Conheço Josyan Courté há longo tempo, desde os anos 1960. Participamos de atividades doutrinárias conjuntas, sempre vinculadas a Chico Xavier.
Amigo e colaborador direto do saudoso José Gonçalves Pereira, o que descreve neste seu depoimento tem “fé pública”, pois Josyan possui a dignidade da nobre estirpe do patriciado romano, de que é exemplo Publius Cornelius Lentulus, cujo caráter e retidão denotava a marcante influência da gens Cornelia, transmitida por sua mãe. n
Na noite fria de 09.08.1966, sob um luar intenso, Chico e eu dirigimo-nos ao lar dos irmãos João e Lázaro, para participar do “Culto da Oração” que lá se realizava em periferia distante, na cidade de Uberaba.
Sentamo-nos à pequena e rústica mesa com mais alguns poucos companheiros. Chico pediu-me para proferir a prece inicial. Eu tinha acabado de memorizar a “Prece de Lívia”, n porém, mesmo assim, retirei do bolso um fragmento de papel onde li, pausadamente:
“Senhor Jesus, abençoa-nos a fé com que esperamos por ti!… Agradecemos-te a felicidade de nosso encontro e o tesouro da amizade com que nos teces a união. Louvores te rendemos pelo auxílio de nossos companheiros e pelas lições de nossos inimigos. Ensina-nos a descobrir a tua vontade no escuro caminho de nossas provas…
“Dá-nos a conformação ante a dor e a certeza de que as trevas nos conduzirão à verdadeira luz! Senhor, concede-nos a humildade de teu exemplo e a ressurreição de tua cruz! Assim seja!…”
Após a prece, ouviu-se um ruído forte e rouco, como de um vento impetuoso, e o médium Xavier começou a psicografar a página “Prodígios da Fé” de Albino Teixeira.
Quando o vento emudeceu, vimos o médium colocar o lápis à sua frente, apoiando a cabeça com as duas mãos, mantendo os olhos cerrados.
Supúnhamos que a reunião estava para terminar, mas tal não ocorreu. Chico retomou o lápis e psicografou o lindo soneto “Caridade” de Auta de Souza.
Após a psicografia, Lázaro retornou a palavra a Chico, que começou a orar a Prece Dominical, para finalizar a reunião.
Nesse momento, irrompeu maravilhoso fenômeno de efeitos físicos.
As palavras saíram da boca do médium, como escritas em pontos de luz, revestidas de intenso brilho dourado, como que flutuando no ar, desaparecendo bem devagar.
Ah! Jesus, como te agradecer, Senhor, as bênçãos recebidas através da mediunidade gloriosa de Francisco Cândido Xavier?
Os demais componentes da mesa, tão surpreendidos como eu, tentavam tocar as lindas palavras luminosas com as pontas dos dedos, o que fazia expandir intenso aroma, que mais tarde vim a identificar como sendo de nardo puro.
Demoramos a nos recompor da emoção e quando saímos em direção do carro para retornar, pequena multidão de carentes, vizinhos dos irmãos João e Lázaro, tão necessitados quanto eles próprios, se comprimiam, aguardando a presença de Chico, como derradeira esperança de amparo naquela noite clara e gelada.
Espontaneamente formaram uma fila. Chico não relutou em atendê-los, um a um, conversando com cada qual quanto quisessem, entregando a todos, sem exceção, cédulas de papel moeda de pequeno valor, o que denominou alegremente como sendo “distribuição de laranjada”, mas que, na verdade, foi um dos “cultos da assistência” mais relevantes que presenciei na minha vida.
Aquelas pessoas, que para o mundo ilusório de César nada significavam, para Chico eram muito, mas muito importantes mesmo, tanto que lhes declinava o nome com intensa amabilidade, como em um encontro de familiares muito queridos.
Foi nessa oportunidade que indaguei do ancião João se ele sabia desde quando o Chico mantinha coberta a cabeça com um gorro escuro que cobria desde a testa à nuca. João respondeu-me que, no dia anterior, o teria visto sem tal acessório da indumentária.
Naquela noite ninguém sabia ainda o que ele queria ocultar: as marcas dos sinais da crucificação do Cristo, em sua própria cabeça, marcas que apareceriam e sumiriam até se fixarem em definitivo, obrigando-o ao sigilo absoluto.
Já dentro do carro, lembro-me que Chico falou da sua grande alegria em ter recebido a comunicação de Auta de Souza, que retornou através da psicografia após muito tempo de ausência.
Perguntei-lhe da identidade de Albino Teixeira, ele respondeu-me tratar-se de pessoa que vivera na Guanabara, e, na Vida Espiritual, apresentava-se como um “Espírito completista”.
A respeito do fenômeno observado na prece final, pretendi obter melhores esclarecimentos, mas ele apenas respondeu-me ter sentido, no encerramento da reunião, a presença de sua mãe, e nada mais adiantou. Retornando a São Paulo, dei-me pressa em relatar os detalhes da viagem a José Gonçalves Pereira, o construtor da enorme obra assistencial levantada às margens do Tietê, na altura do Belenzinho, nos idos de 1960.
Gonçalves, Joaquim Alves, José Bissolli eram amigos de Chico desde a época em que ele realizava sessões de materialização (1952-1953), ocasião em que D. Alvina, mãe de Gonçalves, se materializara por inteiro, à frente do filho.
Essas magníficas reuniões, que apresentavam os Espíritos revestidos com o “ectoplasma” transcendente e luminoso de Chico, foram suspensas por Emmanuel, para atender a prioridade do livro, já que o desgaste físico do Chico era enorme.
Porém, depois daquelas reuniões, só restou àqueles companheiros construírem a “Casa Transitória de Fabiano”, encabeçados pela liderança de Gonçalves dentro do princípio evangélico: “muito se pedirá a quem muito recebeu”.
Relatou-nos Julinha (Julia Tecla Kolheisen) — a mensageira da caridade junto aos hansenianos abrigados em Pirapitingui — que Emmanuel, quando encerrou aqueles trabalhos de materialização, dissera aos presentes que lhes estavam sendo adiantados “cinquenta anos de aprendizado prático espírita-cristão”.
Gonçalves e os demais companheiros compreenderam perfeitamente o recado e procuraram dar conta do crédito espiritual recebido.
Itatiba, 8 de julho de 2011.
Josyan Courté
[1] O depoimento acima foi extraído do folhetim COMUNICAÇÃO - Ano 45, nº 196, abril a junho de 2012. Editado pelo GEEM - Grupo Espírita Emmanuel.
[2] “Prece de Lívia” — Ainda não conseguimos identificar a fonte de origem dessa prece, mas no livro Ave, Cristo! de Emmanuel temos o “Hino às Estrelas” de Lívia.