O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Carmelo, ele mesmo — Mensagens familiares de Carmelo Grisi


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O retorno do doutor Radovir

1 Parece caso pensado, mas nossos encontros obedecem a certa matemática que não compreendo. Vocês chegam de Votuporanga ou de Rio Preto no momento justo em que temos assuntos de urgência para comentar. Hoje, por exemplo, temos o ocorrido com o nosso Radovir.

2 Faz hoje precisamente três meses que a nossa Martha esteve aqui mesmo em nossa companhia, levemente influenciada por nosso Hilário n que a desejava mais apta, a fim de se garantir na própria segurança, para aceitar sem revolta a viuvez que a esperava.

3 O mundo circulatório do Radovir estava muito difícil. O doutor Orlando já nos havia pedido informação sobre o desequilíbrio que o nosso amigo apresentava e ficamos na expectativa.

4 Induzi-lo a remédios não se nos fazia possível. O nosso Radovir era um homem que não mudava nem mesmo o próprio passo. Sempre estimei nele um filho amigo que a nossa Elvira me ensinava a compreender. 5 Sem ferir-lhe o nome de modo algum, o nosso caro Radovir era um homem de brigas santas. Às vezes, da conversa dele saíam raio, trovão, granizo e ventania forte; no entanto, quando a tempestade cedia, ei-lo de novo, ao modo de um cordeiro a mostrar-se disposto para qualquer serviço.

6 A notícia da desencarnação do amigo nos alcançou a todos e tivemos o privilégio de cooperar no trabalho do nosso caro Dr. Orlando que, assessorado por outros amigos, o desligou do corpo inerme, antes que o funeral se dirigisse para a Vila Ercília. n Acompanhei calado o que se fazia, pensando no apego inútil da maioria das pessoas na Terra, quando se enrolam com “teres e haveres” que lhes sobem do coração para a cabeça.

7 Nosso Radovir, que se impressionara construtivamente com as palavras de nossa Martha, logo após a sua estadia por aqui, conservou as impressões da esposa com respeito e segurança. Ele conhecia demais as peças do corpo para se deixar iludir com as opiniões dos colegas e familiares.

8 Médico é assim mesmo. Sabendo muito mais de si mesmo, em qualquer enfermidade, ele percebeu que Martha lhe entregava notícias do Além, porque se notava próximo da grande renovação. Mesmo ignorando que se lhe transmitia uma revelação doméstica nos diálogos que a esposa levara daqui, assustou-se, como é natural.

9 Soube ser grato ao carinho da Hilda, ao ministrar-lhe recursos espirituais de última hora e percebeu que a Elvira estava em torno de nossas atividades socorristas, que poderia claramente seguir-nos para tratamento em postos de socorro mais completo, mas deixamos que ele agisse como melhor lhe parecesse. Aceitou os passes da Hilda e as orações que se pronunciaram em seu louvor, mas sair da sua prudência e de sua formação era para ele algo impossível.

10 Elvira, transformada na enfermeira dedicada, fez o que pôde a fim de aliviar-lhe as dores e alcançou êxito, porque o nosso Radovir, antes de deixar o velório para seguir na direção do pouso da Vila Ercília, se deixou retirar do corpo inerme e não quis assistir ao ato final de sua representação no mundo. Falo em representação porque a Terra, agora, mais se parece a um grande palco, exibindo uma peça agitada em que todos aí somos protagonistas, queiramos ou não.

11 Agora, é preciso agradecer à querida Martha, quanto fez pelo querido companheiro, partilhando-lhe todas as alegrias e todas as horas difíceis do seu temperamento polêmico.

12 Comunicamos a ela que o marido está cuidadosamente amparado. Ainda não se apossou de si próprio com segurança. 13 Está na incerteza dos dois mundos que os materialistas querem seja um apenas. Tratado com raios terapêuticos, na base da luz em doseamento que não sei definir, está se libertando das lembranças muito materializadas que alimentou.

14 Admito que o Romeu e Hilda estivessem na convicção de ouvir-lhe a palavra ainda hoje, mas não foi possível. Está ele sob a hipnose da vida familiar. Fala na Martha, nos filhos e nos outros parentes com ansiedade. Homem de aço, não lhe ficaria bem conversar com os amigos da Terra numa demonstração de sensibilidade doentia de que não foi portador. Ele se restaura e virá até nós com o suporte do amparo do Alto e aguarda mais tempo na quarentena em que hoje se vê, entre a certeza e a indecisão.


Carmelo Grisi

(16.04.1983)     


ELUCIDAÇÕES


Neste noticiário sobre o passamento do Dr. Radovir temos vários pontos a considerar. Comecemos pelo conhecimento de eventos futuros nas Esferas espirituais próximas ao Plano terrestre.

Hilário, seu cunhado, vivendo no Além, já fora informado de que ele já estava com seus dias contados aqui na Terra, enquanto que os familiares e amigos nada percebiam em relação à sua saúde nos últimos meses. No entanto, a vida física poderia se dilatar por mais tempo, se outros fatores concorressem para isso, mas o Dr. Radovir não colaborou.

Devido à sua personalidade intransigente para consigo mesmo ele não se permitia submeter-se a exames e tratamentos com seus colegas e amigos, entre eles, categorizados cardiologistas. Sua convicção materialista dificultava a aproximação de Espíritos amigos para aconselhá-lo a ceder em favor de si mesmo, através de intuições ou contatos fora do corpo, durante o sono físico, a fim de permanecer mais tempo encarnado.

Apesar de seus méritos, ele não pôde contar senão com uma preparação muito superficial para enfrentar o desenlace para o qual, nos últimos dias, os amigos espirituais conseguiram intuí-lo. Sua esposa Martha estivera em Uberaba três meses antes e compartilhara da alegria da quinta mensagem transmitida por Carmelo.

Ao voltar, entusiasmada, conseguiu que ele lhe desse atenção sobre sua visita ao Grupo Espírita da Prece, não tanto pela mensagem ali recebida, mas por relatar as ponderações do Chico sobre o suicídio de um médico que fora amigo seu.

Quando perguntaram ao médium sobre a situação do médico suicida no mundo espiritual, ele dissera que o Espírito tinha a seu favor as operações gratuitas que fizera, pois que passavam de cem, e elas iriam funcionar como atenuantes do seu gesto infeliz. Radovir então retrucou:
— Se as coisas forem assim, eu, que opero na Santa Casa diariamente, há 34 anos, terei bastante mérito na “outra vida”.

Fez uma pausa e em seguida perguntou à esposa em tom jocoso:
— E você, quais são seus méritos para poder ficar junto de mim? Pelos meus cálculos já terei feito no mínimo de dez a quinze mil operações sem cobrar nada. Se existir uma outra existência depois desta, então não estarei tão mal nela.
E quedou-se pensativo.

Dr. Radovir era intelectual, agnóstico, como ele sempre dizia, progressista e inconformado com as injustiças sociais.

Muito humano com os doentes e deserdados da sorte, colocava-se, neste particular, ao nível dos verdadeiros cristãos. Ao entregar-se ao trabalho, sentia-se compromissado com a vida, tudo fazendo para que seus pacientes se recuperassem.

A sala de cirurgia era o seu templo; lá dentro era o sacerdote oficiando. Esta era a sua religião, pois somente lá, em plena ação cirúrgica, ele conseguia sentir que “alguém” guiava suas mãos e o advertia sobre detalhes nas intervenções, para que elas fossem coroadas de êxito. Foi um emérito cirurgião, conhecido e estimado na cidade e regiões vizinhas. A pobreza chorou sua morte e disso fomos testemunha.

Seu retorno à Pátria Espiritual ocorreu em 25 de janeiro de 1983. (Após sua readaptação à Vida Maior, o Dr. Radovir também enviou mensagens aos familiares, através da psicografia do Chico.)


Gerson Sestini



[8] Irmão de Martha, desencarnado em 1976.


[9] Bairro de São José do Rio Preto em que se localiza o Cemitério da Ressurreição, onde foi sepultado o corpo do Dr. Radovir.


Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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