Relatam seus familiares, um fato curioso na vida de Alceu. A despeito da formação católica, quando cursava o 1.º grau, no Colégio Imaculada Conceição de Leopoldina, com apenas 12 anos foi indagado pela professora:
— Tem medo da morte?
— Não.
— Por quê?
— Porque acredito na reencarnação.
Muito calado, observador atento, grande senso de responsabilidade e um amadurecimento interior considerável, permitindo, já em tenra idade, penetrar com profundidade nos enigmas da vida. Assim era Alceu.
Mantinha com os pais, Edésio Fernandes Duarte Andries e Marília Gouvêa Andries, e os irmãos Luciano, Edésio, Cíntia e Flávia, um relacionamento amigo, desprendido, evidenciando em suas atitudes a mesma grandeza espiritual que observamos em sua mensagem publicada neste livro.
DEPOIMENTO
Na ocasião de sua desencarnação, cursava o 3.º ano de engenharia na Universidade Federal de Ouro Preto - MG, e encontrava-se em férias escolares.
Alceu foi um filho sempre obediente, bom amigo, bom irmão. A sua desencarnação causou muito pesar à população leopoldinense.
Com o acidente, estávamos esmagados pela dor da saudade e da separação. Nossos planos de pais tinham ido por terra. Aquele filho em quem depositávamos toda a nossa esperança, partira…
Estávamos transtornados e sem saber qual caminho seguir.
Lendo livros presenteados por amigos, concluímos que nada podemos fazer para impedir, ante a vida, acontecimentos inevitáveis, quando fomos procurar Chico Xavier…
A carta de Alceu obtivemos na segunda viagem a Uberaba.
A mensagem foi um bálsamo para nossas almas. Nosso filho vinha tal qual ele era, esclarecendo-nos tudo e respondendo todas as perguntas que fazíamos no silêncio da separação.
Foi tudo muito claro. Ali estava ele. O seu modo de escrever, o jeito de pegar no lápis, até a assinatura da mensagem é a mesma que usava quando encarnado.
MENSAGEM
1 Mãezinha Marília e papai Edésio, têm sido peregrinações difíceis, as que me dedicam, vindo até aqui, procurando a minha pobre palavra.
2 Já sabemos o que me sucedeu, felizmente através de nossos irmãos de Leopoldina, principalmente. Entretanto, ninguém consegue sofrear o desejo de pais queridos, quando se decidem a procurar pelas notícias de um filho abençoado e esforcei-me quanto pude para dizer-lhes que vou seguindo bem, confirmando as minhas anotações através de nossas orações tocadas de fé em Deus. Queriam, porém, algum informe por intermédio do nosso amigo e pedi para vir até aqui, a fim de revê-los.
3 Mãezinha Marília, perdoe-me se não consegui atender-lhe as observações sobre as minhas corridas no trânsito. 4 A cada dia, quando me ausentava, ouvia-lhe as observações sobre o cuidado que me cabia respeitar ante a máquina; entretanto cumpri o que, decerto, se lavrara em algum lugar a meu respeito. 5 Impossível não ser assim, porque sempre dirigi com a máxima atenção. Entretanto, não creio que alguém consiga sustar o curso de certas experiências que se nos revelam inevitáveis.
6 Foi muito difícil para mim a ausência do lar, quando eu mais me ajustava à esperança de vencer na vida com os recursos em mãos. 7 Entretanto, foi preciso harmonizar-me com as opiniões dos amigos que cultivam o Espiritismo para aceitar por mim o gênero de morte do corpo que me surpreendeu.
8 Desde o momento em que me vi fora do envoltório físico, antes que o sono me impusesse a imobilidade em suas redes invisíveis, passei a procurar, por perto de mim, quem pudesse ir à nossa casa transmitir as minhas notícias.
9 Achava-me bem, com a ideia de que persistia na existência terrestre e, muito interessado em identificar o meu caminho para a nossa residência, encontrei um senhor de semblante moreno e amigo que me disse chamar-se Cândido Veloso. n
10 Afirmava-se em serviço na cidade, e não vacilei em chamá-lo para orientar-me. Ele sabia o meu itinerário e levou-me ao “Amor ao Próximo”, n esclarecendo-me que o irmão Tintino n viria logo me atender.
11 Assombrado, notei que não mais me reconhecia entre as pessoas da Terra, pois a elas me dirigia de modo muito estranho, porque pareciam indiferentes à minha ansiedade.
12 O querido tio de todos nós apareceu com bondade. Explicou-me que eu fora vítima de um trauma violento na desencarnação, e me acolheu de imediato em pequena enfermaria de socorros mais urgentes.
13 Ali comecei a experimentar a dor que me seguiu por diversos dias, até que eu pudesse ir com calma à nossa casa. 14 Tive a impressão de que a fé e a esperança haviam desertado de nosso ambiente. A tristeza dos pais queridos me afligiu. Roguei forças a Jesus por nós.
15 Em breve tempo, o tio Washington se fazia sentir junto de nós, doando-me as suas ideias muito lúcidas relativamente ao acontecido. 16 Lembrou-me os convites dele, da tia Penha, da prima Alcione, da irmã Elizabeth Montenari, n a fim de que estivesse esclarecido sobre o que nos acontece além do corpo, e, muito grato, aderi aos ensinamentos e disciplinas que me foram propostos. 17 Com o regime adotado, posso estar em casa quase que todos os dias, e tenho progredido um tanto mais no ideal de lhes ser útil.
18 É com muita alegria que lhes peço cultivarmos a confiança na Espiritualidade, pois considero uma bela conquista a possibilidade de chegar até aqui sabendo, de antemão, como evitar as primeiras dificuldades do nosso intercâmbio.
19 Mãe, não me afastei de nosso amor, nem de nossa casa. Estou trabalhando no “Tintino”, n como sucede ao papai. Rogo ao Edesinho n substituir-me em casa.
20 Tenho os irmãos todos em minh’alma, e rogo a Deus nos faça felizes. Tenho aprendido de novo a prestigiar a oração e prometo-lhes prosseguir, com êxito, em minha nova fase de restauração.
21 Agradeço, querida mãezinha Marília e querido papai, todas as orações com que me fortaleceram aqui, para que eu pudesse suportar a transição rápida sem maiores reclamações.
22 Endereço o meu reconhecimento a todos os amigos que me fortaleceram naqueles dias, nos quais me vi em dificuldades para escolher a estrada em que devia caminhar.
23 Graças a Deus, acertei os meus passos e rogo à mãezinha me auxilie a vencer-me nas inseguranças que ainda me assinalam aqui.
24 O Oldemar tem sido um grande amigo, e também ele preferiu trabalhar ao lado de dona Alaíde n e dos filhos queridos, permanecendo em nossa instituição. De nossos familiares, tenho recebido muito carinho e assistência da vovó Ana e do avô e querido amigo Manoel. n
25 Amizades e dedicações não me faltam. Tenho o auxílio da irmã Irthes Terezinha, de Ubá, do irmão Aires, de Cataguases, do irmão Isaltino, de Juiz de Fora, do amigo Abel Gomes, de Astolfo Dutra, n e podem acreditar que o nosso trabalho de formação espiritual é intensivo com amigos e instrutores em ação.
26 Eis aqui as minhas notícias de rapaz transferido de escola. São simples, mas são minhas.
27 O tio Washington está comigo neste instante e pede, por nosso intermédio, para que Alcione e Ostinho n prossigam, tanto quanto os irmãos, junto à tia Penha, nos serviços da seara de amor e luz em que todos nos encontramos.
28 Agradeço tudo o que tenho recebido nas renovações de nossa casa em meu benefício. Não me refiro à máquina n que tanto desejei possuir, porque estou fazendo exercícios mentais para esquecê-la.
29 Felizmente estou sempre melhor, conquanto as saudades muitas.
30 Entretanto, é com o meu sentimento transbordando de esperanças no futuro melhor, que deponho nas mãos dos pais queridos o coração muito respeitoso e muito grato do filho.
Alceu
Alceu Gouvêa Andries
27.03.1982
ELUCIDAÇÕES
1) Cândido Veloso — Desencarnado em 1941, aos 72 anos de idade. Foi um dos fundadores da Igreja Metodista de Leopoldina, e também da União Beneficente Operária Leopoldinense. Desconhecido da família do comunicante e de Chico Xavier.
2) “Amor ao próximo” — Centro Espírita Amor ao Próximo, de Leopoldina, com mais de 8 décadas de atividades.
3) Tintino — José de Oliveira Pires, mais conhecido como Tintino Pires. Espírita militante, ligado ao Centro Espírita Amor ao Próximo, com participação ativa na construção do Albergue Noturno “Major Zeferino”. Tio do pai do comunicante. Desencarnou em 1955, com 74 anos de idade.
4) Washington Duarte Andries — Irmão mais velho do pai de Alceu. Tornou-se espírita convicto e profundamente estudioso. Desencarnou em agosto de 1980, com 53 anos de idade.
Penha Aparecida — Esposa de Washington Duarte Andries.
Alcione Aparecida Andries Lopes — Filha mais velha do casal Washington-Penha.
Elizabeth Montenari — Espírita militante. Presidente do Centro Espírita “Tintino Pires” e responsável pelo Departamento de Difusão Doutrinária do Centro Espírita Amor ao Próximo.
5) …Trabalhando no “Tintino”… — Centro Espírita “Tintino Pires”, fundado em 1977, na periferia de Leopoldina, assim denominado em homenagem a Tintino Pires.
6) Edesinho — Irmão de Alceu.
7) Oldemar Montenari — Militante espírita de Leopoldina. Dedicado servidor do próximo, trabalhador do Centro Espírita Amor ao Próximo. Fundou a Sopa da Fraternidade, que atende diariamente pessoas carentes. Fundador também do Centro Espírita “Tintino Pires”.
Alayde de Oliveira Montenari — Esposa de Oldemar Montenari.
8) Mariana Siqueira — Trisavó de Alceu, desencarnada há vários anos. Morou em Sapé de Ubá, município de Ubá - MG. Incansável trabalhadora da Doutrina Espírita.
Avô Manoel — Trisavô de Alceu, esposo de D. Mariana Siqueira. Companheiro da esposa nos trabalhos doutrinários.
9) Irthes Terezinha de Andrade — Natural de Ubá, MG. Muito ligada ao movimento espírita leopoldinense. Desencarnou em 1957, aos 51 anos.
Aires de Oliveira — Natural de Cataguases - MG. Desencarnado há vários anos. Não foram conseguidos mais dados. Sabe-se que é mentor espiritual de centros espíritas de Cataguases e do Centro Espírita Amor ao Próximo, de Leopoldina.
Isaltino da Silveira Filho — Espírita militante. Um dos fundadores do Centro Espirita Ivon Costa, em Juiz de Fora - MG.
Abel Gomes — Espírita, escritor, poeta e professor. Deixou alguns livros, dois dos quais editados pela Federação Espírita Brasileira. Natural de Braz Pires, município de Astolfo Dutra - MG, onde há uma instituição de amparo que leva seu nome. Desencarnou em 1934, aos 57 anos.
10) Washington Duarte Andries Filho — primo de Alceu, filho do casal Washington-Penha.
11) “… a máquina…” — refere-se à moto que dirigia quando do acidente.
Paulo de Tarso Ramacciotti