Produção mediúnica oferecida pelo médium Francisco C. Xavier ao Dr. C. Ottoni.
Dr. Christiano, oferecendo-lhe este meu trabalho mediúnico, desejo explicar-lhe que Emmanuel é uma entidade que escreve por meu intermédio, cujas produções têm sido publicadas ultimamente, no Rio, pela imprensa espiritualista.
Esta é a sua última produção e como trata de uma questão científica, quis oferecer-lha neste manuscrito modesto. Se o assunto está aqui exposto com a preparação necessária é o que eu ignoro, em vista da minha pobreza intelectual.
O senhor há de avaliar este humilde manuscrito e se o julgar vazio e inútil, fica a boa intenção de minh’alma muito agradecida que lhe oferece esta lembrança.
P. Leopoldo, 28-9-1934.
Francisco Cândido Xavier.
Produção de Emmanuel, recebida em 25 e 26 de setembro de 1934.
1 Todos os fenômenos da vida, que se apresentam ao raio visual da ciência humana, mantenedores do seu entretenimento, são os da assimilação e desassimilação, todavia, os que afetam mais particularmente a percepção do homem não são os da atividade vital em si mesma, consubstanciados nas sínteses orgânicas assimiladoras, mas justamente os fenômenos da morte. É um axioma fisiológico a extinção das células que constituem o suporte de todas as manifestações do organismo e apenas apreciais geralmente uma ideia da vida, por intermédio desses movimentos destruidores.
2 Quando no homem ou nos irracionais uma ação se opera determina o desaparecimento de uma certa percentagem de substâncias da economia vital; quando a sensibilidade se exterioriza e quando os pensamentos se manifestam, eis que os nervos se consomem, gastando-se o cérebro em suas atividades funcionais.
A vida corporal é bem a verdadeira expressão da morte, através da qual efetuais as vossas observações e os vossos estudos.
Não dispondes, dentro da exiguidade dos vossos sentidos, senão de elementos que constatam a perda de energia, a luta vital, os conflitos que se estabelecem para que os seres se mantenham no seu próprio habitat.
A vida, em suas causalidades profundas, escapa aos vossos escalpelos e apenas a embriogenia observa na penumbra e no silêncio, infinitésima fração do fenômeno assimilador das criações orgânicas.
3 Segundo os dados da vossa fisiologia, a célula primitiva é comum em todos os seres vertebrados e espanta ao embriogenista a lei organogênica que estabelece a ideia diretora do desenvolvimento fetal, desde a união do espermatozoário ao óvulo, especificando os elementos amorfos do protoplasma; nos domínios da vida, essa ideia diretriz conserva-se inacessível até hoje aos vossos processos de indagação e de análise, porquanto esse desenho invisível não está subordinado a nenhuma determinação físico-química, porém, unicamente ao corpo espiritual preexistente, em cujo molde se realizam todas as ações plásticas da organização e sob cuja influência se efetuam os fenômenos endosmóticos. Organismo fluídico caracterizado por seus elementos imutáveis é ele o assimilador das forças protoplásmicas, o mantenedor da aglutinação molecular que organiza as configurações típicas de cada espécie, ele incorpora-se átomo por átomo à matéria do gérmen, dirigindo-a segundo a sua natureza particular.
4 Algumas objeções científicas têm sido apresentadas à teoria inconfutável do corpo espiritual preexistente, destacando-se entre elas como a mais digna de refutação a hereditariedade, a qual somente deve ser ponderada em sua feição fisiológica. Todos os tipos do reino mineral, vegetal, animal, incluindo-se o hominal, organizam-se segundo as disposições dos seus precedentes ancestrais, dos quais herdam naturalmente pela lei das afinidades electivas a sua sanidade ou os seus defeitos de natureza orgânica unicamente.
De todos os estudos referentes ao assunto, em vossa época, salienta-se a teoria darwiniana das gêmulas, corpúsculos infinitesimais que se transmitem pela via seminal aos elementos geradores, contendo na matéria embrionária a disposição de todas as moléculas do corpo que se reproduzem dentro de cada espécie.
A maioria das moléstias, inclusive a dipsomania são transmissíveis, porém, isso não implica um fatalismo biológico que engendre o infortúnio dos seres, porque inúmeros Espíritos, em traçando o mapa do seu destino, buscam, com o escolher semelhantes disposições, alargar as suas possibilidades de triunfo sobre a matéria, como um fato decorrente das severas leis morais, as quais, como no ambiente terrestre, prevalecem no mundo espiritual e que não nos cabe explanar neste estudo.
Não obstante a preponderância dos fatores físicos nas funções procriadoras é totalmente descabido e inaceitável o atavismo psicológico, hipótese aventada pelos desconhecedores da independência da individualidade espiritual e que revestem a matéria de poderes que jamais possuiu em sua condição de passividade característica.
Reconhecendo-se, pois, a veracidade da argumentação de quantos aceitam a hereditariedade fisiológica nos atos da procriação, representando cada organismo aquele de que provém por filiação, afastemos a hipótese da hereditariedade psicológica, porquanto, espiritualmente devemos considerar apenas, ao lado da influência ambiente, a afinidade sentimental.
5 De todas as funções gerais que caracterizam os seres viventes, somente os fenômenos da nutrição podem ser estudados pela perquirição científica e mesmo assim, imperfeitamente.
Além das operações comuns que se efetuam automaticamente, há uma força inerente aos corpos organizados, que mantém coesas as personalidades celulares, sustentando-as dentro das particularidades de cada órgão, presidindo aos fenômenos partenogenéticos da sua evolução, substituindo, através da segmentação, quantas se consomem nas secreções glandulares, no trabalho do equilíbrio orgânico. Essa força é o que denominais princípio vital, essência fundamental que regula as existências das células vivas e na qual elas se banham constantemente, encontrando assim a sua necessária nutrição, força que se acha esparsa em todos os escaninhos do universo orgânico, combinando as substâncias minerais, azotadas e ternárias, operando os atos nutritivos de todas as moléculas. O princípio vital é o agente entre o corpo espiritual e a matéria passiva, inerente às faculdades superiores do Espírito, o qual o adapta, segundo as forças cósmicas que constituem as leis físicas de cada Plano de existência, proporcionando essa adaptação às suas necessidades.
Essa força ativa e regeneradora de cujo enfraquecimento decorre a ausência de tônus vital, precursor da destruição orgânica é a ação criadora e conservadora do corpo espiritual sobre os elementos físicos.
6 O corpo espiritual não retém somente a prerrogativa de constituir a fonte da força plástica e misteriosa da vida, a qual opera a oxidação orgânica, é também a sede das faculdades, dos sentimentos e da inteligência e sobretudo é o santuário da memória, em que o ser encontra os elementos comprobatórios de sua identidade, através de todas as mutações da matéria.
7 As células orgânicas renovam-se incessantemente e como pode a criatura conhecer-se entre essas contínuas transformações? O pensamento, que desconhece glândulas que o segreguem, porquanto constitui a vibração consciente do corpo espiritual, para que se manifeste, quantas células se consomem e se queimam? O cérebro assemelha-se a um complicado laboratório, onde o Espírito, prodigioso alquimista, efetua maravilhosas associações atômicas e moleculares, necessárias às exteriorizações inteligentes.
É ainda, pois, ao corpo espiritual que se deve o prodígio da memória, misteriosa chapa fotográfica, onde tudo se grava, sem que os menores coloridos das imagens se confundam.
8 A neurologia tem procurado explicar toda a classe de fenômenos intelectuais através das ações combinadas do sistema nervoso e, de fato, atingiu certezas irrefutáveis, como por exemplo as de que uma lesão orgânica faz cessar a manifestação que lhe corresponde e que a destruição de uma rede nervosa faz desaparecer uma faculdade; semelhante asserto, porém, não elimina a verdade da influenciação de ordem espiritual e invisível, porque faz-se mister compreender a alma não isolada do corpo, mas ligada a ele, o qual, representa a sua forma objetivada, como um aglomerado de matérias imprescindíveis à sua tangibilidade, animadas pela sua vontade e pelos seus atributos imortais.
Algumas escolas filosóficas fizeram da alma uma abstração, mas a psicologia moderna restabeleceu a verdade, unindo os elementos psíquicos aos materiais, reconhecendo no corpo a representação da alma, representação material necessária, segundo as leis físicas imperantes na Terra, as quais colocaram no sensório o limite das percepções humanas, as quais são exíguas em relação ao número ilimitado das vibrações da vida, que para elas se conservam inapreensíveis.
É, pois, o corpo espiritual a alma fisiológica que assimila a matéria ao seu molde, à sua estrutura, a fim de materializar-se no mundo palpável; sem ele a fecundação constaria de uma composição amorfa e todas as manifestações inteligentes e sábias da natureza, que para nós deve significar a expressão da vontade divina, constituiriam uma série de fatos irregulares e incompreensíveis, sem objetivo determinado.
Todas as faculdades organizadoras são oriundas do Espírito.
9 E como se tem operado a evolução do corpo espiritual?
Remontai ao caos telúrico do vosso globo nas épocas primárias. Cessadas as perturbações geológicas, estabelecido o repouso em algumas grandes extensões do orbe, eis que entre as forças cósmicas associadas aparece o primeiro rudimento da vida organizada — o protoplasma; eis que os séculos se escoam, eis os infusórios, as amebas, os zoófitos, os seres monstruosos das profundidades submarinas…
Recapitulemos os milênios passados e acharemos a nossa própria história. A individualidade, o nosso “ego” constitui o nosso maior triunfo; e chegados ao raciocínio, ao sentimento da humanidade, através de vidas inumeráveis, teremos atingido o zênite de nossa evolução anímica? Não. Se vós e nós que ainda conservamos as características da nossa existência, nos encontramos acima dos nossos semelhantes inferiores, os irracionais, acima de nós se acham os seres superiores da espiritualidade, que se hierarquizam ao infinito e cuja perfeição nos compete alcançar.
Emmanuel
[1] Nota da editora: Mensagem oferecida por Chico Xavier ao médico Dr. Christiano Ottoni, prefeito de Pedro Leopoldo, MG. [No livro impresso essa mensagem foi publicada na forma de fac-símile do original, um opúsculo manuscrito produzido pelo médium, contendo 16 páginas enumeradas em algarismo romano.]