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1 Recebi o seu bilhete,
Meu caro Juca Vilaça.
Pede você que lhe escreva
Algo mais sobre a cachaça.
2 Explica você: “Cornélio,
Abra o caso mais a fundo,
Fale mais dos resultados
Quanto à pinga no outro mundo.”
3 Você tem razão. A pinga,
Por mais que a verdade doa,
Sem controle que a governe,
Arrasa qualquer pessoa.
4 Além de ser forte agente
Da obsessão tal e qual,
Provoca desequilíbrio
No corpo espiritual.
5 Prejudica e desfigura
Muito mais do que se pensa,
Cachaça, por si, carrega
Tristeza, inércia, doença…
6 Em qualquer parte onde surja,
Lembra sempre, em qualquer clima.
Enxurrada morro abaixo
Ou fogo de morro acima.
7 Muito difícil contê-la
Quando segue de arrastão
Porque mergulha a cabeça
Em sombra ou destruição.
8 Você recorda o Pereira
Da Mata do Xique-Xique…
Desencarnado, ele mora
Numa beira de alambique.
9 Morreu de tanto beber
Nhô Totico da Água Santa;
Hoje, sem corpo, anda à caça
De quem lhe empreste a garganta.
10 Rafael foi-se em bebida,
— O pobre do nosso Rafa, —
E agora em vida diversa
Só pensa em copo e garrafa.
11 Daqui, vejo, rua em rua,
Sem rumo em que se comande,
Nosso Ercílio do copinho
Que tombou em litro grande.
12 Embriagada vivia
Dona Quiquita Borela…
Depois da morte procura
Quem tome pinga com ela.
13 Uma história das mais tristes
A do nosso Chico Souza…
Perdendo o corpo em ressaca,
Não se lembra de outra cousa.
14 Largando o mundo, aos copázios,
Nhô Bernardo do Lajão,
Continua, após a morte,
Na mesma perturbação.
15 Cachaça, meu caro amigo,
Tem este traço comum:
Estraga de qualquer modo
A mente de qualquer um.
16 Em muito caso de angústia,
Nas provas justas da vida,
Muito suicídio e loucura
São do excesso de bebida.
17 Nas festas e cerimônias
Não se canse de aprender
A arte de alçar o copo
Nobre e firme sem beber.
18 Pinga ajuda o coração?!…
Disso há gente que se gabe,
Mas se cachaça é remédio
A medicina é que sabe.
19 Quanto a nós, recorde o aviso
Do nosso Nico Belém:
— “Água que gato não bebe
Não auxilia a ninguém.”
Cornélio Pires
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