1 A reunião alcançava a parte final. E, na organização mediúnica, Bezerra de Menezes retinha a palavra.
2 O benfeitor desencarnado distribuía consolações, quando um companheiro o alvejou com azedume:
— Bezerra, não concordo com tanta máscara no ambiente espírita. Estou cansado de tartufismo. Falo contra mim mesmo. Posso, acaso, dizer que sou espírita-cristão? Vejo-me fustigado por egoísmo e intolerância, avareza e ciúme; cometo desatenções e disparates; reconheço-me frequentemente caído em maledicência e cobiça; ainda não venci a desconfiança, nem a propensão para ressentir-me; quando menos espero, chafurdo-me nos erros da vaidade e do orgulho; involuntariamente, articulo ofensas contra o próximo; a ambição mora comigo e, por isso, agrido os meus semelhantes com toda força de minha brutalidade; a crítica, o despeito, a maldade e a imperfeição me seguem constantemente. Posso declarar-me espírita com tantos defeitos?
3 O venerável orientador espiritual respondeu, sereno:
— Eu também, meu amigo, ainda estou em meio de todas essas mazelas e sou espírita-cristão…
4 — Como assim? — revidou o consulente agitado.
— Perfeitamente — concluiu Bezerra, sem alterar-se. — Todas essas qualidades negativas ainda me acompanham… Só existe, porém, um ponto, meu caro, que não posso esquecer. É que, antes de ser espírita-cristão, eu fazia força para correr atrás de todas elas e agora, que sou cristão e espírita, faço força para fugir delas todas…
5 E, sorrindo:
— Como vê, há muita diferença.
Irmão X
(Humberto de Campos)