1 Simão Pedro desperta, além da vida humana.
Retoma, pouco a pouco, as forças da memória.
Terminara, por fim, a luta insana
Do flagelo por grande pesadelo.
2 Recorda a cruz do fim, levantada ao avesso,
Que aceitara na Terra por vitória…
Sabe que está no Além, pensando em recomeço
Do próprio apostolado…
3 Onde estaria o Mestre Sempre Amado?
E os outros companheiros
De ânimo nobre e forte,
Que o haviam, no mundo, precedido,
Sob a perseguição sem pausa e sem sentido,
Ao encontro da morte.
4 A brisa da manhã suave e cristalina
Trazia-lhe perfume ao leito novo e alvo…
5 Indagava Simão: “Que surpresas teria?”
Tocou o próprio corpo, achou-se são e salvo
E chorava, enlevado, em suprema alegria…
6 Alguns instantes mais e ouviu, enternecidamente,
Cânticos de louvor e saudação;
7 Alguém surgiu à porta, de repente,
Envolto em doce luz
A doar-lhe conforto e proteção…
Pedro entendeu quem era e bradou-lhe: “Jesus!”
8 Erguendo-se, em seguida,
Leve e ágil, gritou: “Ave, Senhor da Vida!…”
9 Cristo abeirou-se dele, a enlaçá-lo sorrindo,
Depois vieram outros companheiros,
Instrutores, amigos, mensageiros,
Do júbilo fazendo o festival mais lindo…
10 Pedro enxergou, feliz, os vergéis exteriores…
Eram jardins imensos,
Recheados de flores.
11 Em profunda euforia,
O ditoso Simão
Tomou a si a mão
Que Jesus lhe estendia
E disse, quase em pranto:
12 — Senhor; estou cansado,
Não mais me distancies de teu lado…
Trago comigo a dor
Dos que moram no mundo,
Aquele imenso caos, cada vez mais profundo,
De penúria, fadiga e sofrimento…
13 Não desejo perder as luzes que hoje alcanço,
Permite-me, Senhor ficar contigo,
Neste celeste abrigo…
14 Necessito de paz, de socorro e descanso…
Louvo a ti por me buscares…
Deixa-me nestes bosques estelares…
15 Ao mundo de onde venho,
Pelas tribulações padecidas no lenho,
Não mais quero voltar…
Desejo aqui viver contigo, neste lar…
16 Mas Jesus apontou-lhe o imenso espaço à frente
E falou-lhe a sorrir:
— Fica, Simão, se estás contente…
17 Estes sítios são teus,
Tanto quanto de todos os irmãos
Que serviram, na Terra, à bondade de Deus…
18 Cristo fez pausa e, logo após,
Explicou: Quanto a mim,
Não posso repousar;
A construção do bem é o meu lugar…
19 Ouve, Simão!… Enquanto
Houver na Terra um só gemido
Numa gota de pranto,
Enquanto houver no mundo um coração caído,
Devo esforçar-me por permanecer
No trabalho do amor que é meu dever…
20 Mas, descansa, Simão!… Ver-nos-emos depois,
Nunca houve distância entre nós dois…
21 Afastou-se Jesus,
Entretanto, Simão fitando o Excelso Amigo,
Bradou sem vacilar:
— Senhor, eu vou contigo!…
22 No passo firme do Divino Mestre,
Ambos se retiraram das Alturas,
Buscando a direção das faixas obscuras
Da vastidão terrestre…
23 Na retaguarda, em paz, ficou a multidão
De almas angelicais, numa doce canção,
Cujo estribilho recordava
Esta expressão de luz dos hinos galileus:
— “Louvado seja o amor!… Bendito seja Deus!…”
Maria Dolores
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