1 Lá vai…
— Que é?
— Um oceano de suor. n
2 Lá vai…
— De onde vem?
— Da nascente do nada.
3 Lá vai… 36
— Aonde vai?
— Ao estuário do infinito.
4 Afinal, a libertação.
Momento de apoteose na Eternidade.
Fieiras de milênios e de vidas…
Labirintos de ideias e paixões…
Andanças, quedas, levantares,
novas quedas, novos recomeços…
5 Agora, outras formas, outras dimensões,
outros grãos da poeira cósmica.
Novos céus, novas terras, novos Cristos…
6 Múltiplas emoções fluem da Inteligência.
Novos ares do Universo,
novos panoramas,
novas perspectivas
no calidoscópio do existente… n
7 Rompimento do indevassável,
vitória sobre o impossível,
disciplina do caos…
8 Além dentro do ser…
Além sem limitações… n
Além, além do além… n
Convivência mais íntima nas causas…
9 Aonde pensa
o viandante das nebulosas?
O que faz ele?
Qual a sua fisionomia?
10 Voltará por aqui?
Ninguém sabe… n
Ninguém sabe… n
|
JORGE Mateus DE LIMA — Tendo concluído o curso médico, em 1914, no Rio de Janeiro, volta Jorge de Lima, em 1922, a Maceió, onde é recebido como o “Príncipe dos Poetas Alagoanos”. Poeta, romancista, jornalista, contista, ensaísta, professor de Literatura na Universidade do Brasil, era um talento multívio. Em sua última fase literária, após ter abandonado o modernismo regionalista que tanta fama lhe trouxera, J. de Lima “incursionou pela poesia religiosa e terminou cultuando uma poesia quase abstrata, ou tirante a escrita automática”. (Péricles E. da Silva Ramos, in A Lit. no Brasil, III, t. 1, pág. 609.) Referindo-se ao Livro de Sonetos do poeta, J. Fernando Carneiro “informa, com sua autoridade de médico, amigo e exegeta de Jorge de Lima, que ele escreveu todo o livro, 77 sonetos e mais 25 que continuaram inéditos, em pleno estado hipnagógico e no espaço apenas de 10 dias”. (apud A. Rangel Bandeira, Jorge de Lima…, pág. 115. ) “O poeta que escreveu a Invenção de Orfeu, e se chamou Jorge de Lima,” — disse Eduardo Portella — “foi dos mais complexos e fortes de toda a nossa poesia moderna.” “Muitas vezes” — observa Rangel Bandeira (ibidem, pág. 123) — “Invenção de Orfeu dá a impressão de ter sido um livro psicografado; era Jorge de Lima que registrava seu próprio delírio.” Segundo Fernando Carneiro, o poeta alagoano foi “a encarnação da bondade”: “Tudo em Jorge de Lima estava envolto num halo de bondade, até a sua tristeza, até as suas fraquezas.” (União dos Palmares, Est. de Alagoas, 23 de Abril de 1893 * — Rio de Janeiro, Gb, 15 de Novembro de 1953.) — (*) Ver Antônio Rangel Bandeira, Op. cit., pág. 16.
BIBLIOGRAFIA: XIV Alexandrinos; Poemas; Poemas Escolhidos; Tempo e Eternidade; Invenção de Orfeu; etc.
Nota. Vamos, em seguida, transcrever pequeno trecho do “Poema do Cristão”, de A Túnica Inconsútil (apud Luiz Santa Cruz, N. Cl., nº 26, pág. 57), de autoria do distinto poeta, quando ainda entre os homens:
“Os milênios passados e os futuros
não me aturdem porque nasço e nascerei,
porque sou uno com todas as criaturas,
com todos os seres, com todas as coisas,
que eu decomponho e absorvo com os sentidos,
e compreendo com a inteligência
transfigurada em Cristo.
Tenho os movimentos alargados.
Sou ubíquo: estou em Deus e na matéria;
sou velhíssimo e apenas nasci ontem,
estou malhado dos limos primitivos,
e ao mesmo tempo ressoo as trombetas finais,
compreendo todas as línguas, todos os gestos, todos os signos,
tenho glóbulos de sangue das raças mais opostas.”
[1] 2-15. Exemplos de anadiplose: “…este meu corpo, / este meu corpo… — “E esta luz,/ esta luz que…”
[2] 5-18-23. “Para onde foram as minhas rugas?!/ Esconderam-se as rugas”; “Se não estivesse tão calmo, teria medo,/ muito medo…”; “Mas, a memória!?/ Oh! memória”. Exemplos de epífora: “Nome dado à FIGURA que resulta quando se repete a mesma palavra ou frase no fim de vários VERSOS…” (Geir Campos, Op. cit.)
[3] 7-8. Aonde-Onde. No Roteiro Literário do Brasil e de Portugal, vol. I, pág. 48, nota 5, lê-se: “onde: aonde. Nos melhores autores, antigos ou modernos, não se observa, em geral, a distinção entre onde e aonde que os gramáticos acham ser de rigor.”
[4] Refere-se o poeta à possibilidade que tem o Espírito de se locomover pela volitação.
[5] 29-36. Exemplos de anáfora: “Ah! se eu pudesse!” e “Lá vai…”
[6] Atente-se na hipérbole.
[7] Observem-se a enumeração e os diversos exemplos de poliptoto.
[8] Anáfora.
[9] Epanalepse, mesarquia e mesotelêuton: “Além, além do além…”
[10] Observe-se, ainda, a palilogia: “Ninguém sabe… / Ninguém sabe…” Palilogia: “Nome dado à FIGURA que resulta quando se repete por inteiro uma frase ou um VERSO,… (Geir Campos, Op. cit.)