O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Viajaram mais cedo — Familiares diversos


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Djalma Pompeu de Camargo Rangel

Santos (SP), 07 de outubro de 1960.
Santos (SP) — 16 de novembro de 1981.

Religioso, de formação espírita, tinha, Djalma, em sua cabeceira, o Evangelho Segundo o Espiritismo, que compulsava diariamente.

Gostava de motores e estudou até o terceiro ano ginasial.

Filho bondoso, ajudava muito os que lhe batiam à porta, com conselhos e cooperação material, sobretudo de alimentos, a famílias carentes.

Muito quieto em casa, nos últimos trinta dias que antecederam o acidente, tornou-se mais quieto ainda; certa feita, confessou ao pai que já estava um pouco cansado de viver, que já havia feito tudo o que tinha de fazer.

Rompeu inexplicavelmente o noivado no dia do acidente que o vitimou.

Filho único do casal, Sérgio Salgado e Maria Helena de Camargo Rangel.




DEPOIMENTO


Para mim, as palavras do Djalma significaram a continuação da vida, porque não tinha mais sentido viver.

Lendo, relendo as mensagens do querido filho, fui compreendendo que a vida continua.

Dirce n foi uma luz no meu caminho; ajudou-me muito e, por suas mãos, chegamos a Uberaba.


Maria Helena de Camargo Rangel




MENSAGEM


1 Querida mãezinha e meu caro pai Sérgio, peço-lhes me abençoem.

2 Estamos efetivamente tão juntos nas tarefas do bem, nas quais Jesus nos confiou encargos e bênçãos que nos alegram tanto, que entendo seja desnecessário um comunicado assim formal de minha parte.

3 O nosso amigo Carlos Alberto me favoreceu com a oportunidade de transmitir vários recados aos pais queridos e tenho, graças a Deus, aproveitado todas as ocasiões que se me apresentam, a fim de fazer-lhes sentir a continuidade de minha presença e de meu afeto.

4 Compreendo, apesar de tudo, que desejariam notícias tão minudenciadas quanto possível, sobre a minha transferência de Plano e aqui estou, na satisfação de abraçá-los, juntamente de nossa irmã Dirce e tantos amigos outros, tentando comunicar-lhes a certeza de que não sofri tanto como se imagina.

5 Sabem em que alto grau de estima conservava a moto que se me fez amiga para todos os momentos de trabalho ou mesmo de entretenimento com os irmãos de ideal e de luta e, por isso, compreendem que não me expressaria, no sentido de lastimar a minha condução preferida, que não teve culpa na ocorrência de novembro, daquele novembro que passou, no 1981, em que me preparava para as alegrias do Natal com a maior atenção.

6 Meus pensamentos estavam tranquilos e eu comandava a máquina sem qualquer excesso de que deva me penitenciar.

7 Tudo bem, no entanto, praticamente, conquanto tivesse conhecimento dos cuidados do meu pai Sérgio, a meu respeito com o veículo, desconhecia o fato de seguir sob a vigilância carinhosa dele, naturalmente, buscando qualquer senão de minha parte ou de parte do meu cavalo de engrenagens complicadas, no propósito de nos corrigir sem alarde, em apoio do meu próprio bem-estar.  n

8 Imaginava justamente que nos achávamos todos naquela fase do ano em que o tempo se enfeita para atravessar o período das Festas do Natal e do Ano Novo, quando um carro atravessou à minha frente, impedindo-me o prosseguimento da marcha.

9 O choque foi muito grande, porque me vi atirado fora, à feição de alguém que fosse pisoteado por um potro bravo e não sei de que modo conservava a cabeça intacta nos ombros.

10 Não acredito que os acidentados tenham consciência imediata do que lhes ocorre, porque somos os protagonistas de um inesperado espetáculo de sofrimento que atrai a atenção de quantos se nos acercam da posição menos feliz.

11 Uma explosão que me arremessasse para longe, cegando-me a visão e conturbando-me o cérebro, não me causaria tanto espanto mesclado de aflição.

12 Tempo não tive para qualquer raciocínio, mas percebi, no auge de meu assombro, que era o próprio pai Sérgio a me tomar nos braços, de maneira a conduzir-me para o socorro preciso. Sentia-lhe o calor das mãos, o hálito de bondade e os braços a me resguardarem de encontro ao peito, enquanto vozes anônimas se faziam ouvir opinando, gritando e proferindo exclamações que registrava sem captar-lhes o sentido…

13 Aquele apoio imprevisto me reconfortava. Quis falar, no entanto, era isso impossível.

14 Uma força que não consigo explicar me imobilizava de todo, embora o meu querido protetor me mostrasse a própria ternura nos batimentos acelerados do coração…

15 Desejei revelar a minha capacidade de movimento; se fiz algum, isso aconteceu à revelia de meu conhecimento, porque, naqueles instantes finais do corpo físico, eu me reconhecia de modo indefinível…

16 Apenas minha cabeça me parecia viver e, assim mesmo, na condição de uma chama a se extinguir…

17 Entreguei-me, de todo, à ideia de que o pai amigo velava por mim, enquanto me apagava, e a convicção de que me achava sob proteção segura me asserenava o íntimo atribulado.  n

18 Por um momento só, pensei na mãezinha, no amigo Sr. Aguiar  n que me aguardaria no Iate, mas isso foi uma ideia relampagueante que me entregou, para logo, a um torpor estranho que admiti fosse um sono temporário.

19 Dormi, quase calmamente, se posso dizer que o carinho do pai a transportar-me era o maior fator de possível equilíbrio que eu conseguisse demonstrar…

20 O sono me pareceu uma descida a diversos degraus de inconsciência, porque ainda hoje, procurando recapitular aqueles minutos inesquecíveis, ignoro todas as particularidades do fenômeno de que me via objeto, sem a mínima ideia das horas ou dias que despendi naquela ausência de mim mesmo; despertei num aposento amplo, retomando gradativamente a memória…
21 Sabia que meus olhos estavam abertos, entretanto, por dentro de mim, era difícil aquela contagem de tempo em regime de recessão.

22 Indagava de mim mesmo se estaria em algum hospital de emergência e esforçava-me por lembrar…

23 Não conseguia vencer aquele branco enorme que me separava das últimas recordações…

24 A moto abalroada, a queda aflitiva, as considerações dos populares que passavam a me cercar e, depois, quase que de imediato, os braços do pai Sérgio a me envolverem de apoio e reconforto…

25 Uma senhora de fisionomia serena abeirou-se de mim e sorriu, perguntando por meu estado de espírito…

26 A princípio, o diálogo foi difícil.
Mentalizo as ideias primeiras que me afloraram ao cérebro abatido…

27 Pedi me restituíssem à nossa casa onde a mamãe me esperava com o pai amigo que me assistira; falei de minhas obrigações e compromissos de trabalho em Guarujá e do meu desejo de reaver a moto para qualquer conserto que se fizesse preciso…

28 A senhora,  n porém, que eu supunha fosse uma enfermeira-chefe da instituição em que fora internado, me falou com brandura, acalmando-me os sentimentos de rapaz que nada queria com a morte…

29 Muito delicadamente, se referia à vida diferente a que fora transportado e conversou com carinho, induzindo-me a aceitar a nova realidade em que estava vivendo, sem maior experiência do assunto. 30 Quando notei que ela se reportava à minha avó Elvira  n com intimidade de mãe a informar-me que guardava a mãezinha e a vovó no coração, passei a reconhecer que não dialogava com uma pessoa desconhecida…
O resto, poderão imaginar…

31 A febre da inconformação me dominou por vários dias, até que aceitasse a nova condição de existência a que fora conduzido violentamente e, somente aí, no reequilíbrio indispensável, entendi tudo e tudo aceitei, a fim de atingir as melhoras de que necessitava.

32 Pude, então, voltar ao ambiente doméstico e compartilhar das lágrimas dos pais queridos que eram igualmente minhas…

33 Outros amigos vieram com o meu avô Pompeu  n buscando recuperar-me o otimismo e a autoconfiança; o nosso Carlos Alberto, o nosso Tato de Deus, veio ao meu encontro e, assessorado por outros amigos, pude rogar em pensamento à mãezinha Maria Helena e ao querido pai Sérgio se voltassem para um campo de esperança e consolação, no qual configuramos a casa do mentor Henrique Seara.  n

34 Notando que os pais dedicados me ofereciam mãos abençoadas ao novo trabalho, em que o apoio aos necessitados é o nosso objetivo, adquiri melhoras inesperadas que me transformam hoje no filho agradecido e companheiro de ação constante na lavoura do bem.

35 Agradeço aos pais queridos quanto fazem a meu benefício, estendendo os braços acolhedores aos que sofrem problemas maiores do que os nossos, e continuo acalentando ideais e aspirações que me falam alto ao mundo íntimo…

36 Muito grato à nossa irmã Dirce, que nos incentivou a procurar no trabalho em favor de nós mesmos o esquecimento de nossa personalidade para assimilarmos, por dentro de nós, as dificuldades e as lágrimas alheias, a fim de saná-las, quanto se nos faça possível, e sinto-me a caminho de grandes renovações.

37 Pais queridos, muito grato, estou melhor e mais forte.
Lutando por meu reerguimento para o bem.

  38 Estou incorporando novas ideias da vida ao meu estreito campo de experiências pessoais e começo a perceber as existências da vida sob novo prisma…

39 É preciso esquecer-nos para sermos de Deus na pessoa do próximo e isso para mim representa hoje uma nova e abençoada verdade.

40 Agradeço ao querido Tato que me cede a oportunidade de falar, precisamente agora quando o aniversário dele está sendo lembrado, mas prometo que não estou a me comunicar em vão.

41 Colheremos novas forças de nosso contato com as realidades novas que vou compreendendo, aos poucos; e, com a bênção de Jesus, tudo vai alcançando a forma ideal de convivência com as nossas saudades juntas.

42 Querida mãezinha, não posso prolongar-me e aqui encerro, beijando as suas mãos, com as mãos do pai Sérgio que, depois de Deus, é o meu maior amigo e, com toda a ternura e gratidão que sou capaz de sentir, recebam o coração inteirinho do filho sempre mais reconhecido.


Djalma

Djalma Pompeu de Camargo Rangel

06.07.1983.    


Caio Ramacciotti

Paulo de Tarso Ramacciotti



[1] Dirce Pessoa da Silva Lourenço, residente em Santos, genitora do Tato, Carlos Alberto da Silva Lourenço, co-autor de Jovens no Além, Somos Seis e Venceram, livros editados pelo GEEM. Carlos Alberto é citado na mensagem do Djalma. D. Dirce é incansável lidadora da Doutrina Espírita em Santos, consolando e orientando familiares que temporariamente se viram colhidos pela separação de filhos queridos.

[2] O pai ocasionalmente o acompanhava, sem que o filho soubesse. Confirma que Djalma dirigia a moto com muito cuidado.

[3] Foi socorrido pelo pai.

[4] Patrão do Djalma, no Iate Clube de Santos, onde trabalhava como mecânico náutico.

[5] Senhora: Maria Regina Pezenatto, bisavó materna, desencarnada em 1966.

[6] Elvira Pezenatto Moura, avó materna, residente em Santos.

[7] Avô Pompeu - Faleceu em 1947. Nome idêntico ao do neto, Djalma Pompeu de Camargo Rangel.

[8] Médico de Santos, já desencarnado, Patrono Espiritual do Centro Espírita Henrique Seara.


Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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