O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Janela para a vida — Autores diversos


17

Vida livre

   1 Ele casava a filha numa festa

   E o sitiante, em meio aos convidados,

   Explica sobre o filho que lhe resta:

   — Meu rapaz, um gigante de destreza,

   É criado, conforme a natureza.

   Vai por todos os lados,

   Estuda como quer e quando quer.

   Homem é diferente de mulher,

   Não se deve mostrar com ares de menina,

   Nada de contenção ou disciplina.

   Endimião, meu filho, é um atleta perfeito.

   Não só isso. É uma grande inteligência,

   Sem qualquer pensamento acovardado e estreito.

   É livre para toda experiência

   Em que deseje realizar-se,

   Sem máscara, sem freio, sem disfarce…


   2 Aparecendo a pausa, um amigo aparteia:

   — Mas, coronel, e a lei da educação?

   — A educação — replica o interpelado —

   Nunca foi o tabu que se receia,

   É caminho do impulso liberado

   Para elevar a civilização.


   3 Era assim o sitiante: um homem singular.

   A palestra, porém, fora rompida.

   A filha e o genro estavam a chegar,

   Morariam não longe do lugar

   E apresentavam-se contentes

   Para o abraço de terna despedida.


   4 Endimião, em plena juventude,

   Era dono da força e da saúde.


   5 Dois anos findos sobre o relatado

   No longo entardecer de um dia quente,

   Eis o rapaz surgindo, de repente,

   No sítio do cunhado.

   A irmã tanto se alegra quão se espanta,

   Estava a sós com velha governanta;

   O marido ausentara-se em serviço…

   Um dia apenas, breve compromisso.

   O rapaz se declara de passagem,

   Diz-se ansioso por seguir viagem…

   Mas a irmã, em diálogo escondido,

   Roga-lhe: — Fica, irmão, estou desorientada,

   Tenho medo da noite… Meu marido

   Deixou comigo, em caixa resguardada,

   Duzentos e cinquenta mil cruzeiros…

   A nossa governanta é pessoa cansada,

   Nossos poucos peões e alguns vaqueiros

   Não residem tão perto…

   Este sítio é um lugar quase deserto.

   Somente em nossos cães consigo companheiros…

   A noite se avizinha,

   Temo ficar sozinha,

   Tenho medo, confesso…


   6 O irmão sorriu e esclareceu: — Não posso.

   Agora me despeço,

   Tenho grande jornada

   Para vencer até o fim do dia…

   E acrescentou, num gesto de alegria:

   — Irmã, não tenhas medo.

   Ninguém sabe o que guardas em segredo.

   Deixando a moça amedrontada,

   Saiu no próprio carro em disparada.


   7 Mas, depois de uma hora,

   Eis que ali chega, inopinadamente,

   O conhecido pai da estimada senhora.

   Soubera o genro ausente, por um dia,

   E viera fazer-lhe companhia.


   8 Júlio, reencontro e lembranças do lar,

   O diálogo segue ativo e manso

   Até que se despedem, a buscar,

   No silêncio noturno, a bênção do descanso.


   9 Alta noite, em seu quarto, a senhora desperta,

   Tem pela frente um homem mascarado,

   Que lhe aponta um revólver, lado a lado,

   E lhe diz numa voz estranha e sibilante:

   – É um assalto,

   Quero todo o dinheiro,

   Toda a quantia por inteiro…

   Ouvi o seu marido a conversar na praça

   E exijo a soma toda…


   10 Atônita, a senhora, a tremer e a tremer,

   Ergue-se à luz do luar que vem pela vidraça

   E põe-se a obedecer…

   Segue na direção da caixa que lacrara,

   No entanto, o genitor já despertara…

   Pé ante pé, caminha armado,

   Faz luz que jorra, em cheio, no salão,

   E atira sobre o homem mascarado

   Que se estira no chão.

   Acorrem servidores prestimosos

   E o defensor da filha solicita,

   Ante a senhora, agoniada e aflita:

   — Que alguém me desmascare este sujeito,

   Não se importem com o sangue a borbulhar no peito,

   Quero ver esta cara de ladrão…


   11 Sob as mãos calejadas na lavoura,

   Primeiro, surge a cabeleira loura,

   Depois, em dolorosa exclamação,

   Todos gritam um nome: “Endimião!…”


   12 O pai que dera o filho à liberdade

   Sem ressalva, sem base, sem suporte,

   Cai sobre o filho, agora entregue à morte,

   Sobre quem arrojara o rápido gatilho

   E clama a estremecer em convulsivo pranto:

   — Oh! Deus, por que matei o filho que amo tanto?!…

   Socorre-me, Senhor!…

   Ah!… meu filho, meu filho!…


Maria Dolores


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