O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Nosso Lar — André Luiz


16

Confidências

(Sumário)

1. Consolou-me a palavra maternal, reorganizando-me as energias interiores. Minha mãe comentava o serviço como se fora uma bênção, referia-se às dores e dificuldades, levando-as a crédito de alegrias e lições sublimes. 2 Inesperado e inexprimível contentamento banhava-me o espírito. Aqueles conceitos alimentavam-me de estranho modo. Sentia-me outro, mais alegre, animado e feliz.

— Oh! Minha mãe! — Exclamei comovido, — deve ser maravilhosa a Esfera da sua habitação! Que sublimes contemplações espirituais, que ventura!…

3 Ela esboçou um sorriso significativo e obtemperou:

— A Esfera Elevada, meu filho, requer, sempre, mais trabalho, maior abnegação. Não suponhas que tua mãe permaneça em visões beatíficas, a distância dos deveres justos. Devo fazer-te sentir, no entanto, que minhas palavras não representam qualquer nota de tristeza, na situação em que me encontro. É antes revelação de responsabilidade necessária. 4 Desde que voltei da Terra, tenho trabalhado intensamente pela nossa renovação espiritual. Muitas entidades, desencarnando, permanecem agarradas ao lar terrestre, a pretexto de muito amarem os que demoram no mundo carnal. Ensinaram-me aqui, todavia, que o verdadeiro amor, para transbordar em benefícios, precisa trabalhar sempre. Desde minha vinda, então, procuro esforçar-me por conquistar o direito de ajudar aqueles que tanto amamos.


2. — E meu pai? — Perguntei. — Onde está? Por que não veio com a senhora?

Minha mãe estampou singular expressão no rosto e respondeu:

— Ah! Teu pai! Teu pai!… Há doze anos que está numa zona de trevas compactas, no Umbral. 2 Na Terra, sempre nos parecera fiel às tradições da família, arraigado ao cavalheirismo do alto comércio, a cujos quadros pertenceu até o fim da existência, e ao fervor do culto externo, em matéria religiosa; mas, no fundo, era fraco e mantinha ligações clandestinas, fora do nosso lar. 3 Duas delas estavam mentalmente ligadas a vasta rede de entidades maléficas, e, tão logo desencarnou o meu pobre Laerte, a passagem no Umbral lhe foi muito amarga, porque as desventuradas criaturas, a quem fizera muitas promessas, aguardavam-no ansiosas, prendendo-o de novo nas teias da ilusão. 4 A princípio, ele quis reagir, esforçando-se por encontrar-me, mas não pôde compreender que após a morte do corpo físico a alma se encontra tal qual vive intrinsecamente. 5 Laerte, portanto, não percebeu minha presença espiritual, nem a assistência desvelada de outros amigos nossos. Tendo gasto muitos anos a fingir, viciara a visão espiritual, restringira o padrão vibratório, e o resultado foi achar-se tão só na companhia das relações que cultivara, irrefletidamente, pela mente e pelo coração. 6 Os princípios de família, o amor ao nosso nome, ocuparam algum tempo o seu espírito. De algum modo, lutou, repelindo as tentações; mas caiu afinal, novamente enredado na sombra, por falta de perseverança no bom e reto pensamento.

7 Eminentemente impressionado, objetei:

— Não há, porém, meios de subtraí-lo a tais abjeções?

— Ah! Meu filho, — elucidou a palavra materna, — eu o visito frequentemente. Ele, porém, não me percebe. Seu potencial vibratório é ainda muito baixo. Tento atraí-lo ao bom caminho, pela inspiração, mas apenas consigo arrancar-lhe algumas lágrimas de arrependimento, de quando em quando, sem obter resoluções sérias. 8 As infelizes, das quais se tornou prisioneiro, segregam-no às minhas sugestões. Venho trabalhando intensamente, anos a fio. Solicitei o amparo de amigos em cinco núcleos diversos, de atividade espiritual mais elevada, inclusive aqui em “Nosso Lar”. 9 Certa vez, Clarêncio quase conseguiu atraí-lo ao Ministério da Regeneração, mas debalde. Não é possível acender luz em candeia sem óleo e sem pavio… Precisamos [da] adesão mental de Laerte, para conseguir levantá-lo e abrir-lhe a visão espiritual. No entanto, o pobrezinho permanece inativo em si mesmo, entre a indiferença e a revolta.

10 Depois de longa pausa, suspirou, continuando:

— Talvez não saibas ainda que tuas irmãs Clara e Priscila vivem hoje igualmente no Umbral, agarradas à crosta da Terra. Sou compelida a atender às necessidades de todos. 11 Meu único auxílio direto repousava na cooperação afetuosa de tua irmã Luísa, aquela que partiu quando eras pequenino. Luísa esperou-me aqui muitos anos, foi meu braço forte nos trabalhos ásperos de amparo à família terrena. 12 Ultimamente, contudo, depois de lutar corajosa, a meu lado, a benefício de teu pai, de ti e das irmãs, tão grande é a perturbação dos nossos familiares, ainda na Terra, que voltou a semana passada, a fim de reencarnar entre eles, num gesto heroico de sublime renúncia. Espero, pois, que te restabeleças breve, para que possamos desdobrar atividades no bem.

13 Assombravam-me as informações referentes a meu pai. Que espécie de lutas seriam as dele? Não parecia sincero praticante dos preceitos religiosos, não comungava todos os domingos? Enlevado com a dedicação maternal, perguntei:

14 — A senhora, entretanto, auxilia o papai, não obstante a ligação dele com essas mulheres infames?

— Não [as] classifiques assim, — ponderou minha mãe, — dize, antes, meu filho, nossas irmãs doentes, ignorantes ou infelizes. São filhas de nosso Pai, igualmente. Não tenho feito intercessões apenas por Laerte, mas por elas também, e estou convencida de haver encontrado recursos para atraí-los todos ao meu coração.


3. Espantou-me a grande manifestação de renúncia. Pensei subitamente em minha família direta. Senti o velho apego à esposa e aos filhos queridos. Perante Clarêncio e Lísias, deliberava sempre recalcar sentimentos e calar indagações; mas o olhar materno encorajava-me. Alguma cousa fazia-me sentir que minha mãe não se demoraria muito tempo a meu lado. Aproveitando o minuto que corria célere, interroguei:

2 — A senhora, que tem acompanhado o papai devotadamente, nada poderá informar relativamente a Zélia e às crianças? Aguardo, ansioso, o instante de voltar a casa, a fim de auxiliá-los. Oh! Minhas imensas saudades devem ser igualmente compartilhadas por eles! Como deve sofrer minha desventurada esposa com esta separação!…

3 Minha mãe esboçou um sorriso triste e acrescentou:

— Tenho visitado meus netos periodicamente. Vão bem.

E, depois de meditar alguns instantes, acentuou:

— Não deves, porém, inquietar-te com o problema de auxílio à família. Prepara-te, em primeiro lugar, para que sejamos bem sucedidos; há questões que precisamos entregar ao Senhor, em pensamento, antes de trabalhar na solução que elas requerem.

4 Quis insistir no assunto para colher pormenores, mas minha mãe não reincidiu nele, esquivando-se, generosa. A palestra estendeu-se ainda longa, envolvendo-me em sublime conforto. Mais tarde, ela despediu-se. Curioso por saber como vivia até ali, pedi permissão para acompanhá-la. Afagou-me então, carinhosa, e disse:


4. — Não venhas, meu filho. Esperam-me com urgência no Ministério da Comunicação, onde serei munida de recursos fluídicos para a jornada de regresso, nos gabinetes transformatórios. Além disso, preciso ainda avistar-me com o Ministro Célio, para agradecer a oportunidade desta visita.

E, deixando-me nalma duradoura impressão de felicidade, beijou-me e partiu.


André Luiz


Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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