O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Antologia dos Imortais — Autores diversos — 2ª Parte — Waldo Vieira


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Luís Guimarães Júnior n

PASTORAL

1 Acompanho a canção que a vida tece…
Chovem raios de sol doirando o espaço…
Verte o rio fugindo, passo a passo,
Do monte em cujos pés o lírio cresce…


2 Um trilo doce ecoa igual à prece…
Dorme a rosa em botão… Canta o sanhaço…
A flor que não se rende ao vento escasso,
Calma, espera na leira a farta messe…


3 À luz do firmamento azul e escampo,
Abrem-se mamonais sorrindo ao campo,
E a brisa, leve e morna, escala a serra…


4 Meu coração soluça, sonha ainda,
E escuta as queixas da saudade infinda,
Quando volito além, fitando a Terra… n


MATINADA

1 Ampla luz se desnastra, onda por onda,
Desponta a madrugada purpurina…
O carreiro das lágrimas termina,
Minha alma acorda, anseia, indaga, sonda…


2 Subo, encantado e pasmo… A etérea ronda
Das estrelas, na abóbada divina,
Lembra flores, em monte, na campina
Que o Eterno Lavrador cultiva e esmonda…


3 A saudade aparece… O peito chora…
Gaturamo rompendo os véus da aurora,
Onde encontrar meu ninho nesses ramos?


4 Torno à Terra, em soluços de alegria!…
Bendito seja Deus que nos confia
O amor por céu na luz do lar que amamos!



[1] LUÍS Caetano Pereira GUIMARÃES JÚNIOR — Poeta, jornalista, contista, comediógrafo, formou-se em Direito pela Faculdade do Recife, em 1869, depois de iniciar os estudos na Faculdade de S. Paulo, seguindo a carreira diplomática. Foi adido à legação brasileira no Chile, em Londres e em Roma, além de haver exercido as funções de secretário de legação em Lisboa. Aposentou-se no cargo de ministro plenipotenciário, na Venezuela. Sócio de várias Associações culturais do Brasil e do estrangeiro, foi fundador da cadeira nº 31 na Academia Brasileira de Letras. Ronald de Carvalho (Peq. Hist. Lit. Brasileira, págs. 287-288), ao estudar a poesia de Luís Guimarães Júnior, acentuou que “as notas descritivas predominam, geralmente, sobre as subjetivas, o artista sobreleva ao poeta, e o pintor se avantaja ao filósofo”, acrescentando, adiante: “Há nos seus painéis um laivo de ternura discreta, um sentimento de melancolia muito particular.” Prefaciando-lhe Sonetos e Rimas, Fialho de Almeida chamou-lhe “o Massenet do soneto” (apud Iracema G. Vilela, Luiz Guimarães Júnior, pág. 110). (Rio de Janeiro, Gb, 17 de Fevereiro de 1845 — Lisboa, 19 de Maio de 1898.) n
BIBLIOGRAFIA: Corimbos; Sonetos e Rimas; Poema dos Mortos; Filigranas; etc.


[2] Verso 14 - Neste soneto primoroso, o Autor se identifica perfeitamente, não apenas pela forma, em tudo semelhante ao que produziu quando encarnado, mas sobretudo pelo fundo. Vejamos alguns versos de uns poucos sonetos do artista de Corimbos. Comecemos pelo “Noite Tropical” (apud Pan. III, pág. 24):

   “Dorme a fazenda: — apenas hesitante
A voz do cão, em uivos assustados,
Corta o silêncio, e vai nos descampados
Perder-se como um grito agonizante.” (2º quarteto.)

Em “Madrugada na Roça” (id., pág. 25), é interessante o 1º quarteto:


   “Dentro da sombra matinal os campos
Riem-se ao fresco pranto da alvorada,
Sobre a planície verde e rociada
Voa o bando dos tardos pirilampos.”

Cf., ainda, “Paisagem” (id., pág. 26) e observemos o ritmo dos versos quase que sublimes.

Por fim, em “Idade Média”, vejamos o último terceto:

   “— Penso que um dia nos azuis espaços,
Livre afinal do mundo e dos teus braços,
Minha alma voará como a andorinha.”

Atentemos, ainda, no esquema rimático usado: abba para os quartetos (o preferido pelo poeta, inclusive em “Visita à Casa Paterna”, “Noite de São João”, “Soneto Romântico”, “Veneza” e outros sonetos) e para os tercetos o mesmo de “Veneza”, “Idade Média”, “A Borralheira”, etc. As rimas auditivas (tece c/ cresce, espaço c/ passo, prece c/ messe, sanhaço c/ escasso) não eram estranhas ao autor, que soube tão bem servir-se de rimas até imperfeitas, como por exemplo: bela c/ compreendê-la, “resvela” por resvala, em “Noite de São João”, dela c/ estrela e bela, em “Madrugada na Roça”, secreto c/ soneto, em “A Borralheira”.

Sobre o verbo volitar, Cf. nota 13, PARTE I, pág. 42.


[3] Veja-se O Ocidente, Revista Ilustrada de Portugal e do Estrangeiro, Lisboa, 30 de Maio de 1898, pág. 128.


Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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