1 Cercado de potências angélicas, o Mestre dos mestres recebia a longa fileira de almas necessitadas, a chegarem da Terra, trazidas pelas asas veludosas do sono.
2 Rogativas particulares sucediam-se ininterruptas. E o Divino Dispensador as acolhia afavelmente. Para as solicitações mais disparatadas, oferecia a ternura do benfeitor e o sorriso do sábio. Jovens e velhos, adultos e crianças eram admitidos à Augusta Presença, um a um, expondo cada qual sua necessidade e sua esperança.
3 — Senhor, — implorava carinhosa mãe, de olhos súplices, — meus filhos aguardam-te a complacência vigilante!
E prosseguia, aflita, enumerando intrincados problemas domésticos, destacando projetos para o futuro, na experiência carnal.
4 O Mestre ouviu e recomendou aos cooperadores atendessem a súplica, na primeira oportunidade.
5 Seguiu-se-lhe linda jovem que rogou, ansiosa:
— Oh! Jesus, atende-me! Socorre meu noivo que sucumbe… Livra-o da morte, por piedade! Sem ele, não viverei!…
6 O Benfeitor Divino ouviu, atento, e ordenou que os emissários restituíssem o dom da saúde física ao doente grave.
7 Logo após, entrou velho e simpático lavrador, de gestos confiantes, que se prosternou, suplicando:
— Doador da Vida, abençoa meu campo! Peço-te! Amo profundamente a terra que me confiaste. É o celeiro do meu pão, recreio de meus olhos, esperança de minha velhice!…
8 O Pastor Divino sorriu para ele, abençoou-o, afetuosamente, e determinou aos auxiliares santificassem o ritmo das estações sobre o campo daquele trabalhador devotado, para que ali houvesse flores e frutos abundantes.
9 Em seguida, cavalheiro respeitável penetrou o recinto de luz, evidenciando nobre posição intelectual, e solicitou, reverente:
— Protetor dos Necessitados, o ideal de realizar algo de útil na Terra inflama-me o espírito… Dá-me possibilidades materiais, concede-me a temporária mordomia de teus infinitos bens! Quero combater o pauperismo, a fome, a nudez, entre os homens encarnados… Auxilia-me por compaixão!
10 O Embaixador do Sumo Bem contemplou-o, satisfeito, aquiesceu com palavras de estímulo e designou adjuntos para a articulação de providências, quanto à satisfação do pedido.
11 Minutos depois, entrou um filósofo que implorou:
— Sábio dos sábios, dá-me inspiração para renovar a cultura terrestre!…
12 O Cristo aprovou a petição, concedendo-lhe vasto séquito de instrutores.
13 E a legião dos suplicantes prosseguia sempre, movimentada e feliz, valendo-se da visita providencial do Celeste Benfeitor às sombrias fronteiras da carne. Jesus atendia sempre, ministrando incentivos e alegrias, graças e consolações, determinando medidas aos assessores diretos.
14 Em dado instante, porém, o círculo foi penetrado por um homem diferente. Seu olhar lúcido falava de profunda sede interior, seus gestos respeitosos traduziam confiança e veneração imensas.
15 Ajoelhou-se, humilde, estendeu os braços para o Emissário do Eterno Pai e, ao contrário de quantos lhe haviam precedido na súplica, explicou-se com simplicidade:
— Senhor, eu sei que sempre dás, conforme nossos rogos.
16 Ante a estupefação geral, continuou:
— Há quase vinte séculos, ensinaste-nos que o homem achará o que procura e receberá o que pede…
17 O Divino Orientador ouvia, comovido, enquanto os demais seguiam a cena com admiração.
18 O visitante reverente deixou cair lágrimas sinceras e prosseguiu:
— Vezes inúmeras, tenho lidado com o desejo e a posse, com a esperança e a realização, nos círculos transitórios da existência carnal. Estou pronto para cumprir-te os desígnios superiores, seja onde for, quando e como quiseres, mas, se permites, rogo-te luz divina do teu coração para o meu coração, paz, alegria e vigor imortais de tua alma para minhalma!… Quero seguir-te, enfim!…
19 Com doçura admirável, o Mestre tocou-lhe a fronte e indagou:
— Queres ser meu discípulo?
— Sim! — Respondeu o aspirante da luz.
20 Calou-se o Cristo. Verificando-se intervalo mais longo, e considerando que todos os pedintes haviam recebido gratificações e júbilos imediatos, o aprendiz perguntou:
— Que me reservas, Senhor?
21 O Doador das Bênçãos contemplou-o com ternura e informou:
— Volta ao campo de teus deveres. Entender-me-ei contigo diretamente.
22 E depois de um silêncio, que ninguém ousou interromper, o Mestre concluiu:
— Reservar-te-ei a lição.
Irmão X
(Humberto de Campos)