O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Enxugando lágrimas — Familiares diversos


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Tudo é vida e renovação da vida

1 Querida mamãe. Meu querido pai. Abençoem-me.

2 Sinceramente, estou assim na posição de alguém que não sabe retomar-se com segurança.

3 Alguém que passou por acontecimento difícil de descrever, que perdeu as forças, que se arrojou a grande enfraquecimento, que ficou doente sem saber como, e volta à família para dar notícias. 4 Tenho a cabeça parecendo engrenagem enferrujada; com muito custo vou movendo as peças, e preciso pensar; embora o vovô Acylino n esteja aqui comigo com tia Raquel Bailão n e outros protetores, quando a ideia de que me reajusto nos movimentos mais por impulsão deles do que por minha própria capacidade, e diz que minhas informações são necessárias.  5 Creio que meus queridos pais estão desanimados… É o que deduzo do que ouço. Por isso, convalescente, qual me vejo, rogo à senhora, mamãe, para que não deixe o seu coração devotado e carinhoso se arrebentar no sofrimento em que nos achamos, de instante para outro. Ajude-nos.

6 Não podemos, por enquanto, ficar sem o apoio de casa. E nossa casa agora mais me parece um lago de pranto e de aflição. Não posso pensar em nosso ambiente, sem receber um golpe no espírito.

7 Não estou reclamando. Não.
Que família conseguiria perder dois filhos de uma só vez e ficar imperturbável?

8 Compreendi, querido papai, no justo momento do carro arremessado sobre nós…

9 Creiam, o senhor e mamãe, que nossas conversas sobre o assunto do espírito e as poucas leituras que pude desfrutar me valeram muito. 10 Procurei a conformação enquanto adivinhasse o rigor da provação que nos separava. 11 Enquanto tinha a impressão de que o mundo desabava sobre nós, fiz forças para tentar algum auxílio ao Fausto, n e à Walquíria n e à companheira, mas era tudo uma espécie de tempestade concentrada em recinto estreito, como que a quebrar-nos as energias.

12 Procurei, por dentro de mim, onde estavam as orações de minha mãe, e as achei todas. Eram luzes na memória semelhando pequenas chamas que de repente acendessem para que eu não estivesse no escuro. 13 Repeti no íntimo todas as preces de que me lembrava, ou colocava as palavras minhas nas estruturas que o amor de mamãe e seu carinho de pai me puseram no coração. 14 O sono veio rápido, um sono de injeção maciça quando a pessoa se vê obrigada a entregar-se sem qualquer resistência. 15 Depois, nada mais vi senão que despertava com meu avô Acylino e com um amigo que me lembra parte de seu nome Luiz Pereira. 16 Tia Raquel Bailão me disse que Fausto e eu fôramos transportados para uma Escola-Hospital ligada à Mossâmedes, informando que estávamos sob a proteção de Santa Damiana da Cunha. n

17 Daí para cá, sei que fui levado à nossa casa algumas vezes, mas fico muito perturbado com as lágrimas de meus pais queridos, que não sei consolar. Ainda estou fraco, fraco mesmo. 18 Fausto ainda não tem forças para se retomar. E de Walquíria e o mais nada sei. 19 Quis saber alguma coisa do pobre doente que se fez instrumento de nossa prova, e meu avô Acylino me disse que se eu quisesse falar ao senhor e à mamãe deveria primeiro, orar pelo causador do problema n e desculpá-lo com todo o coração.  20 Quero dizer-lhes que fiz isso com sinceridade e peço a Jesus que o proteja onde estiver, porque também não sei como ficou o pobre enfermo, que nos merece paz e compreensão.

21 Papai, olhe mamãe e não deixe que ela venha a baquear. Lembremos o Celso Júnior, n o Luciano, a Cybele e tantos entes queridos. 22 Aqui nós nos viramos com muitas saudades, mas procuraremos nos virar, desde que os pais queridos nos auxiliem.

23 A vida não termina quando o corpo cai estragado, ou inútil.

24 Penso que nós somos parecidos com as lagartas e as borboletas. As lagartas, ao que me parece, se arrastam no solo e nem sonham que um dia terão asas.
Chega um momento em que se acomodam no casulo, dando a impressão de refúgio fechado e, em momento determinado, saem para o ar de modo tão diferente que devem ganhar o espaço com grande assombro. 25 Pois, comigo, o assunto é isso aí: “Asas não tenho, mas que a gente sai do corpo com outros recursos, não posso negar”… 26 Creio que os problemas são muitos, mas o maior de todos, é perdir-lhes para viver, para que não queiram vir para cá de maneira violenta. Mamãe, viva e ajude o papai, os nossos a viver. Agradeço à D. Trindade n o que está fazendo por nós.
Se puder vê-los fortes, estarei fortalecido.

27 Não consigo escrever mais. As lembranças parecem fora de mim, esperando minha memória sarar para repassarem aos lugares que ocupam em minha cabeça.
Não sei explicar, de outro modo, o que sinto.

28 Vovô Acylino me afirma que o senhor, papai, compreenderá com mamãe tudo que não posso escrever. Fausto n não sabe que estou aqui, mas enviarei a ele as vibrações de reconforto que estou sentindo pelo fato de conseguir escrever.

29 Mamãe querida e querido papai, a morte não existe, tudo é vida e renovação da vida. Pretendo aprender muito. Por agora posso apenas trazer-lhes o coração.

30 Recebam os dois — os nossos maiores amores da Terra — papai e mamãe — um beijo nas mãos com todo amor e com a gratidão do filho, sempre o filho reconhecido,


Acylino




VIBRAÇÕES DE RECONFORTO


Da seção “Chico Xavier”, do Jornal Espírita, de novembro de 1976, extraímos os dados principais sobre “Tudo é Vida e Renovação da Vida”, servindo-nos da reportagem “Mensagem de Acylino Luiz Pereira Neto a seus queridos pais”, de Décio Estrêlla. n

Depois de afirmar que o advogado Dr. Celso Luiz Pereira, residente em Anicuns, Estado de Goiás, à Rua Benjamim Constant, nº 4, enviou-lhe a comovedora mensagem que Acylino transmitiu a seus pais, por intermédio de Francisco Cândido Xavier, na noite de 13 de março de 1976, informando que Acylino e seu irmão Fausto desencarnaram a 6-2-1976, às 9:45 horas, acrescenta o ilustre jornalista da folha espírita paulistana:

“Observe, pois, que o espírito de Acylino, gozando dos préstimos que a evolução lhe favorecera, pôde comunicar-se após trinta e cinco dias de ter ocorrido a perda do corpo físico num pavoroso desastre que lhe arrebatou o Espírito para a Pátria Espiritual, em companhia de seu irmão Fausto, enquanto que as duas coleguinhas Walquíria e Míriam, que se achavam também no Fusca-1.300-L, não faleceram. Uma delas fraturou a coluna, enquanto a outra fraturou os braços, clavículas e trincou a bacia, achando-se recuperada.


O ACIDENTE


Acompanhando a carta que o Dr. Celso nos mandou em 3 de abril de 1976, transcreveremos alguns trechos para que o leitor sinta a sinceridade, o carinho e o amor de verdadeiros pais e amigos de Espíritos que reencarnaram nos lares terrenos e que chegam na condição de filhos, por breve espaço de tempo.

“Acuso o recebimento de sua correspondência e confesso que não foi pequena a emoção que senti ao receber uma carta tão bonita e consoladora como a sua. Tudo isto é mais uma ajuda para que a gente tenha forças para suportar tão grande provação a que fomos submetidos de uma hora para outra.”

“A dor, a saudade que sentimos pelo desenlace de nossos queridos Acylino e Fausto, creia-me, meu irmão, é dose fortíssima. Há momentos que a gente baqueia, chegando mesmo quase à loucura. Moramos no interior de Goiás, a 74 km da Capital, a oeste. Minha esposa é filha daqui, e eu sou de uma cidade histórica aqui vizinha — Mossâmedes, berço de meus antepassados. A minha família era constituída de 5 filhos, 4 homens legítimos e uma filha adotiva.”

Interessante é o que nos conta o Dr. Celso — prossegue Décio Estrêlla — do carinho que Acylino tinha para com a filhinha adotiva: “No dia do aniversário de nosso casamento, eu transportava uma senhora de minha fazenda para a cidade, quando, com apenas dez minutos de viagem, esta veio a falecer, deixando-nos aquela pequena criança recém-nascida. O meu filho mais velho — Acylino — ficou inteiramente compadecido diante daquele quadro triste, e me pediu permissão para que criássemos aquela criancinha pobre, o que concordamos plenamente. Havíamos reconhecido que aquela coincidência era mesmo n um capricho do destino.

“Não existia família mais feliz do que a nossa: 5 filhos, todos bonitos, fortes e inteligentes. Tudo parecia correr às mil maravilhas: o mais velho estudava em Goiânia, onde gozava do maior prestígio junto ao colégio e aos colegas. Era um predestinado desde criança. Era admiradíssimo pela inteligência e humildade. Conquistou o primeiro lugar em todas as escolas onde passou. O segundo tinha inteligência acentuadíssima. Fez o ginásio com idade mínima, pois a sua precocidade era fora do comum. Tornou-se homem antes da hora e tinha apenas 14 anos. Media 1.83 m e pesava 70 quilos. Era um grande motorista e me ajudava muitíssimo em minhas lidas de fazenda. Eram dois filhos que para nós representavam tudo; eram o nosso orgulho, a nossa vaidade, gozavam junto à mocidade do maior prestígio possível; as moças disputavam por causa deles. Mas, no dia 6 de fevereiro, às 9:45 horas, eles regressavam de uma reunião estudantil, conduzindo duas moças da sociedade local, e já adentrando a cidade, eis que…” (Aqui, o missivista se refere ao responsável pelo acidente, que anteriormente já havia tentado suicídio por duas vezes, e, segundo afirmara ao funcionário do posto de gasolina, onde colocara apenas dez cruzeiros de combustível, naquele dia, morreria de qualquer jeito, e não sozinho, dando mostras de absoluta alienação mental, vítima de grave processo obsessivo). “Por falta de sorte ou predestinação, os meus filhos vinham tranquilos em um Fusca 1.300-L, que eu havia dado para eles, há poucos dias. Quando o infeliz viu o carro dos meninos, já havia saído do posto em grande velocidade, arremessou o veículo, um Fusca 1972, contra o dos meus filhos. A pancada foi enorme. O meu Acylino desencarnou na hora, o infeliz também se espatifou. O meu filho Fausto ficou em estado de coma, tendo resistido por mais de 48 horas. As duas companheiras, uma fraturou a coluna e está sujeita à paralisia irreversível, segundo diagnóstico médico, e a outra fraturou os braços, a clavícula e trincou a bacia, tendo grande dificuldade em andar. A cidade ficou abaladíssima, toda a comunidade tem chorado conosco, temos recebido pêsames de quase todo o País, pois graças a Deus somos bem relacionados e contamos com grande número de amigos e parentes.”

“Do dia do trágico acontecimento para cá, a nossa vida tornou-se amargurada, as lágrimas são constantes, o mundo sem sentido, a desilusão enorme, a dor e a saudade, nossas companheiras inseparáveis.”


Nas explicações finais, Décio Estrêlla afirma que o Dr. Celso Luiz Pereira, desesperado, procurou o Grupo Espírita da Prece, no dia 13 de março de 1976, e que estava convicto de que iriam ter alguma notícia do Plano Espiritual, e quando lá chegou, o médium Xavier lhe descreveu várias entidades espirituais, informando que era cedo demais para receber qualquer mensagem de seus filhos. Contudo, quase uma hora da manhã, para surpresa de todos, eis que surge a página esperada, trazendo, dentre outros, um pormenor importante: a referência a Mossâmedes, onde nasceu Damiana, a Mulher Missionária, e o pai do comunicante.

Linhas antes, associando-se, de coração, a todos os pais e demais familiares que têm passado por duras provas, ressalta o ilustre jornalista o importante papel dos fiéis missionários da Mediunidade com Jesus:

“Felizmente, graças à Lei do Amor de Nosso Divino Pai e Criador, temos contado com humildes servidores do Bem como divinos canais ou antenas abençoadas, que se traduzem em archotes ou luzeiros nas noites gélidas das nossas desilusões que vêm cantar aos ouvidos de nossas almas feridas, a suave melodia do amor do além-túmulo, serenando-nos os ânimos através da fenomenologia mediúnica psicográfica, provando-nos pelos fatos descritos que a vida continua, que o canal receptor nada sabe do que ocorreu na véspera.” E arremata:

“Ao partir os grilhões carnais de um ente amado, é preciso que cada um de nós esteja sempre preparado a fim de que as dores inconsoláveis dos que sobrevivem não reflitam, penosamente, nos que partiram. Esta compreensão já é uma grande ajuda para os que se encontram do lado de lá, aguardando a serenidade de ânimo, coragem e compreensão de que Deus realmente é amor. Sim, o pranto discreto, as lágrimas silenciosas, sem revolta, a deslizarem por rútilas pérolas, no rosto combalido, representam ondas vibratórias de carinho e de reconhecimento dos que ficaram.”


Ser-nos-á possível acrescentar algo, à guisa de conclusão? Cremos que sim, mas de modo bastante sumário:

a) deixando claro que não está reclamando, e compreendendo a dificuldade da família que veio a perder dois filhos de uma vez, o Espírito convalescente implora aos pais que combatam o desânimo e a revolta, a fim de que, ao pensar no antigo ninho doméstico, transformado num “lago de pranto e de aflição”, não venha a “receber um golpe no espírito”;

b) necessidade do Culto Evangélico no Lar, com vistas à indispensável preparação para a Vida Maior, já “que nossas conversas sobre o assunto do espírito e as poucas leituras que pude desfrutar me valeram muito”;

c) que os pais, através da conformação e do trabalho devotado aos semelhantes, virando-se com muitas saudades, auxiliem os filhos desencarnados a se virarem, também, onde estejam com saudades muitas;

d) o desenvolvimento do estudo da comparação de “que nós somos parecidos com as lagartas e as borboletas”, encontra-se no Cap. XI — “Existência da alma”, da obra Evolução em Dois Mundos, ( † ) primeira parte, ditada pelo Espírito de André Luiz; n

e) que precisamos orar pelos causadores de semelhantes problemas e desculpá-los de todo o coração, a fim de que possamos conseguir estabelecer a ligação com as forças mais altas da Vida;

f) que o fato de conseguir escrever, faculta ao Espírito a possibilidade de enviar vibrações de reconforto ao irmão internado, temporariamente, na Escola-Hospital da Espiritualidade Superior, local de refazimento este, por sua vez, ligado a uma cidade terrena, onde nasceram e desencarnaram antepassados seus, possivelmente, alguns deles, ele mesmo, Acylino, e o próprio irmão;

g) que devemos divulgar a Doutrina Espírita, buscando com isto consolar as criaturas que perderam entes queridos em situações de violência, preparando-nos todos ao mesmo tempo, enquanto reencarnados, para a travessia de um Plano a outro a que inapelavelmente não podemos fugir, viajantes do efêmero que somos por este mundo, por agora, de expiações e provas.


Nota: Depois de concluído o presente capítulo, resolvemos nos deslocar até Anicuns, Estado de Goiás, cidade que dista não mais que cem quilômetros além de Goiânia, com vistas a não somente obter as fotos das quais necessitávamos, quanto para colher mais alguns dados que reputamos importantes para os nossos estudos.

Assim o fizemos, na manhã de 5 de fevereiro de 1978, não obstante tenhamos entrevistado pessoalmente, tão só a Sra. mãe de Acylino — D. Maria do Rosário Bailão Luiz Pereira, uma vez que o Dr. Celso Luiz Pereira encontrava-se ausente, por motivo de viagem.


Do rápido “tête-à-tête” com D. Maria do Rosário, julgamos pertinente apenas acrescentar o seguinte:

1. Acylino Luiz Pereira Neto: nasceu em Goiânia, a 17 de novembro de 1959, e desencarnou em Anicuns (Go), a 6 de fevereiro de 1976.


2. Tia Raquel Bailão: Prima desencarnada do avô materno, Sr. Augusto da Silva Bailão.


3. Fausto: Trata-se do irmão Fausto Bailão Luiz Pereira, que nasceu em Goiânia, a 30 de agosto de 1961 e desencarnou em Anicuns (Go), a 8 de fevereiro de 1976. Comunicou-se através do médium Xavier, ao final da reunião pública no Grupo Espírita da Prece, em Uberaba, Minas, a 15 de maio de 1976.


4. Celso Júnior, Luciano, Cybelle e Walquíria: Irmãos de Acylino, respectivamente, os três primeiros com 15, 12 e 9 anos de idade.


5. Dona Trindade: Trata-se de D. Trindade Méscua, espírita convicta que levou os pais de Acylino a Uberaba, com a recomendação de D. Maria do Rosário para que não participasse absolutamente nada a ninguém, em Uberaba, sobre os motivos que os levavam a procurar o médium Chico Xavier.


6. “Causador do problema”: A quem todos devemos endereçar os nossos melhores pensamentos de paz e vibrações de reconforto, em nome de Jesus: José Lobo, conhecido por José do Acari.


7. Acylino era espírita e frequentava espontaneamente o Centro Espírita a que estava ligado, todas as semanas, não descurando jamais da tarefa abençoada de assistência social espírita. Minutos antes da desencarnação, ele e Fausto participavam de uma reunião no Colégio onde estudavam, que visava à distribuição de dinheiro obtido para uma excursão que não se realizou, para as diversas instituições de benemerência de sua cidade.


Elias Barbosa



[1]  Jornal Espírita, São Paulo, novembro de 1976, Ano II. nº 17, p. 5.


[2]  Aparente coincidência, bem entendido. — Nota do Autor deste Capítulo [o organizador, Elias Barbosa].


[3]  Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira, Evolução em Dois Mundos, ditado pelo Espírito de André Luiz, 1ª edição — 1959. FEB, Rio, pp. 79-86.


[4]  [Damiana da Cunha Menezes faleceu no dia 12 de dezembro de 1831 e foi sepultada com todas as honras de heroína na Igreja de Mossâmedes.]


Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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