O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Estante da vida — Irmão X


31

Sementeira e colheita

1 Certo homem, enredado no vício da embriaguez, era frequentemente visitado por generoso amigo espiritual que lhe amparava a existência.

— Arrepende-te e recorre à Bondade Divina! Rogava o benfeitor quando o alcoólatra se desprendia parcialmente do campo físico, nas asas do sono. Vale-te do tempo e não adies a própria renovação! Um corpo terrestre é ferramenta preciosa com que a alma deve servir na oficina do progresso. Não menosprezes as próprias forças!…

2 O infeliz acordava, impressionado. Rememorava as palavras ouvidas, tentava mentalizar a formosura do enviado sublime e, intimamente, formulava o propósito de regenerar-se.

3 Todavia, sobrevindo a noite, sucumbia de novo à tentação.

Embebedando-se, arrojava-se a longo período de inconsciência, tornando ao relaxamento e à preguiça.

Borracho, empenhava-se tão somente em afogar as melhores oportunidades da vida em copinho sobre copinho.

4 Entretanto, logo surgia alguma faixa de consciência naquela cabeça conturbada, o mensageiro requisitava-o, solícito, recomendando:

— Atende! Não fujas à responsabilidade. A passagem pela Terra é valioso recurso para a ascensão do Espírito… O tempo é um crédito de que daremos conta! Apela para a compaixão do Senhor! Modifica-te! Modifica-te!…

5 O mísero despertava na carne, lembrava a confortadora entrevista e dispunha-se ao reajustamento preciso; no entanto, depois de algumas horas, engodado pelos próprios desejos, caía novamente na zona escura.

Ébrio, demorava-se meses e meses na volúpia do autoesquecimento.

6 Contudo, sempre aparecia um instante de lucidez em que o companheiro vigilante interferia.

Novo socorro do Céu, novas promessas de transformação e nova queda espetacular.

7 Anos e anos foram desfiados no milagroso novelo do tempo, quando o infortunado, de corpo gasto, se reconheceu enfermo e abatido.

A moléstia instalara-se, desapiedada, na fortaleza orgânica, inclinando-lhe os passos para o desfiladeiro da morte.

8 Incapaz de soerguer-se, o doente orou, modificado.

Queria viver no mundo e, para isso, faria tudo por recuperar-se.

9 Em breves segundos de afastamento do estragado veículo, encontrou o divino mensageiro e, ajoelhando-se, comunicou:

— Anjo abnegado, transformei-me! Sou outro homem… Estou arrependido! Reconheço meus erros e tudo farei para redimir-me… Recorro à piedade de nosso Pai Todo-Compassivo, de vez que pretendo alcançar o futuro na feição do servidor desperto para as elevadas obrigações que a vida nos conferiu…

10 O protetor abraçou-o, comovidamente, e, enxugando-lhe as lágrimas, rejubilou-se, exclamando:

— Bem-aventurado sejas! Doravante, estarás liberto da perniciosa influência que até agora te obscureceu a visão. Abençoado porvir sorrirá ao teu destino. Rendamos graças a Deus!

11 O doente retomou o corpo, de coração aliviado, com a luz da esperança a clarear-lhe a alma.

Mas os padecimentos orgânicos recrudesciam.

A assistência médica, aliada aos melhores recursos de enfermagem, revelava insuficiência para subtrair-lhe o mal-estar.

12 Findos vários dias de angustiosa dor, entregou-se à prece com sentida compunção e, amparado pelo benfeitor invisível, achou-se fora da carne, em ligeiro momento de alívio.

— Anjo amigo, — implorou, — acaso o Todo-Bondoso não se compadece de mim? Estou renovado!… Alterei meus rumos! Por que tamanhas provas?

13 O guardião afagou-o, benevolente, e esclareceu:

— Acalma-te! O sincero reconhecimento de nossas faltas é força de limitação do mal em nós e fora de nós, qual medida que circunscreve o raio de um incêndio, para extingui-lo pouco a pouco, mas não opera reviravoltas na Lei. 14 O amor infinito de Deus nos descerra fulgurantes caminhos à própria elevação; todavia, a justiça d’Ele determina venhamos a receber, invariavelmente, segundo as nossas obras. ( † 15 Vale-te do perdão divino que, por resposta do Senhor às tuas rogativas, é agora em tua alma anseio de reajuste e dom renovador, mas não olvides o dever de destruir os espinhos que ajuntaste. 16 O arrependimento não cura as afecções do fígado, assim como o remorso edificante do homicida não remedeia a chaga aberta pelo golpe da lâmina insensata!… Aproveita a enfermidade que te purifica o sentimento e usa a tolerância do Céu como novo compromisso de trabalho em favor de ti mesmo!…

17 O doente desejou continuar ouvindo a palavra balsamizante do amigo celeste… A carne enfermiça, porém, exigia-lhe a volta.

18 Contudo, recompondo-se mentalmente no corpo fatigado, embora gemesse sob a flagelação regeneradora, chorava e ria, feliz.


Irmão X

(Humberto de Campos)

Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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