O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Brasil, coração do mundo, pátria do Evangelho — Humberto de Campos


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A Obra de Ismael

1 O grande movimento preparatório do Espiritismo em todo o mundo tinha, no Brasil, a sua repercussão, como era natural.

Por volta de 1840, ao influxo das falanges de Ismael,  †  chegavam dois médicos humanitários ao Rio de Janeiro. Eram Bento Mure  †  e Vicente Martins, n que haviam feito da medicina homeopata um verdadeiro apostolado. 2 Muito antes da codificação kardeciana, conheciam ambos os transes mediúnicos e o elevado alcance da aplicação do magnetismo espiritual. Introduziram numerosos serviços de beneficência no Brasil e traziam por lema, dentro da sua maravilhosa intuição, a mesma inscrição divina da bandeira de Ismael — “Deus, Cristo e Caridade”. Indescritível foi o seu devotamento à coletividade brasileira, à qual se haviam incorporado, sob os altos desígnios do mundo espiritual.

3 Nas suas luminosas pegadas, seguiriam, mais tarde, outros pioneiros da homeopatia e do Espiritismo, na pátria do Evangelho. Foram eles, os médicos homeopatas, que introduziram aqui os passes magnéticos, como imediato auxílio das curas. Hahnemann  †  conhecia a fonte infinita de recursos do magnetismo espiritual e recomendava esses processos psicoterápicos aos seus seguidores.

4 Os primeiros fenômenos de Hydesville,  †  na América do Norte, em 1847, não passaram despercebidos na corte do Segundo Reinado. A febre de experimentações que se lhes seguiu, nas grandes cidades europeias, incendiou, igualmente, no Rio de Janeiro, alguns cérebros mais destacados no meio social. Em 1853, a cidade já possuía um pequeno grupo de estudiosos, entre os quais se podia notar a presença do Marquês de Olinda  †  e do Visconde de Uberaba.  †  No Salvador, esses núcleos de experimentação já existiam, em idênticas circunstâncias. 5 Em 1860 surgem as primeiras publicações espiritistas. Em 1863, o Dr. Luís Olímpio Teles de Menezes  †  com alguns colegas, replicavam no Diário da Bahia a um artigo algo irônico de um cientista francês, desfavorável ao Espiritismo, publicado na Gazeta Medical e transcrito no jornal referido. As publicações brasileiras não passaram despercebidas ao próprio Allan Kardec, que delas teve conhecimento, com a mais justa satisfação íntima. [v. O Espiritismo no Brasil.]

6 A doutrina seguia sua marcha vitoriosa, através de todos os ambientes cultos da Europa e da América, quando o grande codificador desprendeu-se dos laços que o prendiam à vida material, em 1869. Justamente nesse ano surgira o primeiro mensário espírita brasileiro — “O Eco de Além Túmulo”.  †  O desaparecimento do mestre deixara algo desorientado o meio geral da doutrina em organização. Em Paris, como nos grandes centros mundiais, quiseram substituir a sua autoridade, inutilmente. As falanges de Ismael, porém, estavam vigilantes. 7 Sugeriram aos espiritistas brasileiros a necessidade de criar um núcleo central das atividades, no Rio, que ficasse como o órgão orientador de todos os movimentos da doutrina, no Brasil. Um dos emissários de Ismael, que dispunha de maiores elementos no terreno das afinidades mediúnicas, para se comunicar nos grupos particulares organizados na cidade, adotou o pseudônimo de Confúcius, com o qual transmitia instrutivas mensagens e valiosos ensinamentos. Em 1873 fundava-se, com estatutos impressos e demais formalidades exigidas, o “Grupo Confúcius”,  †  que constituiria a base da obra tangível e determinada de Ismael na terra brasileira. Por esse grupo, passaram, na época, todos os simpatizantes da doutrina e, se efêmera foi a sua existência como sociedade organizada, memoráveis foram os seus trabalhos, aos quais compareceu pessoalmente o próprio Ismael, pela primeira vez, esclarecendo os grandes objetivos da sua elevada missão no país do Cruzeiro. 8 Nem todos os espiritistas modernos conhecem o fecundo labor daqueles humildes arroteadores dos terrenos inférteis da sociedade humana. A realidade é que eles lutaram denodadamente contra a opinião hostil do tempo, contra o anátema, o insulto e o ridículo e, sobretudo, contra as ondas reacionárias das trevas do Mundo Invisível, para levantarem bem alto a bandeira de Ismael, como o manancial de luz para todos os Espíritos, e de conforto para todos os corações. As entidades da sombra vieram trazer a obra ingrata da oposição ao trabalho produtivo da edificação evangélica no Brasil. Bem sabemos que, se Aquiles  †  possuía um ponto vulnerável no seu calcanhar, o homem em si, pela sua vaidade e fraqueza, possui esse ponto vulnerável, generalizado em todos os escaninhos da sua personalidade espiritual, e os seres das trevas se não conseguiram vencer totalmente os trabalhadores, conseguiram desuni-los no plano dos seus serviços à grande causa.

9 O Grupo Confúcius teve uma existência de três anos rápidos.

Os mensageiros de Ismael, triunfando da discórdia que destruía o grande núcleo nascente, fundavam sobre ele, em 1876, a “Sociedade de Estudos Espíritas Deus, Cristo e Caridade”,  †  sob a direção esclarecida de Francisco Leite Bittencourt Sampaio, grande discípulo do emissário de Jesus, que, juntamente com Bezerra, tivera a sua tarefa previamente determinada no Alto. A ele se reunia Antônio Luís Sayão,  †  em 1878, para as grandes vitórias do Evangelho nas terras do Cruzeiro. O trabalho ingrato das trevas, no Plano Invisível, é arrojado e perseverante. 10 No seio desse redil de almas humildes e simples, esclarecidas à luz dos princípios cristãos, onde militavam espíritas lúcidos  e sábios como Bittencourt Sampaio, que abandonara os fulgores enganosos da sua elevada posição na literatura e na política para se apegar às claridades do ideal cristão, as entidades tenebrosas conseguem encontrar um médium, pronto para a dolorosa tarefa de movimentar a desarmonia e, estabelecida de novo a discórdia, os mensageiros de Ismael reorganizam as energias existentes para fundarem, em 1880, a “Sociedade Espírita Fraternidade”,  †  com a qual se carregava em triunfo o bendito lema do suave estandarte do emissário do Divino Mestre. 11 Em 1883, Augusto Elias da Silva,  †  na sua posição humilde, lançava o “Reformador”,  †  coadjuvado por alguns companheiros e com o apoio das hostes invisíveis. As mesmas reuniões do grupo humilde de Luiz Sayão  †  e Bittencourt Sampaio são continuadas. Uma plêiade de médiuns curadores, notáveis pela sua abnegação, iniciam, no Rio, o seu penoso apostolado. Elias da Silva e seus companheiros notam, entretanto, que a situação ia-se tornando difícil com as polêmicas esterilizadoras. A esse tempo, os emissários do Alto afirmam categoricamente aos seus camaradas do mundo tangível:

— “Chamem agora Bezerra de Menezes ao seu apostolado!”

12 Elias bate, então, à porta generosa do mestre venerável, o que não era preciso, porque seu grande coração já se encontrava a postos, no sagrado serviço da Seara de Jesus, sobre a face da Terra.

Bezerra de Menezes traz consigo a palma da harmonia, serenando todos os conflitos. Estabelece a prudência e a discrição, entre os temperamentos mais veementes e combativos.

13 A obra de Ismael, no que se referia às luzes sublimes do Consolador, estava definitivamente instalada na pátria do Cruzeiro, apesar da precariedade do concurso dos homens. As divergências foram atenuadas, para que a tranquilidade voltasse a todos os centros de experimentação e de estudo. Os operários espalhavam-se no Rio, cada qual com a sua ferramenta, dentro do grande plano da unificação e da paz, nos ambientes da doutrina, plano esse que eles conseguiriam relativamente realizar, mais tarde, organizando o aparelho central de suas diretrizes, que se consolidaria com a Federação Espírita Brasileira,  †  onde seria localizada a sede diretora, no Plano Tangível, dos trabalhos da obra de Ismael no Brasil.


Humberto de Campos

(Irmão X)


[1] [João Vicente Martins (1808-1854)]


Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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