1 Procurando distração,
Fui, contente, ao carnaval!
Muito ouvia em torno dele
E quis vê-lo ao natural.
2 Apelei para João Panca,
Um prestimoso vizinho,
Que não me deixasse a sós,
Não queria estar sozinho.
3 João concordou comigo,
Era sempre o companheiro…
E lá nós fomos, os dois,
Ao passeio, dia inteiro.
4 João falava na caridade,
Mas a festa estava à espera;
Era preciso seguir,
Beneficência “já era”.
5 Já que falava em virtude
Chamei-o a ver Dona Bela,
Que nos atirou um vaso,
Pingando água amarela.
6 Conquanto desapontado,
Visitamos Dona Aninha,
Que nos jogou sobre o peito,
Duas “joias” de galinha.
7 João mostrava-se amargurado,
E como alguém que se poupa,
Regressou à própria casa,
A fim de trocar de roupa.
8 Encontrei um grande praça,
Léo, filho de Dona Esther;
Ele pediu-me, alterado,
Uma saia de mulher.
9 Todo amigo dava gritos,
Nessa festa sem sentido,
Afirmava Dona Clara,
Ter a calça do marido.
10 Vi flautas e violões,
Passando, em busca ao sem-fim,
Muita gente me chamava,
Ao lado dos tamborins.
11 Um homem que carregava,
Dois chocalhos, uma vara,
Não sei se foi por querer,
Esmurrou-me a própria cara.
12 Carnaval representava,
A festa do meu País,
Por isso segui em frente,
Tão forte quanto feliz.
13 Era justo conhecer
Uma festa semelhante,
Por isso aceitei sem mágoa,
A agressão extravagante.
14 Fui buscar, querendo um grupo,
O amigo Simão Veloz,
Ele queria cantar,
Mas “rugia” junto a nós.
15 Meus amigos sempre muitos,
Pareciam-me doentes,
No entanto, não quis deixá-los,
Ao vê-los irreverentes.
16 Venci diversos empeços
E fui ao Tino da Chalaça,
Ele, porém, nem me viu,
Estirado na cachaça.
17 O povo todo dançava,
E eu olhava sem remoque,
Achava muito esquisita,
A orquestra chamada Roque.
18 Um homem sério abriu alas,
Era o melhor dos Nicolas,
Lembrava antigo palhaço,
Exibindo Cabriolas.
19 Perguntei a um guarda amigo,
Que a ninguém queria mal,
Só desejava saber,
Se estava no carnaval.
20 Ele disse:
Olhe as crianças,
Todas dançam recordando
Nossas futuras mudanças.
21 Vi um par, a longos beijos,
Na sombra de velho muro,
Como a dizer que o amor,
Só se revela no escuro.
22 Disse o amigo:
— Se o senhor quer demorar-se,
Procurando amigos maus,
Dê-me logo oitenta paus.
23 Dentre os quadros que anotei,
Vi o mestre Manassés,
Que dançava e requebrava,
Da cabeça até os pés.
24 Um conflito sucedeu,
Vendo a filha de Nereu
Nos braços de outra pessoa,
Genuíno enlouqueceu.
25 Achei-me desencantado.
Eu que entrara reverente.
A fim de largar o grupo
Precisava ser valente.
26 Retornei a nossa casa
Meditando, por sinal,
Se o carnaval que assistira,
Que seria? bem ou mal?
27 Pensei em meu pai distante,
Minha mãe falou: — Na vida,
O carnaval é loucura,
Doença desconhecida.
Jair Presente
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