O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Enxugando lágrimas — Familiares diversos


12 n

A morte, um lado diferente; só isso

1 Mãe, peço a bênção.

2 É isso mesmo, fé e alegria. Aprendi com o seu coração e não encontro lição maior neste momento de reencontro. Este é um dia nosso, dia de amor, porque estamos novamente unidos por esse fio misterioso da palavra escrita.

3 Estou melhor. Não posso dizer que a pele está corrigida como um milagre. Estou em tratamento.

4 Fevereiro tem carná. Estou lembrando aqueles cartazes de nossa Goiânia. E carná tem luta sem fevereiro mesmo.

5 Esperei estes minutos e prometi que não faria investimentos de tristeza.

6 Morte, “Veia”, n é um lado diferente. Só isso. É como se a pessoa vivesse aí, junto de um velho muro, ignorando o que há no avesso da cerca. Pois a cerca não é assim tão forte. Vim sem pular por altura nenhuma. 7 Cheguei naturalmente, com meu pai, a fim de agradecer. Estou quase bem. Digo quase bem, porque a cabeça ainda balança um pouco, se a memória der um empurrão mais forte.

8 “Veia”, sou eu que peço para que não esquente a cabeça.
Tudo passou.
Fico muito grato por seu esforço. Esforço de não guardar ressentimento.

9 Seu filho estava realmente brincando com a vida. Perdoe se isso aconteceu. Não tive a ideia de que a terminação seria aquela. Foi uma zebra sem tamanho a que me surpreendeu. Mas não há de ser nada.

10 Mãe, não culpe a ninguém, peço.
Agradeço o seu pedido ao nosso amigo Dr. Wanderley, e peço transmita aos nossos, especialmente ao nosso Mário, o respeito e o carinho com que me deram a paz.

11 Isso, mãe, é assim mesmo. Uns chegam por aqui em maca ou cama de sofrimento, outros voltam com o sangue enrolado por dentro das veias, outros regressam de juízo perdido nos remédios do descanso obrigatório, e muitos dormem por aí e acordam por aqui com a cara e a coragem.

12 Eu, que sempre julguei cuidar-me para não entrar pelo cano, vim para cá diante do cano a querer entrar por dentro de mim. Mas, fora o pesar que causei ao seu carinho e aos nossos, estou menos mal.
Sucedeu o melhor.

13 Nunca me perdoaria se o amigo estivesse no meu lugar, em matéria da viagem forçada.

14 Às vezes, uma brincadeira é sistema de balança pagadora. Supus que me entregava a um divertimento de rapaz, e o prato da justiça ficou mais pesado para mim.

15 Agora, no que falo, digo o que ouço do velho Gastão. Diz ele, por vezes, “que entrou na água, julgando entreter-se, e a água acabou entrando nele”. Nossos negócios estavam por ali, Meia Ponte, periferia, e ocorrências. Sentimos que o fogo em mim se faça fogo em seu coração e que as águas do rio se hajam transformado em lágrimas nos seus olhos, entretanto, as lutas estão passando.

16 Pai e eu refletimos nessa base e contamos com o seu perdão.
Peço ao seu carinho: Medite nos Henriques outros que estão por aí necessitando de sua bondade de mãe.

17 O nosso reencontro será fatal.
Anteontem, fui eu a rever meu pai, ontem foi o velho Gregoris a retornar para os braços do filho.
Meu avô que se fez de volta para cá, desconhecendo tantos fatos dos tempos últimos, surpreendeu-se muito ao reencontrar-me.

18 “Veia”, o seu dia chegará. Não se apresse.
Sei que o suicídio não é dose para nós, mas a morte pode sobrevir por motivos diversos. E um deles, e talvez dos mais fortes, é aquele do desejo forte da pessoa quando escolhe morrer.
As suas tarefas são muitas.

19 Um rapaz qual eu mesmo, estuda e estuda, no entanto, um coração de mãe é muito mais importante no mundo, sem estudar especificamente para atuar nos Grupos da Humanidade.

20 Conduzamos nosso Eduardo para a compreensão. Ele não pode andar encucado, perguntando porque — o porquê da minha vinda para cá num inesperado momento. Ajude meu irmão a considerar o caminho do trabalho a escolher.

21 Não sei o que deva falar.
Opiniões às vezes são forças disfarçadas de violência. Não sei porque Eduardo prefere voar, mas, se isso é sonho dele, desejo ao querido irmão o destino de um Lindbergh.
Esquema traçado no painel, e subida calma para cima das nuvens. Sem cair, é claro.

22 O que não me conformo é vê-lo impressionar-se de tal modo que precise de medicina especializada.
Diga ao irmão que a vida é um capítulo que Deus escreve por nosso intermédio. E por tudo o que se escreve não se dispensa um ponto final. A morte é mudança de linha. Estou apenas num parágrafo novo.

23 Saí dos estudos para trabalho empresarial e deixei a APEGO a fim de empreender outras tarefas e apegar-me a outros valores.
Apenas rogo a Eduardo apreciar a seriedade da vida, sem brincar com ela.

24 Mãe, agradeço a todos.
Estou tranquilo.
Seu carinho me trouxe paz.

25 Você entendeu tudo e me libertou de tudo o que me poderia prender aí.
Prometo, trabalharei e tentarei habilitar-me para servir ao seu lado, com as suas faculdades mediúnicas.

26 Estou feliz, porque você, “Veia”, cumpriu a sua fé espírita. Você não só falou e disse, mas ensinou e fez. Muito obrigado.

27 Meu abraço aos cunhados, à Márcia e Ângela.
Não se preocupe se a família está aumentando.

28 Filho, mamãe, dá trabalho, mas oferece a bênção do sacrifício com Deus.
E isso é processo legal dos melhores.
Agora, nós dois vamos trabalhar em silêncio para varrer o resto da poeira que ficou no caminho do dez de fevereiro.

29 “Veia”, tudo está bem, mas muito bem mesmo.
Penso no dinheiro que talvez pudesse faltar, mas pedi ao meu pai nos auxilie para que nada falte às suas mãos, sempre prontas para distribuir.

30 E quando conversar comigo no retrato, não me pergunte o que houve. O que houve é que amo a você cada vez mais, e que não quero me separar de você.

31 Mãe, agradeça por mim aos amigos e colegas de serviço. Todos foram notáveis pela dedicação.
Fique alegre e fique com Deus.

32 Filhos quando beijam as mães nada precisam contar. Elas adivinham. Pois adivinhe também, que seu filho estará em seus passos e que não me esquecerei um momento de seu carinho. E se você adivinhar que meus olhos estão molhados, é porque estou chorando de alegria por saber, querida mamãe, que sempre fui e que sou seu para sempre.

33 Sempre seu filho,


Henrique




FATALIDADE DO REENCONTRO


De uma entrevista com a genitora do comunicante, eis o que conseguimos colher:

“Nasceu Henrique Emanuel Gregoris a 7 de julho de 1952, em Goiânia.

Seus pais, Gastão Henrique Gregoris e D. Augusta Soares Gregoris, n ambos espíritas, em homenagem ao luminoso Espírito de Emmanuel, registraram o filho com o seu nome.

Henrique teve uma infância feliz e despreocupada até à desencarnação de seu pai, vítima de afogamento durante um pescaria. Passou pela adolescência quando sua família faceava grandes problemas financeiros.

Cedo deixou os estudos, indo trabalhar em Brasília — D. F., em 1972, a convite de um tio, Sr. Wilson Fidalgo, que lhe conseguiu colocação no Grupo do INCA, onde permaneceu por dois anos. Lá, prestou o vestibular na Universidade do Distrito Federal, para Administração de Empresas, sendo bem sucedido.

Com a morte do seu amigo Izídio Inácio da Silva, em acidente automobilístico, resolveu voltar para Goiânia, temendo com suas idas e vindas, “sofrer acidente e morrer longe da mãe e dos irmãos”.

Em 1974, de volta, ingressou na PLANITEC, Assessoria e Planejamento, a qual prestava serviços a APEGO — Associação de Poupança e Empréstimos de Goiás. Conseguiu a transferência de seus estudos para a Universidade Católica de Goiás.

Henrique, de personalidade alegre e extrovertida, gostava, à maneira do pai, de ajudar os amigos e as pessoas que o procuravam. Possuía amplo círculo de amizades entre jovens e adultos. Apreciava a vida do campo, tendo especial atração pela criação de gado vacum e cavalos, sendo estes seus planos para o futuro.

Era espírita. Gostava da literatura espírita, e seu último livro a ler, Jovens no Alémn recebeu dele o seguinte comentário: “é um barato”.

Nas férias e feriados, ia receber passes e água fluidificada, na Irradiação Espírita Cristã e no Centro Espírita Irmã Scheilla, na sua cidade de residência.

No dia 10 de fevereiro de 1976, no trabalho habitual, recebeu um telefonema de um amigo, convidando-o insistentemente para uma tarde alegre e divertida.

Henrique, solteiro e sem compromissos, concordou.

Às 22:30 horas do referido dia, sua mãe foi acordada por João Pontes, amigo e colega de Faculdade, dizendo que Henrique fora acidentado e estava muito mal no Hospital São Salvador, onde fora socorrido.

Chegando ao hospital, sua genitora foi informada pelo médico plantonista que seu filho havia falecido, vítima de arma de fogo. O amigo, com sua arma, tê-lo-ia ferido, julgando-se numa brincadeira.

Após 25 dias da desencarnação, seu pai Gastão Henrique Gregoris enviou expressiva mensagem, através do médium Chico Xavier, ( † ) consolando a esposa e mãe. n

A família desejava um esclarecimento sobre o fato, aguardando o desenrolar do processo instaurado pela Polícia do 1º Distrito Policial de Goiânia.

Após alguns meses, o advogado da família, Dr. Wanderley de Medeiros, informou que o acusado havia sido absolvido.

A família não concordou, absolutamente, sendo feita a apelação para Instância Superior.

Dois dias após a apelação (desconhecendo totalmente o fato), o médium Francisco Cândido Xavier, a pedido do Espírito de Henrique, deslocou-se até Goiânia para dizer-lhe à genitora — D. Augustinha — que perdoasse o amigo.

D. Augusta, diante do pedido do filho desencarnado, imediatamente enviou uma carta ao seu advogado, solicitando-lhe que encerrasse definitivamente o processo.”


Anotemos o que ostentou O Popular, de 18 de julho de 1976, sob o título “Mãe desiste de ação contra acusado da morte de seu filho”: n “O juiz Orimar Bastos, da Comarca de Piracanjuba, respondendo pela de Hidrolândia, absolveu o bacharel João França de responsabilidade na morte de Henrique Emanuel Gregoris. Contratado pela mãe da vítima, o advogado Wanderley de Medeiros entrou com a petição de apelação contra a sentença. Dona Augusta Soares Gregoris, genitora de Henrique, antes que a petição tivesse curso, desistiu da apelação, comunicando a seu advogado que seu filho, depois de morto, perdoara ao acusado. Assim, a ação foi encerrada definitivamente.”

Depois de se referir à tragédia e de transcrever, na íntegra, a mensagem de Gastão, eis o desfecho do artigo, do qual suprimimos a transcrição da carta de D. Augusta:

“Ao receber a notícia da absolvição do réu e julgando que o advogado dela, no processo, fizera considerações desairosas à memória do seu filho, Dona Augusta contratou Wanderley de Medeiros para a apelação.

“O médium espírita, n contudo, veio pessoalmente a Goiânia para lhe dizer que Henrique Emanuel se manifestara em Uberaba e pedira à sua mãe para perdoar o acusado, que era inocente.”


Da mensagem recebida pelo médium Xavier, no Grupo Espírita da Prece, ao final da sessão pública da noite de 25 de setembro de 1976, destaquemos apenas os seguintes itens:

1 — observemos a linguagem rica de gírias, que era habitual ao missivista, quando encarnado;


2 — “Veia” — tratamento carinhoso de Henrique, quando se dirigia à sua mãezinha;


3 — curiosa a imagem do muro, sendo a morte nada mais que “um lado diferente”;


4 — “Agradeço o seu pedido ao nosso amigo Dr. Wanderley, e peço transmita aos nossos, especialmente ao nosso Mário…” — O Espírito se refere ao advogado da família — Dr. Wanderley de Medeiros e aos cunhados Mário Lúcio Sobrosa e Luiz Antônio Rabelo.


5 — Sumamente confortador verificarmos a técnica de enxugar lágrimas do jovem Henrique: através do trocadilho, servindo-se da expressão “entrar pelo cano”, tão popular.


6 — Muito consolo a extrair para todos nós, os viajores da Eternidade: “Nunca me perdoaria, se o amigo estivesse em meu lugar, em matéria de viagem forçada.”


7 — Novamente, em tom jocoso, o Espírito alude à desencarnação do pai e à dele mesmo, alcançando, ao mesmo tempo, um clima altamente poético através da conotação dos signos fogo e águas do rio.


8 — Lembrete absolutamente concorde com o Capítulo XV de O Evangelho segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, — “Fora da Caridade não há Salvação”: ( † ) “Peço ao seu carinho: Medite nos Henriques outros que estão por aí necessitando de sua bondade de mãe.”


9 — Depois de afirmar que “o nosso reencontro será fatal”, isto é, que todos os Espíritos afins um dia se reencontrarão para trabalharem unidos, co-criadores, colaborando com o Criador na expansão do Universo Infinito, conta como se surpreendeu seu avô paterno, Gregoris, ao vê-lo no Mundo Espiritual. Na verdade, o Sr. Eduardo Gregoris desencarnara uma semana após a partida de Henrique, e desconhecia o penoso acontecimento que se lhe abatera sobre a família.


10 — “Conduzamos nosso Eduardo para a compreensão.” Trata-se do irmão que, com efeito mostra autêntica vocação de aviador. Sobre Lindbergh refere-se ao famoso (Charles August Lindbergh) aviador norte-americano.


11 — O trocadilho “deixei a APEGO a fim de apegar-me a outros valores” é da mais alta importância do ponto de vista de identificação do Espírito, já que o médium, de modo algum, poderia conhecer tantos detalhes, inclusive a circunstância de o comunicante ter saído “dos estudos para trabalho empresarial.”


12 — Márcia e Ângela: irmãs de Henrique.


13 — Profundamente humano o fecho da carta mediúnica, quando Henrique, enxugando lágrimas, pergunta à mãe querida, se seria capaz de adivinhar porque ele o fazia de olhos molhados.


Elias Barbosa



[1] Veja-se o depoimento de D. Augusta Soares Gregoris na obra anteriormente citada — Amor e Luz, ( † ) pp. 110-117.


[2]  Trata-se do livro de Francisco Cândido Xavier, Caio Ramacciotti e Espíritos Diversos, Jovens no Além, Grupo Espírita Emmanuel Sociedade Civil Editora, São Bernardo do Campo, SP, 1ª edição, setembro de 1975.


[3]  Veja-se o capítulo anterior.


[4] O Popular — Cidade/Estado. Goiânia. 18/07/1976. pág. 5. Ano XXXIX. nº 8543.


[5]  O repórter se refere ao médium Francisco Cândido Xavier.


Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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