O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Luz acima — Irmão X


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Na esfera dos bichos

1 Dizem que os macacos contemplavam grande cidade, nela depositando os sonhos para o futuro…

2 Viviam cansados — clamavam alguns — e queriam repouso. As fêmeas da espécie declaravam-se exaustas. Desde milênios, criavam os filhinhos, amamentavam-nos, sofriam horrores, cobriam-se de humilhações e pleiteavam repouso.

3 Quem lhes ouvisse as queixas, acompanharia o coro de lágrimas. Os símios mais velhos choravam de meter pena. Afirmavam, sem rebuços, que os conflitos na floresta eram francamente angustiosos e terríveis.

4 Sem dúvida, a turma despreocupada dos bichos dormia quase o dia inteiro, saboreava os produtos da terra e, quando não via presa fácil, desfrutava a lavoura dos homens com toda a sem-cerimônia. Se o tédio ameaçava, corriam todos para o arvoredo forte e improvisavam verdadeiro parque de diversões, na ramaria bordada de flores. 5 Comiam o que não plantavam, valiam-se dos imensos recursos do solo, mas, assim que terminavam as brincadeiras, vinha o rosário de lamentações.

— Não suportamos esta vida! — Reclamavam os antigos.

— Renovemos tudo! — Desafiavam os novos.

6 Acabavam as reclamações, observando detidamente a cidade enorme que lhes centralizava as esperanças.

7 Tornando à gruta selvagem, impunham-se comentários alusivos à modificação. A transferência para a casa do bípede humano era a única medida razoável. Os seres racionais tinham a noite magnificamente iluminada por lâmpadas coloridas. Trajavam roupas brilhantes. Dispunham de residências acolhedoras. Bebiam água gelada, na canícula, e chocolate reconfortante, no inverno. Possuíam palácios de governo, colégios, clubes, imprensa, parques e maquinaria. Gozavam as delícias da inteligência. Respiravam, pois, num Céu legítimo.
Urgia, assim, a mudança imediata.

8 Diante da exigência geral, reuniram-se os chimpanzés mais prudentes e mandaram um macaco velho para fazer os apontamentos locais.

O símio inteligente aproximou-se dos homens e deixou-se prender manhosamente num circo.

Partilhou a experiência dos filhos da razão, durante cinco anos consecutivos. Devorou centenas de bananas, andou por vilas e aldeolas enfeitado de guizos, fez pilhérias notáveis e, certo dia, regressou…

9 Grande congresso dos companheiros, a fim de ouvi-lo.

As fêmeas da tribo, sustentando os filhinhos, e os monos encanecidos enfileiravam-se à frente de todos.

10 O emissário apresentou o seu relatório em guinchos solenes. Quase impossível traduzir-lhe a exposição em linguagem humana, todavia, o mensageiro explicou-se, mais ou menos assim, depois das saudações fraternais:

— Vocês pensam que estou voltando de um paraíso e todos aguardam o instante de penetração no reino humano, como se fossem alcançar plena isenção de serviço e responsabilidade. No entanto, laboram em grave erro.  11 Demorei-me cinco anos entre as criaturas que nos são superiores na organização, na conduta e na forma. Realmente, as leis a que se submetem, no continuísmo da espécie e na própria manutenção, não diferem dos princípios que somos constrangidos a obedecer. Criam os filhos com dificuldades análogas às nossas e lutam igualmente com as tempestades e doenças. Quem lhes vê, contudo, o domicílio luxuoso julga-os falsamente, supondo encontrar entre eles o repouso e a alegria sem-fim. 12 Os homens, sem dúvida, são superiores a nós e agem num plano muito mais alto. Entretanto, ai deles se pararem de trabalhar! A natureza que nos cerca lhes invadirá as cidades, destruindo-lhes o encanto e as benfeitorias. Possuem castelos e universidades, carruagens e granjas. No entanto, para alimentarem os valores educativos que os distanciam de nós, são obrigados a respeitar horríveis disciplinas. 13 Não fazem o que desejam, qual nos ocorre na furna. São submetidos a códigos e decretos, com os quais devem consagrar os próprios brios. A guerra entre eles, a bem dizer, é um estado natural. Os piores entregam-se a monstros perigosos, conhecidos pelos nomes de egoísmo e vaidade, ambição e discórdia, e começam a praticar violências calculadas, para dominarem as situações… Em razão disso, os melhores são compelidos a viver armados até às unhas, de modo a se defenderem, preservando as instituições de que se ufanam.  14 A residência deles, indiscutivelmente, é maravilhosa, mas são tantos os problemas inquietantes a torturá-los de perto que, de quando em quando, eles mesmos improvisam chuvas de bombas com que inutilizam as próprias obras, a fim de recapitularem as lições que andam aprendendo com os poderes mais altos da vida. Para manterem o brilho da Esfera em que habitam, padecem aflições dia e noite. 15 De fato, são detentores de prodigiosa inteligência e parece-me que subirão muito mais na montanha do progresso que não podemos, por enquanto, compreender. Em compensação, trabalham tanto, sofrem tão largamente e são obrigados a tamanhas disciplinas que eu, meus irmãos, voltei resignado à minha sorte… Quero a minha gruta barrenta, prefiro nossos costumes e necessidades… o Céu dos homens não serve para mim… não suporto… sou um macaco…

16 Os membros do conclave, porém, cobriram-no de zombaria e pedradas. Ninguém acreditou no mensageiro. Para a bicharia, a cidade dos homens era um ninho celestial, sem deveres e sem lutas, sem dificuldades e sem percalços e, por isso mesmo, a macacada continuou exigindo acesso à esfera humana, com o único objetivo de gozar e repousar.

17 Escutei a lenda curiosa, estudando-lhe o símbolo.
Não pintará esta história a mesma situação corrente entre os “vivos” e os “mortos” da atualidade?


Irmão X

(Humberto de Campos)

Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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