1 Querida mãezinha Elena e meu querido papai. Abençoem-me.
2 Desde anteontem estamos mais juntos. Dia quatro — um dia para recordar… n Graças a Deus, porém, as nossas lembranças estiveram orvalhadas de fé em Deus, conquanto as lágrimas viessem registrar a saudade que é presença inevitável.
3 Estou contente porque o papai, a mamãe, a nossa Lete n e os nossos amigos passaram o dia reconhecendo que a morte de um ente amado alcança apenas o corpo que, afinal de contas, é uma vestimenta como as outras.
4 Mãezinha, devo isso ao seu carinho na procura. Agradeço por tudo e por todo o bem que nos fez, auxiliando-me a descortinar a passagem da notícia para nosso intercâmbio. Estou aprendendo que a morte aí na Terra se parece com o foguete dos astronautas. A pessoa se desenvolve de criança para adulto e aí começa o despojamento. De quando em quando, atiram-se cargas para trás, a fim de que a vida se sobreponha à libertação progressiva do espírito, e, desfazendo-se de massas outras, a criatura vai rompendo o tempo, até que a desencarnação simbolize a queda do último fardo para a retaguarda, a fim de que a cápsula de chegada alcance o ponto de mira. 5 Felizmente, essas conclusões me auxiliam na renovação precisa, o que passou já se foi. Em meu caso, até que o símile é perfeito, uma vez que a precipitação de meu corpo no espaço vazio de um edifício bem me parece a perda do volume de peso de que deveria me desvencilhar, por fim, na minha viagem terminada.
6 Peço digam à Cristina n que não a esqueci. Compreendo que a omissão de um nome adquire tanta significação quanto à enunciação dele. n Acontece que desejo ver a nossa querida companheira habilitada a novos roteiros do coração. Que o amor está em meu peito de rapaz, isso é inegável, mas esse amor deve agora atingir outro nível, e isso é igualmente a solução para vencer. 7 Na Terra, a gente ama as criaturas com a hipnose da posse. Acreditamos que os entes queridos são propriedade nossa, que nos compete mobilizar como melhor nos pareça, entretanto aqui a responsabilidade comanda os sentimentos, e o noivo que fui passa a ser o irmão. 8 De qualquer modo, quero que a nossa Cristina conte comigo, embora seja eu, por enquanto, um apagado servidor que recomeça a estudar a vida, podando as linhas sinuosas para que as retas prevaleçam. Sei que a nossa admirável menina me traz no pensamento, e de reflexão em reflexão nos entenderemos com mais segurança, porque desejo vê-la plenamente feliz.
9 Agradeço à nossa Lelete a alegria com que recebeu as minhas notícias, e quero dizer ao papai que nós dois continuamos para a frente. Não existe ausência entre nós. Ele será o trabalho e eu serei o aprendiz, acompanhando-lhe os passos, com o abençoado orgulho de lhe ser sempre o filho e companheiro de todos os momentos.
10 A vovó Helena e o avô Tumenas, com outros amigos, sem me esquecer da tia Lúcia, estão aqui comigo. Sinto-me ainda desambientado, porque a falta de casa não se supre nem com o Céu, se o Céu existisse como sendo lugar determinado. Paraíso é o recanto onde Deus nos reúne com os entes amados, e, em razão disso, a nossa casa ainda é a minha maior bênção. Mas estou aprendendo a construir por aqui, e, com o amparo de Deus, espero levantar uma residência para nós.
11 Creiam que isto não é sonho nem promessa, é a realidade que as palavras da Terra alada não conseguem vestir com expressões exatas.
12 Ao meu pai, muito grato por ter vindo até este retângulo de papel no qual me expresso através de um lápis, a fim de repetir quanto o amo. Deus lhe conserve a saúde e a vida, juntamente da mãezinha, da Lete e de todos os que se reúnem aos nossos corações no mundo.
13 Aqui termino as letras sem terminar os sentimentos com os quais prosseguirei falando aos dois, ao papai e à mãezinha, em nossos encontros do pensamento e da oração, sempre feliz por encontrá-los juntos de minha condição dos melhores pais que Deus me poderia haver concedido, beijo-lhes as mãos queridas e deixo-lhes o coração repleto de carinho e de esperança.
14 O filho reconhecido,
Elcinho
(6/4/1979)
NOTAS E COMENTÁRIOS
1. Desde anteontem estamos mais juntos. Dia quatro - um dia para recordar - Elcio refere-se ao aniversário de seu desencarne, ocorrido dois dias antes da comunicação (4/4/1978).
2. A nossa Lete - mais um apelido carinhoso de Elcio para com a irmã.
3. Cristina - Cristina Bauzys, noiva de Elcinho.
4. Peço digam à Cristina que não a esqueci. Compreendo que a omissão de um nome adquire tanta significação quanto a enunciação dele - nestas frases, quanto nas seguintes, Elcio traz algumas palavras de conformação para a noiva que deixou no Plano Físico, já que esta ficara inconformada por não ter sido lembrada na primeira mensagem.
Familiares já citados na primeira comunicação: vovó Helena, avô Tumenas e Tia Lúcia.
Ensinamentos preciosos brinda-nos o Espírito de Elcio nesta segunda mensagem. Pode-se dizer inclusive que, à parte das referências familiares, a definição do jovem sobre o ciclo vida material-vida espiritual é lapidar: “Estou aprendendo que a morte aí na Terra se parece com o foguete dos astronautas. A pessoa desenvolve-se de criança para adulto e aí começa o despojamento. De quando em quando, atiram-se cargas para trás, a fim de que a vida se sobreponha à libertação progressiva do espírito, e, desfazendo-se de massas outras, a criatura vai rompendo o tempo, até que a desencarnação simbolize a queda do último fardo para a retaguarda, a fim de que a cápsula de chegada alcance o ponto de mira.”
Provando que, mesmo despojado das vestes físicas, o espírito continua junto dos seus, Elcinho dirige palavras carinhosas à noiva Cristina pelo fato de a ter omitido na mensagem anterior e esta ter se magoado com isso.
Já vivendo a vida do espírito, Elcio passa a encarar o amor por Cristina sob outro ângulo: sem sentimentos de posse. Sim, pois sabe que aquela que teve por companheira no Plano Físico deve prosseguir em sua jornada e, conforme suas palavras, “habilitada a novos roteiros do coração”. A compreensão das coisas da vida faz com que se adquira essa mentalidade despojada do desejo de cobiça; ao contrário daqueles outros que, arraigados ao próprio egoísmo, mais não fazem que retardar o próprio progresso e o da pessoa que julgam amar, agrilhoando seu destino mentalmente ao dela, atando-a aos laços invisíveis do pensamento.
O jovem soube vencer a delicadeza do momento e transformou seu amor de companheiro em amor de irmão. E, não se contentando em consolar Cristina pela psicografia, encontra-se com ela no Plano Espiritual durante o sono físico, conforme ela mesma nos relata no depoimento que se segue:
“Noite de 17 para 18 de maio de 1978.
“Eram mais ou menos 20 horas, eu estava no meu quarto, num dos muitos momentos de dor e solidão. Há menos de dois meses de sua morte, eu tinha (e ainda hoje tenho) muitas dúvidas e uma vontade imensa de conversar com o Elcio. Foi aí, então, entre muitas lágrimas, que resolvi lhe escrever, com a certa convicção de que ele estaria me ouvindo.
“Fiz-lhe uma série de perguntas, tais como:
— Por que ele havia morrido?
— Onde ele estava?
— Por que me abandonou, no momento, até então, mais feliz de nossas vidas?
“Depois de muito perguntar e sem obter nenhuma resposta, agora já mais calma, amassei aquela folha e a joguei fora, pois tinha certeza de que ele havia me ouvido. Deitei e dormi.
“Quando acordei, na manhã seguinte, mal pude acreditar: através de um sonho maravilhoso, nos encontramos. Nosso encontro foi no colégio onde estudamos; ele estava todo de preto e me disse, após um longo abraço:
— Deus me deu permissão de eu sair de onde estava para vir responder às suas perguntas.
“Ele, então, sentou-se numa espécie de trono, e eu fiquei a seus pés segurando as suas mãos, que já não eram mais palpáveis como antes; agora pareciam plumas. Ele era agora o Elcio espiritual, eu via e sentia a sua imagem. E continuou a dizer:
— Eu não te abandonei, estou mais perto de ti do que possas imaginar. Eu morri porque era a minha hora, mas sempre estarei te protegendo; tu serás muito feliz. Por que morri? Não tenho permissão para te responder, mas posso te dizer que onde estou é tão bonito, tão bom e estou tão feliz, que se tu pudesses imaginar irias querer morrer também.”
“Eu lhe perguntei:
— Você está mais feliz do que quando ficamos noivos? (Três dias antes de sua morte).
— Sim, mas não fique triste, aqui a felicidade é diferente. Aqui é o Céu; o Inferno está na Terra.”
“Tornei a perguntar-lhe:
— Por que você morreu? Por que me deixou sozinha?
“Ele não me respondeu; após um breve silêncio, disse:
— Você será muito feliz, eu sempre estarei ao teu lado te ajudando. Não te esqueças, eu estou ao teu lado, mas não posso te dizer por que morri. Deus só me deixou vir falar contigo para te acalmar e dizer que não te abandonei. Confie em mim, eu vou te ajudar.
“Despertei desse sonho com a absoluta certeza de que os nossos Espíritos se encontraram e cujo encontro tenho gravado na memória e no coração até hoje. A sua imagem de felicidade é inexplicável, talvez só a conheceremos quando estivermos no lugar em que o Elcio está.”
Cristina Bauzys
És um Espírito eterno, em serviço temporário no mundo.
O corpo é teu refúgio e teu bastão, teu vaso e tua pena e teu buril, tua harpa e tua enxada. ( † )
Emmanuel / Chico Xavier