unicamente o egoísmo e a ambição, a vaidade e a fantasia
na Crosta Planetária. Contraímos pesados débitos e escravizamo-nos aos
tristes resultados de nossas obras, deixando-nos ficar, indefinidamente,
na messe dos espinhos.
29 “Foi assim que atingimos
a época moderna, em que a loucura se generaliza e a harmonia mental
do homem está a pique de soçobro. De cérebro evolvido e coração imaturo,
requintamo-nos, presentemente, na arte de esfacelar o progresso espiritual.”
30 O excelso orientador fez
à oração mais longo intervalo, durante o qual observei companheiros
em torno. Homens e mulheres, segurando alguns fortemente as mãos uns
dos outros, exibiam extrema palidez no semblante estarrecido. Alguns
deles, por certo, compareciam ali pela primeira vez, como eu, dado o
extático assombro que se lhes estampava no rosto.
31 Fixando na assembleia o
olhar percuciente, o Instrutor prosseguiu:
— “Nos séculos pretéritos, as cidades florescentes do mundo desapareciam
pelo massacre, ao gládio dos conquistadores sem entranhas, ou estacionavam
sob a onda mortífera da peste desconhecida e não atacada. 32
Hoje, as coletividades humanas ainda sofrem o assédio da espada homicida,
e chuvas de bombas arremetem contra populações indefesas; no entanto,
a febre amarela, a cólera e a varíola foram dominadas; a lepra, a tuberculose
e o câncer experimentam combate sem tréguas. 33
Existe, porém, nova ameaça ao domicílio terrestre: o profundo desequilíbrio,
a desarmonia generalizada, as moléstias da alma que se ingerem, sutis,
solapando-vos a estabilidade.
34 “Vossos caminhos
não parecem percorridos por seres conscientes, mas semelham-se a estranhas
veredas, ao longo das quais tripudiam duendes alucinados. Como fruto
de eras sombrias, caracterizadas pela opressão e maldade recíprocas,
em que temos vivido, odiando-nos uns aos outros, vemos a Terra convertida
em campo de quase intérminas hostilidades. 35
Homens e nações perseguem o mito do ouro fácil; criaturas sensíveis
abandonam-se aos distúrbios das paixões; cérebros vigorosos perdem a
visão interior, enceguecidos pelos enganos da personalidade e do autoritarismo.
36 Empenhados em
disputas intermináveis, em duelos formidandos de opinião, conduzidos
por desvairadas ambições inferiores, os filhos da Terra abeiram-se de
novo abismo, que o olhar conturbado não lhes deixa perceber. Esse hiante
vórtice, meus irmãos, é o da alienação mental, que não nos desintegra
só os patrimônios celulares da vida física, senão também nos atinge
o tecido sutil da alma, invadindo-nos o cerne do corpo perispiritual.
37 Quase todos os quadros
da civilização moderna se acham comprometidos na estrutura fundamental.
Precisamos, pois, mobilizar todas as forças ao nosso alcance, a serviço
da causa humana, que é a nossa própria causa.
38 “O trabalho salvacionista
não é exclusividade da religião: constitui ministério comum a todos,
porque dia virá em que o homem há de reconhecer a Divina Presença em
toda a parte. A realização que nos compete não se filia ao particularismo:
é obra genérica para a coletividade, esforço do servidor honesto e sincero,
interessado no bem de todos.
39 “Se visitais
a nossa companhia buscando orientação para o trabalho sublime do espírito,
não vos esqueça vossa luz própria. Não conteis com archotes alheios
para a jornada. Em míseros Planos de sofrimento regenerador, nas vizinhanças
da carne, choram amargamente milhões de homens e de mulheres que abusaram
do concurso dos bons, precipitando-se nas trevas ao perder no túmulo
os olhos efêmeros com que apreciavam a paisagem da vida à luz do Sol.
40 Displicentes e recalcitrantes,
esquivaram-se a todas as oportunidades de acender a própria lâmpada.
Aborreciam os atritos da luta, elegeram o gozo corporal como objetivo
supremo de seus propósitos na Terra; e, quando a morte lhes cerrou as
pálpebras saciadas, passaram a conhecer uma noite mais longa e mais
densa, referta de angústias e de pavores.”
2.
Nesse momento, Eusébio interrompeu-se por mais de um minuto, como a
recordar cenas comovedoras que as imagens de seu verbo evocavam, demonstrando
certa vaguidade no olhar.
2 Notei a ansiedade
com que a assembleia aguardava o retorno de sua palavra. Damas sensibilizadas
ressumbravam forte impressão nas fisionomias transfiguradas, e todos
nós, ante a exposição leal e comovente, nos mantínhamos quedos e aturdidos.
3 Decorridos longos segundos,
o orador prosseguiu com inflexão enérgica e patriarcal:
— “Procurais conosco a precisa orientação para os trabalhos que vos tangem presentemente na Crosta da Terra. Seduzidos pela claridade da Esfera Superior, fascinados pelas primeiras noções do amor universal, desejais a graça da cooperação na sementeira do porvir. Reclamais asas para os surtos sublimes, tendes em mira coadjuvar no esforço de elevação.
4 “Indubitavelmente, a intenção
não pode ser mais nobre; é, entretanto, indispensável considereis a
vossa necessidade de integração no dever de cada dia. Impossível é progredir
no século, sem atender às obrigações da hora. Torna-se imprescindível,
na atualidade, recompor as energias, reajustar as aspirações e santificar
os desejos.
5 “Não basta crer
na imortalidade da alma. Inadiável é a iluminação de nós mesmos, a fim
de que sejamos claridade sublime. Não basta, para o arrojado cometimento
da redenção, o simples reconhecimento da sobrevivência da alma e do
intercâmbio entre os dois mundos. Os levianos e os maus, os ignorantes
e os estultos, podem corresponder-se igualmente a distância, de país
a país. 6 Antes de
mais nada importa elevar o coração, romper as muralhas que nos encerram
na sombra, esquecer as ilusões da posse, dilacerar os véus espessos
da vaidade, abster-se do letal licor do personalismo aviltante, para
que os clarões do monte refuljam no fundo dos vales, a fim de que o
sol eterno de Deus dissipe as transitórias trevas humanas.
7 “Vanguardeiros da fé viva,
que o desejais ser doravante no mundo, não obstante os percalços que
se nos defrontam, exige-se de vós a cabal demonstração de estardes certos
da espiritualidade divina.
8 “O Plano Superior
não se interessa pela incorporação de devotos famintos de um paraíso
beatífico. Admitiríeis, porventura, vossa permanência na Crosta Planetária,
sem finalidades específicas? Se a erva tenra deve produzir consoante
objetivos superiores, que dizer da magnífica inteligência do homem encarnado?
Que não há que esperar da razão iluminada pela fé! Receberíamos tão
sagrados depósitos de conhecimento edificante para um sacrifício por
nada? Teríamos o aljôfar de tais bênçãos para fortalecer o propósito
egoístico de alcançar o Céu sem escalas preparatórias, sem atividades
purificadoras?
9 “Nossa meta, meus
amigos, não se compadece com o exclusivismo ególatra. A Porta Divina
não se abre a Espíritos que se não divinizaram pelo trabalho incessante
de cooperação com o Pai Altíssimo. E o solo do Planeta, a que vos prendeis
provisoriamente, representa o abençoado círculo de colaboração que o
Senhor vos confia. Recolhei o orvalho celeste no escrínio do coração
sedento de paz; contemplai as estrelas que nos acenam de longe, como
sublimes ápices da Divindade; todavia, não olvideis o campo de lutas
presentes.
10 “O espiritualismo, nos tempos
modernos, não pode restringir Deus entre as paredes de um templo da
Terra, porque a nossa missão essencial é a de converter toda a Terra
no templo augusto de Deus.
11 “Para a nossa
vanguarda de obreiros decididos e valorosos passou a fase de experimentação
fútil, de investigações desordenadas, de raciocínios periféricos. Vivemos
a estruturação de sentimentos novos, argamassando as colunas do mundo
vindouro, com a luz acesa em nosso campo íntimo. 12
Natural é que os aprendizes recém-chegados experimentem, examinem, operem
sondagens e evoquem teorias brilhantes, em que as hipóteses concorram
ao lado da exibição personalista: compreensível e razoável. Toda escola
caracteriza-se pelos diversos cursos, que lhe formam os quadros e as
disciplinas. 13 Não
nos dirigimos aqui, porém, aos que ainda sonham na clausura do “eu”,
enredados nos mil obstáculos da fantasia que lhes cristaliza as impressões.
Falamos a vós outros, que sentis a sede de universalismo, anônimos companheiros
da humanidade que se esforça por emergir das trevas para a luz. Como
aceitardes a estagnação como princípio e a felicidade exclusivista como
fim?
14 “Alimentemos a esperança
renovadora. Não invoqueis Jesus para justificar anseios de repouso indébito.
Ele não atingiu as culminâncias da Ressurreição sem subir ao Calvário,
e as suas lições referem-se à fé que transporta montanhas.
15 “Não reclamemos, pois, ingresso
em mundos felizes, antes de melhorar o nosso próprio mundo. Esquecei
o velho erro de que a morte do corpo constitui milagrosa imersão da
alma no rio do encantamento. Rendamos culto à vida permanente, à justiça
perfeita, e adaptemo-nos à Lei que nos apreciará o mérito sempre de
conformidade com as nossas próprias obras.
16 “Nosso ministério é de iluminação
e de eternidade.
“O Governo Universal não nos circunscreveu as atividades à guarda de altares
perecíveis. Não fomos convocados a velar no círculo particular duma
interpretação exclusivista, senão a cooperar na libertação do Espírito
encarnado, abrindo horizontes mais claros à razão humana, refazendo
o edifício da fé redentora que as religiões literalistas esqueceram.
17 “Sopros imensos
da onda evolucionista varrem os ambientes da Terra. Todos os dias ruem
princípios convencionais, mantidos a título de invioláveis durante séculos.
A mente humana, perplexa, é compelida a transições angustiosas. A subversão
de valores, a experiência social, o processo acelerado de seleção pelo
sofrimento coletivo perturbam os tímidos e os invigilantes, que representam
esmagadora maioria em toda parte… 18
Como atender a esses milhões de necessitados espirituais, se não receberdes
a responsabilidade do socorro fraterno? Como sanar a loucura incipiente,
se não vos transformardes em ímãs que mantenham o equilíbrio? Sabemos
que a harmonia interior não é artigo de oferta e procura nos mercados
terrestres, mas aquisição espiritual só acessível no templo do Espírito.
19 “Faz-se, pois, mister acendamos
o coração em amor fraternal, à frente do serviço. Não bastará, em nossas
realizações, a crença que espera; indispensável é o amor que confia
e atende, transforma e eleva, como vaso legítimo da Sabedoria Divina.
20 “Sejamos instrumentos do
bem, acima de espectantes da graça. A tarefa demanda coragem e suprema
devoção a Deus. Sem que nos convertamos em luz, no círculo em que estivermos,
em vão acometeremos a sombra, aos nossos próprios pés. E, no prosseguimento
da ação que nos compete, não nos esqueçamos de que a evangelização das
relações entre as Esferas visíveis e invisíveis é dever tão natural
e tão inadiável da tarefa quanto a evangelização das pessoas.
21 “Não busqueis o maravilhoso:
a sede do milagre pode viciar-vos e perder-vos.
22 “Vinculai-vos, pela oração
e pelo trabalho construtivo, aos Planos superiores, e estes vos proporcionarão
contato com os Armazéns Divinos, que suprem a cada um de nós segundo
a justa necessidade.
23 “As ordenações que
vos ajoujam na paisagem terrena, por mais ásperas ou desagradáveis,
representam a Vontade Suprema.
24 “Não galgueis os obstáculos,
nem tenteis contorná-los pela fuga deliberada: vencei-os, utilizando
a vontade e a perseverança, ensejando crescimento aos vossos próprios
valores.
25 “Cuidai em não transitar
sem a devida prudência nos caminhos da carne, em que, muita vez, imitais
a mariposa estouvada. Atendei as exigências de cada dia, rejubilando-vos
por satisfazer as tarefas mínimas.
26 “Não intenteis o voo sem
haver aprendido a marcha.
27 “Sobretudo, não indagueis
de direitos prováveis que vos caberiam no banquete divino, antes de
liquidar os compromissos humanos.
28 “Impossível é o título de
anjos, sem serdes, antes, criaturas ponderadas.
29 “Soberanas e indefectíveis
leis nos presidem aos destinos. Somos conhecidos e examinados em toda
parte.
30 “As facilidades
concedidas aos Espíritos santificados, que admiramos, são prodigalizadas
a nós, por Deus, em todos os lugares. O aproveitamento, porém, é obra
nossa. 31 As máquinas
terrestres podem alçar-vos o corpo físico a consideráveis alturas, mas
o voo espiritual, com que vos libertareis da animalidade, jamais o desferireis
sem asas próprias.
32 “A consolação e a amizade
de benfeitores encarnados e desencarnados enriquecer-vos-ão de conforto,
quais suaves e abençoadas flores da alma; entretanto, fenecerão como
as rosas de um dia, se não fertilizardes o coração com a fé e o entendimento,
com a esperança inquebrantável e o amor imortal, sublimes adubos que
lhes propiciem o desenvolvimento no terreno do vosso esforço sem tréguas.
33 “Não cobiceis o repouso
das mãos e dos pés; antes de abrigar semelhante propósito, procurai
a paz interior na suprema tranquilidade da consciência.
34 “Abandonai a ilusão, antes
que a ilusão vos abandone.
35 “Empolgando a chefia da
própria existência, deixai plantado o bem na esteira de vossos passos.
36 “Somente os servos que trabalham
gravam no tempo os marcos da evolução; só os que se banham no suor da
responsabilidade conseguem cunhar novas formas de vida e de ideal renovador.
Os demais, chamem-se monarcas ou príncipes, ministros ou legisladores,
sacerdotes ou generais, entregues à ociosidade, classificam-se na ordem
dos sugadores da Terra; não chegam a assinalar sua permanência provisória
na Crosta do Planeta; adejam como insetos multicores, tornando à poeira
de que se alçaram por alguns minutos.
37 “Regressando, pois, ao corpo
de carne, valei-vos da luz para as edificações necessárias.
“Participemos do glorioso Espírito do Cristo.
“Convertamo-nos em claridade redentora.
38 “O desequilíbrio generalizado
e crescente invade os departamentos da mente humana. Combatem-se, desesperadamente,
as nações e as ideologias, os sistemas e os princípios. Estabelecida
a trégua nas lutas internacionais, surgem deploráveis guerras civis,
armando irmãos contra irmãos. A indisciplina fomenta greves, a ânsia
de libertação perturba o domicílio dos povos. Guerreiam-se as esferas
de ação entre si; encarnados e desencarnados de tendências inferiores
colidem ferozmente, aos milhões. Inúmeros lares transformam-se em ambientes
de inconformação e desarmonia. Duela o homem consigo mesmo no atual
processo acelerado de transição.
39 “Equilibrai-vos, pois, na
edificação necessária, convictos de que é impossível confundir a Lei
ou trair-lhe os ditames universais!”
3.
Perorando, Eusébio proferiu bela e sentida prece, invocando as bênçãos
divinas para a assembleia. Sublimes manifestações de luz fizeram-se,
então, sentir sobre nós.
2 Encerrados os trabalhos,
os companheiros ainda presos ao Círculo carnal começaram a retirar-se
em respeitoso silêncio.
3 Calderaro conduziu-me à
presença do Instrutor e apresentou-me. O alto dirigente recebeu-me com
afabilidade e doçura, cumulando-me de palavras de incentivo. Precisávamos
servir, explicou ele, encarecendo as necessidades de assistência espiritual
amontoadas em toda a parte, reclamando cooperadores abnegados e fiéis.
4 Quando Calderaro se referiu
aos meus projetos, mostrou-me Eusébio paternal sorriso e, expondo-nos
providências diversas a tomar, recomendou nos puséssemos em contato
com o grupo socorrista a que o Assistente emprestava ativa colaboração.
5 Logo após, ao retirar-se,
ladeado pelos assessores que lhe compunham a comitiva, o nobre mentor
confortou-me, bondoso:
— Sê feliz!
6 Dirigindo a Calderaro expressivo
olhar, acrescentou:
— Dado ensejo, conduze-o ao serviço de assistência às cavernas.
Tomado de curiosidade, agradeci sensibilizado e dispus-me a esperar.
André Luiz