1 Você nos roga notícias,
Meu caro Arnaldo Gotuzzo,
Sobre arte além da morte,
Depois de tombar no abuso.
2 Arte, em verdade, é missão,
Que espírito e vida encerra
Construção de inteligência
Das mais nobres que há na Terra.
3 Os artistas, caro amigo,
Nos caminhos onde estão,
São companheiros chamados
À obra de elevação.
4 Cada um deles no mundo
Deve em tudo andar atento,
Para guardar a limpeza
Na força do pensamento.
5 Entretanto — quantos deles!…
Escondem os dons divinos,
Nos antigos espinheiros,
De trevas e desatinos.
6 No esquecimento corpóreo,
Muitos que a Terra não conta,
Se a vaidade os domina
Vão seguindo, de alma tonta.
7 Mas na morte, eis que observam
Os fracassos de alto preço
E chovem as petições
Dos cursos de recomeço.
8 Ruth dançando em aplausos
Enlouqueceu muita gente…
Hoje, ela quer renascer
Carregando um pé doente.
9 Abusou, de baile em baile,
Nosso amigo Estanislau…
Renasceu de pernas duras,
Lembrando pernas de pau.
10 Nina arrasou alma e corpo,
Pintando murais e telas,
Agora quer vida nova
Para servir em panelas.
11 Mentia usando voz linda
Nosso Nicola Maleta…
Encontrei-o reencarnado
Cantando na picareta.
12 Armênio esculpia pedras,
E endoidava corações
Hoje remove calhaus
Na Fazenda Solimões.
13 Antonino enfeitiçava
Muita moça em bandolim,
Hoje ele toca cabritos
No morro do Gergelim.
14 Manequim fez muito abuso,
Maricota dos Castilhos…
Morreu mas pede outro berço
Quer ser mãe de quinze filhos.
15 Morreu bordando calúnias
Nosso amigo Gil da Glória,
Hoje, ele quer escrever,
Mas quase não tem memória.
16 Arte é recurso sublime,
Que se deve respeitar,
Quanto mais dela se abusa
Mais débitos a pagar.
17 Arte limpa, caro amigo,
Nos lares ou nos museus,
É sempre luz apontando
Para a grandeza de Deus.
Cornélio Pires
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