O Caminho Escritura do Espiritismo Cristão
Doutrina espírita - 2ª parte.

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Brasil, coração do mundo, pátria do Evangelho — Humberto de Campos


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Os Degredados

1 Todos os Espíritos edificados nas lições sublimes do Senhor reuniram-se, logo após o descobrimento da nova terra, celebrando o acontecimento, nos espaços do Infinito. Grandes multidões elegantes e aéreas formavam imensos hífens de luz entre a Terra e o Céu. 2 Uma torrente impetuosa de perfumes se elevava da paisagem verde e florida, em busca do firmamento, de onde voltava à superfície do solo, saturada de energias divinas. 3 Sobre os ninhos quentes das árvores, pousavam as vibrações renovadoras das esperanças santificantes e, no Além, ouviam-se as músicas evocadoras da Galileia,  †  exuberante e agreste, antes das lutas arrasadoras das Cruzadas, que lhe talaram todos os campos, transformando-a num montão de ruínas. 4 Afigurava-se que a região dos pescadores humildes, que conheceu, com mais intensidade, os passos do Divino Mestre, se havia transplantado igualmente para o continente novo, dilatada em seus suaves contornos.

5 Uma alegria paradisíaca reinava em todas as almas que comemoravam o advento da pátria do Evangelho, quando se fez presente, na assembleia augusta, a figura misericordiosa do Cordeiro.

6 Um sorriso complacente pairava nos seus lábios angélicos e as suas mãos líricas seguravam um largo estandarte branco, como se um fragmento de sua alma radiosa estivesse ali dentro, transubstanciado naquela bandeira de luz, que era o mais delicioso dos símbolos de perdão e de concórdia.

7 Dirigindo-se a um dos seus elevados mensageiros na face do orbe terrestre, em meio do divino silêncio da multidão espiritual, a sua voz falou com doçura:

— “Ismael, manda o meu coração que doravante sejas o zelador dos patrimônios imortais que constituem a Terra do Cruzeiro.  8 Recebe-a nos teus braços de trabalhador devotado de minha seara, como o recebi no coração, obedecendo a sagradas inspirações do Nosso Pai. 9 Reúne as incansáveis falanges do Infinito, que cooperam nos ideais sacrossantos de minha doutrina, e inicia, desde já, a construção da pátria do meu ensinamento. 10 Para aí transplantei a árvore da minha misericórdia e espero que a cultives com a tua abnegação e com o teu sublimado heroísmo… 11 Ela será a doce paisagem dilatada do Tiberíades, que os homens aniquilaram, na sua sede de carnificina. 12 Guarda este símbolo da paz e inscreve na sua imaculada pureza o lema da tua coragem e do teu propósito de bem servir à causa de Deus e, sobretudo, lembra-te sempre de que estarei contigo no cumprimento dos teus deveres, com os quais abrirás para a humanidade dos séculos futuros um caminho novo, com a sagrada revivescência do Cristianismo…”

13 Ismael recebe o lábaro bendito das mãos compassivas do Senhor, cheio de lágrimas de reconhecimento, e, como se estivessse em ação o impulso secreto de sua vontade, eis que a bandeira suave tem agora uma insígnia. 14 Na sua branca substância uma tinta celeste insculpira o lema imortal: “Deus, Cristo e Caridade”. 15 Todas as almas ali reunidas entoam uma hosana melodiosa e intraduzível à sabedoria do Senhor do Universo. São vibrações gloriosas da espiritualidade, que se elevam pelos espaços ilimitados, louvando o Artista Inimitável e o Matemático Supremo de todos os sóis e de todos os mundos.

16 O emissário de Jesus desce então à Terra, onde estabelecerá a sua oficina. Os exércitos dos seres redimidos e luminosos acompanham a sua esplêndida trajetória e, como se o chão do Brasil fosse a superfície de um novo Hélicon  †  da imortalidade, a natureza, macia e cariciosa, toda se enfeita de luzes e sombras, de sinfonias e de ramagens perfumosas, preparando-se para um banquete dos deuses.

17 Os caminhos agrestes são agora sendas de maravilhosa beleza, rasgada pelas coortes do Invisível.

18 Nessa hora, a frota de Cabral foge das águas verdes e fartas da baía de Porto Seguro.

19 Nas fitas extensas da praia, estão chorando, desesperadamente, os dois degredados, dos vinte párias sociais que o rei D. Manuel I  †  destinara ao exílio nas Índias.

Os homens do mar afastam-se daqueles sítios, levando as amostras de sua extraordinária riqueza. Em toda a paisagem existe um largo ponto de interrogação, enquanto os dois infelizes se lastimam sem consolo e sem esperança. Os silvícolas amáveis e fraternos abrem-lhes os braços; é dos seus corações rudes e simples que desabrocham, para a sua amargura, as flores amigas de um brando conforto.

20 Mas, Afonso Ribeiro,  †  um dos condenados ao penoso desterro, avança numa piroga desprotegida e desmantelada, sem que os olhos da História lhe enxergassem o gesto de profunda desesperação, a caminho do mar alto. Ao longe, percebem-se ainda os derradeiros mastros das caravelas itinerantes. O infeliz degredado anseia por morrer. Os últimos gemidos são abafados na sua garganta exausta. Seus olhos, inchados de pranto, contemplam as duas imensidades, a do oceano e a do céu, e, esperando na morte o socorro suave, exclama do íntimo do seu coração:

— “Jesus, tende piedade da minha infinita amargura!… Enviai a morte ao meu Espírito desterrado… Sou inocente, Senhor, e padeço a tirania da injustiça dos homens… Mas, se a traição e a covardia me arrebataram de minha pátria, afastando dos meus olhos as paisagens queridas e os afetos mais santos do coração, essas mesmas calúnias não me separaram da vossa misericórdia!…”

21 Nesse instante, porém, o pobre exilado sente que uma alvorada de luz estranha lhe nasce no âmago da alma atribulada. Uma esperança nova apossa-se de todas as suas fibras emotivas e, como num suave milagre, a sua jangada rústica regressa, celeremente, à praia distante. Em vão as ondas sinistras e poderosas tentam arrebatá-lo para o oceano largo. Uma força misteriosa condu-lo à terra firme, onde o seu coração encontrará uma família nova.

22 Ismael havia realizado o seu primeiro feito nas Terras de Vera Cruz. Trazendo um náufrago e inocente para a base da sociedade fraterna do porvir, ele obedecia a sagradas determinações do Divino Mestre.  23 Primeiramente, surgiram os índios, que eram os simples de coração; em segundo lugar, chegavam os sedentos da justiça divina e, mais tarde, viriam os escravos, como a expressão dos humildes e dos aflitos, para a formação da alma coletiva de um povo bem-aventurado por sua brandura e fraternidade. 24 Naqueles dias longínquos de 1500, já se ouviam no Brasil os ecos suaves e doces do Sermão da Montanha.


Humberto de Campos

(Irmão X)

Texto extraído da 1ª edição desse livro.

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