Pedro Leopoldo, 23 de abril de 1957.
1 Querido José
Jesus nos abençoe e ampare sempre.
2 Estou aqui nesta carta para agradecer-lhe todo o acervo de alegrias que tenho recebido (como sempre) de seu carinho… Qual acontece habitualmente, as palavras me fogem. Em razão disso, meu caro José, concentro-me na oração, rogando ao Senhor lhe retribua. Só Jesus, em Sua Infinita Bondade, poderá compensar-lhe a dedicação e a ternura.
3 Sinceramente, não sei mais enumerar todas as lembranças que tenho recebido nas semanas últimas. É tão grande o seu devotamento e as dádivas são tantas que rogo a você, à Luiza e às nossas queridas Alvina, Jeny e Eny considerarem apenas o meu coração, desculpando as falhas de minha memória, sim? Deus os recompense por tudo.
4 Pelas mãos do nosso estimado Paulo, recebi as encomendas que você me enviou pelo nosso Sylvio. Segundo o programa anteriormente traçado, achava-me ausente daqui, nos dias do Centenário, e o nosso caro amigo deixou-me as suas lembranças com Paulo e Wanda. Fiquei encantado com os livros. A edição de “O Livro dos Espíritos” – 1857 – é um extraordinário documento para nossos estudos. n Esse livro primeiro com o montante do material que Allan Kardec publicou (excetuando-se, a meu ver, o livro Obras Póstumas, que não é publicação de Kardec e sim dos amigos do Codificador que lhe reuniram apontamentos pessoais) representa aos meus olhos o manancial e a fonte, formando a origem de nossa Redentora Doutrina. 5 Manancial e fonte constituindo um todo, por que sem o manancial a fonte não existiria e sem a fonte o manancial estaria reduzido à condição de um poço estagnado. Allan Kardec terá assim agido à feição de um engenheiro divino, edificando justo caminho às águas vivas do Cristianismo renascente no Espiritismo, águas essas que hoje se espraiam em todas as direções, fertilizando os campos mentais do mundo.
6 Nosso admirável Dr. Canuto prestou inolvidável serviço à Nossa Causa, trazendo a lume o texto de 1857. Podemos, assim, estudar os assuntos da Codificação e reexaminá-los, no limiar do nosso segundo século de trabalho, para o qual, com o auxílio de Jesus daremos nossas melhores forças, não é? Creia que já estou fazendo planos para nossas tarefas em 2057. Já podemos contar cem anos de graças sobre graças. E temos recebido tanto de nossa Doutrina Maternal que acredito deva ser crescente o nosso entusiasmo por vê-la cada vez mais nobre e mais engrandecida.
7 Minha maior felicidade será se Jesus me conceder a ventura de reencarnar-me logo depois que me desenfaixar do corpo de que presentemente disponho para seguir de, algum modo, ainda mesmo reconhecendo a minha indigência de tudo, a marcha do Espiritismo que nos devolve Jesus em Sua Grandeza. 8 Penso que em 2057, nossos alicerces já se mostrarão mais sólidos. A ciência terá acordado para deveres mais amplos e estará, com a ajuda de Deus dando mão forte à religião para as nossas conquistas definitivas do Espírito. A Terra terá sofrido mais um pouco, provavelmente com as guerras e renovações que virão inevitáveis, e por isso mesmo revelar-se-á mais compreensiva e mais bela…
9 Medito no futuro com grande enternecimento e… vou sonhando… sonhando…
Oh! como seremos felizes se pudermos prosseguir trabalhando, na esfera de luta em que o Senhor nos permite agir agora!…
Perdoe-me, meu filho, os transportes do coração.
10 O selo, felizmente, foi lançado com brilhantismo. Louvado seja Deus: Envio a você, Luiza, Alvina, Jeny e Eny um cartão do dia 18. Apesar de somente datá-lo hoje, empreguei a data de 18 para significar nosso júbilo, ante a passagem do Primeiro Centenário.
11 É uma felicidade pensar que o Brasil teve a honra de lançar à cultura terrestre o primeiro selo comemorativo espírita. Deus nos conserve unidos e diligentes no serviço abençoado de nossa fé.
12 Agradeço a você as bandeiras. De todo o material do Centenário, principalmente impressos, que tenha sido lançado em São Paulo, ficaria contente se você me mandar cópias, dentro do que seja possível. Não se preocupe, porém. Quando o seu carinho dispuser de alguma duplicata do material que possa ser coletado enviar-me-á com a sua gentileza de sempre, não é? Não vá se afligir com a minha solicitação.
13 Quando teremos o prazer de nosso abraço? Fico na expectativa de suas notícias, sim? Estarei em Pedro Leopoldo, se Deus quiser, até o dia 26 de maio próximo. Dia 27 devo sair em serviço com um de meus chefes de trabalho. Aguardarei, assim, o seu pronunciamento, afim de combinarmos nosso encontro. Espero o seu abraço com imensa alegria.
14 Entregarei quinta-feira próxima os livros que você enviou para os nossos caros Arnaldo e Enio. Farei a entrega em seu nome, pois sei como ficarão satisfeitos.
Aguardo o “Ação e Reação” a qualquer momento. Logo chegue a Pedro Leopoldo, seguirá para São Paulo, sim?
15 Espero que a reunião das caravanas de fraternidade em Ribeirão Preto tenha atingido os melhores resultados. Conseguiu você algo no sentido de incluir a criança no trabalho de assistência? Creio que aos meninos não deve ser outorgado serviço igual àquele que se recomenda aos adultos, mas admito a importância de colocarmos as crianças felizes no auxílio às crianças infortunadas, para que; cedo aprendam a valorizar as dádivas divinas, crescendo mentalmente para a Compreensão Maior. 16 Aliás, semelhante trabalho tenho aprendido com duas benfeitoras de minh’alma — Meimei no mundo espiritual e Alvina neste mundo. Sinto que isso é um ponto muito expressivo, por que quando os jovens se aproximam de nossas Mocidades Espíritas, na maioria das vezes, já trazem consigo hábitos e concepções difíceis de modificar. Se pudermos conduzir a criança por um caminho de mais amplo entendimento, creio que os problemas serão muito suavizados para a juventude.
17 Meu filho, desculpe-me esta carta assim longa… Muitas lembranças para todos os nossos, todos…
Um abraço para Luiza, Alvina, Jeny, Eny, Iza, Jo, Robe, Zora, Bissoli e para todos os nossos do coração.
Agradecendo a você mais uma vez por todas as bênçãos de seu carinho e de seu amor, envio-lhe minh’alma sempre com vocês, reconhecidamente. n
Chico
[1] Veja a imagem do frontispício do Livro dos Espíritos no original em francês da edição de 1857 no serviço Google - Pesquisa de livros
[2]
Cópia desta carta, que foi datilografada em máquina de escrever, encontra-se
sob a custódia do Dr. Eurípedes Higino, filho adotivo do Chico; no final
da mesma o Chico acrescentou breve
nota manuscrita.