1.
Nota. – Nesta sessão, nenhuma pergunta prévia tinha provocado
o assunto que foi tratado. Inicialmente o médium se havia ocupado de
saúde; depois, pouco a pouco, viu-se conduzido às reflexões, cuja análise
damos a seguir. Falou durante cerca de uma hora, sem interrupção.
2. — Os progressos do Espiritismo causam aos seus inimigos um pavor que não podem dissimular. No começo brincaram com as mesas girantes, sem pensar que acariciavam uma criança que devia crescer; a criança cresceu… então eles pressentiram o seu futuro e disseram de si para si que em breve estariam com a razão… Mas, como se diz, a criança tinha sete fôlegos. Resistiu a todos os ataques, aos anátemas, às perseguições, mesmo às zombarias. Semelhante a certos grãos que o vento carrega, produziu inúmeros rebentos; para um que destruíam, brotavam cem outros.
Primeiro empregaram contra ele as armas de uma outra era, as que outrora eram bem-sucedidas contra as ideias novas, porque essas ideias não passavam de lampejos esparsos, que tinham dificuldade de vir à luz através da ignorância e porque ainda não haviam criado raízes nas massas… hoje é outra coisa, tudo mudou: os costumes, as ideias, o caráter, as crenças; a Humanidade não mais se inquieta com as ameaças que amedrontavam as crianças; o diabo, tão temido por nossos ancestrais, já não causa medo: riem dele.
Sim, as armas antigas se gastaram contra a couraça do progresso. É como se, em nossos dias, um exército quisesse atacar uma praça forte, guarnecida de canhões, com as flechas, os aríetes e as catapultas dos nossos antepassados.
Os inimigos do Espiritismo viram, pela experiência, a inutilidade das armas carcomidas do passado contra a ideia regeneradora; longe de o prejudicar, seus esforços só serviam para o propagar.
Para lutar vantajosamente contra as ideias do século, seria preciso estar à altura do século; às doutrinas progressistas seria necessário opor doutrinas ainda mais progressistas; mas o menos não pode sobrepujar o mais.
Não podendo, pois, triunfar pela violência, recorreram à astúcia, a arma dos que têm consciência de sua fraqueza… de lobos, fizeram-se cordeiros, para se introduzirem no aprisco e aí semearem a desordem, a divisão, a confusão. Porque conseguiram lançar a perturbação em algumas fileiras, cedo demais se julgaram senhores da praça. Nem por isto os adeptos isolados deixaram de continuar sua obra, e diariamente a ideia abre o seu caminho sem muito alarido… Eles é que fizeram barulho… Não a vedes penetrar em toda parte? nos jornais, nos livros, no teatro e mesmo no púlpito? Ela trabalha todas as consciências; arrasta os espíritos para novos horizontes; é encontrada em estado de intuição naqueles mesmos que dela não ouviram falar. Eis um fato que ninguém pode negar e que cada dia se torna mais evidente. Não é a prova de que a ideia é irresistível e que é um sinal dos tempos?
Aniquilá-lo, portanto, é uma coisa impossível, porque seria preciso aniquilá-lo não num ponto, mas no globo inteiro; e, depois, as ideias não são levadas nas asas dos ventos? e como atingi-las? Pode-se pegar fardos de mercadorias na alfândega; mas, ideias! elas são inatingíveis.
3. — Que fazer, então? Tentar apoderar-se delas, para as acomodar à sua vontade… Pois bem! é o partido pelo qual se decidiram. Disseram a si mesmos: O Espiritismo é o precursor de uma revolução moral inevitável; antes que se realize completamente, tratemos de a desviar em nosso proveito; façamos de modo que aconteça com ela como com certas revoluções políticas; desnaturando o seu espírito, poder-se-ia imprimir-lhe outro curso.
Assim, o plano de campanha está mudado… Vereis se formarem reuniões espíritas, cujo objetivo confessado será a defesa da doutrina, e cujo objetivo secreto será a sua destruição; supostos médiuns que terão comunicações encomendadas, adequadas ao fim a que se propõem; publicações que, à sorrelfa do Espiritismo, se esforçarão para o demolir; doutrinas que lhe tomarão algumas ideias, mas com o pensamento de o suplantar. Eis a luta, a verdadeira luta que ele terá de sustentar, e que será perseguida obstinadamente, mas da qual sairá vitorioso e mais forte.
Que podem os homens contra a vontade de Deus? É possível desconhecê-la diante do que se passa? Seu dedo não é visível nesse progresso que desafia todos os ataques? nesses fenômenos que surgem em toda parte como um protesto, como um desmentido dado a todas as negações?… A vida dos homens, a sorte da Humanidade, não está em suas mãos?… Cegos!… Eles não contam com a nova geração que se ergue e que diariamente suplanta a geração que se vai… Mais alguns anos e esta terá desaparecido, não deixando atrás de si senão a lembrança de suas tentativas insensatas, para deter o impulso do espírito humano que marcha, marcha a despeito de tudo… Eles não contam com os acontecimentos que vão apressar a eclosão do novo período humanitário… com os apoios que vão levantar-se em favor da nova doutrina e cuja voz poderosa imporá silêncio aos seus detratores em razão de sua autoridade.
4. — Oh! como estará mudada a face do mundo para aqueles que virem o começo do próximo século!… Quantas ruínas verão em sua retaguarda, e que esplêndidos horizontes se abrirão à sua frente!… será como a aurora afastando as sombras da noite… Aos ruídos, aos tumultos, aos rugidos da tempestade sucederão cantos de alegria; depois das angústias, os homens renascerão para a esperança… Sim! o século vinte será um século abençoado, porque verá a era nova, anunciada pelo Cristo.
Nota. – Aqui o médium para, dominado por indizível emoção
e como que esgotado de fadiga. Após alguns minutos de repouso, durante
os quais parece voltar ao grau de sonambulismo ordinário, continua:
– Que vos dizia eu, então? – Faláveis do novo plano de campanha dos adversários do Espiritismo; depois considerastes a era nova. – É isso.
5. — Enquanto esperam, disputam o terreno palmo a palmo. Renunciaram mais ou menos às armas de outros tempos, cuja ineficácia reconheceram; agora ensaiam as que são todo-poderosas neste século de egoísmo, de orgulho e de cupidez: o ouro, a sedução do amor-próprio. Junto aos que são inacessíveis ao medo, exploram a vaidade, as necessidades terrenas. Aquele que se obstinou contra a ameaça, às vezes dá ouvidos complacentes à lisonja, ao atrativo do bem-estar material… Prometem pão a quem não o tem, trabalho ao artesão, clientela ao negociante, promoção ao empregado, honras aos ambiciosos se renunciarem às suas crenças; ferem-nos em sua posição, em seus meios de subsistência, em suas afeições, se são indóceis; depois, a miragem do ouro produz sobre alguns seu efeito ordinário. Nesse número encontram-se, necessariamente, alguns caracteres fracos, que sucumbem à tentação. Há os que caem na armadilha de boa-fé, porque a mão que os dirige se esconde… Há, também, e muitos, que cedem à dura necessidade, mas que não pensam menos nisto; sua renúncia é apenas aparente; curvam-se, mas para se erguerem na primeira ocasião… Outros, os que têm em mais alto grau a verdadeira coragem da fé, afrontam o perigo resolutamente; esses vencem sempre, porque são sustentados pelos Espíritos bons… Alguns, oh!… mas estes jamais foram espíritas de coração… preferem o ouro da Terra ao ouro do céu; ficam, pela forma, ligados à doutrina e, sob esse manto, apenas servem melhor à causa de seus inimigos… É uma triste troca que fazem e que pagarão muito caro!
6. — Nos tempos de cruéis provas que ides atravessar, ditosos aqueles sobre os quais se estender a proteção dos Espíritos bons, porque jamais esta foi tão necessária!… Orai pelos irmãos transviados, a fim de que aproveitem os breves instantes de mora que lhes são concedidos, antes que a justiça do Altíssimo se torne mais pesada sobre eles… Quando virem rebentar a tempestade, mais de um exclamará graça! Mas lhes será respondido: Que fizestes dos nossos ensinos? Vossos médiuns não escreveram centenas de vezes a vossa própria condenação?… Tivestes a luz, e não a aproveitastes; nós vós tínhamos dado um abrigo: por que o abandonastes? Sofrei, pois, a sorte daqueles que preferistes. Se vosso coração tivesse sido tocado por nossas palavras, teríeis ficado firmes no caminho do bem, que vos era traçado; se tivésseis tido fé, teríeis resistido as seduções armadas contra o vosso amor-próprio e a vossa vaidade. Então acreditastes no-las impor, como aos homens, por falsas aparências? Sabeis, se duvidastes, que não há um só movimento da alma que não tenha seu contragolpe no mundo dos Espíritos?
7. — Credes que seja por nada que se desenvolve a faculdade da vidência em tão grande número de pessoas? que seja para oferecer um novo alimento à curiosidade que hoje tantos médiuns adormecem espontaneamente em sono de êxtase? Não; desiludi-vos. Esta faculdade, que há tanto tempo vos é anunciada, é um sinal característico dos tempos que são chegados; é um prelúdio da transformação, porque, como vos foi dito, deve ser um dos atributos da nova geração. Essa geração, mais depurada moralmente, sê-lo-á também fisicamente; a mediunidade sob todas as formas será mais ou menos geral, e a comunhão com os Espíritos um estado, a bem dizer, normal.
Deus envia a faculdade de vidência nesses momentos de crise e de transição, para dar aos seus fiéis servidores um meio de desmanchar a trama de seus inimigos, porque os maus pensamentos, que se julgam escondidos na sombra dos refolhos da consciência, se refletem nessas almas sensitivas, como num espelho, e se descobrem por si mesmos. Aquele que só emite bons pensamentos não teme que se os conheça. Feliz o que pode dizer: Lede em minha alma como num livro aberto.
[Sem nome.]
Observação. – O sonambulismo espontâneo, do qual já falamos, não é, com efeito, senão uma forma de mediunidade vidente, cujo desenvolvimento já era anunciado há algum tempo, assim como o aparecimento de novas aptidões mediúnicas. É notável que em todos os momentos de crise geral ou de perseguição, as pessoas dotadas desta faculdade são mais numerosas do que nos tempos normais. Houve-os muito no momento da Revolução; os calvinistas das Cevenas, perseguidos como animais selvagens, tinham numerosos videntes que os advertiam do que se passava ao longe; por este fato, e por ironia, foram classificados de iluminados; hoje, começa-se a compreender que a visão a distância, independente dos órgãos da visão, pode bem ser um dos atributos da natureza humana, e o Espiritismo o explica pela faculdade expansiva e pelas propriedades da alma. Os fatos deste gênero se multiplicaram de tal maneira que já não causam tanta admiração; o que outrora parecia a alguns milagre ou sortilégio, é hoje considerado como efeito natural. É uma das mil vias pelas quais penetra o Espiritismo, de sorte que, se se estanca uma fonte, ele surge por outros caminhos.
Assim, esta faculdade não é nova, mas tende a generalizar-se, sem dúvida pelo motivo indicado na comunicação acima, mas, também, como meio de provar aos incrédulos a existência do princípio espiritual. No dizer dos Espíritos, ela se tornaria mesmo epidêmica, o que naturalmente se explicaria pela transformação moral da Humanidade, transformação que deveria produzir no organismo modificações que facilitassem a expansão da alma.
Como outras faculdades mediúnicas, esta pode ser explorada pelo charlatanismo. Desse modo, é bom precaver-se contra a trapaça que, por um motivo qualquer, poderia tentar simulá-la, e assegurar-se, por todos os meios possíveis, da boa-fé dos que dizem possuí-la. Além do desinteresse material e moral e da honorabilidade notória da pessoa, que são as primeiras garantias, convém observar com cuidado as condições e as circunstâncias nas quais se produz o fenômeno, e ver se nada oferecem de suspeito.