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EADE — Estudo Aprofundado da Doutrina Espírita — Programa II — Filosofia e Ciência Espíritas


Roteiro 9


Espírito

Objetivos:

» Conceituar Espírito do ponto de vista filosófico, científico e religioso.

» Refletir a respeito da interpretação espírita de Espírito.



IDEIAS PRINCIPAIS

  • Os conceitos filosóficos e científicos mais conhecidos indicam que Espírito é: alma racional ou intelecto; pneuma ou sopro animador; ser incorpóreo; matéria sutil; personalidade.

  • A expressão “Penso, logo existo”; de Descartes, é o conceito de Espírito mais aceito no meio científico.

  • Todas as religiões do passado e do presente concordam quanto ao princípio da existência do Espírito, e da sua sobrevivência além da existência física; porém, as interpretações, nesse aspecto, são diversificadas.

  • Para o Espiritismo há dois elementos distintos e gerais do Universo, ambos criados por Deus: Espírito e matéria. O Espírito é revestido de matéria semimaterial, o perispírito, que serve de molde à formação do corpo que será utilizado durante a reencarnação. O Espírito sobrevive à morte do corpo físico e pode […] renascer quantas vezes se fizerem necessárias, consonante o princípio da reencarnação. Quando encarnado, o Espírito é chamado alma. Allan Kardec: O Livro dos Espíritos, questões 27, 134, 135 e 135-a.



 

SUBSÍDIOS


Etimologicamente, a palavra Espírito, do latim spiritus, significa respiração ou sopro. Também pode referir-se a alma, coragem ou vigor. No grego, Espírito significa pneuma, traduzida como respiração (sopro) que, metaforicamente, descreve um ser, um espírito ou, até mesmo, influência espiritual. No hebraico, o termo para Espírito é ruah que, modernamente, pode ser simbolizado como psique (do grego psychein = soprar).

Originalmente, psique era utilizado como uma das características da vida humana; mais tarde evoluiu para a ideia de vida, propriamente dita, e, por fim, como sinônimo de alma, considerada o princípio da vida. A psique seria então a “alma das sombras” (dos mortos) em oposição à “alma do corpo”.

A palavra Espírito apresenta, portanto, dois contextos, um metafísico e outro metafórico. O primeiro faz parte das abordagens filosóficas. O segundo está relacionado ao sentido etimológico e ao simbolismo usualmente utilizados pelos poetas e escritores.

As religiões e as tradições espiritualistas consideram Espírito como um princípio incorpóreo. Segundo a Doutrina Espírita, Espírito (1) é a individualização ou humanização do princípio inteligente do Universo.

1. ESPÍRITO: CONCEITOS FILOSÓFICOS E CIENTÍFICOS


A Filosofia apresenta cinco interpretações básicas para Espírito, assim expressos:

  • Alma racional ou intelecto — que “[…] é o significado predominante na filosofia moderna e contemporânea, bem como na linguagem comum.” (2)

  • Pneuma ou sopro animador — conceito admitido desde a época dos filósofos estoicos, (28) para os quais Espírito é “aquilo que vivifica”. Essa interpretação permaneceria nos séculos seguintes, como este de Immanuel Kant (1724-1804), para quem Espírito é “[…] o princípio vivificante do sentimento.” (2)

  • Ser incorpóreo — genericamente, engloba as almas dos mortos, anjos e demônios. Dentro desse contexto, Kant também afirmava que “[…] Espírito é um ser dotado de razão e sentimento, que o vivifica.” (2)

  • Matéria sutil ou impalpável — conhecida como força que anima as coisas (conceito semelhante ao de pneuma). Alguns filósofos do Renascimento (3) (séculos XIII ao XVII) desenvolveram essa ideia, resgatada dos antigos estudos estoicos. Os seus principais representantes foram o ocultista cristão Heinrich Cornellius Agripa (1486-1537)  †  (4) e Paracelso (1493-1541)  †  (4), cujo nome verdadeiro era Philippus Aureolus Theophrastus Bombastus von Hohenheim, grande médico e ocultista.

  • Capacidade pensante — “Foi Descartes (1596-1650) quem introduziu e impôs esse significado. […] Portanto, a rigor, não sou mais que uma coisa que penso, um Espírito, um intelecto ou uma razão, termos cujo significado antes me era desconhecido (2) (Méditations touchant la premiéres philosophie - Google Books - , 1641)”.

As ideias de Descartes, sintetizadas na expressão “penso, logo existo” (cogito, ergo sum) definiram a linha do pensamento científico dos séculos seguintes, sobretudo entre o XIX e o XX, época da predominância das ideias positivistas. Seu pensamento persiste no meio científico da atualidade, de forma que Espírito pode ser sintetizado no conjunto de faculdades intelectuais, genericamente definidas como mente.


Para os filósofos espiritualistas, Espírito é um ser dotado de inteligência e sentimento, ou ser pensante dos cientistas. Para os cientistas materialistas, que nada admitem além da matéria, o Espírito é visto como um princípio material organizado por um conjunto de leis físicas que produziram, em consequência, o sistema nervoso, sede do pensamento. Nesse sentido, Espírito é o mesmo que inteligência (capacidade de conhecer).

Os exageros de algumas concepções filosóficas, religiosas e científicas criaram, contudo, dicotomia entre os conceitos de Espírito e de matéria. Aliás, Voltaire (1694-1778), pseudônimo de François-Marie Arouet, famoso escritor e filósofo iluminista francês, (29) analisou minuciosamente o verbete alma, distribuindo suas ideias em onze itens do seu livro Dicionário filosófico. Nesses itens, cujo resumo é apresentado em seguida, o filósofo destaca as diferentes ideias existentes à sua época.

  • […] Alma é um termo vago, indeterminado, que exprime um princípio desconhecido de efeitos conhecidos, que sentimos em nós. […] No sentido próprio e literal do latim e das línguas que dele derivam significa o que anima. (5)

  • […] Assim é que se disse da alma dos homens, dos animais, às vezes a planta das plantas, para indicar o seu princípio de vegetação e vida. (5)

  • Neste sentido, a alma era geralmente entendida como a origem, causa e a própria vida, fato que corroborava o conceito de que tudo morria com o corpo. Então, indagava o filósofo: […] Mas o que é princípio de nossa vida, o que é o princípio de nossos pensamentos, serão duas coisas diferentes? (5)

  • […] Ousamos por em questão se a alma inteligente é espírito ou matéria; se criada antes de nós; se sai do nada em nosso nascimento; se, depois de nos ter animado um dia na Terra, ela vive depois de nós na eternidade. (6)

  • […] Como, pois, somos tão atrevidos em afirmar o que é alma? Sabemos com certeza que existimos, que sentimos, que pensamos. (7)

  • […] O corpo da Igreja inteira definiu que a alma é imaterial. (8)

  • […] O homem é um ser que age, sente e pensa; aí está tudo o que sabemos dele. (9)

  • […] O maior benefício de que somos devedores ao Novo Testamento é o de nos ter revelado a imortalidade da alma. (10)

2. CONCEITOS HISTÓRICOS DE ALMA OU ESPÍRITO


Para os egípcios antigos (11) a alma estava ligada ao KA (perispírito), elemento imaterial e invisível, que sobrevivia à morte do corpo. A alma renascia inúmeras vezes e podia comunicar-se com os mortos. Os babilônicos “[…] acreditavam que a morte não era o fim da existência do homem. A vida futura, para eles, era tida como um “reino subterrâneo”, para onde caminhariam, sem distinção, todos os falecidos.” (12) Os hindus (13) admitiam a reencarnação do Espírito.

O culto aos antepassados, realizado pelos chineses (14) indica a crença na imortalidade do Espírito, fortemente arraigada às tradições espirituais desse povo. Já os antigos persas (15) (iranianos atualmente) seguiam os preceitos do sábio Zoroastro que, entre outros ensinamentos, pregava que os homens podiam ser influenciados pelos bons ou maus Espíritos.

3. O QUE É ESPÍRITO SEGUNDO O ESPIRITISMO


Para a Doutrina Espírita há dois elementos distintos e gerais do Universo, criados por Deus: Espírito e matéria. (16) O Espírito, encarnado ou desencarnado, está revestido de uma matéria semimaterial, o perispírito, (17) que serve de molde para construção do corpo físico. Quando encarnado, é chamado de alma, mas alma e Espírito são palavras sinônimas, (18) utilizadas respectivamente apenas para indicar o ser que possui corpo físico (encarnado) e o que não possui (desencarnado).

O estado natural do Espírito é de ser livre, de viver no plano espiritual, no qual o Espírito mantém sua personalidade e suas características individuais. Assim, as reencarnações, por mais numerosas que sejam, são sempre temporárias. Ainda segundo a Doutrina Espírita, a interação do Espírito com o corpo físico se dá, necessariamente, através do perispírito: “[…] Antes de se unir ao corpo, a alma é um dos seres inteligentes que povoam o mundo invisível e que revestem temporariamente um envoltório carnal para se purificarem e se esclarecerem.” (19)

Para os orientadores da Codificação, os “[…] Espíritos são a individualização do princípio inteligente, como os corpos são a individualização do princípio material. A época e o modo dessa formação é que são desconhecidos.” (20)

Quanto à natureza do Espírito, sabemos muito pouco a respeito, como esclarece Kardec:


A natureza íntima do Espírito propriamente dito, isto é, do ser pensante. nos é inteiramente desconhecida. Ele se nos revela pelos seus atos e esses atos não podem impressionar os nossos sentidos, a não ser por um intermediário material. O Espírito precisa, pois, de matéria, para atuar sobre a matéria. Tem por instrumento direto de sua ação o perispírito, como o homem tem o corpo. […] Depois, serve-lhe também de agente intermediário o fluido universal, espécie de veículo sobre o qual ele atua, como nós atuamos sobre o ar para obter determinados efeitos, por meio da dilatação, da compressão, da propulsão, ou das vibrações. (21)


Outro ponto fundamental, revelado pela Doutrina Espírita, é fazer clara distinção entre Espírito e matéria. O principal atributo do Espírito é a inteligência. O corpo físico e o perispírito são elementos materiais que se submetem à vontade do Espírito. Os órgãos e todas as estruturas biológicas do corpo físico e do perispírito são “animados” pelo fluido vital, uma das modificações do fluido cósmico universal, que lhes concede vitalidade.

Dessa forma, a Doutrina Espírita também não confunde Espírito com a energia vital que faz funcionar os sistemas, órgãos, tecidos e células do corpo físico e do perispírito. No cadáver já não há mais energia vital, fato que caracteriza o fenômeno da morte, mas o Espírito sobrevive, passando a viver em outra dimensão, no mundo espiritual, porém revestido do seu corpo perispiritual. Assim, esclarece Kardec: “O Princípio vital, é o princípio da vida material e orgânica, seja qual for a sua fonte, e que é comum a todos os seres vivos, desde as plantas até o homem. O princípio vital é coisa distinta e independente, já que pode haver vida com exclusão da faculdade de pensar.” (22)

4. CONCLUSÃO


Em síntese, afirma a Doutrina Espírita em relação ao Espírito:

  • A dúvida relativa à existência dos Espíritos tem como causa principal a ignorância acerca da sua verdadeira natureza. Geralmente, são figurados como seres à parte na Criação e cuja necessidade não está demonstrada. (23)

  • Seja qual for a ideia que se faça dos Espíritos, a crença neles necessariamente se baseia na existência de um princípio inteligente fora da matéria. (23)

  • Desde que se admite a existência da alma e sua individualidade após a morte, é preciso que se admita, também: 1º, que a sua natureza é diferente da do carpo, visto que, separada deste, deixa de ter as propriedades peculiares ao corpo; 2º, que goza da consciência de si mesma, pois é passível de alegria ou sofrimento, sem o que seria um ser inerte e de nada nos valeria possuí-la. (24)

  • Os Espíritos vivem no Plano espiritual: […] não um lugar determinado e circunscrito, mas o espaço universal: é todo um mundo invisível, no meio do qual vivemos, que nos cerca e nos acotovela incessantemente. (25)

  • Ora, essas almas que povoam o espaço são justamente aquilo a que chamamos Espíritos. Assim, pois, os Espíritos são apenas as almas dos homens, despojadas do invólucro corpóreo. Se os Espíritos fossem seres à parte, sua existência seria mais hipotética. Se, porém, se admitir que há almas, há que se admitir também os Espíritos que são simplesmente as almas e nada mais. Se se admitir que as almas estão por toda parte, ter-se-á que admitir igualmente que os Espíritos estão por toda parte. (26)

  • O Espírito […] é o ser que pensa e sobrevive [à morte]. O corpo não passa de um acessório do Espírito, de um envoltório, de uma veste, que ele deixa quando está usada. Além desse envoltório material, o Espírito tem um segundo, semimaterial, que o liga ao primeiro. Por ocasião da morte, despoja-se deste, porém não do outro, a que damos o nome de perispírito. Esse envoltório semimaterial, que tem a forma humana, constitui para o Espírito um corpo fluídico, vaporoso, mas que, pelo fato de nos ser invisível no seu estado normal, não deixa de ter algumas das propriedades da matéria. (27)

ORIENTAÇÕES AO MONITOR


1. No início da reunião, o monitor pede à turma para responder esta questão, justificando a resposta: Há Espíritos?

2. Ouvir e comentar as ideias apresentadas.

3. Em seguida, dividir a turma em três grupos para leitura, troca de ideias e elaboração da síntese de um dos itens deste Roteiro de Estudo, assim especificados:

4. Ao término do trabalho, pedir aos grupos que indiquem um relator para apresentar a síntese elaborada.

5. O monitor faz esclarecimentos a respeito do que foi relatado, esclarecendo possíveis dúvidas.

6. Como fechamento do estudo, apresenta as ideias que constam do item quatro (Conclusão) dos subsídios.



REFERÊNCIAS

1. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2010, questões 23-28, p. 87-90.

2. ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia - Google Books. Tradução de Alfredo Bosi e Ivone Castilho Benedetti. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 354.

3. Origem: https://pt.wikipedia.org/wiki/Renascimento

4. Origem: http://compossivel.wordpress.com/category/filosofia-renascentista/

5. VOLTAIRE. Dicionário filosófico - Google Books. Tradução de Ciro Mioranza e Antonio Geraldo da Silva. São Paulo: Editora Escala, 2008, p. 35.

6. Idem ibidem - p. 36.

7. Idem ibidem - p. 37.

8. Idem ibidem - p. 39.

9. Idem ibidem - p. 45.

10. Idem ibidem - p. 47.

11. XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da luz. Pelo Espírito Emmanuel. 37. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2008. Capítulo 4, p. 50-53.

12. BUENO, Taciano. O Espiritismo confirmado pela ciência - Google Books. 1ª ed. São Paulo: JR Editora, 2006. Capítulo3, item 69, p. 98-99.

13. XAVIER, Francisco Cândido. A caminho da luz. Op. Cit. Capítulo 5, p. 64.

14. Idem - Capítulo 8, p. 92.

15. IMBASSAHY, Carlos. Religião. 5. ed. Rio de Janeiro: FEB, 200. Item: Zoroastro, p. 181.

16. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Op. Cit. Questão 27, p. 88-89.

17. Idem - Questões 135 e 135-a, p. 149.

18. Idem - Questão 134, p. 148.

19. Idem - Questão 134-b, p. 149.

20. Idem - Questão 79, p. 120.

21. Idem - O Livro dos Médiuns. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. 1ª ed. Rio de Janeiro: FEB, 2008. Segunda parte, Capítulo 1, item 58, p. 95-96.

22. Idem - O Livro dos Espíritos. Op. Cit. Introdução, parte II, p. 26.

23. Idem - O livro dos médiuns. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. 1ª ed. Rio de Janeiro: FEB, 2008. Primeira parte, Capítulo 1, item 1, p. 22.

24. Idem ibidem - Item 2, p. 22.

25. Idem ibidem - p. 23.

26. Idem ibidem - p. 24-25.

27. Idem ibidem - Item 3, p. 25-26.

28. (Nota da organizadora) Estoicismo:  †  escola filosófica grega, fundada no século III a.C. por Zenão de Cítio. O estoicismo é uma doutrina filosófica que afirma que todo o universo é corpóreo e governado por um Logos divino (noção que os estoicos tomam de Heráclito e desenvolvem). A alma está identificada com este princípio divino, como parte de um todo ao qual pertence. Este logos (ou razão universal) ordena todas as coisas: tudo surge a partir dele e de acordo com ele; graças a ele o mundo é um kosmos (termo que em grego significa “harmonia”).

29. (Nota da organizadora) Iluminismo:  †  movimento surgido na França do século XVII e que defendia o domínio da razão sobre a visão teocêntrica que dominava a Europa desde a Idade Média. Para os filósofos iluministas o pensamento racional deveria ser levado adiante, substituindo as crenças religiosas e o misticismo que, segundo eles, bloqueavam a evolução do homem. O homem deveria ser o centro e passar a buscar respostas para as questões que, até então, eram justificadas somente pela fé.


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