1.
Em virtude do meu interesse, no estudo dos fenômenos de
materialização, não hesitei em solicitar o prestigioso concurso de Alexandre,
que se colocou gentilmente ao lado de meus desejos.
— Nosso grupo, — informou, atencioso, — não realiza trabalhos dessa
espécie, mas não teremos dificuldade em recorrer a outros amigos. Temos
companheiros devotados cooperando em núcleos de atividades dessa natureza.
2 E porque revelasse minha
profunda curiosidade científica, o orientador prosseguiu:
— Trata-se de serviço com elevada responsabilidade, porquanto, além
de exigir todas as possibilidades do aparelho mediúnico, há que movimentar
todos os elementos de colaboração dos companheiros encarnados, presentes
às reuniões destinadas a esses fins. 3
Se houvesse perfeita compreensão geral, respeito aos dons da vida, e
se pudéssemos contar com valores morais espontâneos e legitimamente
consolidados no espírito coletivo, essas manifestações seriam as mais
naturais possíveis, sem qualquer prejuízo para o médium e assistentes.
4 Acontece, porém,
que são muito raros os companheiros encarnados dispostos às condições
espirituais que semelhantes trabalhos exigem. Por isso mesmo, na incerteza
de colaboração eficiente, as sessões de materialização efetuam-se com
grandes riscos para a organização mediúnica e requisitam número dilatado
de cooperadores do nosso Plano.
5 — Compreendo, —
exclamei, valendo-me de pequena pausa do generoso instrutor. — Muitas
vezes, quando envolvidos na carne, não sabemos conduzir a pesquisa intelectual!…
6 — Certíssimo! —
Disse o meu interlocutor, benevolente, — se a indagação científica
estivesse acompanhada de seguros valores do sentimento, do caráter,
da consciência, outras seriam as realizações em vista da luz de espiritualidade
acesa para o caminho, mas quase sempre somos assediados pela exigência
repleta de pretensões e daí os fracassos inevitáveis.
7 O orientador amigo continuou
a série de esclarecimentos morais, belos e edificantes, e esperei, ansioso,
o instante de observar esses serviços prodigiosos dos trabalhadores
espirituais, os quais se realizam com grande surpresa para os estudiosos
da Crosta.
8 Alexandre, delicado como
sempre, obsequiou-me com todas as providências necessárias. Amigos atenciosos
incumbiram-se de atender-me à curiosidade sadia e fui notificado de
todas as medidas levadas a efeito.
2.
Na noite aprazada, Alexandre, que me proporcionava a satisfação de seguir-me
de perto, conduziu-me à casa residencial, onde teria lugar uma assembleia
diferente.
A reunião seria iniciada às vinte e uma horas, mas, com antecedência
de cinquenta minutos, estávamos ambos, ali, na sala íntima, acolhedora
e confortável, onde grande número de servidores do nosso Plano iam e
vinham.
2 Os trabalhos eram superintendidos
pelo Irmão Calimério, entidade superior à condição hierárquica de Alexandre,
que, recebido carinhosamente por ele, assim se externou, depois de apresentar-me:
— Venho até aqui no propósito de atender ao aprendizado do companheiro. André desejava inteirar-se quanto aos serviços de materialização e tomei a liberdade de apresentá-lo; entretanto, não nos encontramos aqui, como simples observadores. Se possível, trabalharemos também.
3 — Alexandre, — replicou
Calimério, muito gentil, evidenciando extrema delicadeza de trato, —
a tarefa é de todos nós. Proporcione ao nosso novo amigo todos os valores
de que possamos dispor e desculpem-me se não posso assisti-los pessoalmente.
A supervisão dos trabalhos da noite permanece a meu cargo; todavia,
estejam à vontade.
E, fixando em mim os olhos muito lúcidos, acentuou:
— Observar para edificar é serviço divino.
4 Demandamos, respeitosos,
o interior doméstico. Admiradíssimo, notei a enorme diferenciação do
ambiente. Não havia, ali, como em outras reuniões a que assistira, a
grande comunidade de sofredores às portas. A residência particular,
onde se efetuariam os trabalhos, chegava a ser isolada por extenso cordão
de trabalhadores de nosso Plano, num círculo de vinte metros em derredor.
5 Percebendo-me a estranheza,
Alexandre explicou:
— Aqui, é indispensável o máximo cuidado para que os princípios mentais de origem inferior não afetem a saúde física dos colaboradores encarnados, nem a pureza do material indispensável aos processos fenomênicos. Em vista disso, torna-se imprescindível insular o núcleo de nossas atividades, defendendo-o contra o acesso de entidades menos dignas, através de fronteiras vibratórias.
3.
Observando a extensão dos cuidados postos em prática, perguntei:
— Se é preciso tamanho zelo, no que se refere ao nosso campo de serviço, não se fará a mesma exigência aos companheiros encarnados, com a função de assistentes?
2 Alexandre sorriu, compreendendo
a sutileza de minha interrogação, e respondeu:
— Todo o perigo desses trabalhos está na ausência de preparo dos nossos
amigos da Crosta, os quais, na maioria das vezes, alegando impositivos
científicos, se furtam a comezinhos princípios de elevação moral. 3
Quando não se verifica o devido cuidado por parte deles, o fracasso
pode assumir características terríveis, porque os irmãos que estabelecem
as fronteiras vibratórias, no exterior do recinto, não podem impedir
a entrada das entidades inferiores, absolutamente integradas com as
suas vítimas terrenas. 4
Há obsidiados que se sentem tão bem na companhia dos perseguidores,
que imitam as mães terrestres agarradas aos filhos pequeninos, penetrando
recintos consagrados a certos serviços, com que não se compadece ainda
o espírito infantil. Quando os amigos menos avisados ingressam na tarefa
em tais condições, as ameaças são verdadeiramente inquietantes.
5 — Então, aqui, —
considerei, — não devem entrar as vítimas do vampirismo…
— A rigor, não deveriam entrar, — falou o instrutor, sorrindo, — mesmo porque
há outros centros onde podem ser socorridas; mas, algumas vezes, a caridade
fraternal aconselha a tolerância, mesmo em ambientes como este.
6 E, após ligeira pausa, acentuou:
— Por isso mesmo, as reuniões para serviços de materialização aparecem
raramente; a homogeneidade, aqui, deve ser muito mais intensa. Consagra-se
a maioria de nossas atividades ao esforço da caridade cristã. Neste
ambiente, porém, limita-se o trabalho a certas demonstrações da sabedoria
espiritual. 7 Os homens,
contudo, em sentido geral, não sabem, por enquanto, compreender a essência
divina de tais demonstrações e, quase sempre, acorrem a elas com o raciocínio
acima do sentimento. Pelas inquietudes da investigação, perdem, muitas
vezes, os valores da cooperação, e os resultados são negativos. 8
Quando, porém, conseguirem trazer o coração iluminado, receberão
alegrias iguais àquela que desceu sobre os discípulos de Jesus, quando,
de portas cerradas, em sublime comunhão de amor e fé, receberam a visita
do Mestre, perfeitamente materializado, depois da ressurreição, em casa
humilde de Jerusalém, de conformidade com a narrativa dos Evangelhos.
( † )
4.
Em virtude de haver Alexandre entrado em silêncio, por alguns instantes,
intensifiquei as minhas observações.
Surpreendido, notei o esforço de vinte entidades de nobre hierarquia que movimentavam o ar ambiente. Em seus gestos rítmicos, semelhavam-se a sacerdotes antigos que estivessem executando operações magnéticas de santificação interior do recinto.
2 Atendendo-me ao espírito
de pesquisa, Alexandre esclareceu:
— Não se trata de hierofantes em gestos convencionais. Temos ali esclarecidos
cooperadores do serviço, que preparam o ambiente, levando a efeito a
ionização da atmosfera, combinando recursos para efeitos elétricos e
magnéticos. 3 Nos trabalhos
deste teor requisitam-se processos acelerados de materialização e desmaterialização
da energia. As entidades manifestantes, ao campo visual de nossos amigos
encarnados, quase sempre são criaturas eminentemente ligadas à Crosta
e aos seus Planos de sensações, mas os organizadores legítimos da tarefa
em curso são verdadeiros e competentes orientadores dos Planos espirituais,
com grandes somas de conhecimento e responsabilidade.
4 Não decorreram muitos instantes
e alguns trabalhadores de nossa Esfera compareceram, trazendo pequenos
aparelhos que me pareceram instrumentos reduzidos, de grande potencial
elétrico, em virtude dos raios que movimentavam em todas as direções.
5 Minha curiosidade não tinha
limites.
— Estes amigos, — explicou o meu generoso instrutor, — estão encarregados de
operar a condensação do oxigênio em toda a casa. 6
O ambiente para a materialização de entidade do Plano invisível aos
olhos dos homens requere elevado teor de ozônio e, além disso, é indispensável
semelhante operação, a fim de que todas as larvas e expressões microscópicas
de atividade inferior sejam exterminadas. A relativa ozonização da paisagem
interior é necessária como trabalho bactericida.
7 E, depois dum gesto significativo,
acrescentou:
— O ectoplasma, ou força nervosa, que será abundantemente extraído do médium, não pode sofrer, sem prejuízos fatais, a intromissão de certos elementos microbianos.
8 Logo após, reparei, surpreendido,
o trabalho de várias entidades que chegavam do exterior, trazendo extenso
material luminoso.
— São recursos da Natureza, — informou-me o instrutor solicito, — que os operários
de nosso Plano recolhem para o serviço. 9
Trata-se de elementos das plantas e das águas, naturalmente invisíveis
aos olhos dos homens, estruturados para reduzido número de vibrações.
— E serão aproveitados nos trabalhos da noite? — Perguntei.
— Sim, — esclareceu Alexandre, paciente, — serão mobilizados pela ação dos
orientadores.
5.
Nesse instante, pessoas familiarizadas com a reunião penetraram a sala,
tomando os lugares que lhes eram habituais.
2 Estabeleceu-se, entre os
encarnados, ligeira conversação, onde se comentavam os trabalhos
levados a efeito anteriormente.
3 Não se passaram muitos minutos
e a jovem médium, afável e simpática, deu entrada no recinto, acompanhada
por diversas entidades, dentre as quais se destacava um amigo de elevada
condição, que parecia chefiar o grupo de servidores. Esse exercia considerável
controle sobre a moça, que a ele se ligava através de tênues fios de
natureza magnética.
4 Sentindo-me a insopitável
curiosidade, o orientador esclareceu:
— O controlador mediúnico é o Irmão Alencar, que também foi médico na Terra. Calimério é o dirigente legítimo, encarregado da supervisão dos trabalhos, em nosso Círculo.
5 Como notasse minha estranheza,
Alexandre reiterou:
— Alencar é orientador do aparelho mediúnico para as atividades de materialização propriamente ditas. Aproximemo-nos dele.
6 Muito sensibilizado, recebi
a saudação do novo amigo, que nos acolheu afetuosamente:
— Ser-nos-á muito útil a presença de ambos, — disse-nos, fixando meu instrutor,
em particular, — porquanto necessitamos de colaboradores para o auxílio
magnético ao organismo mediúnico.
— Estamos à sua disposição, — acentuou Alexandre, satisfeito, — tomaremos lugar
entre os seus assistentes.
Alencar agradeceu num gesto expressivo de sincero contentamento.
7 Entre os colaboradores figurava
uma criatura muito querida ao meu orientador. Tratava-se de Verônica,
que havia sido exímia enfermeira na Crosta, e que me colocou à vontade,
conversando amavelmente.
— Irmão Alexandre, — disse ela, depois de rápidos momentos de palestra
carinhosa, — iniciemos o auxílio magnético. Precisamos incentivar os
processos digestivos para que o aparelho mediúnico funcione sem obstáculos.
8 Não tive ensejo para interpelações
verbais. Alexandre, porém, endereçou-me significativo olhar, induzindo-me
a incentivar observações.
Ele, Verônica e mais três assistentes diretos de Alencar colocaram
as mãos, em forma de coroa, sobre a fronte da jovem, e vi que as suas
energias reunidas formavam vigoroso fluxo magnético que foi projetado
sobre o estômago e o fígado da médium, órgãos esses que acusaram, imediatamente,
novo ritmo de vibrações. 9
Concentraram-se as forças emitidas, gradualmente, sobre o plexo solar,
espalhando-se por todo o sistema nervoso vegetativo e, com espanto,
observei que se acelerava o processo químico da digestão. 10
As glândulas do estômago começaram a segregar pepsina e ácido clorídrico,
em maior quantidade, transformando rapidamente o bolo alimentar. 11
Admirado, reconheci a elevada produção de enzimas digestivas e vi que
o pâncreas trabalhava ativamente, lançando grandes porções de tripsina,
na parte inicial dos intestinos, que figuravam grande hospedaria de
bacilos acidificantes. 12
Valendo-me da oportunidade, analisei o fígado, que parecia sofrer especial
influenciação, notando-lhe a condição de órgão intermediário, não somente
com funções definidas na produção da bile, mas também exercendo importante
papel nos fenômenos nutritivos, relacionado com a vida dos glóbulos
do sangue. As células hepáticas esforçavam-se, apressadas, armazenando
recursos da nutrição ao longo das veias interlobulares, que se assemelhavam
a pequeninos canais de luz.
13 Em poucos minutos, o estômago
permanecia inteiramente livre.
— Agora, — exclamou Verônica, serviçal, preparemos o sistema nervoso
para as saídas da força.
14 Reparei a diferenciação
dos fluxos magnéticos, diante da nova operação posta em prática. Separaram-se
os assistentes de algum modo e, enquanto Alexandre projetava a energia
que lhe era peculiar sobre a região do cérebro, Verônica e os companheiros
lançavam os recursos que lhes eram próprios sobre todo o sistema nervoso
central, encarregando-se cada um de determinada zona dos nervos cervicais,
dorsais, lombares e sacros.
15 As forças projetadas sobre
a organização mediúnica efetuavam limpeza eficiente e enérgica, porquanto
via, espantado, os resíduos escuros que lhes eram arrancados dos centros
vitais.
16 Sob o fluxo luminoso
da destra de Alexandre, o cérebro da jovem alcançava brilho singular,
como se fora espelho cristalino. Todas as glândulas mais importantes
resplandeciam, à maneira de núcleos vigorosos, excitados por elementos
sublimes. 17 Debaixo
da chuva de raios espirituais em que se encontrava, a médium deixava
perceber o trabalho divino de que era objeto, na intimidade de todas
as células orgânicas, que pareciam restaurar o equilíbrio elétrico.
18 Terminada a tarefa, Alexandre
acercou-se de mim, observando, diante da minha indisfarçável curiosidade:
— O aparelho mediúnico foi submetido a operações magnéticas destinadas a socorrer-lhe o organismo nos processos de nutrição, circulação, metabolismo e ações protoplásmicas, a fim de que o seu equilíbrio fisiológico seja mantido acima de qualquer surpresa desagradável.
19 Prosseguindo o exame dos
trabalhos em curso, reparei que Verônica alçava, agora, a destra sobre
a cabeça da jovem, demorando-a no centro da sensibilidade.
— Nossa irmã Verônica, — explicou o meu generoso orientador, — está aplicando
passes magnéticos como serviço de introdução ao desdobramento necessário.
6.
Nesse momento, porém, algo aconteceu de estranho no Círculo de nossas
atividades espirituais. Percebeu-se grande choque de vibrações no recinto.
2 Dois servidores aproximaram-se
de Alencar e um deles explicou, espantadiço:
— O senhor P… aproxima-se, porém, em condições indesejáveis…
— Que aconteceu? — Indagou o controlador, seguro de si.
— Bebeu alcoólicos em abundância e precisamos providenciar-lhe o insulamento.
3 O controlador esboçou um
gesto de contrariedade e murmurou, encaminhando-se para a porta de entrada:
— É muito grave! Neutralizemos a sua influenciação, sem perda de tempo.
4 Alexandre convidou-me a
observar o caso de mais perto. Em vista da estupefação que me tomava
de assalto, esclareceu:
— Nestes fenômenos, André, os fatores morais constituem elemento decisivo de organização. Não estamos diante de mecanismos de menor esforço e, sim, ante manifestações sagradas da vida, em que não se pode prescindir dos elementos superiores e da sintonia vibratória.
5 Nesse instante, o senhor
P… transpunha a porta.
Bem posto, evidenciando excelentes disposições, não parecia ameaçar o equilíbrio geral, mesmo porque não revelava, exteriormente, qualquer traço de embriaguez.
6 Satisfazendo, porém, as
determinações de Alencar, diversos operários dos serviços cercaram-no
à pressa, como enfermeiros a se encarregarem de doente grave.
7 Incapaz de guardar minha
própria impressão, indaguei:
— Que ocorre, afinal? Esse homem parece calmo e normal.
— Sim, — elucidou Alexandre, benevolente, — parecer não é tudo. 8
A respiração dele, em semelhante estado, emite venenos. Noutro núcleo
poderia ser tratado caridosamente, mas aqui, atendendo-se à função especializada
do recinto, os princípios etílicos que exterioriza pelas narinas, boca
e poros são eminentemente prejudiciais ao nosso trabalho. 9
Como vemos, há necessidade de preparação moral para qualquer trato mais elevado com os Planos
superiores da vida.
A viciação, em qualquer sentido, antes de tudo, deprime o viciado, mas
perturba igualmente os outros.
10 Recordei a função do álcool
no organismo humano, mas bastou que a lembrança me aflorasse, de leve,
para que o instrutor me esclarecesse, imediatamente:
— Você compreende que as doses mínimas de álcool intensificam o processo digestivo
e favorecem a diurese, mas o excesso é tóxico destruidor. 11
As emanações de álcool de cana, ingerido pelo nosso irmão, em doses
altas, são altamente nocivas aos delicados elementos de formação plástica
que serão agora conferidos ao nosso esforço, além de constituírem sério
perigo às forças exteriorizadas do aparelho mediúnico.
12 De fato, pouco a pouco, experimentava-se, embora vagamente, o cheiro característico de fermentação alcoólica.
Reparei que o Sr. P… foi cercado pelas entidades operantes e neutralizado pela influenciação delas, à maneira do detrito anulado por abelhas laboriosas, em plena atividade na colmeia.
7.
Prosseguiram os serviços normalmente.
Entre os votos de êxito dos companheiros encarnados semiconfiantes,
a médium foi conduzida a pequeno gabinete improvisado, fazendo-se, em
seguida, ligeira oração. 2
Via-se, no entanto, que, como acontecia em outras reuniões, os amigos
terrestres emitiam solicitações silenciosas, entrando as vibrações mentais
em conflito ativo, desservindo ao invés de auxiliar no trabalho da noite,
o qual requisitava a mais elevada percentagem de harmonia. 3
À claridade fraca e suave da luz vermelha que substituíra a forte lâmpada
comum, notavam-se as emissões luminosas do pensamento dos amigos encarnados.
Francamente, não havia na pequena comunidade o espírito de entendimento
divino do serviço em curso. 4
Ninguém ponderava a expressão do fato para a Humanidade terrena, sequiosa
de revelação celeste. Via-se que a reunião era profundamente dominada
pelo “eu”. Enquanto uns exteriorizavam exigências, outros determinavam
as pessoas desencarnadas que deveriam comparecer nos fenômenos de
materialização. 5 Procurei,
contudo, coibir minhas impressões de desagrado, porque todos os trabalhadores
de grande elevação, no recinto, portavam-se calmamente, tratando os
companheiros carnais com desvelado carinho, quais sábios em face de
crianças queridas ao coração.
6 Diversos servidores
espirituais começaram a combinar as radiações magnéticas dos companheiros
terrenos, a fim de constituírem material de cooperação, enquanto Calimério,
projetando seu sublime potencial de energias sobre a médium, operava-lhe
o desdobramento que durou alguns minutos. 7
Verônica e outras amigas amparavam a jovem, parcialmente libertada dos
veículos físicos, mas algo confusa e inquieta ao lado do corpo, já mergulhado
em profundo transe.
8 Em seguida notei que, sob
a ação do nobre orientador da tarefa, exteriorizava-se a força nervosa,
à maneira dum fluxo abundante de neblina espessa e leitosa.
9 Notando a perturbação vibratória
do ambiente, em vista da atitude desaconselhável dos companheiros encarnados,
disse Calimério ao controlador mediúnico:
— Alencar, é necessário extinguir o conflito de vibrações. 10
Nossos amigos ignoram ainda como auxiliar-nos, harmonicamente, através
das emissões mentais. É mais razoável se abstenham da concentração por
agora. Diga-lhes que cantem ou façam música de outra natureza. Procure
distrair-lhes a atenção deseducada.
8.
Alencar, porém, que se encontrava sob preocupações fortes, diante das
múltiplas obrigações que deveria desempenhar no momento, pediu a colaboração
de Alexandre, que se colocou à disposição dele, imediatamente:
— André, — falou o meu orientador, em tom grave, — improvisemos a garganta
ectoplásmica. Não podemos perder tempo.
2 E, identificando-me a inexperiência,
acrescentou:
— Não precisa inquietar-se. Bastará ajudar-me na mentalização das minúcias anatômicas do aparelho vocal.
3 Estava aturdido, mas o instrutor
considerou:
— A força nervosa do médium é matéria plástica e profundamente sensível às nossas criações mentais.
4 Logo após, Alexandre tomou
pequena quantidade daqueles eflúvios leitosos, que se exteriorizavam
particularmente através da boca, narinas e ouvidos do aparelho mediúnico,
e, como se guardasse nas mãos reduzida quantidade de gesso fluido, começou
a manipulá-lo, dando-me a impressão de estar completamente alheio ao
ambiente, pensando, com absoluto domínio de si mesmo, sobre a criação
do momento.
5 Aos poucos, vi formar-se,
sob meus olhos atônitos, um delicado aparelho de fonação. No íntimo
do esqueleto cartilaginoso, esculturado com perfeição na matéria ectoplásmica,
organizavam-se os fios tenuíssimos das cordas vocais, elásticas e completas
na fenda glótica e, em seguida, Alexandre experimentava emitir alguns
sons, movimentando as cartilagens aritenóides.
6 Formara-se, ao influxo mental
e sob a ação técnica de meu orientador, uma garganta irrepreensível.
Com assombro, verifiquei que através do pequeno aparelho improvisado e com
a cooperação dos sons de vozes humanas, guardados na sala, nossa voz
era integralmente percebida por todos os encarnados presentes. 7
Parecendo-me satisfeito com o êxito de seu trabalho, Alexandre falou
pela garganta artificial, como quem utilizava um instrumento vocal humano:
— Meus amigos, a paz de Jesus seja convosco! Ajudem-nos, cantando! Façam música e evitem a concentração!…
9.
Fez-se música no ambiente e vi que o Irmão Alencar, depois de ligar-se
profundamente à organização mediúnica, tomava forma, ali mesmo, ao lado
da médium, sustentada por Calimério e assistida por numerosos trabalhadores.
2 Aos poucos, valendo-se da
força nervosa exteriorizada e de vários materiais fluídicos, extraídos
no interior da casa, aliados a recursos da Natureza, Alencar surgiu
aos olhos dos encarnados, perfeitamente materializado.
3 Surpreendido, reconheci
que a médium era o centro de todos os trabalhos. Cordões tenuíssimos
ligavam-na à forma do controlador e, quando tocávamos levemente na organização
mediúnica, o amigo corporificado demonstrava evidentes sinais de preocupação,
o mesmo acontecendo à jovem médium em relação a Alencar. 4
Os gestos incontidos de entusiasmo dos assistentes, que tentavam cumprimentar
diretamente o mensageiro materializado, repercutiam desagradavelmente
no organismo da intermediária.
5 O Irmão Alencar
entreteve pequena palestra, diante dos companheiros terrestres extasiados.
Não eram, todavia, as palavras trocadas entre ele e os assistentes que
me impressionavam o coração, e, sim, a beleza do fato, a realidade da
materialização, dando ensejo a dilatadas esperanças no futuro humano,
quanto à fé religiosa, à filosofia confortadora da imortalidade e à
ciência enobrecida, a serviço da razão iluminada.
6 Alexandre aproximou-se de
mim e considerou:
— Repare na grandeza do acontecimento. O médium desempenha o papel
de entidade maternal, enquanto Alencar, sob a influência positiva de
Calimério, permanece em temporária filiação ao organismo mediúnico.
Todas as formas que se materializarem serão “filhas provisórias” da
força plástica da intermediária. 7
O amigo que conversa com os encarnados é Alencar, mas os seus envoltórios
do momento são nascidos das energias passivas da médium e das energias
ativas de Calimério, o mais elevado diretor desta reunião. 8
Se violentarmos a médium em nosso Plano, feriremos Alencar em processo
de materialização; se os companheiros terrenos violentarem o mensageiro,
repentinamente corporificado, esfacelarão a médium, acarretando consequências
funestas e imprevisíveis.
10.
Perplexo, ante o fenômeno, indaguei:
— Mas esta força nervosa é apenas a propriedade de alguns privilegiados na Terra?
— Não, — replicou Alexandre, — todos os homens a possuem com maior
ou menor intensidade; entretanto, é preciso compreender que não nos
encontramos, ainda, no tempo de generalizar as realizações. 2
Você sabe que este domínio exige santificação. O homem não abusará no
setor do progresso espiritual, como vem fazendo nas linhas de evolução
material, onde se transformam prodigiosas dádivas divinas em forças
de destruição e miséria. 3
Neste campo de realizações sublimes, meu amigo, a que nos sentimos ligados,
a ignorância, a vaidade e a má-fé permanecem incapacitadas por si próprias,
traçando fronteiras de limitação para si mesmas.
6 Impressionado com as maravilhas
sob meus olhos, notei que, ao apelo de Alencar e com o concurso generoso
de Calimério, materializaram-se mãos e flores, à maneira de mensagens
afetuosas para os assistentes da reunião.
7 Reinava grande alegria
entre todos, com exceção do Sr. P…, que revelava intraduzível mal-estar,
sob o controle direto de vários trabalhadores espirituais que lhe neutralizavam
a nociva influência.
8 Depois de maravilhosos
minutos de serviço e júbilo, com significativas demonstrações de agradecimento
a Deus, terminaram os trabalhos da noite, cooperando todos nós para
que a médium fosse perfeitamente reintegrada no seu patrimônio psicofísico.
9 Meu coração transbordava
de contentamento e esperança; todavia, era forçoso confessar que, para
tamanhas manifestações de serviço e tão sublimes bênçãos, era muito
reduzido o entendimento dos encarnados. Semelhavam-se a crianças afoitas,
mais interessadas no espetáculo inédito que desejosas de consagração
ao serviço divino. 10
Francamente, estava desapontado. Tantos emissários celestes a se esforçarem
por meia dúzia de pessoas que pareciam distantes do propósito de servir
à causa da Verdade e do Bem?!
11 Expus minha opinião ao
devotado instrutor, mas Alexandre respondeu, tranquilo:
— E Jesus? Considera você que Ele tenha trabalhado somente para os galileus
que o não compreendiam? Julga que tenha ensinado tão só no templo de
Jerusalém? 12 Não,
meu amigo: convença-se de que todos os nossos atos, no bem ou no mal,
estão sendo praticados para a Humanidade inteira. Por agora, os nossos
companheiros terrestres não nos entendem, nem cresceram devidamente
para a completa consagração a Jesus, mas a semeadura é viva e produzirá
a seu tempo. Nada se perde.
13 E, sorrindo, rematou,
depois de longa pausa:
— É verdade que você, no mundo, foi médico sempre interessado em ver
o resultado de seu trabalho, mas não se esqueça do esforço silencioso
dos semeadores do campo e recorde que as sementes depositadas nos sarcófagos
egípcios, há alguns milhares de anos, estão começando a produzir maravilhosamente
no solo da Terra.
André Luiz
[O capítulo 28 do
livro “Nos
domínios da mediunidade”, descreve uma reunião de efeitos físicos.]