1 Senhor Jesus!
Diante do calendário que se renova, deixa que nos ajoelhemos para implorar-te compaixão.
2 Tu que eras antes que fôssemos, que nos tutelaste, em nome do Criador, na noite insondável das origens, não desvies de nós teu olhar, para que não venhamos a perder o adubo do sangue e das lágrimas, oriundo das civilizações que morreram sob o guante da violência!…
3 Determinaste que o Tempo, à feição de ministro silencioso de tua justiça, nos seguisse todos os passos…
4 E, com os séculos, carregamos o pedregulho da ilusão, dele extraindo o ouro da experiência.
5 Do berço para o túmulo e do túmulo para o berço, temos sido senhores e escravos, ricos e pobres, fidalgos e plebeus.
6 Entretanto, em todas as posições, temos vivido em fuga constante da verdade, à caça de triunfo e denominação para o nosso velho egoísmo.
7 Na governança, nutríamos a vaidade e a miséria.
8 Na subalternidade, alentávamos o desespero e a insubmissão.
9 Na fortuna, éramos orgulhosos e inúteis.
10 Na carência, vivíamos intemperantes e despeitados.
11 Administrando, alongávamos o crime.
12 Obedecendo, atendíamos à vingança.
13 Resistíamos a todos os teus apelos, em tenebrosos labirintos de opressão e delinquência, quando vieste ensinar-nos o caminho libertador.
14 Não te limitaste a crer na glória do Pai Celeste.
Estendeste-Lhe a incomparável bondade.
15 Não te circunscreveste à fé que renova.
Abraçaste o amor que redime.
16 Não te detiveste entre os eleitos da virtude.
Comungaste o ambiente das vítimas do mal, para reconduzi-las ao bem.
17 Não te ilhaste na oração pura e simples.
Ofertaste mãos amigas às necessidades alheias.
18 Não te isolaste, junto à dignidade venerável de Salomé, a venturosa mãe dos filhos de Zebedeu.
Acolheste a Madalena, possuída de sete gênios sombrios.
19 Não consideraste tão somente a Bartimeu, o mendigo cego.
Consagraste generosa atenção a Zaqueu, o rico necessitado.
20 Não apenas aconselhaste a fraternidade aos semelhantes.
Praticaste-a com devotamento e carinho, da intimidade do lar ao sol meridiano da praça pública.
21 Não pregaste a doutrina do perdão e da renúncia exclusivamente para os outros.
Aceitaste a cruz do escárnio e da morte, com abnegação e humildade, a fim de que aprendêssemos a procurar contigo a divina ressurreição…
22 Entretanto, ainda hoje, decorridos quase vinte séculos sobre o teu sacrifício, não temos senão lágrimas de remorso e arrependimento para fecundar o Saara de nossos corações…
23 Em teu nome, discípulos infiéis que temos sido, espalhamos nuvens de discórdia e crueldade nos horizontes de toda a Terra! É por isso que o Tempo nos encontra hoje tão pobres e desventurados como ontem, por desleais ao teu Evangelho de Redenção.
24 Não nos deixes, contudo, órfãos de tua bênção…
25 No oceano encapelado das provações que merecemos, a tempestade ruge em pavorosos açoites… Nosso mundo, Senhor, é uma embarcação que estala aos golpes rijos do vento. Entre as convulsões da procela que nos arrasta e o abismo que nos espreita, clamamos por teu socorro! 26 E confiamos em que te levantarás luminoso e imaculado sobre a onda móvel e traiçoeira, aplacando a fúria dos elementos e exclamando para nós, como outrora disseste aos discípulos aterrados: — “Homens de pouca fé, porque duvidastes?” ( † )
Irmão X
(Humberto de Campos)
FIM