Ortensio observou o seguinte fato interessante: o médium, naquela reunião, só quando recebeu a mensagem de sua mãe é que segurou o lápis de forma diferente, isto é, mantendo-o menos inclinado, entre os dedos indicador e médio, e não entre os dedos indicador e polegar como o faz habitualmente, psicografando ou escrevendo fora do transe mediúnico.
Em fevereiro de 1977 tivemos a oportunidade de também observar esta particularidade, quando Chico recebeu uma mensagem do Espírito de uma criança. A letra, na 1ª página, apresentava caracteres infantis, arredondados, bem diferentes da habitual do médium — e observem o detalhe — só enquanto apoiava o lápis, levemente, entre os dedos indicador e médio. No restante da psicografia, que preencheu dezenas de laudas de papel, o lápis voltou à posição habitual e a letra mudou-se, também, para a habitual.
São nuances curiosos da psicografia de Chico Xavier. Tivemos a impressão, na época, de que o lápis naquela posição especial facilitava a atuação do Espírito, permitindo-lhe escrever como na sua última existência terrena, mas, continuando daquela forma, demoraria muito tempo para que a mensagem fosse transcrita para o papel.
Essa maior facilitação, com o lápis quase solto entre os dedos indicador e médio, contribuiria para a escrita em idioma desconhecido do médium.
É de conhecimento geral que Chico Xavier não é poliglota, tendo frequentado apenas 4 anos de bancos escolares.
Assim, evidentemente, o público presente àquela referida reunião do Grupo Espírita da Prece presenciou um fenômeno notável de mediunidade poliglota ou xenoglossia † [do gr. xénos: “estrangeiro” + glossa: “língua (linguagem)”], este último termo criado pelo cientista francês, nobelista Charles Richet.
É um fenômeno mediúnico de muito valor como comprovante indiscutível da realidade do intercâmbio entre os encarnados e desencarnados. Referindo-se a ele, mais especificamente aos casos de xenoglossia obtidos pela psicografia, o pesquisador italiano Ernesto Bozzano, em seu livro Xenoglossia (Ed. FEB, Rio, 2ª ed., 1949, p. 47) afirmou, categórico: “Do ponto de vista científico, os casos que formam esta categoria são os melhores, por isso que o texto escrito em língua que o médium ignorava fica, como documento irrefragável, à disposição dos estudiosos.”
Logo após o encontro fraterno com Ortensio Saullo, em Uberaba, aproximadamente um mês após o recebimento da mensagem de D. Ilda, abordamos Chico Xavier, expondo-lhe nossas indagações frente ao fenômeno de xenoglossia que acabávamos de tomar conhecimento.
Eis a entrevista:
1 P. — Chico, temos em mãos a mensagem, em italiano, recebida por seu intermédio, aqui em Uberaba, do Espírito de D. Ilda Saullo. Gostaríamos que nos contasse como a recebeu, considerando o fato inusitado de você tê-la psicografada em idioma estrangeiro.
R. — Recebi naturalmente. Esta mensagem foi psicografada mecanicamente, de forma inconsciente, qual ocorre com a maioria das páginas recebidas até hoje por meu intermédio.
2 P. — Ortensio, o filho de D. Ilda Saullo, observou que você psicografou a mensagem de sua mãe segurando o lápis de modo diferente do habitual, entre os dedos indicador e médio. Qual a explicação para esse fato?
R. — Creio que isso aconteceu em vista de maneiras especiais da senhora comunicante, ao escrever por minhas mãos.
3 P. — Chico, conhecemos aquela célebre mensagem de 1937, que você psicografou em inglês, na Sociedade Metapsíquica de São Paulo, com letras invertidas, mas corretas quando lidas com auxílio de um espelho. n Outras comunicações, em língua estrangeira, além daquelas recebidas nos E.U.A., n foram escritas por seu intermédio? Pode relacioná-las?
R. — Em outros idiomas, também recebi algumas mensagens em Pedro Leopoldo. n
4 P. — Por outras vias mediúnicas, por ex., pela clarividência ou clariaudiência, você já recebeu mensagens em idiomas estrangeiros? Nesses casos, como as transmitiu aos destinatários?
R. — Algumas vezes, recebi mensagens dessa natureza, mas apenas frases curtas que eu lia em páginas do Plano Espiritual e transmitia aos destinatários, então presentes à reunião em que estávamos, letra por letra.
5 P. — Considerando a importância da xenoglossia, pode nos dizer algo mais sobre esse fenômeno?
R. — Não tenho reservações pessoais, específicas, sobre as ocorrências em torno das poucas mensagens, em idiomas diferentes do português, que tenho recebido mediunicamente até agora. Não dispondo de raciocínios profundos para analisar esses fatos, recebo-os, quando surgem, espontaneamente, com o reconforto e a alegria em que me vejo quando consigo psicografar as páginas dos nossos Amigos Espirituais, em nosso próprio idioma.
Paulo Rossi Severino, sob o título “Senhora Italiana envia do Além, através de Chico Xavier, Mensagem em Italiano, com letra e assinatura semelhantes”, na Folha Espírita, n depois de ligeira introdução onde explica as circunstâncias mediante as quais tomou contato com a mensagem recebida no idioma de Ernesto Bozzano, a quem se refere, afirma:
Da. Ilda Mascaro Saullo, nasceu em 19/11/1906, desencarnando em 20/12/1977, dando sua mensagem 74 (setenta e quatro) dias após sua morte física. Era casada com o Sr. Salvatore Saullo, e teve 4 (quatro) filhos: Antônio, Domenica, Ortensio e Mário, o caçula, nascido após a guerra.
Mulher humilde, enfrentou grandes dificuldades e sofrimentos ao longo de sua existência, nunca se revoltando. Católica praticante, tinha fé inabalável. Apesar de sua luta pela sobrevivência, sempre repartia seu pão com os mais necessitados.
“Quando criança, esclarece o Sr. Ortensio, ouvia papai a lhe pedir: — Ilda, procure poupar um pouco para a nossa velhice, e ela lhe respondia com bondade: “Jesus não nos abandonará”. Além das grandes dificuldades que passávamos, por volta de meus 30 (trinta) anos, começaram os problemas sérios de saúde. Ao chegar o tempo da última guerra, as suas crises cardíacas foram se acentuando; lembro-me que durante a noite no período da guerra, ao soarem as sirenes de alarme, indicando bombardeio, todos deveriam se proteger nos abrigos subterrâneos. Mamãe, porém, nos recolhia junto dela no andar térreo do prédio onde morávamos. Não podíamos nos juntar aos demais no abrigo, pois ela sentia falta de ar. Sempre que isso acontecia, ela nos ensinava a orar, até o término do bombardeio. Quando terminava, ela tinha crise cardíaca, devido à tensão e angústia por que passava. Nas crises era socorrida pelos filhos, pois papai foi prisioneiro de guerra por quase 4 (quatro) anos. Passamos privações e grandes dificuldades. Eu, com apenas 8 (oito) anos de idade já estava enfrentando a vida para ajudar em casa. Assim passaram os anos, e a sua saúde cada vez mais se agravando, com reumatismo, problema cardíaco e diabete. Não mais saiu de casa, ficando todo o tempo no leito. Com a minha vinda para o Brasil, o seu coração já muito doente, agravou-se, sentindo a separação, pois éramos muito ligados; depois de um ano mais ou menos, trouxe-os para cá. Permaneceram no Brasil por 3 (três) anos, mas foram forçados a retornar, pois mamãe não se adaptava ao clima de São Paulo, tendo mesmo agravado seu estado de saúde. Prometi-lhe que regressaria tão logo fosse possível, porém, ela sabendo do meu noivado, afirmou que meu lugar era aqui mesmo. Lembrando o seu pensamento, quando falava com papai, que Jesus não a desampararia, isto de fato aconteceu, porque ela sempre foi amparada, por seus filhos. Onze anos depois, em 1970, fui visitá-la, encontrando-a feliz por me ver, mas sempre doente, pouco saindo de seu leito. Sempre apegada ao seu terço e às suas orações, recebia as suas comunhões no leito, onde duas vezes por semana, era visitada por um padre da capela próxima. Nunca demonstrou qualquer sinal de revolta ou angústia, pela doença que há anos a mantinha no leito. Regressei em 1975, quando ela me mostrou um caroço surgido no seio.
Em junho de 1977, viajei novamente para lá, e sua alegria era tanta, que suas lágrimas demonstravam uma possível despedida. Naquela ocasião minha esposa e eu, estávamos frequentando e lendo os livros de filosofia orientalista. Procurei transmitir a mamãe em seu leito de dor, os ensinamentos que havíamos aprendido. E na leitura da Sutra Sagrada, eu a fazia repetir que era filha de Deus perfeita, e que não havia doença em seu corpo. Após vários dias de repetição de certos trechos, ela me disse: “Filho, você me pede para repetir tantas vezes que estou perfeita, que a doença não existe, quando eu estou muito doente e cheia de dores. Filho, estou cansada, peço a Jesus que me leve, pois não aguento mais. Só tenho pena de seu pai, pois vocês já têm suas famílias constituídas.”
Em setembro de 1977, com o caso gravíssimo de saúde de minha esposa, fomos encaminhados ao Chico Xavier, para nos ajudar na decisão, e fomos iluminados porque sua orientação abriu novos caminhos em nossas vidas. Em dezembro de 1977, dia 22, fomos avisados por telefone do desenlace de mamãe. Consegui chegar no enterro no dia 23 em Roma. De volta ao Brasil, fui à casa de nosso querido irmão Chico Xavier, que sempre nos acolhe com imenso carinho e amor. Pedi notícias de minha querida mãezinha, a resposta dizia: — Que se encontrava em refazimento espiritual com a ajuda de seus familiares. Em outra oportunidade recebemos a mensagem.”
Escrita em italiano com semelhança de letra
Da outra vez, no entanto, a mensagem veio em italiano, através do lápis de Francisco Cândido Xavier.
O Sr. Ortensio, disse-nos que o pai e os irmãos foram avisados do recebimento da mensagem. Eles aceitam a autenticidade, mas como desconhecem o fenômeno da psicografia, o Sr. Salvatore Saullo, virá ao Brasil, procurando conhecer melhor o ocorrido. Dª. Maria Teresa, acredita na autenticidade, em primeiro lugar, porque foi recebida em italiano; em segundo lugar, pela semelhança flagrante da letra, da assinatura, como também de frases peculiares, que podem se comprovar pelas suas cartas recebidas periodicamente. E ainda — segundo o Sr. Ortensio — pela citação do nome de seu sogro Salvatore Saullo.
[11] “Chico Xavier psicografou confortadoras mensagens em Italiano — Mediunidade poliglota é o tema de Entrevista com o médium”, Anuário Espírita 1979, pp. 92-100.
[12] Vide reprodução fotográfica no livro impresso Claramente vivos, à pág. 112.
[13] Ver Enciclopédia de Parapsicologia, Metapsíquica e Espiritismo, de João Teixeira de Paula, Vol. II.
[14] As mensagens recebidas em língua inglesa pelos médiuns Francisco C. Xavier e Waldo Vieira, em 1965, nos EUA, constituem a Segunda Parte do livro Entre Irmãos de Outras Terras, Ed. FEB, Rio.
[15] Posteriormente, fazendo uma pesquisa na literatura espírita, encontramos no livro Trinta Anos com Chico Xavier, de Clovis Tavares, Edição Calvário, um relato bem elaborado sobre a mediunidade poliglota do médium mineiro. O autor foi testemunha ocular de alguns casos e colheu informações fidedignas de muitos outros, ocorridos em Pedro Leopoldo, permitindo-lhe relatar o recebimento de mensagens em vários idiomas, ignorados pelo médium Chico Xavier, tais como: luxemburguês, alemão, italiano, árabe, grego e castelhano.
[16] Folha Espírita, São Paulo, Abril de 1979, Ano VI, Nº 61, p. 10.