O ceticismo, no tocante à Doutrina Espírita, quando não resulta de uma oposição sistemática e interesseira, origina-se quase sempre do conhecimento incompleto dos fatos, o que não impede algumas pessoas de darem a questão por encerrada, como se a conhecessem perfeitamente. Pode-se ser muito espirituoso, ter muita instrução mesmo, e carecer-se de bom senso. Ora, o primeiro indício da falta de bom senso é a crença de alguém na própria infalibilidade. Muitas pessoas também só veem nas manifestações espíritas um objeto de curiosidade. Esperamos que, pela leitura deste livro, encontrem nesses fenômenos estranhos algo mais do um que simples passatempo.
A ciência espírita compreende duas partes: uma experimental, sobre as manifestações em geral, outra filosófica, sobre as manifestações inteligentes. Aquele que observou apenas a primeira está na condição de quem só conhece a Física pelas experiências recreativas, sem haver penetrado a filosofia da ciência. A verdadeira Doutrina Espírita está no ensino que os Espíritos deram, e os conhecimentos que esse ensino comporta são muito graves para serem adquiridos de outro modo que não seja por um estudo sério e perseverante, feito no silêncio e no recolhimento; somente nessa condição se pode observar um número infinito de fatos e particularidades que escapam ao observador superficial e permitem firmar uma opinião.
Se este livro não tivesse como resultado senão mostrar o lado sério da questão e provocar estudos nesse sentido, isso já seria muito, e nos sentiríamos felizes por haver sido escolhido para realizar uma obra sobre a qual, aliás, não pretendemos ter nenhum mérito pessoal. Esperamos que ele dê outro resultado, o de guiar os homens que desejam esclarecer-se, mostrando-lhes, em tais estudos, um fim grande e sublime: o do progresso individual e social e o de lhes indicar o caminho a seguir para o alcançar. Associar-nos-emos de todo coração a seus trabalhos e nos rejubilaremos com todas as comunicações que eles houverem por bem nos enviar a respeito.
O ensino dado pelos Espíritos prossegue, neste momento, sobre várias partes, cuja publicação eles adiaram a fim de disporem de mais tempo para os elaborar e completar. A próxima publicação, que será continuação dos três livros contidos nesta primeira obra, compreenderá, entre outras coisas, os meios práticos pelos quais o homem pode conseguir neutralizar o egoísmo, fonte da maioria dos males que afligem a sociedade. Este assunto diz respeito a todas as questões de sua posição no mundo e de seu futuro terrestre. 134
Nota — Esta segunda parte será publicada mediante subscrição, e destinada às pessoas que se inscreverem com esse objetivo, fazendo-nos seu pedido por escrito (sem qualquer ônus).
[133] N. T.: Muito mais resumido e com ligeiras modificações na sua redação, este epílogo corresponde, na edição definitiva de 1860, à XVII parte da “Introdução” de O Livro dos Espíritos.
[134] N. T.: Tudo indica que Allan Kardec está se referindo a O Livro dos Médiuns, publicado em 1861, e não, como pensam alguns, ao opúsculo Instrução prática sobre as manifestações espíritas, publicado em 1858.
