O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Boa nova — Humberto de Campos


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A luta contra o mal

1 De todas as ocorrências da tarefa apostólica, os encontros do Mestre com os endemoninhados constituíam os fatos que mais impressionavam os discípulos.
A palavra “diabo” era então compreendida na sua justa acepção. Segundo o sentido exato da expressão, era ele o adversário do bem, simbolizando o termo, dessa forma, todos os maus sentimentos que dificultavam o acesso das almas à aceitação da Boa Nova e todos os homens de vida perversa, que contrariavam os propósitos da existência pura, que deveriam caracterizar as atividades dos adeptos do Evangelho.

2 Dentre os companheiros do Messias, Tadeu era o que mais se deixava impressionar por aquelas cenas dolorosas. Aguçavam-lhe sobremaneira, a curiosidade de homem, os gritos desesperados dos Espíritos malfazejos, que se afastavam de suas vítimas sob a amorosa determinação do Mestre Divino. Quando os pobres obsidiados deixavam escapar um suspiro de alívio, Tadeu volvia os olhos para Jesus, maravilhado de seus feitos.

3 Certo dia em que o Senhor se retirara, com Tiago e João, para os lados de Cesareia de Filipe, ( † ) uma pobre demente lhe foi trazida, a fim de que ele, Tadeu, anulasse a atuação dos Espíritos perturbadores que a subjugavam. Entretanto, apesar de todos os esforços de sua boa vontade, Tadeu não conseguiu modificar a situação. Somente no dia imediato, ao entardecer, na presença confortadora do Messias, foi possível à infeliz dementada recuperar o senso de si mesma.

4 Observando o fato, Tadeu caiu em sério e profundo cismar. Por que razão o Mestre não lhes transmitia, automaticamente, o poder de expulsar os demônios malfazejos, para que pudessem dominar os adversários da causa divina? Se era tão fácil a Jesus a cura integral dos endemoninhados, por que motivo não provocava ele de vez a aproximação geral de todos os inimigos da luz, a fim de que, pela sua autoridade, fossem definitivamente convertidos ao Reino de Deus? Com o cérebro torturado por graves cogitações e sonhando possibilidades maravilhosas para que cessassem todos os combates entre os ensinamentos do Evangelho e os seus inimigos, o discípulo inquieto procurou avistar-se particularmente com o Senhor, de modo a expor-lhe com humildade suas ideias íntimas.


5 Numa noite tranquila, depois de lhe escutar as ponderações, perguntou-lhe Jesus, em tom austero:
— Tadeu, qual o principal objetivo das atividades de tua vida?
Como se recebesse uma centelha de inspiração superior, respondeu o discípulo com sinceridade:
— Mestre, estou procurando realizar o Reino de Deus no coração.
— Se procuras semelhante realidade, por que a reclamas no adversário em primeiro lugar? Seria justo esqueceres as tuas próprias necessidades nesse sentido? Se buscamos atingir o infinito da sabedoria e do amor em Nosso Pai, indispensável se faz reconheçamos que todos somos irmãos no mesmo caminho!…

6 — Senhor, os Espíritos do mal são também nossos irmãos? — Inquiriu admirado o apóstolo.
— Toda a criação é de Deus. Os que vestem a túnica do mal envergarão um dia a da redenção pelo bem. Acaso, poderias tu duvidar disso? O discípulo do Evangelho não combate propriamente o seu irmão, como Deus nunca entra em luta com seus filhos; aquele apenas combate toda manifestação de ignorância, como o Pai, que trabalha incessantemente pela vitória do seu amor, junto da humanidade inteira.

7 — Mas, não seria justo, — ajuntou o discípulo, com certa convicção, — convocarmos todos os gênios malfazejos para que se convertessem à verdade dos Céus?
O Mestre, sem se surpreender com essa observação, disse:
— Por que motivo não procede Deus assim?… Porventura, teríamos nós uma substância de amor mais sublime e mais forte que a do seu coração paternal? 8 Tadeu, jamais olvidemos o bom combate. Se alguém te convoca ao labor ingrato da má semente, não desdenhes a boa luta pela vitória do bem, encarando qualquer posição difícil como ensejo sagrado para revelares a tua fidelidade a Deus. Abraça sempre o teu irmão. 9 Se o adversário do Reino te provoca ao esclarecimento de toda a verdade, não desprezes a hora de trabalhar pelo triunfo da luz; mas segue o teu caminho no mundo atento aos teus próprios deveres, pois não nos consta que Deus abandonasse as suas atividades divinas para impor a renovação moral dos filhos ingratos, que se rebelaram na sua casa. Se o mundo parece povoar-se de sombras, é preciso reconhecer que as leis de Deus são sempre as mesmas, em todas as latitudes da vida.

10 É indispensável meditar na lição de Nosso Pai e não estacionar a meio do caminho que percorremos. Os inimigos do Reino se empenham em batalhas sangrentas? Não olvides o teu próprio trabalho. Padecem no inferno das ambições desmedidas? Caminha para Deus. Lançam a perseguição contra a verdade? Tens contigo a verdade divina que o mundo não te poderá roubar, nunca. 11 Os grandes patrimônios da vida não pertencem às forças da Terra, mas às do Céu. O homem, que dominasse o mundo inteiro com a sua força, teria de quebrar a sua espada sangrenta, ante os direitos inflexíveis da morte. E, além desta vida, ninguém te perguntará pelas obrigações que tocam a Deus, mas, unicamente, pelo mundo interior que te pertence a ti mesmo, sob as vistas amoráveis de Nosso Pai.

12 Que diríamos de um rei justo e sábio que perguntasse a um só de seus súditos pela justiça e pela sabedoria do reino inteiro? Entretanto, é natural que o súdito seja inquirido acerca dos trabalhos que lhe foram confiados, no plano geral, sendo também justo se lhe pergunte pelo que foi feito de seus pais, de sua companheira, de seus filhos e irmãos. Andas assim tão esquecido desses problemas fáceis e singelos? Aceita a luta, sempre que fores julgado digno dela e não te esqueças, em todas as circunstâncias, de que construir é sempre melhor.

13 Tadeu contemplou o Mestre, tomado de profunda admiração. Seus esclarecimentos lhe caíam no espírito como gotas imensas de uma nova luz.
— Senhor, — disse ele, — vossos raciocínios me iluminam o coração; mas, terei errado externando meus sentimentos de piedade pelos Espíritos malfazejos? Não devemos, então, convocá-los ao bom caminho?
— Toda intenção excelente — redarguiu Jesus será levada em justa conta no Céu, mas precisamos compreender que não se deve tentar a Deus. 14 Tenho aceitado a luta como o Pai ma envia e tenho esclarecido que a cada dia basta o seu trabalho. ( † ) Nunca reuni o colégio dos meus companheiros para provocar as manifestações dos que se comprazem na treva; reuni-os, em todas as circunstâncias e oportunidades, suplicando para o nosso esforço a inspiração sagrada do Todo-Poderoso. 15 O adversário é sempre um necessitado que comparece ao banquete das nossas alegrias e, por isso, embora não o tenha convocado, convidando somente os aflitos, os simples e os de boa vontade, nunca lhe fechei as portas do coração, encarando a sua vinda como uma oportunidade de trabalho, de que Deus nos julga dignos.

16 O apóstolo humilde sorriu, saciado em sua fome de conhecimento, porém acrescentou, preocupado com a impossibilidade em que se via de atender eficazmente à vítima que o procurara:
— Senhor, vossas palavras são sempre sábias; entretanto, de que necessitarei para afastar as entidades da sombra, quando o seu império se estabeleça nas almas?!…
— Voltamos, assim, ao início das nossas explicações, — retrucou Jesus, — pois, para isso, necessitas da edificação do Reino no âmago do teu espírito, sendo este o objetivo de tua vida17 Só a luz do amor divino é bastante forte para converter uma alma à verdade. Já viste algum contendor da Terra convencer-se sinceramente tão só pela força das palavras do mundo? As dissertações filosóficas não constituem toda a realização. Elas podem ser um recurso fácil da indiferença ou uma túnica brilhante, acobertando penosas necessidades. 18 O Reino de Deus, porém, é a edificação divina da luz. E a luz ilumina, dispensando os longos discursos. Capacita-te de que ninguém pode dar a outrem aquilo que ainda não possua no coração. Vai! Trabalha sem cessar pela tua grande vitória. Zela por ti e ama a teu próximo, sem olvidares que Deus cuida de todos.


19 Tadeu guardou os esclarecimentos de Jesus, para retirar de sua substância o mais elevado proveito no futuro.
No dia seguinte, desejando destacar, perante a comunidade dos seus seguidores, a necessidade de cada qual se atirar ao esforço silencioso pela sua própria edificação evangélica, o Mestre esclareceu, com seus apóstolos singelos, como se encontra dentro da narrativa de Lucas: — “Quando o Espírito imundo sai do homem, anda por lugares áridos, procurando repouso e não o achando diz: — Voltarei para a casa donde saí; e, ao chegar, acha-a varrida e adornada. Depois, vai e leva consigo mais sete Espíritos piores do que ele, que ali entram e habitam; e o último estado daquele homem fica sendo pior do que o primeiro.” ( † )

20 Então, todos os ouvintes das pregações do lago compreenderam que não bastava ensinar o caminho da verdade e do bem aos Espíritos perturbados e malfazejos; que indispensável era edificasse cada um a fortaleza luminosa e sagrada do Reino de Deus, dentro de si mesmo.


Humberto de Campos

(Irmão X)

Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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