O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Nosso Lar — André Luiz


13

No gabinete do Ministro

(Sumário)

1. Com as melhoras crescentes, surgia a necessidade de movimentação e trabalho. Decorrido tanto tempo, esgotados anos difíceis de luta, volvia-me o interesse pelos afazeres que enchem o dia útil de todo homem normal, no mundo. 2 Incontestável que havia perdido excelentes oportunidades na Terra; que muitas falhas me assinalavam o caminho. Agora, porém, recordava os quinze anos de clínica, sentindo um certo “vazio” no coração. 3 Identificava-me a mim mesmo, como vigoroso agricultor em pleno campo, de mãos atadas e impossibilitado de atacar o trabalho. Cercado de enfermos, não podia aproximar-me, como noutros tempos, reunindo em mim o amigo, o médico e o pesquisador. 4 Ouvindo gemidos incessantes nos apartamentos contíguos, não me era lícita nem mesmo a função de enfermeiro e colaborador nos casos de socorro urgente. Claro que não me faltava desejo. Minha posição ali, contudo, era assaz humilde para me atrever. 5 Os médicos espirituais eram detentores de técnica diferente. No planeta, sabia que meu direito de intervir começava nos livros conhecidos e nos títulos conquistados; mas, naquele ambiente novo, a medicina começava no coração, exteriorizando-se em amor e cuidado fraternal. 6 Qualquer enfermeiro, dos mais simples, em “Nosso Lar”, tinha conhecimentos e possibilidades muito superiores à minha ciência. Inexequível, portanto, qualquer tentativa de trabalho espontâneo, por constituir, a meu ver, invasão de seara alheia.

7 No apuro de tais dificuldades, Lísias era o amigo indicado às minhas confidências de irmão.

Interpelado, esclareceu:

— Por que não pedir o socorro de Clarêncio? Atendê-lo-á por certo. Peça-lhe conselhos. Ele pergunta sempre por sua pessoa e tudo fará a seu favor.


2. Animou-me grande esperança. Consultaria o Ministro do Auxílio.

Iniciando, contudo, as providências, fui informado de que o generoso benfeitor somente poderia atender na manhã seguinte, no gabinete particular.

Esperei ansioso o momento oportuno.

2 No dia imediato, muito cedo, procurei o local indicado. Qual não foi, porém, minha surpresa vendo que três pessoas lá estavam aguardando Clarêncio, em identidade de circunstâncias!

O delicado Ministro do Auxílio chegara muito antes de nós e atendia a assuntos mais importantes que a recepção de visitas e solicitações.

3 Terminado o serviço urgente, começou a chamar-nos, dois a dois. Impressionou-me tal processo de audiência. Soube, porém, mais tarde, que ele aproveitava esse método para que os pareceres fornecidos a qualquer interessado servissem igualmente a outros, assim atendendo a necessidades de ordem geral, ganhando tempo e proveito.


3. Decorridos muitos minutos, chegou-me a vez. Penetrei no gabinete em companhia de uma senhora idosa, que seria ouvida em primeiro lugar, por ordem de precedência. O Ministro recebeu-nos, cordial, deixando-nos à vontade para discorrer.

2 — Nobre Clarêncio, — começou a companheira desconhecida, — venho pedir seus bons ofícios a favor de meus dois filhos. Ah! Já não tolero tantas saudades e estou informada de que ambos vivem exaustos e sobrecarregados de infortúnios, no ambiente terrestre. Reconheço que os desígnios do Pai são justos e amorosos; no entanto, sou mãe! Não consigo subtrair-me ao peso da angústia!…

2 E a pobre criatura se desfez, ali mesmo, em copioso pranto. O Ministro, dirigindo-lhe um olhar de fraternidade, embora conservando intacta a energia pessoal, respondeu, bondoso:

— Mas, se a irmã reconhece que os desígnios do Pai são justos e santos, que me cabe fazer?

3 — Desejava, — replicou, aflita, — que me concedesse recursos para protegê-los eu mesma, nas Esferas do globo!…

— Ah! Minha amiga, — disse o benfeitor amorável, — só no espírito de humildade e de trabalho é possível a nós outros proteger alguém. 4 Que me diz de um pai terrestre que desejasse ajudar os filhinhos, mantendo-se em absoluta quietação no conforto do lar? O Pai criou o serviço e a cooperação como leis que ninguém pode trair sem prejuízo próprio. Nada lhe diz a consciência, neste sentido? Quantos bônus-hora n poderá apresentar em benefício de sua pretensão?

5 A interpelada respondeu, hesitante:

— Trezentos e quatro.

— É de lamentar, — elucidou Clarêncio, sorrindo, — pois aqui se hospeda, há mais de seis anos, e apenas deu à colônia, até hoje, trezentos e quatro horas de trabalho. Entretanto, logo que se restabeleceu das lutas sofridas em região inferior, ofereci-lhe atividade louvável na Turma de Vigilância, do Ministério da Comunicação…

6 — Mas aquilo por lá era serviço intolerável, — atalhou a interlocutora, — uma luta incessante contra entidades malfazejas. Era natural que não me adaptasse.

7 Clarêncio continuou, imperturbável:

— Coloquei-a, depois, entre os Irmãos da Suportação, nas tarefas regeneradoras.

— Pior! — Exclamou a senhora, — aqueles apartamentos andam repletos de pessoas imundas. Palavrões, indecências, miséria…

8 — Reconhecendo suas dificuldades, — esclareceu o Ministro, — enviei-a a cooperar na Enfermagem dos Perturbados.

— Mas quem os tolerará, senão os santos? — Inquiriu a pedinte rebelde, — fiz o possível; entretanto, aquela multidão de almas desviadas assombra a qualquer!

9 — Não ficaram aí meus esforços, — replicou o benfeitor sem se perturbar, — localizei-a nos Gabinetes de Investigações e Pesquisas do Ministério do Esclarecimento e, contudo, talvez enfadada com as minhas providências, a irmã recolheu-se, deliberadamente, aos Campos de Repouso.

— Era, também, impossível continuar ali, — disse a impertinente, — só encontrei experiências exaustivas, fluidos estranhos, chefes ásperos.

10 — Pois note, minha amiga, — esclareceu o devotado e seguro orientador, — o trabalho e a humildade são as duas margens do caminho do auxílio. Para ajudarmos alguém, precisamos de irmãos que se façam cooperadores, amigos, protetores e servos nossos. 11 Antes de amparar os que amamos, é indispensável estabelecer correntes de simpatia. Sem a cooperação é impossível atender com eficiência. 12 O camponês que cultiva a terra alcança a gratidão dos que saboreiam os frutos. 13 O operário que entende os chefes exigentes, executando-lhes as determinações, representa o sustentáculo do lar, em que o Senhor o colocou. 14 O servidor que obedece, construindo, conquista os superiores, companheiros e interessados no serviço. 15 E nenhum administrador intermediário poderá ser útil aos que ama, se não souber servir e obedecer nobremente. 16 Fira-se o coração, experimente-se a dificuldade, mas, que saiba cada qual que o serviço útil pertence, acima de tudo, ao Doador Universal.

17 Depois de pequena pausa, continuou:

— Que fará, pois, na Terra se não aprendeu ainda a suportar coisa alguma? Não duvido da sua dedicação aos filhos queridos, mas importa notar que haveria de comparecer por lá, como mãe paralítica, incapaz de prestar socorro justo. 18 Para que qualquer de nós alcance a alegria de auxiliar os amados, faz-se necessária a interferência de muitos a quem tenhamos ajudado, por nossa vez. 19 Os que não cooperam não recebem cooperação. Isso é da lei eterna. 20 E se minha irmã nada acumulou de seu para dar, é justo que procure a contribuição amorosa dos outros. Mas, como receber a colaboração imprescindível, se ainda não semeou, nem mesmo a simples simpatia? Volte aos Campos de Repouso, onde se abrigou ultimamente, e reflita. Examinaremos depois o assunto com a devida atenção.

21 Sentou-se a mãe inquieta, enxugando lágrimas copiosas.

Em seguida, o Ministro fitou-me compassivamente e falou:

— Aproxime-se, meu amigo!

Levantei-me, hesitante, para conversar.


André Luiz



[1] Ponto relativo a cada hora de serviço. — NOTA DO AUTOR ESPIRITUAL.


Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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