1.
Após nos refazermos pela manhã, considerando a viagem ainda longa, despedimo-nos,
comovidos. Pelo menos, quanto a mim, podia afirmar que me afastava com
mágoa, tão belas as lições ali colhidas!
2 Alfredo e a esposa nos abraçaram,
sensibilizados, desejando-nos jornada feliz e êxito no trabalho.
Vários amigos da véspera estavam presentes, saudando-nos jubilosos.
3 Tomamos o carro, agradavelmente
surpreendidos.
Ser-me-ia muito difícil descrever a pequena máquina, que mais se assemelhava a pequeno automóvel de asas, a deslocar-se impulsionado por fluidos elétricos acumulados. n
4 Sempre generoso, Aniceto
explicou:
— Aceitei a cooperação do aparelho, não porque os desejo escravizados ao menor
esforço, mas porque a permanência, embora ligeira, no Posto de Socorro,
constituiu ensejo dos mais frutuosos à aquisição de conhecimentos necessários.
5 Receberam vocês lições
intensivas, relativamente aos nossos irmãos perturbados e sofredores,
bem como sobre os efeitos da prece. Desse modo, temos nosso expediente
bastante adiantado, considerando que se encontram ambos em tarefa de
observação e aprendizado, acima de tudo.
6 E, depois de pequena pausa,
continuou:
— Não creiam, todavia, que possamos aproveitar a máquina até a Crosta. Calculo que só poderemos voar até o meio-dia. Em seguida, prosseguiremos a pé.
7 Aniceto calou-se
por instantes, sorriu noutra expressão fisionômica e acentuou:
— Isto, porém, acontecerá somente enquanto não hajam vocês criado asas espirituais,
que possam vencer todas as resistências vibratórias. 8
Semelhante realização pode não estar distante. Dependerá do esforço
que desejarem despender no trabalho aquisitivo. Todo aquele que opere,
e coopere de espírito voltado para Deus, poderá aguardar sempre o melhor.
Não é promessa de amizade. É lei.
9 O pequeno aparelho nos conduziu
por enormes distâncias, sempre no ar, mas conservando-se a reduzida
altura do solo.
10 Quase precisamente ao meio-dia,
estacionamos em humilde pouso, destinado a abastecimento e reparação
de maquinaria de natureza daquela em que havíamos viajado.
Despediu-se de nós o condutor, que nos desejou boa viagem, preparando-se para regressar.
2.
A paisagem tornou-se, então, muito fria e diferente. Não estávamos em
caminho trevoso, mas muito escuro e nevoento. Tornara-se densa a atmosfera,
alterando-nos a respiração.
2 Aniceto contemplou, conosco,
a vastidão caliginosa e falou em tom grave:
— Com quatro horas de locomoção, estaremos na Crosta. 3
Reparem as sombras que nos rodeiam, identifiquem a mudança geral. Infelizmente,
as emissões vibratórias da Humanidade encarnada são de natureza bastante
inferior, em nos referindo à maioria das criaturas terrestres, e estas
regiões estão repletas de resíduos escuros, de matéria mental dos encarnados
e desencarnados de baixa condição. 4
Atravessaremos grandes zonas, não propriamente tenebrosas, mas muito
obscuras ao nosso olhar. Daqui a duas horas, porém, encontraremos sinais
da luz solar.
5 Nossa peregrinação,
francamente, foi muito pesada e dolorosa, e, somente aí, avaliei, de
fato, a enorme diferença da estrada comum, que liga a Crosta a “Nosso
Lar” e aquela que agora percorríamos a pé, vencendo obstáculos de vulto.
6 Imaginei, comovido,
o sacrifício dos grandes missionários espirituais que assistem o homem,
compreendendo, então, quão meritório lhes é o serviço e como necessitam
disposições especiais e formidável bom ânimo, para auxiliarem as
criaturas encarnadas, de maneira constante.
7 Os monstros, que fugiam
à nossa aproximação, escondendo-se no fundo sombrio da paisagem, eram
indescritíveis e, obedecendo a determinações de Aniceto, não posso ensaiar
qualquer informe nesse sentido, a fim de não criar imagens mentais de
ordem inferior no espírito dos que, acaso, venham a ler estas humildes
notícias.
3.
No horário previsto por nosso orientador, começamos a vislumbrar, de
novo, a luz do Sol, como se estivéssemos em madrugada clara. O espetáculo
era magnífico e novo para mim. Calor brando começou a revigorar-nos.
2 Aniceto fixou o
quadro maravilhoso dos raios de luz atravessando as sombras e falou,
de olhos úmidos:
— Agradeçamos ao Senhor dos Mundos a bênção do Sol! Na Natureza física,
é a mais alta imagem de Deus que conhecemos. 3
Temo-lo, nas mais variadas combinações, segundo a substância das Esferas
que habitamos, dentro do sistema. 4
Ele está em “Nosso Lar”, de acordo com os elementos básicos de vida,
e permanece na Terra segundo as qualidades magnéticas da Crosta. 5
É visto em Júpiter de maneira diferente. Ilumina Vênus com outra modalidade
de luz. Aparece em Saturno noutra roupagem brilhante. Entretanto, é
sempre o mesmo, sempre a radiosa sede de nossas energias vitais!
4.
Avançamos, comovidos, e, daí a algum tempo, surgiu-nos o astro sublime,
na posição que antecede o crepúsculo.
2 Doutras vezes, viajando
sempre através da estrada luminosa e fácil de ser percorrida, em vista
das possibilidades de volitação, não fizera maior reparo. Agora, porém,
que atravessara névoas compactas, anotava diferenças profundas.
3 A certa distância, surgia
a Terra, não na forma esférica, porque nos achávamos não longe da Crosta,
mas como paisagem além, a interpenetrar-se nas extensas regiões espirituais.
O Sol resplandecia, rumo ao Poente, como enorme lâmpada de ouro.
4 Aniceto, que parecia alegrar-se
sobremaneira, exclamou:
— Entramos na zona de influenciação direta da Crosta. Poderemos, doravante,
praticar a volitação, utilizando nossos conhecimentos de transformação
da força centrípeta. 5
A luz que nos banha resulta do contato magnético entre a energia positiva
do Sol e a força negativa da massa planetária. Prossigamos. Não tardaremos
a entrar no Rio de Janeiro.
5.
A essa altura, assaltou-me o desejo de perguntar alguma coisa relativamente
à direção.
— Como nos orientaremos? — Indaguei, curioso.
2 — Antes de tudo,
— respondeu o instrutor, — é preciso não esquecer que nossas colônias
estão situadas no campo magnético da América do Sul. Qualquer bússola
seria sensível, de agora em diante, mas, em nosso caso, é indispensável
educar o pensamento e orientar-nos dentro da energia que lhe é peculiar.
3 Empregamos, de novo, a capacidade
volitiva e, dentro em pouco, as matas de Petrópolis estavam à vista.
Mais alguns minutos e perlustrávamos as grandes artérias cariocas. Por
sugestão do instrutor, abeiramo-nos do mar, em exercício respiratório
de maior expressão.
4 Vicente e eu estávamos positivamente
exaustos. Reconhecíamos que o esforço fora significativo para nossas
escassas forças.
5 Indiferentes à nossa presença,
os transeuntes passavam apressados, de mente chumbada aos problemas
de ordem material. Fonfonavam ônibus repletos. A grande baía figurava-se-nos
cheia de forças renovadoras.
6 Quando se acendiam as primeiras
luzes elétricas, Aniceto convidou-nos, generosamente:
— Vamos ao reconforto! Vocês estão fatigadíssimos. Irei mostrar-lhes que “Nosso Lar” tem, igualmente, alguns refúgios na Crosta.
André Luiz
[1] [Vide: Algumas referências ao uso de itens materiais no Mundo Invisível do Plano Espiritual, como edificações providas dos mais diversos objetos, aparelhos, veículos de transporte, etc.]