1 Você meu caro Antonino,
Pergunta com seus cuidados
Por que se faz tão difícil
Ouvir os mortos amados.
2 E acentua: — “Sempre tive
Muitos amigos no Além
Entretanto, peço, peço…
Chamo e não vejo ninguém.
3 “Que dizer Cornélio amigo,
Desta busca inacabada?
Faço preces, grito nomes,
Depois… é silêncio e nada…”
4 Entendo prezado amigo,
Toda a sua inquietação,
Mas ouça: somos quais somos
E as cousas são como são!…
5 Tudo espera tempo próprio
Onde o melhor se processa…
A verdade surge aos poucos
Sem ocupar-se da pressa.
6 Atendendo à luta humana,
Que dá tanto que pensar
O homem, ao pé da morte,
Raciocina devagar.
7 Por outro lado, as ideias,
Que a Terra criou no caso,
Nas portas do grande assunto
Despejou montões de atraso.
8 No mundo, lembra-se a morte,
E temos pessoas pasmas,
Falando em luto, agonia,
Cinzas, pedras e fantasmas!…
9 Isso cria tanto entrave,
Tanta sombra e tanta trica,
Que os vivos do Além não acham
A ligação com quem fica.
10 Basta que um morto qualquer
Dê sinal ou reapareça
E alongam-se fantasias
Tisnando muita cabeça.
11 Recorde: Joana, a viúva
Do Marciano Toledo
Chamava o esposo e ele vindo
A moça tombou de medo.
12 Tonho quis ver o irmão morto
E ao tê-lo junto de si,
Gritou e caiu de susto
Na estrada de Mandaqui.
13 Desejou ver o pai morto
O nosso amigo Aristeu,
Um dia, o rapaz, ao vê-lo,
Desmaiou e adoeceu.
14 Após a morte do tio
Totó buscava encontrá-lo,
Notando o tio na roca
Totó caiu do cavalo.
15 Marina chamava o esposo,
O falecido Teotônio,
Vendo o marido, a mulher
Dizia que era o demônio.
16 Júlia pedia ao marido
Auxílio num grande apuro,
O finado apareceu
Ela rezou no esconjuro.
17 Sabino encontrou em prece
Um irmão já desencarnado,
Gritou, chorou… Depois disse
Que estivera alucinado.
18 Perdeu Silvino a mulher…
Quis vê-la, a Dona Ceição,
Tendo a esposa junto dele
Clamou que era assombração.
19 Zelão contou haver visto
A noiva desencarnada…
Chorou, mas disse, em seguida,
Que era tudo patacoada.
20 Chamava o esposo, a Cecília,
Mulher do Janjão Salerno,
Vendo o finado, a viúva
Mandou Janjão para o inferno.
21 Doca chamava o pai morto
Em frases de imenso amor…
Quando o pai voltou a ela,
Falou que era obsessor.
22 Ante os problemas da morte
São muitos tropeços juntos,
E a verdade pede ao tempo
Que lhe prepare os assuntos…
23 Não se agaste, caro irmão,
O mundo é um contraste em si:
Os vivos buscando os mortos
E os mortos andando aí!…
Cornélio Pires
|