1.
Quase todos os servidores espirituais puseram-se a caminho de tarefas
variadas. Somente alguns amigos permaneceriam na residência de Dona
Isabel, em missão de auxílio e vigilância.
2 Notei que Aniceto continuava
distribuindo instruções diversas, dirigindo-se, em caráter confidencial,
a determinados companheiros, a respeito da missão que lhe confiara Telésforo.
3 Antes do meio-dia, porém,
convidou-nos a acompanhá-lo.
— Na oficina, — disse-nos, bondoso, — encontramos revigoramento imprescindível
ao trabalho. Recebemos reforços de energia, alimentamo-nos convenientemente
para prosseguir no esforço, mas convenhamos que, para muitos de nós,
a noite representou uma série de atividades longas e exaustivas. Necessitamos
de algum descanso. Voltaremos ao crepúsculo.
4 Aonde iríamos? Ignorava.
Recordei que, de fato, se alguns haviam repousado no santuário doméstico,
durante a noite, a maioria havia trabalhado intensamente, e concluí
que, se muitos pela manhã haviam tomado rumo às obrigações, outros teriam
buscado o repouso indispensável.
5 — Aonde ides? — Perguntou
um companheiro da vigilância, que se fizera nosso amigo.
Antes que respondêssemos, Aniceto esclareceu:
— Vamos ao campo.
6 E, dirigindo-se especialmente
a Vicente e a mim, considerou:
— Utilizemos a volição, mesmo porque não temos objetivos imediatos
no centro urbano. Notei que movimentava agora minhas faculdades volitivas
com facilidade crescente. 7
A excursão educativa, com escala pelo Posto de Socorro de Campo da Paz,
fizera-me grande bem. Melhorara em adestramento, sentia-me fortalecido
ante as vibrações de ordem inferior, mobilizava os recursos próprios
sem dificuldade. 8
Reparei, igualmente, que minhas possibilidades visuais cresciam sensivelmente.
Volitando em pleno, não observara, até então, o que agora verificava, extremamente
surpreendido. 9 Dantes,
via somente os homens, os animais, veículos e edifícios chumbados ao
solo. Agora, a visão dilatava-se. Reconhecia, de longe, o peso considerável
do ar que se agarrava à superfície. 10
Tive a impressão de que nadávamos em alta zona do mar de oxigênio, vendo
em baixo, em águas turvas, enorme quantidade de irmãos nossos a se arrastarem
pesadamente, metidos em escafandros muito densos, no fundo lodoso do
oceano.
2.
— Estão vendo aquelas manchas escuras na via pública? — Indagava nosso
orientador, percebendo-nos a estranheza e o desejo de aprender cada
vez mais.
2 Como não soubéssemos definir
com exatidão, prosseguia explicando:
— São as nuvens de bactérias variadas. Flutuam, quase sempre também, em grupos compactos, obedecendo ao princípio das afinidades. Reparem aqueles arabescos de sombra…
3 E indicava-nos certos edifícios
e certas regiões citadinas.
— Observem os grandes núcleos pardacentos ou completamente obscuros!… São zonas
de matéria mental inferior, matéria que é expelida incessantemente por
certa classe de pessoas. 4
Se demorarmos em nossas investigações, veremos igualmente os monstros
que se arrastam nos passos das criaturas, atraídos por elas mesmas…
5 Imprimindo grave inflexão
às palavras, considerou:
— Tanto assalta o homem a nuvem de bactérias destruidoras da vida física,
quanto as formas caprichosas das sombras que ameaçam o equilíbrio mental.
6 Como veem, o “orai
e vigiai” do Evangelho ( † )
tem profunda importância em qualquer situação e a qualquer tempo. 7
Somente os homens de mentalidade positiva, na Esfera da espiritualidade
superior, conseguem sobrepor-se às influências múltiplas de natureza
menos digna.
8 Interessado, contudo, em
maior esclarecimento, perguntei:
— Mas a matéria mental emitida pelo homem inferior tem vida própria como o núcleo de corpúsculos microscópicos de que se originam as enfermidades corporais?
9 O mentor generoso sorriu
singularmente e acentuou:
— Como não? Vocês, presentemente, não desconhecem que o homem terreno
vive num aparelho psicofísico. Não podemos considerar somente, no capítulo
das moléstias, a situação fisiológica propriamente dita, mas também
o quadro psíquico da personalidade encarnada. 10
Ora, se temos a nuvem de bactérias produzidas pelo corpo doente, temos
a nuvem de larvas mentais produzidas pela mente enferma, em identidade
de circunstâncias. 11
Desse modo, na esfera das criaturas desprevenidas de recursos espirituais,
tanto adoecem corpos, como almas. No futuro, por esse mesmo motivo,
a medicina da alma absorverá a medicina do corpo. 12
Poderemos, na atualidade da Terra, fornecer tratamento ao organismo
de carne. Semelhante tarefa dignifica a missão do consolo, da instrução
e do alívio. Mas, no que concerne à cura real, somos forçados a reconhecer
que esta pertence exclusivamente ao homem-espírito.
3.
— Deus meu! — Exclamou Vicente, espantado, — a que perigos está submetido
o homem comum!
2 — Por isso, — tornou
Aniceto, cuidadoso, — a existência terrestre é uma gloriosa oportunidade
para os que se interessam pelo conhecimento e elevação de si mesmos.
3 E, por esta mesma
razão, ensinamos a necessidade da fé religiosa entre as criaturas humanas.
4 Desenvolvendo essa
campanha, não pretendemos intensificar as paixões nefastas do sectarismo,
mas criar um estado positivo de confiança, otimismo e ânimo sadio na
mente de cada companheiro encarnado. Até agora, apenas a fé pode proporcionar
essa realização. 5
As ciências e as filosofias preparam o campo; entretanto, a fé que vence
a morte, é a semente vital. Possuindo-lhe o valor eterno, encontra o
homem bastante dinamismo espiritual para combater até à vitória plena
em si mesmo.
6 Compreendendo que precisaria
completar o esclarecimento, exclamou, depois de pausa mais longa:
— Todos precisamos saber emitir e saber receber. Para alcançarem a posição
de equilíbrio, nesse mister, empenham-se os homens encarnados e nós
outros, em luta incessante. 7
E já que conhecemos alguma coisa da eternidade, é preciso não esquecer
que toda queda prejudica a realização, e todo esforço nobre ajuda sempre.
4.
As explicações recebidas não poderiam ser mais claras. Aquela visão,
porém, de ruas repletas de pontos sombrios a se deslocarem vagarosos,
atingindo homens e máquinas, nas vias públicas, assombrava-me.
2 Sequioso de ensinamentos,
tornei ao assunto:
— A lição para mim tem valores incalculáveis. E quando penso no alto poder reprodutivo da flora microbiana…
Aniceto, contudo, não me deixou terminar. Conhecendo, de antemão, minha
pergunta natural, cortou-me a frase, exclamando:
3 — Sim, André, se não fosse
o poder muito maior da luz solar, casada ao magnetismo terrestre, poder
esse que destrói intensivamente para selecionar as manifestações da
vida, na Esfera da Crosta, a flora microbiana de ordem inferior não
teria permitido a existência dum só homem na superfície do globo. 4
Por esta razão, o solo e as plantas estão cheios de princípios curativos
e transformadores.
5 E, abanando significativamente
a cabeça, concluiu:
Nada obstante esse poder imenso, recurso divino, enquanto os homens,
herdeiros de Deus, cultivarem o campo inferior da vida, haverá também
criações inferiores, em número bastante para a batalha sem tréguas em
que devem ganhar os valores legítimos da evolução.
André Luiz