O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Cartas e crônicas — Irmão X


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Treino para a morte

1 Preocupado com a sobrevivência além do túmulo, você pergunta, espantado, como deveria ser levado a efeito o treinamento de um homem para as surpresas da morte.

2 A indagação é curiosa e realmente dá que pensar.

Creia, contudo, que, por enquanto, não é muito fácil preparar tecnicamente um companheiro à frente da peregrinação infalível.

3 Os turistas que procedem da Ásia ou da Europa habilitam futuros viajantes com eficiência, por lhes não faltarem os termos analógicos necessários. Mas nós, os desencarnados, esbarramos com obstáculos quase intransponíveis.

4 A rigor, a Religião deve orientar as realizações do espírito, assim como a Ciência dirige todos os assuntos pertinentes à vida material. Entretanto, a Religião, até certo ponto, permanece jungida ao superficialismo do sacerdócio, sem tocar a profundez da alma.

5 Importa considerar também que a sua consulta, ao invés de ser encaminhada a grandes teólogos da Terra, hoje domiciliados na Espiritualidade, foi endereçada justamente a mim, pobre noticiarista sem méritos para tratar de semelhante inquirição.

6 Pode acreditar que não obstante achar-me aqui de novo, há quase vinte anos de contado, sinto-me ainda no assombro de um xavante,  †  repentinamente trazido da selva matogrossense para alguma de nossas Universidades, com a obrigação de filiar-se, de inopino, aos mais elevados estudos e às mais complicadas disciplinas.

7 Em razão disso, não posso reportar-me senão ao meu próprio ponto de vista, com as deficiências do selvagem surpreendido junto à coroa da Civilização.

8 Preliminarmente, admito deva referir-me aos nossos antigos maus hábitos. A cristalização deles, aqui, é uma praga tiranizante.

9 Comece a renovação de seus costumes pelo prato de cada dia. Diminua gradativamente a volúpia de comer a carne dos animais. O cemitério na barriga é um tormento, depois da grande transição. O lombo de porco ou o bife de vitela, temperados com sal e pimenta, não nos situam muito longe dos nossos antepassados, os tamoios  †  e os caiapós,  †  que se devoravam uns aos outros.

10 Os excitantes largamente ingeridos constituem outra perigosa obsessão. Tenho visto muitas almas de origem aparentemente primorosa, dispostas a trocar o próprio Céu pelo uísque aristocrático ou pela nossa cachaça brasileira.

11 Tanto quanto lhe seja possível, evite os abusos do fumo. Infunde pena a angústia dos desencarnados amantes da nicotina.

12 Não se renda à tentação dos narcóticos. Por mais aflitivas lhe pareçam as crises do estágio no corpo, aguente firme os golpes da luta. As vítimas da cocaína, da morfina e dos barbitúricos demoram-se largo tempo na cela escura da sede e da inércia.

13 E o sexo? Guarde muito cuidado na preservação do seu equilíbrio emotivo. Temos aqui muita gente boa carregando consigo o inferno rotulado de “amor”.

14 Se você possui algum dinheiro ou detém alguma posse terrestre, não adie doações, caso esteja realmente inclinado a faze-las. Grandes homens, que admirávamos no mundo pela habilidade e poder com que concretizavam importantes negócios, aparecem, junto de nós, em muitas ocasiões, à maneira de crianças desesperadas por não mais conseguirem manobrar os talões de cheque.

15 Em família, observe cautela com testamentos. As doenças fulminatórias chegam de assalto, e, se a sua papelada não estiver em ordem, você padecerá muitas humilhações, através de tribunais e cartórios.

16 Sobretudo, não se apegue demasiado aos laços consanguíneos. Ame sua esposa, seus filhos e seus parentes com moderação, na certeza de que, um dia, você estará ausente deles e de que, por isso mesmo, agirão quase sempre em desacordo com a sua vontade, embora lhe respeitem a memória. 17 Não se esqueça de que, no estado presente da educação terrestre, se alguns afeiçoados lhe registarem a presença extraterrena, depois dos funerais, na certa intimá-lo-ão a descer aos infernos, receando-lhe a volta inoportuna.

18 Se você já possui o tesouro de uma fé religiosa, viva de acordo com os preceitos que abraça. É horrível a responsabilidade moral de quem já conhece o caminho, sem equilibrar-se dentro dele.

19 Faça o bem que puder, sem a preocupação de satisfazer a todos. Convença-se de que se você não experimenta simpatia por determinadas criaturas, há muita gente que suporta você com muito esforço.

Por essa razão, em qualquer circunstância, conserve o seu nobre sorriso.

20 Trabalhe sempre, trabalhe sem cessar.

O serviço é o melhor dissolvente de nossas mágoas.

21 Ajude-se, através do leal cumprimento de seus deveres.

Quanto ao mais, não se canse nem indague em excesso, porque, com mais tempo ou menos tempo, a morte lhe oferecerá o seu cartão de visita, impondo-lhe ao conhecimento tudo aquilo que, por agora, não lhe posso dizer.


Irmão X

(Humberto de Campos)

Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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